Amada Amanda por thays_
Capitulo 2
Tocava Unholy do Sam Smith. Havia uma garrafa de Jose Cuervo sobre a mesa de mármore ao lado da churrasqueira. Bianca estava com um biquíni laranja cortando fatias de limão preparando shots de tequila. Seu corpo era belíssimo, sua pele era escura como a noite, como um chocolate que você deseja muito saborear, mas não pode. Era impossível não olhar e não desejar.
- Bora beber, gurias? - Ela perguntou.
Nos aproximamos dela. Ela colocou sal na pele entre seu polegar e o indicador. Milena apareceu a abraçando por trás, usava um biquíni preto. Era gordinha, cheia de curvas maravilhosas. Beijou o pescoço da namorada, depois lambeu o sal na mão dela de uma forma tremendamente sexy. Tomou um shot e ch*pou o limão. Na sequência as duas se beijaram de uma forma tão intensa que senti uma pontada entre minhas pernas.
Olhei de relance para Amanda e seu olhar estava fixo em mim. Olhei para seus lábios. Bia fez o mesmo com Milena, tomando também uma dose. As duas saíram correndo juntas de mãos dadas pulando na piscina na sequência.
- Tá escorrendo. - Ela disse passando a mão em sua boca.
- O que? - Perguntei levando a mão a minha.
- Sua baba.
Eu ri.
- Afff... Caraca, meu, elas são lindas juntas.
Amanda colocou sal entre seu polegar e o indicador.
- Vem, vamos brindar. - Ela disse.
Eu fiz o mesmo.
Ela encheu dois copinhos de dose. Olhei para ela e levantei o meu e disse:
- Arriba, abajo, al centro y adentro!
Ela acompanhou o movimento do copo comigo, lambemos o sal em nossas mãos, viramos e ch*pamos o limão.
- Cara, isso é forte. - Ela riu.
Eu fiz uma careta.
- Nossa, mil anos que não bebo tequila. A última vez... - Comecei a contar uma história e logo parei.
- A última vez o que? - Ela perguntou divertida.
- Não é uma história da qual eu me orgulhe. Eu era nova.
- O que você fez?
- Eu fiquei com uma das madrinhas no casamento da minha prima e pegaram a gente sem roupa na piscina.
Ela riu.
- Eles eram super-religiosos. Não foi muito legal.
Ficamos nos olhando.
- E você? Qual foi a maior loucura que você já fez bêbada?
- Foi me declarar pra uma menina que eu gostava e acabei tomando um fora. Foi terrível porque todo mundo da escola começou a me zuar depois desse dia.
Ela tirou seu tênis e nos sentamos com os pés na água. Milena beijava Guilherme e Bianca dentro da piscina. Havia uma atmosfera muito sensual pairando no ambiente naquele momento. Eu tirei minha camiseta, ficando de top esportivo e bermuda e entrei na água. Mergulhei e logo subi em sua frente.
- A água ta muito boa.
Ela tirou sua camiseta. Não pude deixar de reparar nas tatuagens em seu colo, era um desenho tribal que descia por entre seus seios. Achei aquilo tremendamente sexy. Não sei se porque já estava acesa pela cena de Bianca e Milena em nossa frente, mas me imaginei passando a língua seguindo o rastro da tatuagem, subindo até sua boca. Como seria seu beijo? Desviei o olhar. Ela entrou em seguida e também mergulhou. Nadou para a borda, tomando certa distância de mim.
Talvez fosse perigoso estar perto demais.
- E você? Qual seu signo? - Perguntei.
- Sou de Libra. Ascendente em Aquário. - Ela respondeu.
- Librianas e os contatinhos.
- Que nada, sou super na minha. Nunca me identifiquei com isso que falam de Libra.
Reparei que ela tinha uma pinta no lado esquerdo de seu rosto e covinhas nas bochechas. Ela era uma graça. Olhei para seus lábios.
De repente, Pedrão deu um pulo bomba na piscina espirrando água para todos os lados.
- Chega dessa pegação aqui, credo, to solteiro, galera, isso é jogo baixo.
Nós rimos e em breve Rafa também se juntou a nós.
- Você mora com seus pais? - Ela perguntou.
- Não, moro sozinha, na verdade eu e meus vira latas.
- Quantos você tem?
- Dois. A Mel e o Tunico.
- Tenho três gatas. A Frida, a Virgínia e a Agatha.
- Frida de Frida Kahlo…?
- Isso.
- E as outras duas?
- Virgínia de Virgínia Woolf e Agatha de Agatha Christie. Minhas escritoras preferidas. Conhece?
