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A tragicomédia de Morgana por shoegazer

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Palavras: 4188
Acessos: 525   |  Postado em: 13/10/2022

Acendam as luzes

CENA IV

Morgana está sentada em uma cadeira de escritório gasta, digitando em frente a um antigo computador branco. Ela está com o cenho franzido, olhando uma página com o cursor piscando. A biblioteca está vazia, e logo ela escuta os passos de alguém se aproximando, e logo a envolvendo com um abraço.

VALENTINA

Vai passar o dia todo aí mesmo?

MORGANA

Quero terminar esse capítulo.

Valentina revira os olhos, e a aperta mais contra o seu corpo, posicionando a cabeça no ombro de Morgana.

VALENTINA

É aquela história lá? Pensei que já tivesse terminado.

MORGANA

E terminei, mas estou revisando. Tem partes que não estão boas, tem coisa que...

Morgana expira devagar pela boca, soltando o ar para cima, afastando seu cabelo.

MORGANA

Eu sinto é vergonha de ter escrito.

VALENTINA

O negócio é que você se cobra muito. Já disse que está ótimo.

MORGANA

Mas ainda não está realmente bom, e você elogia qualquer coisa que eu faço.

VALENTINA

Alguém tinha me dito que tinha melhorado esse complexo horroroso de autocobrança.

Morgana pressiona os lábios, e olha Valentina de soslaio, que a encara de volta. Seu rosto está colado ao dela, o que faz Morgana desviar o olhar e tentar se concentrar na tela.

MORGANA

E melhorei. Só de não ter excluído esse manuscrito pela quinta vez já é uma vitória.

VALENTINA

Se você não publicar isso, eu vou ficar muito puta.

Ela deixa o ar escapar pelo nariz, e roça os lábios na bochecha esquerda de Morgana. O ato faz com que ela pressione as mãos, perdendo o ar.

VALENTINA

Não acha que precisa descansar um pouco?

Valentina beija a bochecha já corada de Morgana por alguns segundos, e a encara.

VALENTINA

Hein?

MORGANA

Quais são seus planos?

Valentina puxa do bolso dois comprimidos brancos, e coloca um deles na sua língua, e o outro ela os coloca lentamente nos lábios de Morgana.

VALENTINA

E aí?

Morgana sorri e pega o comprimido com a ponta da língua, engolindo-o e fechando o editor de texto do computador. Valentina a segura pelo pulso e a leva para fora da biblioteca.

 

 

 

— Estou te dizendo, ela é boa, boa mesmo.

Isabela discute com alguém no telefone. Desde que lera meu manuscrito, ela fiou engajada que ele visse “a luz do dia”, e com isso ligou para algumas pessoas que conhecia.

A maioria das respostas foram “não contratamos pessoas sem reconhecimento”, “não procuramos por novos escritores”, “esse tipo de escrita não nos interessa” e “como quer que façamos propaganda de alguém que nem rede social tem?” Isso é realmente importante?

Os outros falaram que ia ver, mas nenhuma resposta até então. Isabela tentou falar com uma amiga produtora, mas sem sucesso. Ela disse que era impossível adaptar um texto sem o aval de alguém.

Fico sentada no sofá, vendo ela andar de um lado para o outro com os fones ligados ao telefone, tomando seu chá mate enquanto tomo o meu, seguindo-a com o olhar. Sua cara se fecha, e ela resmunga.

— Como é? Não, eu não vou falar com aquela palhaça – ela responde entre os dentes – Não, não nos falamos há pelo menos três anos. Ainda pergunta? Não tem outra pessoa pra me indicar?

Ela pega o papel em cima da mesa e faz algumas anotações, e fecha a cara novamente.

— Não, deixa isso entre nós. Acha mesmo que essa vai se interessar? Tá, vou ligar pra ela agora. Digo que foi você que me indicou. Certo, tá, obrigada, viu? Não, não estou te devendo nada, tchau.

Isabela desliga a ligação, e suspira pesado, apoiando na mesa.

— Não estou te incomodando com isso?

