MARI e ANA por MahLemes
Capitulo 37 - Dançando
-Menina, arrasou! -Miguel disse quando entrei na cozinha.
-Viu? Eu te falei! -Diego me disse.
-Vocês não acham que eu exagerei não? Não estou acostumada com maquiagem.
-Você tá perfeita!
-Eu queria tirar um pouco a cara de criança pra não chamar muita atenção pra minha diferença de idade com a Ma.
-Atingiu o objetivo então. Não que pareça velha, mas tá mais adulta. -Miguel disse.
-Mas não se apega a isso de idade não, viu? Seja você e pronto.
-Eu sei, Di, mas é que em público é melhor não chamar muita atenção, né? Vai que dá algum problema pra Ma na faculdade. Por mim a gente esperava acabarem minhas aulas com ela pra ir em qualquer lugar público, mas ela tava com uma carinha de cachorro que caiu da mudança que não tive coragem de dizer não.
-Entendi seu ponto de vista. Mas assim que acabarem suas aulas com ela você para de se preocupar com isso, combinado?
-Combinado, Di. -Respondi sorrindo com sua preocupação comigo.
-O que você tá combinando com a minha namorada, posso saber? -Márcia disse entrando na cozinha. Eu ia responder com alguma gracinha, mas como era de praxe já eu apenas babei na minha namorada.
Márcia estava vestindo uma camisa solta com decote em V e uma saia justa e curta que acentuava sua bunda e mostrava aquelas pernas perfeitas dela. Seus cabelos estavam soltos levemente cacheados e ela usava uma maquiagem bem básica, apenas com um batom vermelho. No pescoço ela usava um colar com um pingente que chegava até o meio dos seios, parecendo direcionar o olhar para o seu decote. Nos pés um salto baixo provavelmente por imaginar que eu estaria de tênis. Enquanto eu absorvia seu visual notei que ela havia congelado quando me virei para ela. Eu estava usando uma calça jeans preta justa e uma blusa de alcinha azul. Para completar o look acabei colocando um salto um pouco ousado para mim, já que não estava acostumada. Meus cabelos estavam soltos, mas o que chamou a atenção da Márcia eu sabia que tinha sido a maquiagem. Eu havia ligado para Camila me ajudar e ela fez um trabalho incrível. Os meus olhos ela havia delineado de forma bem discreta, abusando apenas na sombra, que começava com um marrom e clareava mais para fora e o rímel era azul, dando um toque bem diferente. Na boca um batom vermelho berrante, como eu nunca havia usado.
-Uau, você tá linda, meu amor. -Disse sem conseguir despregar os olhos dela.
-Eu que o diga, Mari. Você tá... é... diferente...?
-Que foi, não gostou, amor? -Perguntei insegura.
-Não, você tá linda, perfeita, ma petite. Mas tá bem diferente.
Sua fala não me convenceu. Me parecia que tinha algo a mais que ela não queria dizer.
-Pode ser sincera, Ma. Não vou ficar chateada.
-É que... Promete que não vai ficar chateada?
-Fala logo, Ma. Tá me deixando nervosa.
-Tá bom. É que não parece você. Tá linda, tá perfeita. Mas não é a minha pequena... Entende? -Ela disse com uma cara muito insegura.
-Pois é. Não me sinto eu. -Eu disse rindo. -Só pedi pra Camila me maquiar assim pra parece mais velha pra não chamar muita atenção porque tenho medo de arrumar problema pra você na faculdade.
-Ô, ma petite, eu não quero que você mude por mim e nem por ninguém. -Márcia respondeu indo me abraçar. -Você tá linda. Ou melhor, você é linda.
-Mas Ma...
-Mari, vamos combinar uma coisa? -Ela disse olhando nos meus olhos. Apenas fiz que sim com a cabeça. -Você não vai se preocupar com o meu lado com relação à faculdade. Disso cuido eu, tudo bem? Eu quero que se preocupe com suas amigas, seus pais, suas colegas. Eu não quero um relacionamento que vai pesar pra você, mon chérie. Pelo contrário. Eu quero mais é aliviar. Podemos combinar assim?
-Podemos sim, Ma. Você é linda, sabia? -Respondi com os olhos cheios de lágrimas. Era realmente libertador parar de me preocupar com a faculdade nesse sentido. Senti um peso ser removido das minhas costas. Um peso que eu nem sabia estar carregando.
-Você que é, ma petite.
-Ok, gente, chega disso, né?
-Mi do céu, acho que até esqueci que tava aqui. -Márcia disse rindo.
-E acha que não percebi? -Ele disse fazendo bico.
