Capitulo 17
— Por que não tomamos um café na minha casa? — Milena perguntou assim que sentou num café livraria, após beijá-la. Clarisse havia a convidado naquela quarta-feira à tarde.
— Aqui é um bom lugar também. — Clarisse respondeu sem ânimo, mas parecia um tanto apreensiva.
— Está tudo bem? Você não está com uma carinha boa.
— Tive uma noite ruim.
— Dorme lá em casa hoje, te faço dormir bem.
— Desculpe falar assim sem rodeios, mas prefiro ser direta.
— Sobre o que?
— Acho que deveríamos tocar nossas vidas... Separadas.
A postura de Milena mudou, ajeitou-se na cadeira e a fitou sem entender.
— Você está terminando comigo?
— Infelizmente sim, com uma dor imensa no coração.
— Mas... Por que? Acho que perdi alguma coisa.
— O que estou fazendo não é justo com você.
— Você tem outra pessoa?
— Não. — Clarisse coçou as têmporas. — Meu Deus, isso é tão difícil, eu não quero te magoar, mas se continuar com você estarei magoando ainda mais.
— Você é ótima comigo, nunca me magoou.
— Eu gosto muito de você, muito mesmo, mas não é amor, eu sinto muito. — Dizia com angústia.
— Tudo bem, o amor surge com o tempo.
— Não vai acontecer, eu estou te iludindo, não quero mais fazer isso, você merece muito mais.
— Não é só isso, não é? Tem mais alguma coisa.
— Escute, eu estou me sentindo o pior ser humano do mundo por estar fazendo isso, e talvez eu me arrependa, mas eu não consigo mais continuar, sinto como se estivesse mentindo o tempo todo.
— Clarisse, eu não me importo se meus sentimentos não são igualmente correspondidos, isso é normal, mas eu sei que você gosta de mim, eu sinto isso.
— Eu adoro você, querida. Você é linda, é gostosa, me faz rir, me compreende, não me julga, mas você precisa doar isso tudo para alguém que te ame.
Milena baixou a cabeça, brincou com o guardanapo sobre a mesa.
— Só percebeu isso agora? Quase cinco meses depois?
— Talvez eu tenha deixado rolar acreditando que com o tempo algo mais viria da minha parte, mas agora sei que não vem, não consigo te dar mais do que sex* e carinho.
— Eu não tenho pressa, não vejo motivo para terminarmos, não estava bom?
Clarisse se desesperava com a negação dela, mas era algo que já imaginava que poderia acontecer, sabia que ela estava realmente envolvida.
— Esses meses com você foram ótimos, é gostoso estar com você, mas tente entender o real motivo disso tudo, eu não quero mais te iludir, você está perdendo tempo comigo, qualquer pessoa que se relacione comigo estará perdendo tempo.
— Talvez você precise fazer um pouco de terapia, melhorar sua autoestima.
— Os psiquiatras são obrigados a se consultarem, eu faço minha terapia quinzenal com um colega. Não tem nada a ver com isso, a questão é outra.
— Qual?
— Eu não te amo, Milena.
Era tão doloroso falar isso em alto e bom tom, sentia-se péssima, como se nascesse para praticar o vilanismo.
— Talvez você se arrependa disso.
— Eu sei.
— Então é isso? Já posso começar a matar os planos que eu fazia para nós ou talvez você mude de ideia?
— Você não faz ideia de como foi difícil criar coragem de vir aqui falar com você, como isso me custou e está me machucando, ver você triste desse jeito. Mas a decisão foi tomada depois de muita reflexão, estou desde sábado me preparando para isso.
— Querida, você acabou de estraçalhar meu coração. — Milena disse entre as primeiras lágrimas.
— Me desculpe... Não tem uma forma menos dolorosa de fazer isso. Eu sinto muito, muito mesmo. — A médica disse e tentou pegar a mão dela sobre a mesa, mas a mão foi retirada.
— Você poderia ter me poupado disso tudo, poderia ter desfeito o circo logo no início.