— O quê? – ela volta a me olhar, dando um gole no chá pelo canudo de ferro – Não, claro que não, é só que ela sugeriu que eu falasse com minha ex. Prefiro falar com o capeta do que falar com ela, mas não te preocupa que essa aqui... – e pega o papel em cima da mesa – Parece ser gente boa. É de uma galera independente.

Ela volta a tomar o chá e digita os números do papel, e passa um tempo até que alguém atenda.

— Alô, Jaqueline? Boa tarde, aqui quem fala é Isabela, a Yasmin que me recomendou falar contigo. Sim, a do teatro... É que eu tenho uma amiga que está com um roteiro pronto e o negócio é sensacional, não é porque é minha amiga... Não, primeira vez, mas você não está entendendo... Sim, sei que todo mundo se acha diferente, mas ela é boa mesmo. Não podemos marcar uma hora pra ela te mostrar o roteiro sem compromisso? Sim, tem a versão adaptada. O quê? Sério? – ela sorri e faz um sinal positivo pra mim – Certo, terça-feira às quinze horas? Não, com certeza, está fechado. Não, você não vai se arrepender. Obrigada, até terça.

Ela desliga a ligação, e faz o sinal positivo com as duas mãos.

— Conseguimos uma entrevista.

— Sério? – digo animada – Sério mesmo? Nossa, eu...

Nem tenho o que dizer, e agora? Estou nervosa, mas ao mesmo tempo estou feliz, tanto que travei. Como lida com isso?

— O bom é que já vamos sair pra comemorar hoje – ela se aproxima de mim e coloca as mãos sinuosas em meus ombros – coincidência? Claro que não, isso só pode ser um sinal, guria.

Esboço um sorriso tímido. Queria falar pra Isolda logo a novidade, mas não tenho como ligar para ela essa hora. Vai ter que ficar pra amanhã. Também teria que atualizar ela da minha relação com Isabela, que um passo de cada vez, fomos nos aproximando ao ponto que se vê agora.

Como ela tem passado mais tempo em casa, saindo só algumas vezes na semana, nos encontramos com mais frequência porque eu raramente saio. Ela bate na minha porta e me chama pra comer, normalmente à tarde. Eu venho aqui com mais frequência do que ela vai no meu apartamento, porque não tenho nada a oferecer além de comida pronta e ansiedade social.

Mas hoje sairemos juntas, e ainda não sei o que vestir. Comemos uns biscoitos que tinha na casa dela e vou para meu apartamento terminar a leitura de um livro. Se minha irmã visse que gastei com uma pilha de livros e comprei só um par de roupa, ela enlouqueceria, ou melhor, irá enlouquecer. Vou só esperar acontecer.

Tomo um banho demorado, e olho para minha pequena seleção de vestuário. Se veste para esses eventos de um jeito específico? Bem, roupa preta, mesmo gasta, é o que não falta aqui. Coloco um jeans escuro, camiseta lisa preta e meus tênis esburacados. Jogo o cabelo pra trás, ainda me queixando porque não fui dar um corte nisso, e... É isso. Escovo os dentes e passo a amostra de perfume que ganhei da última vez que sai. Olho mais uma vez meu reflexo no espelho. Será que tem alguém que olha pra mim e pensa que eu sou bonita ou simpática? Porque atraente eu sei que estou longe de ser, digo... Quem vai olhar pra mim, com essas olheiras proeminentes, o rosto com algumas manchas antigas de acne, a sobrancelha por fazer e o cabelo desgrenhado e pensar “Nossa, essa garota faz o meu tipo?”

Volto para a casa da vizinha, e a porta está entreaberta. Mesmo assim bato, e ela diz para entrar. Quando chego, ela ainda está se arrumando, ouvindo música enquanto se maquia.

— Vamos comer alguma coisa antes de ir pra lá – diz ela passando o lápis de olho – pra não ter que ficar caçando depois de madrugada.

Eu na rua de madrugada? Está aí uma coisa que a gente esquece que pode fazer. Ela continua se maquiando e vendo algumas combinações de roupas e me deleito assistindo televisão, já que na minha ainda não tem.