-Ô, meu amor, você sabe que é o homem da minha vida. Não fica com ciúmes da Mari. -Márcia disse indo abraçar Miguel.
-Vamos acabar com esse papo furado e vamos comer porque meu homem ainda precisa tomar banho pra gente sair. -Diego entrou na conversa.
Fomos jantar no escritório enquanto os funcionários terminavam a limpeza do restaurante. Pouco depois, Miguel saiu para liberar os funcionários e tomar seu banho para podermos ir.
É claro que chegando à boate a fila estava enorme, mas Diego nos direcionou ao segurança, que confirmou nossos nomes na lista e entramos direto. Era uma boate como outra qualquer. Alguns espaços para sentar e a pista de dança no meio. Num dos cantos havia uma escada que dava para um mezanino que circundava a pista em forma de U. Lá em cima podíamos ver um bar e diversas mesas. No pé da escada havia outro segurança que permitia ou impedia a passagem das pessoas. No lado contrário da escada havia a indicação de banheiros, e logo ao lado de onde entramos havia outro bar.
-O que é lá em cima? -perguntei curiosa para Márcia.
-Lá é o camarote, digamos assim. Só sobe quem está autorizado. O bar tem umas bebidas diferentes e é open de cerveja. Ao menos é isso que ouvi, porque ir mesmo nunca fui.
-Então hoje é o seu dia de sorte, amiga. O Re arrumou com o boy dele pra gente entrar lá hoje.
-Surpresa! -Disse Miguel.
-Eu não acredito que vocês conseguiram. Como assim? O Re tá namorando o dono daqui?
-Você não tem ideia, amiga, o boy tá gamadinho no Re. No início ele nem tava assim a fim dele, mas ele fez tanta coisa romântica pro Re que não teve jeito, ele acabou apaixonando também. Tão parecendo duas lésbicas apaixonadas. -Diego disse e já se escondeu atrás de Miguel, pois sabia que iria apanhar de Márcia, caso não se defendesse.
-Você não presta, Mi.
-Bora subir? -Miguel disse.
-Eu te amo, Mi. -Márcia se corrigiu na hora. Caímos todos na risada.
Subimos e lá parecia outro lugar. As mesas e cadeiras eram elegantes e havia também alguns bancos acolchoados nos cantos. Eles ficavam justamente nos lugares menos iluminados, percebi na hora. Havia poucas mesas disponíveis, então logo nos acomodamos em uma que tínhamos vista para a pista de dança.
-O que vão beber? -Chegou uma garçonete quase instantaneamente na nossa mesa.
-Eu quero uma caipirinha. -Miguel disse.
-Eu vou de Martini. -Disse Diego.
-Quero uma caipirinha também. -Disse Márcia.
-Eu vou de cerveja mesmo. Obrigada.
-Por que não pega uma caipirinha? Lembro que já disse que gosta.
-Gosto sim, meu amor, mas sobe rápido. -Respondi e ri.
-E daí se subir?
-E daí que tô de salto. E não quero passar vexame na primeira vez que saímos juntas, gatinha.
-Tá bom então.
Bebemos nossa primeira rodada rindo muito das coisas que Miguel e Diego contavam sobre clientes do restaurante, mas logo resolvemos ir dançar. Lá a mesa ficava reservada quando você ia para a pista, portanto não perdíamos nossos lugares. Chegamos à pista ao som de “Favela” do Alok. Eu não estava preparada para o que veio em seguida. A Márcia dançava muito. Fiquei praticamente apenas babando na forma como ela dançava e chamava a atenção de todos na pista. Ela parecia estar em transe dançando e nem reparava nada ao seu redor. Aparentemente os meninos já sabiam disso e ficavam de olho caso alguém tentasse se aproximar. Ela então me puxou para dançar com ela e entrei na sua vibe. Eu comecei a sentir a música de uma forma diferente, como se ela me comandasse. Nunca tive coordenação para dançar e muito menos me senti a vontade, mas com a Márcia era diferente, era natural.
***
-Vem cá, ma petite. Deixa eu tirar sua roupa e te fazer toda minha. -Márcia disse com uma voz arrastada tentando soar sexy.
-Pode tirar, gatinha. Sou toda sua. -Respondi achando graça do seu estado meio bêbado e meio sonolento. Eu tinha certeza de que se eu não a ajudasse a tirar a roupa ela iria dormir do jeito que estava. Ela tinha apagado no Uber de volta e eu podia jurar que o sono tava mais presente que o álcool naquele momento. Como ela nem tentou tirar minha roupa eu me despi e fui até ela fazer o mesmo.
-Amor, a gente pode deixar pra depois eu te fazer minha? -Ela disse antes que eu conseguisse tirar sua roupa.