— Eu não sabia o que viria, eu não tinha como saber. Não foi de mentira, eu estava me dedicando ao relacionamento, eu queria que desse certo, acredite em mim.
— É complicado à essa altura. — Enxugou o rosto e levantou da cadeira.
— Eu sinto muito, Milena. — Levantou também, e a abraçou.
— Pense mais um pouco. — Milena pedia com o rosto enfiado no pescoço da médica.
— Eu não tenho mais neurônios disponíveis, já pensei tudo que podia.
— Eu te amo...
Clarisse não respondeu nada, um grande nó fechava sua garganta, a abraçou mais forte.
Ao separar o abraço, Clarisse a beijou com carinho.
— Se você conseguir, ou quando você conseguir, eu adoraria ter sua amizade e companhia.
— A gente conversa sobre isso outro dia. — Disse polidamente.
— Ok. — Enxugou o rosto dela, a beijou novamente.
— É melhor que eu vá logo. — Colocou a bolsa sobre o ombro. — Obrigada pela sinceridade.
— Se cuida, e seja feliz.
Respondeu com um sorriso entristecido e deixou o café. Deixando também uma Clarisse arrasada para trás, juntando novamente seus pedaços.
Passou o dia seguinte trancada em casa, ainda estava arrasada pelo dia anterior, mas à noite animou-se com a chegada dos filhos.
***
— Que pena que vocês não poderão participar da minha festa de Réveillon.
Clarisse almoçava com Miriam e Claudia na quinta-feira, na área da piscina de sua casa. João e Jardel brincavam na água.
— Esse ano resolvemos passar a virada bem longe daqui, vamos passar uns dias em Gramado curtindo a falta do frio.
— Vão desfalcar minha festa.
— As crianças vão ficar aqui? — Claudia perguntou.
— Não. — Exasperou chateada. — Sabrina vai levar para passar a virada na casa da irmã dela, em Guarulhos.
— Isso não é justo, você não pode passar nem a noite de Natal nem a de Réveillon com seus filhos? — Falou Miriam, havia cortado ainda mais o cabelo negro, estava bastante curto agora.
— Eu não aguento mais discutir essas coisas com Sabrina, ela alega que eu fui convidada a passar o Natal em Minas Gerais com eles, que não fui porque não quis.
— Sabrina é uma cínica, ela sabe que a família dela te odeia, ela convida apenas para que você se sinta mal. — Miriam respondeu.
— E conseguiu, me senti uma megera por não ter ido.
— Pelo menos eles estão com você hoje.
— É sim. — Sorriu olhando para eles na piscina. — Meus meninos estão crescendo, a água agora bate quase na cintura deles.
— Eles ficarão mais altos que você, pelo menos João vai. — Claudia constatou.
Clarisse viu o celular vibrando uma vez em cima da mesa, já haviam terminado de almoçar, leu a mensagem.
desculpe pelos dois beijos
Clarisse riu e respondeu.
não precisa pedir desculpas pelo primeiro
— Você e Milena voltaram? — Miriam perguntou animada.
— Não, é Francine.
— Espere aí, você terminou com aquela deusa ruiva para ficar com essa pirralha delinquente? — Miriam não tinha papas na língua.
— Não, eu terminei com Milena porque não a amava, não é motivo suficiente? E não se refira à Francine desse jeito.
— Você é muito tapada, Cisse!
— São as burrices do coração, amor. — Claudia disse de forma calma, com a mão no ombro da esposa.
— E bota burrice nisso!
— Eu terminei com ela porque era a coisa certa a fazer, mesmo se Francine não existisse na minha vida eu teria feito o mesmo.
— Que mentira, eu te conheço, rapariga, você estaria com ela ainda.
— Acho que não. E para seu governo, não tenho nada com Francine, estávamos inclusive sem nos falar há vários dias.
— Quer que eu acredite que não estavam trocando mensagens?
— Acredite, essas foram as primeiras depois de muito tempo.
— Você não tem medo de perder tudo, inclusive sua liberdade?