Nisso se passa quase uma hora, e quando ela sai do quarto, tento não me espantar com suas vestes carregadas em uma camiseta preta rasgada com uma das cantoras que ela gosta na frente, calça rasgada, jaqueta de couro, maquiagem carregada nos olhos, botas e uma gargantilha cheia de correntes presas.

 — E aí, ficou bom?

Arqueio as sobrancelhas e dou com os ombros.

— Não sei, pra mim está.

— Acha que consigo pelo menos beijar uma boca hoje?

— É... – Cerro os olhos, encarando seu batom vermelho escuro – sim, é bem provável.

Porque qualquer mulher que se atrai pelos estilos rebeldes se arrastaria por ela com esse visual. Já eu... Será que não estou básica demais? Mas sem coragem de trocar essa roupa, vou aceitar ir assim mesmo, e também não tenho intenções como a de Isabela.

Ela pega a bolsa de lado e abre a porta, gesticulando para que eu a acompanhe.

 

Ela só não tinha me dito que a tal festa era em um porão mal iluminado e apertado. Como ela conhecia o pessoal da banda, conseguiu duas pulseiras de graça para gente. Chegamos uma hora e meia depois do horário marcado, e o local já está movimentado.

E, como o esperado, ela chama atenção de todo mundo, não só pela altura e a beleza, mas pelo jeito que se porta. Eu deveria me sentir incomodada pelos olhares direcionados a ela, mas nem um pouco. Gosto de ninguém reparar em mim, e gosto ainda mais da sua companhia. Ela vai até o bar, pede um drinque e um suco pra mim, no qual brinda e procuramos um lugar próximo da parede para ficar.

— Já ela chega – diz ela olhando pro telefone – se atrasou um pouco por causa do trânsito.

Não consigo enxergar ninguém direito nesse lugar. O que eu vejo são várias pessoas com roupas pretas bebendo, um barulho ambiente de música misturado com essa luz vermelha. Nunca fui numa boate, mas parece uma. Talvez eu esteja em uma, mas tudo bem.

Logo a amiga de Isabela chega, acompanhada de outras garotas, todas usando roupas de couro coladas, tatuadas e de cabelo comprido. Elas dão um longo abraço, e ela gesticula em minha direção.

— Essa é minha amiga, Morgana.

— E aí – ela estende a mão até mim, sorridente – Sou a Fernanda.

— É um prazer – aperto a mão dela.

— É a primeira vez dela em um show assim – Isabela toca o ombro dela devagar, e ela a olha surpresa.

— Sério? Bem, eu tenho certeza que vai gostar – ela dá um sorriso ainda mais largo – Meninas – ela segura o ombro de Isabela – vou lá tirar o som, até mais tarde.

Nos despedimos e damos uma volta pelo espaço, no qual fica mais apertado na medida que chegam mais pessoas. Isabela vai pegar mais outra bebida e começamos a escutar o barulho dos instrumentos.

— Já vai começar – ela gesticula para que eu a siga, e ficamos mais atrás. As pessoas se aglomeram na frente e a banda, formada por garotas, se posicionam nos seus devidos lugares.

A amiga de Isabela canta e toca, ficando bem na frente com suas outras amigas ao lado. Elas se mantêm séria e o público começa a ovacionar quando os primeiros acordes começam e o som melódico invade o ambiente.

O que dura poucos segundos, porque depois da sequência de bateria, ela dá um sonoro grito que parece ter saído das profundezas do inferno e as pessoas na frente começam a se esmurrar e a empurrar.

Olho para aquilo extasiada, e Isabela faz um chifre com as mãos, mordendo os lábios.

— Isabela, o que está acontecendo?

— Estão curtindo o som.

Um homem caí na nossa frente e logo o juntam, o atirando de volta no empurra-empurra generalizado na nossa frente enquanto praticamente esmurram os instrumentos e ela grunhe de um jeito que nem sabia que era possível fazer isso com a voz. Tenho certeza que, se minha mãe visse isso, ia desmaiar por isso ser alegando que isso é uma violência musical em todos os sentidos.

Apesar de eu não entender nada que ela está cantando, não posso negar que é visceral. Parece que o impacto do som mexe contigo de um jeito que não consegue ficar parado, tanto que, quando percebo, já estou balançando a cabeça no ritmo da música.

