Capitulo 49
CAPÍTULO 49
OFICINA
Somente Agatha e Jana não tiveram visões, pelo menos não por enquanto, às olhei de soslaio, Jana não tinha dado muita importância ao fato, não podia dizer a mesma coisa de Agatha, seu semblante transparecia a decepção e tristeza por não ter visto nada.
“O que te aflige minha, deusa negra? — Eu escrevi e apaguei quando ela leu.
“Eu sempre me achei sem muita utilidade, não como vocês, que sempre souberam o que queriam, por isso eu ficava na reserva, quando Awa e Kira chegaram e passei pela mesma mudança que vocês lá no rio, eu pensei que éramos iguais agora, aí cada uma tem uma visão e comigo não acontece nada.”
O silêncio foi geral, todas nós vimos o que aconteceu, mas parece que Agatha não tinha noção do seu poder.
“Escreva novamente, minha princesa e preste atenção.”
Agatha começou a escrever e só então percebeu que não estava escrevendo como nós, as palavras que ela queria escrever se juntavam formando frases, mas as palavras eram escritas no ar igual os mapas que Esther nos mostrava, quando ela viu o que estava fazendo ficou assustada e as letras caíram e sumiram como uma fumaça.
“ Não se assuste, depois conversamos sobre seu poder, mas acho que você é uma bruxa tão poderosa quanto a Esther, quando era só um bebê costumava entrar na mente das pessoas e também apagá-las, mesmo sem saber o que estava fazendo, achei que isso era normal para você, e pare com isso, você sempre foi igual a todas nós, só não sabemos ainda muita coisa sobre seu poder, agora venha, vamos lá pra frente tentar descobrir onde nos metemos ou nos meteram.”
Guardamos todas as informações compartilhadas nos organizando para enfrentar o casal e descobrir o que estava acontecendo.
Voltamos para o local descampado, onde possivelmente seria a oficina ao ar livre, inventada para realizar o trabalho puxado que consistia na forja das lâminas e outras coisas que fossem criadas ali.
Cada uma trazia consigo as armas mágicas e os aços de liga mágicas, que levamos junto para perto de onde estávamos tomando banho.
Esther vinha ao lado de Agatha, quase colada no corpo da loba explicando como ela deveria fazer a leitura da mente e o cuidado que deveria ter no momento de entrar na cabeça dos outros, por ter pessoas com a alma tão imunda que muitas vezes era preferível não saber nada, do que se sujar com a maldade alheia, certa vez ela mesma invadiu a mente de um estuprador para descobrir um crime e o que foi obrigada a presenciar as crueldades que ele fazia com as crianças antes de estuprá-las e o grau de crueldade com que as matava, que esqueceu o objetivo da leitura e matou o homem antes de sair da sua cabeça. Ainda assim demorou meses para esquecer. Também corria o risco da pessoa aprisionar o Daemate, esse era o verdadeiro nome de quem podia ler a mente de outro, entrar nelas e mudar a forma da pessoa pensar ou matar, caso fosse preciso obrigar a pessoa a se matar, essa conversa vinha sendo feita em tupi guarani, a língua usada na tribo onde Sandy, mulher da Esther, nasceu e viveu boa parte da juventude quando humana e trouxe consigo seus costumes, principalmente os dialetos que sua tribo usava para confundir as tribos inimigas, eu pedi a Sandy que nos ensinasse, caso um dia viessem a precisar falar em códigos e não serem entendidas por ninguém e agora estava sendo usado tão bem, eu particularmente amava as línguas e dialetos usados pelos índios, por causa de Sandy aprendemos mais cinco linguajares usados nas tribos espalhadas por aí.
Mal nos aproximamos, e o senhor foi logo ditando suas regras, tais ordens estavam me deixando louca, meu sangue agitava tudo por dentro, e a ponta dos meus dedos formigavam, loucas para estapear o senhor, eu tinha que fazer esforço para não deixar o desejo me seduzir, não sem antes descobrir qual era a real intenção do suposto ferreiro.