— Meus pais já prometeram me defender, se precisar.
— Está abrindo mão de meus serviços?
— Você é advogada tributarista, Miriam.
— Pense bem no que você vai fazer, você tinha uma namorada dos sonhos e está trocando por uma... Ok, não vou xingar uma menina que nem conheço.
— Melhor assim.
— Eu quero conhecer Francine. — Claudia disse.
— Quem sabe quando vocês voltarem de viagem, podemos marcar algo.
— Como o que? Comer um McLanche Feliz sentada num skate na rua? — Miriam zombou.
— Relaxa, não está acontecendo absolutamente nada entre nós, estou totalmente solteira, livre e desimpedida.
— Então posso voltar a procurar pretendentes para você? Vai ser difícil eu arranjar alguém que bata Milena, mas posso tentar.
— Não, guarde seus serviços de cupido por um tempo, tá bom? Estou bem assim.
— Mais uma que sucumbiu à maldição dos quatro meses. — Claudia lembrou.
— Dessa vez quase chegamos no quinto mês, faltaram três dias.
— Milena chegou a dormir na sua cama? Ou essa maldição também não foi quebrada?
— Ela esteve aqui em casa uma única vez, e dormimos no sofá. Então não.
ainda está brava comigo?
Clarisse olhou a resposta no celular.
nunca estive brava com vc, docinho
— Ela de novo? — Miriam perguntou.
— Sim.
— É assim que vocês ficam flertando? Por SMS?
— Também.
vou embora do abrigo depois de amanhã, verei vc de novo?
Clarisse não respondeu na hora. Deixou o aparelho sobre a mesa e lançou um olhar de dúvida para as amigas.
— Por que você tá com essa cara de sociopata, Clarisse? — Miriam perguntou.
— Estou pensando em fazer uma coisa.
— Se for algo para equilibrar sua energia, eu recomendo, viu? Estou percebendo você num grande desequilíbrio energético hoje.
— Talvez eu esteja arranjando sarna para me coçar, mas se eu não experimentar, como vou saber se pode dar certo?
— E o que vai ser?
Pegou o telefone e ligou para Francine.
— Fran?
— Hey, doutora! Como vai?
— Ah meu Deus, ela ligou para a fedelha... — Miriam espalmou a mão no próprio rosto.
— Bem, e a senhorita?
— Feliz com sua ligação.
— Me diga uma coisa, o que você vai fazer amanhã à noite?
— Arrumar minhas coisas para ir embora.
— Vai passar o Réveillon fazendo isso?
— Não, depois vou beber o guaraná que servem no abrigo antes da meia-noite, e vou dormir.
— Quer vir na minha festa?
— Que festa?
— Vou dar uma festa de Réveillon amanhã aqui em casa para alguns amigos, quer vir?
— Sério?
— Sério, adoraria ter você por aqui, o pessoal é tranquilo, ninguém vai te encher o saco, prometo.
— Nem sua namorada?
— Nós terminamos.
— Caralh*, você tá falando sério?
— Estou.
Francine ficou em silêncio por um momento.
— Você ainda está aí? — Clarisse perguntou.
— Eu posso ir mesmo? Não está me convidando por pena?
— Vou pedir para Iracema te entregar cem reais para você pegar um táxi amanhã à noite, ok? Depois pago a ela.
— Não tenho roupas brancas.
— Venha com qualquer cor.
— Vou poder tomar banho de piscina?
— Se quiser, claro.
— Massa! Que horas?
— Quando você quiser, mas se chegar muito cedo vou te colocar para ajudar a arrumar as coisas.
— Fechou, mano.
— Te vejo amanhã, mano.
Clarisse desligou a ligação com um sorrisinho nos lábios.
— Você já está falando o dialeto das ruas? — Miriam ironizou.
— Estava brincando com ela.
— Então ela vem para sua festa amanhã?
— Espero que sim.
Miriam arrastou sua cadeira para próximo da amiga, inclinou para frente.
— Falando sério agora. Você sabe no que está se metendo?
