O dia que Vitor daria a resposta finalmente havia chegado. Cecília e Luiza pularam o café da manhã em conjunto para receber a equipe da Ventura. 

 

- E então, chegou a uma decisão? – Questionou Cecília, direto ao ponto. 

 

- Cheguei sim. Dez bilhões, por 51% da empresa. 

 

- Dez bilhões por metade da sua empresa, ela não está valendo vinte em sua totalidade, Vitor. 

 

- Ela também não estava à venda. 

 

- Não vou comprar metade. Ou levo tudo, ou não levo nada. 

 

- Eu sei que vocês já conversaram com o pessoal da Maximus Veritá e estão prontos para investir nela no momento que eu negar a venda para vocês. É por isso que se vocês não quiserem, vou abrir capital. 

 

- Vai abrir quanto? 

 

- Vou abrir 49%. Só disponibilizaria 51% se vocês quisessem levar de uma vez. 

 

- E quanto você acha que vai conseguir abrindo para o mercado? Quatro, cinco bilhões num total de centenas de investidores? 

 

- Pelo menos eu ainda teria poder sobre a Ventura. 

 

 - Vitor, você é jovem. Quinze bilhões. Cem por cento da empresa. Com quinze você está feito, investe metade, e está aposentado com menos de 30 anos. 

 

- Dez bilhões por 51%. Posso fazer no máximo por nove. 

 

- Dezesseis pelo total. Se você vendesse metade da empresa por nove, significa que sua empresa estaria à venda em sua totalidade por dezoito. Estou oferecendo dezesseis. Mantenho todo seu catálogo e ainda encomendo um documentário sobre sua vida. – Cecília se recordou que Vitor era um ávido narcisista. 

 

- Dezessete. – Vitor titubeou. 

 

- Dezesseis e meio e eu arco com todas as despesas legais da transição. 

 

Silêncio na sala. Vitor olhou para sua equipe. Coçou a testa. 

 

- Fechado. 

 

- Ótimo. Luiza, chame o fotógrafo. Vamos apertar as mãos e fazer o anúncio à imprensa. 

 

 

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No congresso, após uma votação maçante que facilitaria a vida do agronegócio e frustraria o dia de Lorenzo, o deputado resolveu almoçar em seu próprio escritório. Enquanto comia sua salada caesar, surpreendeu-se com uma mensagem de Erick. 

 

“Acabei de assistir a votação na TV Câmara...imagino que você deva estar bem chateado com o resultado, pela sua cara no final...” 

 

“Pois é. Fui um dos poucos que votou contra. Acontece.” 

 

“Hoje eu vou dar aula até mais ou menos nove da noite. Quer sair para bebermos depois?” 

 

“Isso melhoraria meu dia!! Tem uma cervejaria perto de onde moro, podemos encomendar umas cervejas e beber em casa se você quiser, vai ter um jogo de futebol americano do time que torço hoje à noite na televisão.” 

 

“Sério que você acabou de me chamar para ver futebol e beber cerveja na sua casa? Hahaha” 

 

“Isso soou como um rolê de brothers, né? Hahahaha. Vou reformular: quer ir em casa para tomarmos uns bons drinks?” 

 

“Agora sim! Super topo!” 

 

 

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Uma vez que o acordo de venda havia sido fechado e Cecília se comprometera a produzir a série com os atores argentinos, Yanina voou de Buenos Aires a São Paulo para finalmente assinar o contrato. Ela aproveitou a viagem para também passar no Grupo Gutierrez e encontrar Luiza. 

 

- ¡Hola mi amor! – Yanina a cumprimentou com um selinho. – Quer dizer que você será mi jefa ahora? 

(Oi meu amor. Quer dizer que você será a minha chefe?) 

 

- Não é bem assim... minha mãe é sua chefe, eu sou só a estagiária... 

 

- Y le gustaria brincar de jefa ahora? Estoy disponible e tienes um cuarto de baño mui grande aqui... 

(E você gostaria de brincar de chefe agora? Eu estou disponível e tem banheiro muito grande aqui.) 

 

- No banheiro? Agora? – Luiza abriu um sorriso pretencioso, o que bastou para Yanina puxá-la para el cuarto de baño. 

 

 

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No hospital, Ana Beatriz marcou a cirurgia para o paciente que Camélia apresentou. Dennis iria deixar a noiva operar sozinha, mas como estava completamente sem paciência para o trabalho burocrático da chefia do setor, resolveu se paramentar para participar. 

 

No período intraoperatório, entretanto, por conta de uma complicação de natureza trombótica, o paciente foi a óbito. Dennis e Ana Beatriz se entreolharam assustados. Fazia quase dois anos que Dennis não perdia um paciente durante uma cirurgia. O médico simplesmente começou a se desparamentar para sair da sala. 

