MARI e ANA por MahLemes
Capitulo 33 - Jantar
Cheguei na Márcia era 18:50. Tinha pensado em ficar parada na porta até dar 19 horas quando meu telefone vibrou e o portão dela se abriu.
—Guarda o carro, ma petite—
Entrei na garagem e me deparei com a Márcia com um vestido justo de alcinha com um decote em V bem acentuado. A barra do vestido chegava até o meio de suas coxas. O preto do vestido fazia um contraste perfeito com seus cabelos loiros que estavam presos num coque frouxo. Nos pés ela usava uma rasteirinha, provavelmente pela minha estatura. Ela estava divina. Fiquei hipnotizada olhando para ela.
-Não vai descer, ma petite? -ela me provocou.
Desliguei o carro e desci. Foi então que ela reparou nas minhas roupas. Ficamos hipnotizadas uma pela outra. Saí do transe primeiro e me aproximei dela, lhe tomando os lábios com um selinho rápido.
-Oi, gatinha. Você tá maravilhosa.
-E você está perfeita. -Ela respondeu me fazendo dar uma volta. -Que bunda! -Ela disse me puxando para um beijo de verdade.
Márcia me puxou pela mão, me levando para o lado contrário que havíamos ido no outro dia. Quando passamos pela porta eu perdi o fôlego. Todas as árvores estavam iluminadas por luzinhas amarelas como as de Natal. Umas mais outras menos, deixando um clima bem romântico. Num patamar logo abaixo da maior mangueira havia uma mesa posta para duas com velas. As luzes tornavam o ambiente quase mágico enquanto as velas davam o toque romântico que precisava. Ela me guiou até a mesa por um caminho de cascalho que cortava a grama verde que crescia ao redor das árvores. O paisagismo daquele jardim parecia algo de outro mundo. Eu nunca esperava encontrar isso na minha vida. As plantas pareciam ter nascido naturalmente tamanho o cuidado em escolher seus lugares.
-Má, esse lugar é lindo.
-Espera para ver durante o dia, Mari. Você vai se apaixonar.
-Acho que já me apaixonei. -Respondi olhando nos seus olhos.
-Eu também. -Ela respondeu devolvendo o mesmo olhar.
-Será que estamos falando sobre a mesma coisa?
-Je souhait que oui, ma petite.
Nosso momento se quebrou quando seu telefone apitou. Ela apenas colocou-o no mudo e me pegou pela mão.
-Pode ver a mensagem, Ma. Não me incomodo.
-Agora não. Você é tudo que quero ver nesse momento. Vem, vamos sentar.
Nos sentamos frente a frente e ela nos serviu um vinho. O tempo havia esfriado levemente e no meio das árvores conseguíamos quase sentir frio.
-E como foi a aula a tarde? Conseguiu pegar tudo que precisava?
-Consegui. A Ju me ajudou. Até que não é difícil. Só um pouco extensa mesmo a matéria.
-Minha oferta continua de pé. Se precisar de ajuda é só falar.
-Prefiro sua ajuda em outros tópicos, gatinha. -Respondi piscando para ela.
-Se você não estivesse tão gata nessa roupa e eu tão doida pra sobremesa eu te botava pra fora depois dessa cantada, Mari.
-Foi tão ruim assim? -Perguntei um pouco sem graça.
-Até que não, só queria deixar claro que você é a sobremesa mesmo. -Márcia disse com uma cara tão safada que minha garganta secou, minha calcinha molhou e minhas pernas tremeram. -Agora sim a reação pela qual eu procurava.
Eu não sabia o que dizer. Aquela mulher sabia jogar e pela primeira vez fiquei com medo do que sobraria de mim caso ela resolvesse realmente jogar comigo. Mas esse pensamento escapou da minha mente assim que ela se debruçou sobre a mesa para me servir mais um pouco de vinho e seu decote ficou ainda mais acentuado.
-Queria dizer alguma coisa, mon chérie?
-Só... -Limpei a garganta e tentei novamente -Só que eu não me apego a isso de primeiro a janta e depois a sobremesa.
-A, mas eu me apego, Mari. Preciso de você bem alimentada pro que eu pretendo hoje, já que ontem você me escapou. -Sua cara de leoa encurralando a presa me secou a garganta outra vez.
O jantar, que tinha sido feito por ela, era arroz, strogonoff e batata palha. Estava divino, mas meu apetite estava um pouco prejudicado por conta da expectativa de ter ela para mim. Bebemos apenas meia garrafa, me pareceu que ambas queríamos estar sóbrias para o que viria a seguir. Quando terminamos de comer, Márcia mexeu no celular e o som ambiente que antes tocava músicas instrumentais românticas passou a tocar “A Thousand Years” da Christina Perri.