— Não quer ir lá? – Isabela gesticula para a multidão que se empurra fervorosamente.

— Eu? Não, eu... E se me pisotearem? – digo temerosa, mas logo sinto suas mãos nos meus ombros me empurrando.

— Vai logo!

No primeiro momento eu sinto desespero ao ver tanta gente me tocando e me empurrando ao mesmo tempo, e começo a hiperventilar. Porém, quando respiro fundo e olho para o palco, tudo isso vai embora e percebo que as pessoas não estão se machucando, só estão se empurrando entre si em um frenesi incontrolável que acaba te afetando também, e quando vejo tem outras mulheres comigo fazendo o mesmo. A música fica ainda mais pesada, e o contato físico tão intenso quanto. Quando percebo, eu empurro e sou empurrada em um círculo que gira incessante, até que cessa conforme a música para.

Me sinto sem fôlego, mas assim que respiro fundo e vejo as pessoas ao meu redor fazendo o mesmo, me sinto pronta pra próxima. Peguei o jeito rápido pelo visto, já que Isabela me vê de longe assentindo pra eu continuar.

O empurra-empurra no meio continua, cessando um pouco na medida que as pessoas vão se cansando. Paro pra tomar água e fico ao lado de Isabela, que ri.

— Que bom que está aproveitando – ela diz sorrindo – só estou te vendo daqui.

— Não quer ir?

— Não tenho idade e nem disposição pra isso – ela faz uma careta, mesmo sabendo que não é tão mais velha do que eu.

Passo umas duas músicas com ela, e percebo o olhar de algumas garotas em sua direção, assim como de garotos. Recuperada, ela gesticula para que eu volte pra lá pra curtir como se deve.

Quando em vocalista amiga de Isabela fala que vai fazer o cover de uma banda chamada Sepultura, a plateia começa a gritar animada. O que não espero é que o público fique ainda mais ensandecido com isso, e vejo ainda mais cabelos grandes batendo ao meu redor assim como o delas.

Mesmo sem entender a letra, começo a empurrar os demais animadas, e eles fazem o mesmo, com a cara tomada de prazer por estar ouvindo algo que gosta. Não conheço nada desse estilo de música, mas estou realmente envolvida nessa energia crua e caótica.

Tão caótica que quando vejo, vou sendo levada para a frente, ficando a poucos passos do palco, onde tem uma fila de pessoas balançando o cabelo rápidas no ritmo da música. Alguém se apoia no meu ombro e começa a fazer isso, gesticulando para que o acompanhe.

Balanço a cabeça pra frente e pra trás, me sentindo levemente tonta. Como conseguem fazer isso? Vou tentando de novo e até que é legal. Outra pessoa se apoia no pescoço do cara que está junto a mim, mas a música fica mais rápida e o movimento também, o que acaba me separando deles.

Estou molhada de suor e extasiada, me apoiando na grade, mas não consigo ficar parada já que as pessoas continuam cada vez mais animadas. É contagiante de um jeito inexplicável. Nunca pensei que ficar assim com outras pessoas pudesse causar isso.

Volto a roda formada no meio do show, seguindo o passo das pessoas, sem me importar mais com as cotoveladas e os tropeços, balançando a cabeça como fazem ao meu lado, até que a multidão me leva de volta para a grade e paro do lado de uma pessoa com o cabelo comprido loiro escuro, o girando e balançando frívola com o corpo curvado pra frente. Seja lá quem for, está em transe com o som, curtindo consigo mesmo.

Mal consigo respirar, tanto que o faço pela boca, e a música vai cessando até parar e as pessoas gritarem animadas. Quando essa pessoa levanta a cabeça, vejo que é uma garota.

E ela está me encarando de volta. Seu cabelo bate até o meio dos ombros, e seu óculos está preso na camiseta do Metallica em tons vermelhos. Não consigo parar de olhar pra ela, tanto que me envergonho comigo mesmo ao perceber que nosso contato visual está durando pelo menos uns cinco segundos.

Me afasto envergonhada, procurando por Isabela, mas vejo que ela está bem... Ocupada.