 

- Você lida com a evolução e declaração de óbito, Ana. – Ordenou irritado, tirando as luvas. 

 

- Calma, pode deixar comigo. 

 

- Não era nem para eu estar aqui, era para eu lidar com os cronogramas. Vim te ajudar e acabei me ferrando. Palhaçada. 

 

- Foi uma complicação, Dennis. Não foi culpa nossa. Eu vou relatar na evolução e explicar para os familiares. 

 

- É bom que explique mesmo. Que droga, isso entra nas minhas estatísticas. 

 

- Dennis, ele não é uma estatística! 

 

- Foi uma complicação de um paciente desnecessário que eu nem iria operar! 

 

- Você entrou na cirurgia porque quis! Eu não te forcei a nada! 

 

- Está bem! Está bem. Saco. Eu vou finalizar minhas tarefas. Preencha a declaração e avise à família. 

 

 

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Enquanto Ana, ainda nervosa, preenchia a declaração de óbito, Paloma a abordou, preocupada: 

 

- Anabê, o que aconteceu? Fiquei sabendo que o Dennis surtou lá na sala de operação? 

 

- Perdemos um paciente renal com tumor colorretal. Teve um evento trombótico e não conseguimos salvá-lo. 

 

- Ah...meus sentimentos... mas é verdade que o Dennis surtou mesmo? 

 

- Sim, porque ele deveria estar fazendo trabalho burocrático mas resolveu operar, aí se estressou porque perdemos o paciente. 

 

- Você quer que eu fale com ele? Porque eu posso falar umas poucas e boas para aquele energúmeno que você chama de noivo. 

 

- Não precisa. Foi fofo da sua parte, mas não precisa. Deixa que eu me resolvo com ele. 

 

Nisto, Camélia apareceu. 

 

- Eu acabei de saber do paciente! – A nefrologista exclamou com voz de piedade. 

 

- Desculpe-me, Dra. Camélia, foi uma complicação intraoperatória e- Ana Beatriz se levantou e cobriu o rosto, não sabia se queria chorar de exaustão ou frustração. 

 

- Minha querida, não precisa disso! – Camélia a puxou para um abraço. – Vem aqui. Não precisa ficar assim. Essas coisas acontecem na medicina, você deve estar acostumada já... 

 

- Eu sei, eu só... eu só... – Anabê enterrou o rosto no ombro da colega de hospital, enquanto Paloma assistia de braços cruzados. 

 

- Vai ficar tudo bem, meu anjo. Vai ficar tudo bem. – Camélia segurava Anabê em seus braços enquanto, exausta, Anabê chorava. 

 

- Só vai ficar tudo bem no dia que o ogro do noivo dela aprender a não surtar dentro da sala de cirurgia. – Paloma comentou. 

 

- O que o Dr. Dennis fez? – Camélia perguntou, enquanto ainda segurava Ana Beatriz. 

 

- Foi um troglodita e quis se livrar da culpa. 

 

- Dra. Ana, o que ele fez contigo? – Camélia se desvencilhou do abraço para poder olhar Ana Beatriz nos olhos. 

 

- Nada, ele só estava nervoso... 

 

- Eu já falei para ela que se ela quiser eu o quebro no soco! – Paloma sugeriu. 

 

 - E eu ajudo! – Camélia enxugou as lágrimas do rosto de Ana Beatriz. – Você não tem que se curvar a ele só porque ele é seu chefe não!  

 

- Fora que, tecnicamente, ela é filha de duas das donas desse hospital... 

 

- Você é Ana Beatriz Mancini Gutierrez! – Camélia exclamou. – Você é uma mulher forte e independente! 

 

De todo o discurso, tudo o que Anabê conseguiu absorver foi que Camélia sabia seu nome completo – mesmo que fosse, em tese, um nome conhecido. 

 

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Já perto do meio-dia, no apartamento de Brasília, coberto pela metade, Erick dividia a cama com Lorenzo. O tal jogo de futebol com alguns bons drinks rendeu mais do que o esperado, e os rapazes aproveitaram a noite até quase amanhecer. 

 

- Quer almoçar aqui perto? – Questionou Lorenzo, levantando-se. 

 

- Já está me expulsando da cama? – Brincou Erick, ainda esfregando os olhos. 

 

- Não é isso! É que eu tenho uma sessão daqui a pouco no congresso, meu assessor já me mandou umas quinze mensagens. 

 

- Tudo bem. Eu tenho que ir também, devo corrigir algumas provas para entregar à noite. 

 

- Você quer vir hoje de novo? Digo, vai começar uma maratona de filmes do 007 na tv... 

 

Erick apenas riu. 

 

- O que foi? Não gostou da sugestão? 

 

- Nada não.. suas sugestões são engraçadas, é cerveja com futebol, filme de ação... 

 

- Eu cresci com duas mães lésbicas, isso era programação comum. 