― Entreguem para Raquel as roupas de vocês, ela vai queimar todas de agora em diante suas roupas serão essas. ― Até aí nada demais, a não ser a urgência nas palavras e o medo estampado no rosto da mulher, que a mim pareceu ter pressa de sair dali e do homem para que nos livrássemos da nossa roupa suja, roupas usadas contém suor, resquício de sangue, restos de tecidos de pele e tudo pode ser usado para coletar nosso DNA.
― Agatha junte nossas roupas e acompanhe a dona Raquel, você mesma jogue elas no fogo e quando virarem cinzas, você volta.
Percebi que a mulher arregalou os olhos surpresa, e o homem mais ainda, depois a mesma troca de olhar hostil foi compartilhada. A mulher que já estava próximo a fogueira junto com Agatha parou esperando as roupas passarem por suas mãos, Agatha passou por ela, jogou todas as roupas no fogo e sentou próximo.
― Pode começar com a parte didática não se preocupe com Agatha, ela tem uma audição lupina, de onde está dá pra ouvir tudo, cada palavra dita― Ofereci meu sorriso mais inocente o senhor ficou decidindo se acreditava na minha pureza de sentimento ou não, acabou tendo que engolir a raiva ou enterrar debaixo do seu orgulho ainda olhando para os lados do fogo ele começou.
― Cada loba levanta a sua bigorna que está no pé da montanha e traz para ser colocada em cima dessas bases de ferro aqui que vocês vão cavar a cova vinte e um palmo de terra abaixo. ― Ele apontava o local com uma varinha de bambu, olhei ao redor e não vi a planta, onde será que ele tinha conseguido a peça? Certa vez Amkaly estava assistindo um filme, desses que os humanos gostam, e que exageram quando é sobre a magia dos lobos e vampiros, pois sim, um dos bruxos tinha uma varinha dessas, será que era a mesma? Não duvido nada, melhor parar de divagar sobre besteira.
Fui ao local que ele mostrou, a minha família já estava voltando e minha cabeça estava repleta de perguntas e desconfianças, peguei a peça de ferro, que nem era muito pesada, se comparado com o tamanho, depositei no chão junto às outras, em seguida fui cavar o tal buraco enfiando o ferro, depois de verificar se estava bem firme coloquei a bigorna e passei um pano velho em cima para limpar a sujeira, na mesma hora ouvi um estampido seco muito parecido quando um edifício é detonado com bananas de dinamite e vem abaixo de uma vez, o que era impossível naquele lugar, onde as casas existentes nem tijolos tinham, me virei toda para o lado de onde veio o som e dei de cara com Esther absorta, fazendo os últimos retoques na posição da sua bigorna todas olhavam para o lado de Esther sem coragem de perguntar e quebrar a concentração da loba.
Próximo a casa, o casal de velhos olhavam horrorizados para o local onde estávamos.
― Que barulho foi esse? ― Fiz a pergunta a ninguém em especial, mas ao virar para as garotas, elas olhavam disfarçadamente para Esther, que continuava, tranquilamente, seu trabalho de limpar e polir sua pedra, Agatha começou uma mímica desastrada para demonstrar que Esther ao invés de acoplar a pedra no ferro, simplesmente jogou, fazendo a explosão de ferro e fogo na hora de se ajustarem forçadamente, a forma como Agatha contava era tão engraçada que foi impossível não rir aos berros, obrigando a beta a parar o que estava fazendo e nos encarar.
― Se continuarem com as brincadeiras, vamos demorar mais do que devemos.
Depois disso, ela olhou a tina, que estava esperando ser cheia com água e o fogão esperando ser aceso, quando achou que tudo estava do seu agrado, virou com os dentes de fora, achando ela que aquilo era um sorriso de ter feito tudo rápido esperando para começar. O casal se aproximou ainda desconfiado e com medo de contrariar alguém, eu gostei que eles sentissem medo. O medo evita muitas coisas desnecessárias, como no nosso caso, matar eles antes de saber porque estávamos fazendo isso.
O senhor olhou para Esther, quando viu a forma como ela sorria mudou a vista para onde estávamos.
