Capítulo 3 ? A disputa de dores
A guerra da ch*peta finalmente chegou ao fim na quarta-feira da semana seguinte quando Bruna se rendeu e foi conversar com Ana, pedindo que ela falasse com Alice como amiga. Explicou que aquilo estava atrapalhando o sono de Enzo e toda a sua rotina na escola. Deixou bem claro também que havia visto a foto dele usando ch*peta durante o fim de semana e que nunca conseguiriam progresso nenhum se ele continuasse usando ch*peta em casa como se nada tivesse mudado. Bruna não sabe exatamente o que Ana havia dito para Alice, mas no dia seguinte a ch*peta voltou a vir na mochila e ela agradeceu aos céus, achando que era melhor nem tocar no assunto novamente.
Se ela achava que aquele era um acordo silencioso de paz, estava completamente enganada. Alice parecia continuar implicando com ela e diariamente enviava recados na agenda reclamando de alguma coisa. Ele estava comendo pouco, sua fralda estava demorando para ser trocada, ele estava com muitas picadas de mosquito, não estava bebendo água suficiente... E a lista só aumentava. Pelo menos as reclamações eram pela agenda e Bruna conseguiu evitar o confronto direto até a semana seguinte, quando Alice a chamou para conversar na hora da entrada.
– Eu quero saber quem mordeu meu filho – ela falou irritada.
– Nós não falamos o nome. É uma política da escola.
– Esse meliante mordeu meu filho e é meu direito saber – falou com raiva e completou de uma forma debochada que fez o sangue de Bruna ferver – Preciso pelo menos saber se ele foi vacinado...
Meliante? Vacinado? Ela estava querendo comparar a criança com um cachorro raivoso? Se tinha uma coisa que acabava com o autocontrole de Bruna rapidinho era ouvir adultos falarem mal de crianças.
– Você está falando de uma criança, não um cachorro ou um “meliante” e sim de uma criança de dois anos de idade – ela falou sem conseguir acreditar no que havia ouvido.
A forma como Bruna reagiu claramente surpreendeu Alice e ela fez uma feição que claramente queria dizer “Como você ousa falar assim comigo?”.
– Essa atitude – ela apontou para Bruna – Não me surpreende que seus alunos estejam aí mordendo uns aos outros.
Bruna respirou fundo. Ela queria mandar aquela mulher ir à merd*, mas ela não iria perder o emprego por causa daquela insuportável!
– Eu entendo que mordidas não são agradáveis, mas infelizmente é algo comum na educação infantil. Seu filho não foi o primeiro e nem será o último aluno a ser mordido nessa escola. É uma forma de defesa e comunicação. Algumas crianças batem, empurram, outras mordem. É ruim, mas acontece.
– Então é isso? Mordidas acontecem? Essa é a sua desculpa para agressão?
– Não é uma desculpa! E seu filho foi mordido porque ele pegou o brinquedo da mão de um amigo, foi uma disputa, não uma agressão.
– Isso não justifica a mordida!
– Não, mas eles são crianças e estão aprendendo isso ainda. A criança que mordeu seu filho cuidou dele depois. É o que ensinamos, respeitar e cuidar dos amigos.
– Mordidas são inaceitáveis! E a família dessa criança precisa fazer alguma coisa!
– Infelizmente elas acontecem. Um dia seu filho é mordido e no outro pode ser ele a morder.
– Meus filhos nunca fariam isso! – ela falou com uma certeza tão grande que Bruna quase riu da sua cara. Grande ilusão.
– Nunca diga nunca. Pode acontecer – ela falou e antes de continuar a discussão ela decidiu que seu autocontrole já havia se controlado demais – Vamos ficar mais atentos para tentar evitar de acontecer de novo. Agora me dá licença, preciso ir para a sala.
Quando Bruna chegou em casa, ela ainda estava muito estressada.
– O que foi? – sua irmã perguntou, conhecendo-lhe bem.
Bruna morava com Sabrina desde de que a irmã havia se divorciado há quase cinco anos. Apesar da grande diferença de idade, visto que Bruna era doze anos mais nova, as duas tinham uma relação muito próxima e na medida do possível conviviam muito bem sob o mesmo teto.
– Eu tive um dia muito estressante! – falou jogando-se sobre o sofá.
– Quer jantar? – ofereceu e Bruna rapidamente concordou ao sentir o cheiro.
– Você cozinhou? Que horas você chegou hoje? – ela estranhou, pois sabia que a irmã costumava chegar mais tarde.
Geralmente Bruna quem cozinhava na casa, mas estava tão estressada que era uma benção chegar em casa e não ter essa obrigação.