- Sim, minha mãe adora Agatha Christie. Ela tentou implantar o hábito da leitura em mim, mas sempre fui mais chegada a ajudar meu pai a arrumar os carros.
- Você trabalha? Estuda? - Ela perguntou.
- Trabalho na Aliscar. Conhece?
- Fica perto da antiga fábrica de sal?
- Isso.
- Eu trabalho com TI. To cursando ADS.
Olhei para ela com cara de ponto de interrogação.
- Como?
- Análise e Desenvolvimento de Sistemas
- Tipo programação?
- Isso.
- E você mora sozinha? - Perguntei.
- Não, com minha mãe.
- Você disse que tinha irmãos, são quantos?
- São três, já são casados. Eu sou a mais nova.
Bianca então se aproximou, começou a puxar papo com nós duas. Ela tinha ouvido que Amanda também era de TI e as duas então começaram a conversar empolgadas sobre linguagens de programação. Parecia que falavam outro idioma na minha frente.
- Vocês duas são lindas... Estão juntas? - Bianca perguntou.
Senti meu rosto corar.
- Na verdade a gente acabou de se conhecer. - Respondi.
Ela pareceu surpresa.
- Jura? Vocês tem uma vibe muito gostosa, pensei que já se conheciam...
Amanda e eu nos entreolhamos e o sorriso foi impossível conter. Milena e Guilherme também se aproximaram e nos contaram um pouco da história do trisal. Eles eram casados há cinco anos e os dois tinham se apaixonado por Bianca há três. Moravam todos juntos e pareciam superconectados.
- Nunca imaginei que um dia pudesse amar tanto alguém que não fosse o Gui. - Milena envolveu Bia em seus braços, buscando os lábios da garota de tranças coloridas na sequência.
- Foi a melhor coisa que nos aconteceu. - Guilherme comentou.
- Acredito que podemos amar intensamente mais de uma pessoa ao mesmo tempo. - Bia revelou, agora buscando os lábios de Guilherme.
- É o sonho de todo homem, né? - Marcelo surgiu do nada na conversa. - Ter duas gostosas dessas na cama. Vocês pegam outras pessoas também? Se sim, o pai aqui ta disponível.
- Só se for pra ficar comigo... rola? - Guilherme respondeu sério, tão sério que quase acreditei. Ele desbancou a pose do intrometido numa tacada só.
Todos riram.
- Credo, sai fora. Não sou bicha não.
Ele andou até a borda, ofendido.
- Você pode se surpreender. - Guilherme continuou e Marcelo saiu da piscina num piscar de olhos.
- Que cara mais sem noção, mano. - Eu disse após os risos cessarem.
- As pessoas pensam que é putaria nossa relação, mas é um relacionamento como qualquer outro. - Milena explicou, beijando o rosto de Guilherme.
- A gente acredita em amor livre, mas tudo com respeito. Se eu me interessar por algum cara de vez em quando elas são as primeiras a saber, eu não escondo nada delas, elas são meu porto seguro e tenho muito respeito pelas duas.
- Tá romântico hoje hein, bebê? - Bia beijou seu rosto, depois seus lábios. Ele sorriu.
- É a mais pura verdade, princesinha. - Se beijaram e depois beijaram Milena.
- E a família de vocês? - Amanda perguntou, curiosa.
- Meus pais no começo acharam o maior absurdo da face da terra. - Milena respondeu - Mas acabaram aceitando melhor a ideia depois que começaram a conviver com a Bia.
- Meu pai é falecido, minha mãe mora em Pernambuco, ela sabe e aceitou numa boa. Eu sempre fiquei com meninos e meninas, hoje me considero pan.
- O que é pan? - Perguntei.
- Quando você se interessa por pessoas independentemente do gênero. - Amanda respondeu.
- Mas não é a mesma coisa que ser bi?
- Na verdade é quando você se sente atraído por pessoas de maneira geral, cis, trans, não-binários, entendeu?
- Na verdade não. - Respondi. - O que é cis?
- É quando a pessoa se identifica e se sente confortável com o gênero que foi dado para ela no nascimento.
- Eu sou uma mulher cis. - Milena explicou. - Me deram o sex* e o gênero feminino quando nasci e sempre me vi como mulher, me interessei por coisas que a sociedade fala que "são de mulher."
- Tá, entendi. Mas o que é não-binário?
- Quando você não se identifica especificamente com nenhum dos dois gêneros. Nem masculino, nem feminino, ou então com os dois ao mesmo tempo. - Senti uma onda congelante de medo preencher meu corpo completamente. - Geralmente a pessoa pode se sentir confortável com um pronome neutro, sem dizer que é ele ou ela, sabe? Ou também não, dependente muito da pessoa. - Bia explicou. - Cada pessoa é única.