-Dança comigo, ma petite? -Ela me pediu estendendo a mão.
Não respondi, apenas aceitei sua mão e me levantei. Ela me abraçou, colocando suas mãos em minha cintura. Minhas mãos foram imediatamente para seu pescoço. Escorei minha cabeça em seu ombro e apenas a deixei me guiar em uma dança lenta até quase o fim da música, quando levantei a cabeça e olhei bem fundo em seus olhos.
-Ma, o que tá acontecendo aqui?
-O que você acha que tá acontecendo, mon chérie?
-Eu só sei que eu tô com medo. -Respondi olhando para o nada. Foi quando começou a tocar “Thinking out loud” do Ed Sheeran
-Tá com medo de quê? -Ela perguntou levantando minha cabeça.
-De tudo, Ma. Como você mesma me provou no dia da cachoeira, eu sou inocente, não enxergo maldade nas pessoas. Eu tenho medo de você se cansar de mim e não sei o que pode sobrar se eu me entregar. -Eu estava me segurando para não chorar nesse momento, mas uma lágrima escapou. Márcia a enxugou com o polegar e manteve sua mão em meu rosto.
-Mari, eu entendo seu ponto de vista, mas você precisa ver que eu estou numa situação muito mais delicada que a sua. Você acha que eu arriscaria me envolver com uma aluna só para depois “me livrar” dela?
-Eu não sei, Ma. Eu não te conheço. Você não me conhece. Tá tudo indo tão rápido. Eu quero, sabe? Mas ao mesmo tempo tem uma voz na minha cabeça dizendo que algo vai dar errado.
-O que eu preciso fazer para que você se sinta segura, ma petite? É só me dizer que eu faço. Eu não me sinto dessa forma há tanto tempo. Quero você ao meu lado todo o tempo, eu te desejo a cada segundo do dia. Sua presença traz uma leveza para a minha vida que há muito eu não sentia. Quando você se afasta me parece que o mundo vai acabar e essa sensação só passa quando te vejo de novo. Olha ao redor, Mari. Eu fiz isso para você, para nós. Eu quero te conhecer melhor. Sei que não nos conhecemos, mas sinto como se estivéssemos nos reencontrando, e não nos conhecendo. Eu sei que pareço uma adolescente falando essas coisas após dois encontros e meio, mas é como eu me sinto. -Dessa vez foi ela quem abaixou os olhos.
Vendo sinceridade em seus olhos e ouvindo todas aquelas palavras que nunca haviam sido dirigidas a mim resolvi me entregar de vez. Eu sabia que a chance de eu quebrar a cara era grande, mas me lembrei do velho ditado que minha “vó” sempre dizia: “Quem não arrisca não petisca, filha. A gente tem que correr riscos nessa vida se quiser ser feliz”.
-Eu tô me apaixonando, Ma. E isso é assustador. -Eu disse descansando minha cabeça em seu peito. Pude sentir seu coração disparar na hora. Ela se manteve em silêncio, me apertando no abraço e continuando nossa dança que estava mais para um balançar desde que começáramos a conversar.
-E você continua me surpreendendo, Mari. -Ela disse após alguns instantes que eu não sabia se eram segundos ou minutos. -Você acabou de admitir que está com medo e logo depois se declarou para mim. Você é mesmo única. Corajosa, decidida e sincera. -Ela parou de dançar e se afastou um pouco para me olhar nos olhos e completou -Eu já estou apaixonada, ma petite. Isso me assusta mais do que você pode imaginar. Eu tenho trinta anos e estou apaixonada como uma adolescente por uma adolescente. Não precisa fazer essa cara porque não estou desmerecendo sua idade, Mari. Só quero te mostrar como estamos no mesmo barco. Você me inspirou a me expor completamente a você, ma petite.
-Você disse que está apaixonada por mim? -Perguntei para me certificar que não era coisa da minha cabeça.
-Sim, Mari. Eu estou apaixonada por você e vou fazer de tudo que eu puder para que você se apaixone por mim. -Ela disse isso e me beijou. Por mais que tenhamos dados uns três beijos diferentes a esta altura esse conseguiu ser diferente. Ele foi lento, profundo e transmitiu um carinho e um cuidado que eu jamais havia sentido antes serem transmitidos por meio de um beijo. Aquilo me arrepiou inteira como se uma corrente elétrica passasse dela para mim. Nesse momento eu tive certeza de que estava apaixonada e que faria qualquer coisa para que isso não acabasse.
-Não precisa. -Eu disse quando nos separamos.
-Não precisa de quê? -Márcia me perguntou confusa.
-Não precisa fazer mais nada pra eu me apaixonar por você. Eu já estou completamente apaixonada, Ma.