O show acaba, e as pessoas começam a se dispersar. Preciso de um pouco de ar, e vou até o lado de fora. Deve ter sido toda a intensidade do que aconteceu que me deixou assim, é claro. Passo a camiseta pelo meu rosto, mas ela também está molhada.

Sento em um parapeito ali peto, onde tem pessoas fumando distante, bebendo, conversando. Abaixo a cabeça e tomo o ar de volta, passando a unha devagar pelos hematomas das minhas mãos que já estão sumindo. Externalizar o que sentimos faz bem, o que me faz cogitar a fazer algum exercício físico diário além de caminhada.

— Ei.

Não conheço essa voz, então não deve ser comigo. Continuo a olhar para minhas mãos, arrastando meus dedos uns contra os outros.

Só que uma garrafa de água aparece no meu campo de visão, e quando levanto o olhar, vejo que é a garota, agora de óculos, cabelo preso e séria. Meu rosto já está vermelho por causa dos movimentos, agora deve estar mais. Possivelmente ela veio tirar satisfação do porquê estava olhando pra ela, e agora?

— Você quer água? – sua voz grave ressoa mais uma vez, apontando a garrafa na minha direção mais uma vez. Minha boca está seca, e sei que não devemos aceitar coisas de pessoas que não conhecemos, mas... Se ela está fazendo isso, não quer brigar comigo, eu acho.

— Obrigada – pego e dou um gole na água gelada. Ela também usa uma jaqueta jeans amarrada na cintura, calças pretas justas e tênis branco, se sentando ao meu lado. Entrego a garrafa de volta, sem questionar do porquê isso está acontecendo.

— Foi muito foda, né? – ela diz balançando a garrafa entre as mãos – Elas mandam muito.

— É... – cerro os olhos – na verdade, é minha primeira vez num show desses.

— Sério? – ela diz surpresa, com os óculos de armação transparente deslizando do seu rosto lentamente, o que ela coloca no lugar – E aí, você gostou?

— Bastante – digo com uma animação que não consigo esconder – se tiver uma próxima, com certeza virei.

— E você gosta desse tipo de som?

Ela diz essas coisas sem olhar diretamente para mim, mas tudo bem, porque também não olho para ela, mantendo meu foco para a frente. Não sou tão desenrolada socialmente para falar com alguém que não conheço assim.

— Não sou muito ligada em música... – digo pressionando os lábios, passando as mãos na minha calça – o que tiver tocando e eu curtir, pra mim está bom.

— E como veio parar em um show desse então?

— Vim com uma amiga que conhece uma das garotas da banda – aponto para trás – mas ela está meio ocupada lá pra dentro.

Ela dá um riso contido pela mão, e volta a ajeitar a pose.

— Entendo... – e dá um gole na água – venho pra cá pra desestressar e sair um pouco da rotina maçante. Funciona.

O que eu digo? Falo da minha vida pra acrescentar alguma coisa ou faço uma pergunta como ela está me fazendo? Calma, Morgana, respira, não é nada demais.

— Qual é seu nome? – pergunto finalmente a ela.

— Raquel – ela dá um sorriso de canto – e o seu?

— Morgana.

— De onde tiraram seu nome? – ela arqueia uma das sobrancelhas – Falo isso porque não conheço muitas pessoas com esse nome.

— Da história do Rei Arthur – pressiono os lábios, mordendo o inferior devagar – é a meia irmã bruxa dele, mas é a feiticeira mais poderosa que existe, então dá essa ideia de nome de mulher poderosa...Minha mãe é fascinada por literatura inglesa e deu esses nomes para gente. Minha irmã se chama Isolda também por causa de uma história antiga e...

Já estou falando demais, então me calo. Raquel, porém, gesticula para que eu continue.

— E?

— Quer mesmo saber isso?

— Por que não gostaria de saber? – ela dá com os ombros, apoiando as mãos no parapeito em que estamos sentadas.

— Bom, é... – Aperto meus dedos contra a palma da mão – não é nada demais, da história do Tristão e Isolda, romance clássico.

— Nunca li nenhum desses... – ela faz uma careta – é bom?