— Sei sim, e não estou criando expectativas pela primeira vez na vida.
— Como é isso? Se rolar, rolou?
— Exatamente, vou deixar o acaso me nortear um pouquinho, sem neuras.
— Isso é positivo, querida, quem pode saber o que o Universo está te reservando? — Claudia arrematou.
Fim do capítulo
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Lea
Em: 19/01/2023
Então, lá se foi mais um namoro da Clarisse. Melhor assim,do que virar um triângulo amoroso,o sofrimento seria maior.
Claudia é o equilíbrio nesse casamento com a Miriam. Adoro essas duas.
*
Bom,a Clarisse está determinada em ver até onde vai esse interesse pela a Francine. Tomara que não cause tantos das,para nenhuma das duas.
*
Sabrina é um ser humano raivoso,e a Clarisse é submissa as regras dela,para não perder o pouco tempo que tem com os filhos!
Até agora nem pista do filho desaparecido!
*
Boa tarde, Cristiane!
Resposta do autor:
A fila andou para Clarisse...
Clarisse vai deixar rolar, mas talvez cautela demais atrapalhe as coisas ;)
Sobre o filho, em breve falaremos dele.
Abraços!
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Christina
Em: 19/01/2023
Eita, situação difícil essa da Clarisse com a Milena, é complicado quando não rola reciprocidade nos sentimos. Ok, tive empatia pela Milina, o diálogo mt bem detalhado, o momento foi triste! Espero que a Fran não tenha o mesmo destino, que com ela seja diferente.
Adorei a Claudia, diferente da Miriam, ela não tá querendo julgar tanto a amg, quer até conhecer a Fran... Falando da ex, a Sabrina tá claramente usando os filhos pra atingir a Clarisse, o que passa? mágoa? ressentimento? ou ainda rola algo?
Depois daquele esporro no abrigo, a Fran baixou a guarda, parecia tudo perdido pra ela, daí ela entra em comunicação novamente com a crush e ganha esperança... Essa festa de fim de ano promete!
Resposta do autor:
Até eu fiquei triste pela milena enquanto escrevia a cena do término... rs
Fran terá outro destino, mas não exatamente o que a gente quer ;)
A ex-esposa tem muita mágoa guardada, ela nãoa ceita ver Clarisse feliz.
E lá vem a festa da virada!
abraços!
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patty-321
Em: 19/01/2023
Tá joga Clarisse. Milena e maravilhosa mas se não a ama... foda. Acontece. Aconteceu comigo, neste caso eu era a Milena. Dói pra porra.
Resposta do autor:
Clarisse chutou o balde, mas talvez tenha que ir buscar... rs
Eita, sinto muito, isso acontece muito, comigo tb já rolou... bola pra frente!
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Marta Andrade dos Santos
Em: 18/01/2023
Deixa vida te levar Doutora direito pra Fran.
Resposta do autor:
E a médica vai deixar rolar! Até certo ponto.... rs
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Zaha
Em: 18/01/2023
Oieee!!
Nossa, que capítulo massa!!
Bem, o final entre Clarisse e Milena era esperado!! Já era pra ter passado e ,Clarisse fez bem, dada a situação e como estão passando as coisas!!!
Essa ex dela me chateia muito!!!!
Essa Claúdia é massa!!! Kkkk
Miriam implica que só...." Ela ligou pra fedelha"Hahahaha. MC lanche feliz...raiai
Eita, que será que vai passar nesse Réveillon....a mulher convidou Francine, uau!!! Parece que ela vai deixar as cosias fluírem, né?! Quem sabe Francine quebre a maldição e da cama TB kkkkkk.
Esperando pelos próximos capítulos!!; Quero ver o que vai rolar nessa festa... Agora q tem 18 e o que vai gerar esse rolo em termos de problemas pra Clarisse no ambiento profissional e tal...
Beijao
Resposta do autor:
Miriam vai implicar eternamente com Francince... rs
E vamos para a festa de reveillon!
Abraços e bom doningo!
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