 

- Entendi... mas tenho que corrigir mais provas e trabalhos, final de semestre, sabe como é... 

 

- Tudo bem, fica para a próxima então... 

 

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No estágio, enquanto Luiza terminava de enviar as cópias do acordo para seu irmão analisar, a pedido de Cecília, recebeu uma mensagem de Daniela. 

 

“Então quer dizer que agora você vai mandar no que a Ventura vai produzir? Pode mandá-los fazer um remake dos filmes do Mazzaropi?” 

 

“Mazzaropi? Você está de brincadeira né?” 

 

“Lógico que estou. Mas confesso que adoro assistir a um clássico vez ou outra.” 

 

“Podemos fazer uma noite de filmes lá em casa, se quiser. Posso chamar o pessoal, a Yanina, a Ayla, o Fillipo...” 

 

“Falando na turma, tem algo que reparei, por que a Liara não está mais nos nossos rolês? Eu perguntei para a Ayla mas ela desconversou.” 

 

“Ah, elas brigaram. Parece que as duas estavam disputando quem ficaria com um setor lá da empresa da avó deles, e a Ayla ganhou. Daí a Liara resolveu parar de falar com ela, e por consequência, com a gente também. Pode perceber, ela até está sentando do outro lado da sala agora.” 

 

“Percebi mesmo. Que pena, ela parece bacana.” 

 

A conversa via texto acabou sendo interrompida por uma chamada de Lorenzo. 

 

- Lu, diga-me, a mãe vai para o Estados Unidos que dia? 

 

- Boa tarde para você também, cara. Ela vai amanhã, por quê? 

 

- O jato já está lotado? Tem vaga para mais um? 

 

- Tem vaga sim, por quê? Você quer ir? 

 

- Quero sim. 

 

- Certo. Você recebeu o email que acabei de mandar? 

 

- Das centenas de páginas do acordo? Recebi sim. Vou ver se leio hoje à noite. 

 

- Está bem. Aviso a mãe. Embarcamos amanhã às 7. 

 

- Lu, deixa eu te perguntar... como você identifica uma pessoa conquistadora? Tipo um player? 

 

- Por que você está perguntando isso para mim? 

 

- Porque você é uma player, então deve saber reconhecer outros. 

 

- Eu não vou saber te descrever. Mais fácil você me contar o que aconteceu. 

 

- Eu saí com um carinha mas acho que ele não gostou das minhas sugestões para encontros. 

 

- E quais foram suas sugestões? 

 

- Futebol com cerveja e filme de ação. 

 

- Cara, você está parecendo nossas mães! – Luiza gargalhou. 

 

- Pois é. Foi uma péssima ideia. Ele claramente fugiu. 

 

- Ele detestou as sugestões e agora você acha que ele é um player porque vazou, né? 

 

- Exatamente. 

 

- Dê tempo ao tempo. Não perca contato com ele. Às vezes também ele só está ocupado com as coisas dele. Por acaso é aquele professor lá da parada gay? 

 

- Esse mesmo. 

 

- Vocês pareciam bonitinho juntos. 

 

- Pois é, mas durou só uma noite. 

 

- Você não sabe disso. Muita coisa pode acontecer. 

 

- Não sei. Mas tudo bem. Ah, você viu a foto que a mamãe postou ontem? 

 

- Que foto? – Luiza colocou a ligação no viva voz e correu para checar a rede social. 

 

- Aparentemente, Anabê e Dennis foram visita-la no dia da Parada e ela só postou a foto ontem. 

 

- Mamãe Magdalena sempre posta as fotos com atraso. Mas aqui só tem ela, a Anabê e o Dennis, o que tem demais? 

 

- Calma, olha no espelho atrás. 

 

- Caramba! – Luiza tampou a boca, tamanho o susto. – Quem é essa mulher que tirou a foto? 

 

- É a Cláudia, aquela amiga da mamãe! 

 

- Essa é a Cláudia?! 

 

- Pois é! Será que elas estão juntas? 

 

- Eu perguntei e ela negou! Certeza que estão juntas. Mas por que ela mentiria para mim? 

 

- Lu, você foi a que mais se abalou com o divórcio. Ela não falaria mesmo para você. 

 

- Mas ela também não falou para você. 

 

- Pois é, estranhei isso. Por que ela falaria só para a Anabê? Pelo visto até participaram de brunch juntas. 

 

- Porque todo mundo sabe que a Anabê é a favorita dela e nós dois somos muito mais próximos da mãe Cecília. 

 

- Vou tentar marcar algo com ela semana que vem, tentar extrair a verdade. 

 

- Mantenha-me atualizada. E vê se chega aqui em São Paulo um pouco mais cedo amanhã, se você se atrasar é capaz que a dona Cecília Gutierrez dê um jeito de colocar a culpa em mim. 

 

 

Fim do capítulo