– Minhas aulas foram canceladas hoje a noite por conta de uma reunião, mas aí acabaram adiando a reunião.
Sabrina era professora universitária em um campus próximo da casa delas. Ela dava aulas sobre literatura e cultura africana e trabalhava alguns dias da semana no turno da noite.
– Mas não muda de assunto. Por que você está tão estressada? – perguntou enquanto colocava um prato de comida para si mesma.
– Tem uma mãe na escola que está me deixando maluca! – falou levantando-se para se servir.
– Mais uma que pede para você medir os mls de água que o filho bebe? – perguntou lembrando-se de um caso.
– Aquela mãe era tranquila em comparação a essa! O pior é que eu já fui professora do filho mais velho dela e nunca tive problema. Ela é mãe do Gael! Alice – falou o nome com uma careta.
– Seu queridinho Gael?
Sabrina ouvia Bruna falando muito dos seus alunos e Gael era um dos nomes mais falados naquela casa.
– Sim! E agora sou professora do filho mais novo, Enzo e parece que ela está de implicância comigo!
Enquanto jantavam Bruna narrou detalhadamente os eventos da guerra da ch*peta e todas as reclamações que havia recebido dela desde a reunião.
– Então essa tal de Alice não aceita que tem um filho autista e está descontando em você.
– Bom... Um filho com suspeita de ser uma criança neurodivergente. Mas para saber exatamente eles precisam levar ele em um neuro. Só que não parece que vão fazer isso tão cedo.
– Alguns pais demoram a aceitar, você sabe disso.
– E aí ela despeja toda a decepção dela em mim? Não é justo! – Bruna reclamou – E o problema nem é só ela ser grossa comigo, ela é simplesmente uma pessoa insuportável. Hoje ela comparou uma criança a um cachorro!
– Você sabe como são as famílias na escola que você trabalha – sua irmã falou em um tom julgador que Bruna conhecia muito bem.
– Eu sei, mas normalmente eu não tenho problemas assim. Agora essa mãe... – ela nem tinha palavras para explicar a irritação que sentia – Que ódio! – desabafou!
Sua irmã sabia que não adiantava argumentar. Bruna precisava colocar a raiva para fora e foi o que ela fez.
======
Bruna fazia com que Alice tivesse enxaqueca. Só mais um motivo para não gostar da garota. Depois do confronto sobre a mordida, ela passou o dia com dor e para a sua surpresa, teve uma noite conturbada de sono ao sonhar com Bruna. A garota parecia segui-la até nos seus sonhos. Alice não se lembrava de todos os detalhes ao acordar, mas sabia que havia começado com as duas discutindo e de repente se beijavam e depois faziam um pouco mais... Era a primeira vez que ela tinha um sonho erótico com uma pessoa que não suportava.
Na sexta-feira de manhã quando acordou, a dor de cabeça permanecia e parecia até ter aumentado.
Ela precisou ficar um pouco na escola para ver a obra depois de ter deixado os filhos e a visão de Bruna a fez arrepiar-se ao lembrar do sonho. Fez também a sua dor de cabeça aumentar ao ser ignorada pela garota que foi buscar o Enzo e tirou-o de seu colo sem nem lhe dirigir o olhar. Aquela garota era insuportável! Por que a sua libido não entendia aquilo?
Ela passou o dia tomando diferentes remédios sem nenhum efeito e até foi para casa mais cedo, mas nada adiantava e ela já estava sentindo outros sintomas da crise como enjoo e tontura. Ligou para o ex-marido explicando que precisaria ir na emergência e ele ficou de buscar as crianças na escola, mesmo não sendo o seu dia. Ela pegou um uber porque não tinha condições de dirigir e foi sentindo-se pior enquanto esperava. Ela só lembrou que não havia se alimentado desde de manhã quando estava caminhando para a sala de medicamentos e veio uma sensação de desmaio. Antes de desfalecer ela sentiu duas coisas: uma dor forte em seu tornozelo e o cheiro de Bruna.
=====
Bruna tinha cólicas terríveis desde que teve sua primeira menstruação aos doze anos. Em alguns meses as dores eram tão fortes que nenhum medicamento oral parecia funcionar. Quando ela estava na faculdade descobriu que a maconha podia ajudar, mas ela estava sem e não tinha dinheiro para mais, o que fazia com que sua única opção fosse a emergência. Ela já havia tomado vários remédios ao longo do dia, mas a dor havia persistido. Por isso, ao sair da escola naquela sexta ela havia dado graças a Deus por estar com o carro da sua irmã e foi até o pronto atendimento mais próximo. Ela estava na sala de medicação, sentindo-se finalmente melhor depois de uma semana intensa de trabalho e agradecendo mentalmente o plano de saúde que sua irmã pagava para ela, quando a viu.