Nos beijamos novamente. O beijo começou igual ao anterior, mas logo se intensificou e a luxúria começou a tomar conta dos nossos corpos e toda a tensão sexual que se acumulara durante o jantar voltou com tudo. Márcia estava quase me jogando na mesa quando a música foi interrompida pelo toque do seu telefone.
-Sempre tem algo que nos interrompe. -Ela reclamou buscando o celular.
-Temos bastante tempo, Ma. Eu não estou com pressa. -Respondi tentando acalmá-la.
-Não conheço esse telefone. Deve ser telemarketing.
-Atende, Ma. Vai que é alguém realmente querendo falar com você.
-Tá bom. Alô... Sim, sou eu, pode falar. -Ela ficou escutando a pessoa falar por quase um minuto até que respondeu -Eu compreendo, mas não temos mais nenhuma relação, eu não posso te ajudar... Entendo... Certo... Tudo bem, amanhã pela manhã eu vou aí... -Outra pausa longa -Tudo bem, eu vou. Tchau.
-O que foi, Ma? Aconteceu alguma coisa?
Ela parecia travar uma luta interna até que me respondeu.
-A Jéssica sofreu um acidente e está no hospital.
-Sua prima? Meu Deus, como assim? O que houve?
-Foi um acidente de carro, mas não é a minha prima.
Minha ficha demorou para cair.
-A Jéssica sua ex? -Ela apenas assentiu com a cabeça -E por que o hospital te ligou? -Aquilo começava a ficar estranho.
-Ela teve uma concussão. O acidente foi na terça e ela só acordou hoje mais cedo. Parece que ela está com amnésia. Ela não se lembra dos últimos três anos aparentemente.
-Isso não explica por que te ligaram.
-Há três anos ainda estávamos juntas. Ela ainda não conhecia a atual dela. Disseram que ela está muito confusa e agitada e que fica pedindo para me ligarem.
-E você vai lá ver ela? -Perguntei tentando conter toda a raiva que crescia dentro de mim.
-Eles disseram que esse estado de agitação não faz bem para ela, que eles não podem sedá-la novamente por ter acordado do coma. A Serena já tentou de tudo para que ela se acalmasse, mas ela continua pedindo para me ligarem.
-Você não me respondeu, Márcia. -Disse me afastando dela.
-Eu não tenho escolha, Mari. Por mais que tenhamos terminado de uma forma péssima ela já foi importante para mim e eles disseram que o estado dela pode se agravar se ela continuar no estado de agitação que se encontra.
-Eu preciso ir. Já tá tarde e amanhã eu tenho aula. -Naquele momento percebi que havia feito a escolha errada em me abrir para ela. Mas antes a decepção acontecer agora que lá na frente, quando estivéssemos mais envolvidas ainda. Me virei para ir embora, mas Márcia segurou minha mão.
-Não vai, ma petite. Por favor. Ela é passado. Eu só não quero ter responsabilidade sobre a saúde dela. O que sinto por ela é apenas compaixão de um ser humano por outro. Juro que não é nada mais que isso. Vem comigo para o hospital.
-Você tá me pedindo para ir ao hospital com você visitar sua ex que acha que ainda é sua atual que namora a mulher com quem ela te traiu? Para e analisa um pouco o que você tá me pedindo, Márcia.
-Eu sei que é doido, loucura até, Mari. Mas por favor, vem comigo. Você não precisa entrar no quarto se não quiser, pode entrar de mãos dadas comigo, pode fazer o que quiser, mas não vai embora assim. Não depois do que falamos uma para a outra.
-Acho melhor você ir lá e resolver tudo e quando isso tiver acabado você me liga. Não quero me envolver, Márcia. -Pela sua feição pude ver que ela tinha desistido. Eu não queria ir ao hospital segurar a mão dela enquanto a ex achava que elas ainda estavam juntas. -Eu já vou. Se cuida. -Disse isso, beijei sua bochecha e saí antes que ela pudesse reagir novamente e me convencer a ir com ela. Entrei no carro e logo o portão se abriu. Saí de lá um pouco sem rumo. Não queria voltar para casa ainda. Minha raiva por ter sido trocada pela ex era muita. Meus olhos ardiam com lágrimas contidas.
Bem que aquela voz na minha cabeça me avisou que eu não deveria me abrir que algo iria dar errado. Ela provavelmente voltaria com a ex depois disso. Afinal ela nem se lembrava da atual. O que impedia que as duas voltassem a ter um relacionamento? Várias coisas negativas rodavam na minha cabeça até que resolvi me dirigir para casa. Eu havia conseguido conter as lágrimas, mas precisava urgentemente me deitar. Todas as emoções da noite haviam me esgotado.
Fim do capítulo
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