Aquilo me deixou de certa forma pensativa e ocasionou um boom na minha cabeça. Será que eu era isso? Quer dizer, eu me sentia confortável com meu corpo, mas gostava de ter uma aparência masculina, as pessoas na rua às vezes pensavam que eu era um cara e eu tava tão acostumada com isso que nem ligava mais. Mas eu não tinha a menor vontade de mexer no meu corpo. Eu gostava de assumir um papel masculino na cama, tanto que não gostava de ser tocada e isso pra mim era praticamente impensável, mas eu não sentia a menor vontade de ter barba, pelos, mudar de nome, nem nada disso.
O trisal e Amanda começaram a conversar animadamente sobre o assunto de gênero, sexualidade, lutas políticas, livros, autores e eu fiquei ali imersa em meus pensamentos conflitantes até Amanda me perguntar:
- Você ficaria com uma mulher trans?
- Como assim? Uma mulher que se identifica como homem?
- Não, o contrário.
- Tipo uma drag?
Amanda sorriu.
- Não. Ser drag é uma expressão artística, a pessoa pode gostar de manter um corpo masculino e se montar de vez em quando. Ser uma mulher trans é realmente não se ver no corpo masculino e buscar ter um corpo feminino, por hormônios, cirurgias. A cabeça, desde criança é completamente feminina e não masculina.
Fiquei pensativa. Estava tão absorta em meus medos que respondi prontamente.
- Provavelmente não, deve ser estranho, sei lá, você ficar com uma mulher que já foi um cara...
Amanda desviou o olhar, um pouco incomodada. Frustrada talvez comigo? O que ela esperava que eu dissesse? Eu não me considerava uma pessoa com a cabeça tão aberta quanto aquele trisal, que pra mim até então só existia em seriados americanos. Eu não era tão descolada quanto aquelas pessoas.
- Eu já namorei um homem trans. - Bia revelou. - Mas ele se mudou lá pra Manaus por trabalho e nunca mais nos vimos. Mas eu era muito novinha na época. Nunca ia ter dado certo de qualquer forma.
- A gente tinha uma amiga trans, lembra da Larissa? - Guilherme perguntou para Milena.
- Gata demais, eu super pegaria ela se não fosse hetero.
- Casou e sumiu.
- Cara, isso deu um nó absurdo na minha cabeça.
- É mais simples do que você imagina. - Bia finalizou. - A gente está tão acostumando a viver numa cultura heteronormativa que qualquer possibilidade que foge do padrão é vista como errado.
Deixei eles conversando animadamente e me afastei nitidamente incomodada. Fui para o quarto, tomei um banho, coloquei roupas secas. Fui dar uma volta pelas ruas de terra, para espairecer um pouco minha mente. Aquela história de gênero estava ecoando em minha mente, porque fez com que eu me identificasse muito com algumas partes e isso me deixou apavorada.
Voltei para o quarto algum tempo mais tarde. Amanda já estava deitada e deveria estar dormindo. Tentei não fazer muito barulho. Sentei-me na cama, o quarto estava iluminado pela luz da lua. Olhei sua silhueta na escuridão, sua cintura, seu quadril. E me peguei hipnotizada pelas suas curvas durante longos minutos. Poderia passar horas, apenas a observando daquele jeito.
Eu nunca tinha me sentido atraída por mulheres como ela. Sempre me interessei pelas mulheres com cara de hetero (se é que mulher hetero tem cara), sempre gostei das extremamente femininas, nunca me imaginei a fim de uma skatista igual ela. Amanda tinha algo que estranhamente mexia comigo. Aquele jeito descontraído, despreocupado, divertido. Sua fragilidade, suas dores. Eu tinha uma vontade enorme de pegá-la em meus braços e...
Ela se espreguiçou de repente me tirando daquele transe no qual estava, virou-se em minha direção e pareceu surpresa com minha presença. Disse com voz de sono:
- Você sumiu, Duda. Aonde estava?
- Eu só precisava espairecer um pouco a cabeça. - Revelei.
- O que te preocupa? - Ela perguntou se sentando na cama lentamente. - Usava uma blusinha de alças, marcando seus seios, ao contrário das camisetas largonas que usava. Cobriu as pernas desnudas com um lençol.
- Sei lá. Algumas coisas que eu nunca havia pensado sobre mim antes. Essas coisas de gênero que vocês estavam conversando mais cedo.
Ela ficou em silêncio me observando. Eu continuei.