Não era possível que ela não tinha paz nem quando estava no hospital! O médico havia acabado de lhe dar alta e ela estava caminhando para a saída enquanto Alice entrava. Ela nem teve tempo de fingir que não havia visto a mulher, porque ao passar perto dela, viu que ela começou a cair e como em um reflexo tentou segurá-la. Alice era mais alta e mais pesada que ela e as duas quase caíram juntas no chão até enfermeiras irem ajudar e Bruna entender que Alice havia desmaiado.
======
Quando Alice finalmente voltou a si, ela achou que estava tendo um novo sonho erótico ao ver Bruna em sua frente.
– Você está me seguindo? – perguntou.
– Eu estava aqui primeiro – Bruna argumentou quase que automaticamente e Alice reparou que aquilo não era um sonho.
Foi voltando a ter mais consciência e rapidamente uma das enfermeiras explicou que ela havia desmaiado e torcido o seu tornozelo de leve. Tinha uma bolsa de gelo sobre ele.
– Eu não comia há muito tempo – explicou ainda sentindo-se mal.
– A médica pediu alguns exames só para ter certeza.
– Não precisa – ela tentou ficar um pouco mais em alerta para demonstrar que estava bem – Não é a primeira vez que eu desmaio em uma crise de enxaqueca.
– Você tem enxaqueca? – a enfermeira perguntou com compaixão – Eu sei como é. São terríveis!
Nisso a médica aproximou-se com alguns papéis.
– Eu só quero mesmo o medicamento e vou embora.
– Seria melhor se você deixasse a gente fazer os exames. Só por precaução.
– Não tem necessidade. É só uma crise de enxaqueca. Eu já tive milhares – ela falou com certeza e a médica pareceu aceitar.
– Você pelo menos está com um acompanhante? – ela perguntou olhando para Bruna que estava de pé a uma distancia respeitosa, mas ainda claramente esperando por Alice.
– Não, mas eu não estou dirigindo, não se preocupe. Vou pegar um uber.
– Eu posso te levar – Bruna se ofereceu surpreendendo Alice e aparentemente até ela mesma pela feição que fez.
Aquela resposta pareceu ter sido suficiente para a médica e ela se retirou, assim como a enfermeira que foi buscar o medicamento.
– Você não precisa – Alice falou rapidamente.
– Tudo bem... O seu bairro é caminho para minha casa mesmo.
De repente Alice lembrou que estavam em um hospital e que Bruna já estava lá.
– Você está bem? – perguntou.
– Só cólicas... Às vezes só quando o remédio é direto na minha veia que passa. Mas eu já estou melhor. Eu não vou bater com o carro e te matar no caminho. Ou você também não confia nas minhas habilidades como motorista da mesma forma que questiona as minhas habilidades como professora? – ela provocou.
Aquela garota era simplesmente impossível de conversar.
– Eu só perguntei se você estava se sentindo bem, não precisa pular no meu pescoço por isso – falou irritada.
Aquilo pareceu fazer Bruna sentir-se arrependida, mas ela não se desculpou.
– Só aceita a carona – falou.
– Por que? Você nem gosta de mim! – ela não conseguia não provocar.
– Mas eu gosto dos seus filhos.
A audácia daquela menina chegava até a ser impressionante. Como ela falava claramente que não gostava de uma mãe da escola bem na sua cara? Alice não queria admitir que ela ficava muito gostosa quando estava irritada.
– E se acontecer alguma coisa com você vai ser tão ruim para o Enzo que todos os meus dias serão infernais! – ela continuou – Então eu vou te levar em casa e é o fim da história.
Ela também ficava muito gostosa quando era mandona...
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
[Faça o login para poder comentar]
Lea
Em: 23/11/2023
O autocontrole da Bruna me impressiona,eu já teria perdido o emprego.
Alice mulher, já está tendo sonhos eróticos. Só observo.
A Bruna não deixa passar nenhuma provocação,responde à altura.
Carol Barra
Em: 23/11/2023
Autora da história
Eu nem acho que ela se controla muito nao rsrs
Ela ataca a Alice tb
[Faça o login para poder comentar]
NovaAqui
Em: 23/11/2023
É muito amor envolvido entre elas kkkkk
Carol Barra
Em: 23/11/2023
Autora da história
Amor e odio kkk
[Faça o login para poder comentar]
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook:
Carol Barra Em: 23/11/2023 Autora da história
Exatamente