-Pode sim, Ma. Mas eu vou tirar sua roupa mesmo assim e vamos tomar um banho rápido porque estamos muito suadas. -Eu respondi já tirando sua blusa.
-Precisa não, ma petite. Amanhã a gente toma.
-Não senhora. Já pro banho ou então faço greve de sex* por um mês.
Foi como se eu tivesse ligado ela na tomada. Não esperava uma reação tão enérgica. Quando me dei conta ela já estava ligando o chuveiro e me chamando. Trocamos uns poucos beijinhos e então fomos dormir.
-Bom dia, bela adormecida! Achei que fosse precisar te beijar pra te tirar desse coma.
-Como assim? Quantas horas? Dormi muito?
-Calma, meu amor. Dormiu bastante, mas não tem problema. Eu fiz almoço. -Respondi com um sorriso.
-Sério, Mari? Que gracinha! Nossa, mas quantas horas?
-Uma da tarde já.
-Estranho, não costumo dormir muito. Deve ter sido a companhia. -Márcia disse com uma cara de conquistadora barata.
-Aham, a companhia que tá de pé desde as nove da manhã, né? -Respondi rindo da sua cara de quem foi pega no flagra.
-Ops. -Ela disse e deu um sorriso lerdo.
-Anda, vem, vamos comer. Tô morta de fome.
-Peraí, ma petite. Preciso de um banho, escovar os dentes, fazer xixi.
-Ah, agora que eu tô com fome a senhora quer tomar banho, é? Ontem quando tava fedida não queria, mas agora que a comida tá pronta não vê a hora de tomar um banho. -Disse com o rosto sério.
-Como assim eu não queria tomar banho ontem? -Ela perguntou com uma cara perdida.
-Você não lembra?
-Acho que não. Engraçado porque não bebi muito. Normalmente esqueço quando bebo muito só. E tem que ser muito mesmo.
Comecei a rir da sua cara de desespero quando começou a perceber que faltavam peças nas suas lembranças da noite anterior.
-O que eu fiz, Mari? Tô começando a ficar preocupada.
-Ô meu Deus. Não vou te torturar não, gatinha. Você só disse que queria me fazer sua e logo desistiu. Quando fui tirar sua roupa pra tomar banho não queria. Só tomou porque eu ameacei fazer greve de sex*. -Respondi rindo dela ficando vermelha.
-Você ameaçou uma greve de sex* pra eu tomar banho?
-Sim, foi meu único recurso, Ma.
-Com sex* não se brinca, Mari. Não pode fazer essas coisas. Elas traumatizam. Como eu ia conseguir te dar aula pensando que não ia poder te tocar no fim do dia? -Ela tentou dizer essas coisas com o rosto sério, mas falhou miseravelmente.
-Você não presta, Ma. Agora anda, toma lá seu banho porque senão começo a comer sem você.
-Credo, meu amor. Nem um beijinho de bom dia eu ganho? -Ela disse fazendo bico.
-Hoje não. Você tá muito engraçadinha e não quero alimentar esse seu lado. -Respondi saindo do quarto.
-Vai ter volta! -Ouvi ela dizer quando estava no corredor.
Eu tinha certeza de que teria volta e estava contando com isso. Aproveitei que ela ainda ia demorar uns minutinhos e fui arrumar a mesa ao ar livre. A manhã tinha sido linda, com um céu azul sem nuvens, mas agora o tempo começava a fechar e uma brisa fresca soprava. Estava de olhos fechados pensando em como tinha sido a noite anterior quando senti seu cheiro. Permaneci como estava, mas não escutei seus passos. Apenas senti quando ela se sentou no meu colo de frente para mim e me deu um beijo de tirar o fôlego.
-Bom dia, Mariana. -Ela disse quando terminou o beijo. -É assim que se dá bom dia à sua namorada. Entendeu?
-Mais ou menos. Pode explicar de novo? -Respondi com uma cara safada.
-Você é terrível, menina! -Márcia disse se levantando.
-Não pior que você quando não quer tomar banho. -Eu estava querendo atiçar ela.
-Você tá bem espertinha hoje, eim? Pelo visto vou ter que te ensinar boas maneiras.
-Será que você consegue? -Eu olhei pra ela de forma desafiadora. Ela devolveu meu olhar até que pareceu tomar uma decisão e mudou de assunto.
-O que foi que você fez de almoço pra nós? -Fingi que não havia percebido a mudança e respondi.
-Fiz lasanha de beringela, arroz e salada fria. Você gosta?
-Nunca comi lasanha de beringela. Como é?
-É igual lasanha de macarrão, mas no lugar do macarrão eu coloco a beringela. Fica muito gostosa, é mais prática e menos calórica. -Respondi orgulhosa do meu almoço.