- Quer dizer, eu não quero mudar meu corpo. Mas eu me sinto bem com uma aparência mais masculina. Isso faz de mim uma pessoa... como vocês disseram? Não-binária?
Ela sorriu de uma maneira terna.
- Não sei, isso é algo que só você pode responder sobre si mesma.
Eu fiquei em silêncio. Aquilo me deixou extremamente angustiada. Eu não queria ser nada daquilo. Na verdade, isso nunca tinha sido uma preocupação. Mas o fato de ter me identificado tanto me deixou apreensiva.
Ela se levantou e se sentou ao meu lado, usava um shorts bem curtinho de algodão. Cruzou as pernas em cima da cama e de forma natural pegou minha mão, segurando-a entre as suas.
- Ei, não pira a cabeça. Isso não muda em nada sobre quem você é. Fica tranquila. Não faça disso um problema. Você pode ser uma mulher que apenas gosta de coisas do mundo masculino, isso não faz de você um homem, ou qualquer outra coisa. Você saberia se fosse algo a mais. Eu tenho certeza.
- É que eu nunca tinha pensado em mim por esse ângulo.
- Vem aqui, fica tranquila - Sem que eu esperasse, ela me puxou para um abraço me deixando rendida. Seu cabelo tinha um cheiro muito gostoso. Todo o corpo dela era macio, quente. Inspirei seu perfume e fechei os olhos. A sensação era maravilhosa. Deixei-me ficar ali por longos segundos, minutos talvez, era confortável demais estar perto dela, era natural, como se a gente se conhecesse há muito mais tempo do que realmente nos conhecíamos.
- Fiquei preocupada com você. Mas o Rafa disse que você era exatamente assim.
- Estranha?
Ela riu.
- Sensível.
- Eu não sou sensível. - Me remexi em seu abraço, agora me afastando dela. Incomodada. Não gostava de ser vista como vulnerável.
- Alguém de câncer é sim sensível. Se fecha na sua concha e se isola do mundo. Minha ex era igualzinha.
- Faz tempo que vocês terminaram?
- Uns oito meses mais ou menos.
Não sei porquê, perguntei:
- Você ainda gosta dela?
- Não mais. Ela me magoou muito, não quero ver ela nem pintada de ouro na minha frente.
- Você ficou com mais alguém depois dela?
- Não. Te disse que não era tão simples eu arrumar uma namorada.
- Pra mim parece super simples. - Eu sorri. - Você é bonita, inteligente, divertida... as meninas devem se jogar aos seus pés.
Ela sorriu abaixando os olhos. Afastou-se de mim indo para sua cama.
- Melhor irmos dormir. Está tarde.
Ela deitou e me deu boa noite.
O que eu tinha falado de errado?
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Lea
Em: 05/04/2023
Gostei do trisal, dá para ver que,o respeito é o fator predominante nessa relação,além do amor.
Veremos muitos babacas iguais ao Marcelo,ao decorrer dos capítulos. Pessoas assim,não tem respeito nem com si próprio.
Vêmos que (aparentemente),não será nada fácil para a Duda aceitar que está apaixonada por uma mulher trans.
Já estou vendo que,vou derramar umas lágrimas com esse futuro casal.Amanda já ganhou meu coração
[Faça o login para poder comentar]
patty-321
Em: 21/03/2023
Essas siglas todas deram nó na minha cabeça. Pessoas são pessoas e pronto, pra mim, com suas diferenças, virtudes e tal. Enfim é pq odeio rótulos. Mas tá super legal a estória, com.personagens diferentes
thays_
Em: 23/03/2023
Autora da história
Obrigada por estar acompanhando!! Fico feliz que esteja gostando!! :D
[Faça o login para poder comentar]
jakerj2709
Em: 08/03/2023
Acho que a Amanda é trans e a Duda já está ficando caidinha por ela ,mas irá lutar por puro preconceito que infelizmente é mto frequente no meio lgbtqi+
thays_
Em: 23/03/2023
Autora da história
Exatamente isso!!
[Faça o login para poder comentar]
Marta Andrade dos Santos
Em: 01/03/2023
Complicado em Duda abre a mente.
Resposta do autor:
Sabe aquela história de quem cospe pra cima cai na cara? É bem isso! Obrigada por estar acompanhando!
[Faça o login para poder comentar]
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook:
thays_ Em: 05/04/2023 Autora da história
Oi Lea! Fico feliz que esteja acompanhando! Espero que continue gostando dos próximos capítulos que virão, qualquer crítica ou sugestão serão muito bem vindas!
Duda é um pouco cabeça dura, mas vai perceber que não adianta nada lutar contra seus próprios sentimentos... Amanda pegou ela de um jeito que não tem volta.