— São clássicos, mas não faz muito meu estilo... Gosto mais de dramaturgias... Novelas, melhor dizendo, mas não aquelas da televisão... O tipo de escrita.

— Jura? – ela cruza os braços – E como é isso?

— Shakespeare – e nessa hora eu sorrio sem perceber – já leu? – ela nega fazendo um bico com os lábios – Ele é o maior dramaturgo que existiu, as histórias deles são cheias de tragédia, vingança, traição e... – Pauso para conter a excitação – Só você vendo.

Ela dá um sorriso de canto, e concorda com a cabeça.

— Eu nunca me interessei, mas você falando assim soa legal.

Espero que ninguém leia meus pensamentos, e até eu mesmo acho eles inapropriados. Pressiono os lábios novamente e abaixo a cabeça, com a timidez voltando assim que a empolgação de falar disso vai sendo recalcada.

O telefone toca, e ela puxa do bolso um aparelho compacto e revira os olhos ao ver o número.

— Com licença... – ela gesticula pra mim antes de se levantar e atender – Alô? Não, não estou em casa. Sim, eu já vou. Já sei, amanhã, antes da oito, não falamos isso hoje mais cedo? – ela suspira pesado – Eu já disse que vou, você me vê faltando? Pois é, então pronto. Ok, até amanhã, beijos.

Ela desliga a ligação e, descontente, coloca o telefone de volta.

— Eu vou ter que ir – Raquel diz entre sua voz descontente e desamarra a jaqueta da cintura.

Não, não vai ainda.

— É... – Essa palavra foge da minha garganta, e ela se vira pra mim enquanto veste a jaqueta – eu...

Vai, Morgana, fala. Ela só está esperando você terminar de falar.

— Eu gostei muito de conversar contigo. Podemos conversar de novo?

Raquel sorri, e se aproxima com as mãos enfiadas nos bolsos, possivelmente pensando que sou atirada, ou seja lá o que...

— Claro, anota meu número, é...

Engulo em seco e puxo meu pequeno aparelho, que ela olha com estranheza enquanto abro a aba de contatos e ela me fala a sequência de números. Depois que salvo, ela ri.

— Por quê esse telefone? – ela aponta com o queixo – Está fazendo detox de redes sociais?

 — Eu ganhei ele e... Não me interessei de comprar outro até agora – dou com os ombros, e ela concordar com a cabeça. Seu telefone volta a tocar, e ela suspira chateada, pegando o aparelho e o desligando.

— Bem, até logo.

Ela acena se despedindo e desce a rua. Minha mão ainda fica no ar quando a vejo ir embora, e meu ar voltar.

Pressiono meus olhos, me culpando por essas minhas atitudes. Deve ter sido esses hormônios liberados, a excitação por ter uma entrevista marcada, eu... Eu não sou assim, mal levanto a cabeça quando alguém vem falar comigo, como é que fiz isso?

Mas eu me arrependeria se não o fizesse, não sei explicar o porquê, só achei que deveria fazer isso. Meu coração acelera ao finalmente perceber o que fiz, que foi dar vasão a um pensamento e vontade minha sem pensar nos lados negativos dele. E agora?

Mando mensagem, ligo ou só ignoro toda essa loucura? Por que estou me culpando por isso? Não sei se quero ignorar isso, eu não sei mesmo, porque um lado meu diz que não tem nada demais e outro diz que isso é imoral. Não estou fazendo nada de errado em querer me aproximar de alguém, ou estou? Sinto que estou errada, mesmo...

Mas, assim que me vejo pensando Isabela me encontra, já visivelmente alterada e com o batom borrado.

— Porr*, Morgana – ela fala com seu sotaque ainda mais carregado – te procurei em tudo que foi canto, tá fazendo o que aqui fora?

— É, eu... Estava, é... – Quando percebo que gaguejo, faço uma pausa antes de continuar – Conversando.

— Sério? – sua cara é surpresa – Fez amizade por aqui? Cadê eles? – ela se prende no meu pescoço.

— Ela já teve que ir...

— Uma pena – ela faz uma cara de tristeza antes de me arrastar de volta pro local que estávamos – porque a outra banda já vai começar.

Fim do capítulo


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