-Então quer dizer que minha namorada sabe cozinhar pratos fits?
-Não, só esse aí mesmo. -Respondi rindo.
-Já é um começo. Sou uma negação na cozinha. Faço o básico e olhe lá. Não faço nada de doce. A não ser bolo de caixinha.
-Pode deixar que eu te alimento, tá bom? Eu gosto de cozinhar. Minha vó que me ensinou.
-Que legal. Por parte de pai ou de mãe?
-Mãe. Mas na verdade ela era tia da minha mãe. Não conheci meus avós de verdade.
-Ela já faleceu?
-Já sim.
-Sinto muito, meu amor. -Ela disse me abraçando.
-Tá tudo bem. Já faz dois anos, mas eu continuo sentindo falta das nossas conversas, das nossas brincadeiras. É como se o tempo passasse, mas não passasse. A ausência física dela parece que aconteceu ontem. Não sei explicar direito.
-Eu sei como é. Eu também era muito ligada na minha avó. Ela que me criou praticamente. Minha mãe trabalhava fora e ela costurava, então eu ficava com ela quando era pequena e quando voltava da escola era pra ela que eu contava do meu dia. Quando ela faleceu eu senti muito também. Ela foi a primeira pessoa para quem eu contei que estava apaixonada por uma garota.
-Sério, Má?
-Sim. Nós conversávamos sobre tudo. Num determinado dia ela me perguntou dos garotos e eu meio que desconversei. Eu devia ter uns 15 anos na época. Ela me contou depois que entendeu na hora, mas resolveu não forçar o assunto. Um dia ela veio falar comigo e levou o assunto pro lado de namoro e preconceito. Contou que na época dela ela dava cobertura para uma amiga dela encontrar o namorado escondida porque os pais dela não queriam que ela namorasse um homem negro. E aí ela falou que ela foi a primeira a saber que um amigo dela era gay porque ele disse que confiava nela pra guardar o segredo. Eles até fingiram namorar um tempo pro pai dele não ficar tentando arrumar namoradas pra ele. E aí ela me disse que não tinha preconceito nenhum e que o amor é a coisa mais linda que existe e independe de sex*, idade ou cor. Ela era muito à frente do tempo dela. Se fosse hoje ela teria acrescentado gênero à lista. -Ela disse e sorriu. -E foi assim que ela me fez contar para ela sem me pressionar. Foi numa boa hora. Eu estava quase explodindo. Não sabia o que fazer, com quem conversar. Ela me abraçou e disse que tudo ficaria bem porque ela estava comigo. E realmente, ela cumpriu sua promessa. Ela foi minha confidente por anos. Quando minha mãe se mostrou não muito satisfeita com minha orientação sexual ela me defendeu e conversava todos os dias com ela, tentando mostrar que não tinha nada de errado comigo.
-Nossa, Ma, que legal. Ela faleceu tem muito tempo?
-Na mesma época que terminei o relacionamento. Você deve imaginar como foi uma época conturbada.
-Caramba. Deve ter sido pesado.
-Bastante. Mas agora o que importa é que vou comer sua comida. -Já estávamos levando nossos pratos para a mesa. -Sua lasanha tá com a cara ótima.
-Espero que o gosto também esteja. -Disse com receio dela não gostar.
-Que delícia, Mari! Não acredito que nunca comi isso antes. Muito gostosa.
-Tá falando de mim ou da lasanha? -Perguntei e coloquei uma garfada de comida na boca.
-Eu disse que nunca comi antes. Tem alguma dúvida do que eu tô falando ou quer que eu te lembre como foi que te comi gostoso na sua primeira vez?
Me arrependi amargamente de ter dito qualquer coisa. Minha boca secou e a comida não descia na minha garganta. Tive que beber água pra conseguir engolir. A cara de triunfo da Márcia foi a melhor.
-Que foi, Mari? Tá bem? -Ela perguntou com uma cara cínica.
-Golpe baixo, amor. -Disse rindo dela.
-Você quem começou. Eu tava só falando da sua comida e você veio com duplo sentido. -Ela respondeu com uma cara de quem tem razão.
-Tá bom, eu me rendo. Vamos comer em paz.
Passamos o resto do dia vendo filme, comendo pipoca e fazendo amor em todos os lugares possíveis daquela casa. Por volta de 21 horas ela foi me levar em casa. Ainda ficamos uma hora na porta conversando. Quando ela me avisou que tinha chegado em casa eu já estava deitada pronta para dormir, afinal no dia seguinte teria aula com uma professora que não gostava de atrasos.
Fim do capítulo
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