― Peguem os martelos, a tina com água é para a dupla, assim como o fogão de ferro, a água tem que ser da bica e deve ser cheia pela dupla. Eu separei as duplas que vai…
― Espera. Baseado em quê ou com ordem de quem, o senhor escolheu as duplas? ― Acredito que dessa vez, eu mexi com os brios do ferreiro, porque ele se engasgou com as palavras, arregalou os olhos deixando só a parte branca visível e fechou os dedos numa forma de ameaça, mas foi tão rápido quanto começou, ele conseguiu se controlar respirando fundo, mas quem respondeu, para minha surpresa, foi a mulher, olhando diretamente para Esther, como se pedisse à minha beta que lesse em sua mente, um pedido silencioso.
― Eu recebi a ordem da hoste direta do Miguel por um mensageiro que avisou também da chegada do ferreiro para orientar na fabricação das armas, o mensageiro trouxe uma lista com o nome de vocês e a data aproximadamente de quando chegariam. ― Durante toda a explicação, eu pude observar o medo nos olhos da mulher, que não abaixou a cabeça ou fugiu do olhar inquisidor da minha beta.
― Perfeito, eu esperava essa resposta. Pelo que ouvi a senhora recebeu a ordem e não ele. ― Apontei para ele, que me olhava com ódio não disfarçado.
― Acredito que aí nesse tal papel, não tem nada falando das duplas, eu conheço meu povo e sei quem combina com quem. ― Tomei a folha das mãos dele, amassei e joguei no chão, quando encontrou o solo já estava uma bolinha de fogo se acabando em cinzas que o vento carregou para longe, sob o olhar de admiração da senhora que olhava toda a cena mais afastada da gente.
― Gilles e Agatha fiquem juntas, Ameth e Jana, Esther e eu, pronto acredito que não quebramos nem uma regra, mais uma coisa; tudo que disser, eu vou querer a confirmação de dona Raquel, ela dará a última palavra. Vamos lá preguiçosas, temos muita coisa a fazer. ― Prendi meus cabelos de qualquer jeito dando um nó neles mesmo, sem dar a mínima importância para o ferreiro, com cara de assassino e nem para dona Raquel que não sabia onde enfiar a cara. Todas nós fomos para a bigorna.
Começamos os trabalhos carregando água da bica para encher a tina. Uma dupla enchia a tina e as outras permaneciam no local, isso afastava a oportunidade de sabotarem o local, sei lá, ali eu só confiava na minha família, fizemos todo o processo sem olhar para os lados do homem ou da mulher, que estavam literalmente sem voz, a força da energia negativa de um deles e o cheiro do medo de outro estava presente o tempo todo, passei a observar disfarçadamente o suposto ferreiro, mas eu não era única, todas estavam de olho nele, enquanto Agatha e Gilles vigiavam de perto a senhora, dava para sentir as sombras circulando à distância os dois.
Terminamos de encher as tinas e usamos de magia para acender o fogo, que subiu crepitando e estalando as brasas levantando fagulhas, o homem a tudo assistia com interesse.
― Senhoras como já está tudo pronto, vamos começar as explicações para a forja de uma boa lâmina. Separem os pés fincando no chão na posição de um duelo, sintam a conectividade com o solo, como se dos pés de cada uma as veias e artérias entrassem no solo. Como raízes, no momento em que descer o martelo pense que essa martelada vai afiar sua espada, moldar e dar vida a uma peça empunhada para acabar com o inimigo. Podem começar.
O sorriso que ele exibia quando falou isso e o medo estampado no rosto da mulher, me fez olhar para a minha família que aguardava a ordem vinda de mim ou da minha beta para iniciar os trabalhos, foi então que olhei para Esther seus olhos bicolores se mexeram uma única vez e foi o suficiente para eu me virar para a mulher.
― A senhora tem mais alguma coisa para acrescentar?
Percebi o ferreiro apertar a mão fechando o punho e apertando no exato segundo em que a senhora colocou a mão no coração como se estivesse sentindo uma dor muito grande, cambalear e cair.
Fim do capítulo
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