Família
Aos nove anos Ângela perdeu sua mãe para o câncer e quando mais precisou o patriarca da família lhe abandonou por um negócio nos Estados Unidos deixando ela e seu irmão mais novo na Europa aos cuidados de uma tutora e empregados. Assim eles ficaram por dois anos, depois de algum tempo a menina nem mais sentiu a falta do pai, até que o empresário voltou ao país com nova esposa e um bebê a caminho, de brinde vieram três filhos postiços, Madison Reed, Thomas e Kimberly Vaughan, frutos de outros casamentos da mulher. Dali em diante os Matarazzo tentaram formar uma imagem de família perfeita, pais lindos e ricos junto a seus seis filhos com futuros promissores, mas a primogênita nunca se enganou com tal mundo, soube no momento em que viu aquelas pessoas entrando na sua vida que não eram exatamente boas. Quando se conheceram Sofie a cumprimentou falsamente, apertou com força as bochechas gordinhas dela e lhe disse que era alta demais para alguém de onze anos, depois agarrou Nicolau, o caçula da família até então, e anunciou de forma descarada que seria a nova mãe deles. A morena não podia acreditar no que aquela mulher estava falando, nada poderia substituir sua mãe e nem mesmo colocar isso na cabeça de seu irmão, um alvo fácil levando em conta o fato de não ter conhecido sua progenitora, mas Ângela não permitiu que a memória de Nicole se fosse daquela forma, lutou contra a família para manter um quadro da mulher destacado no hall de entrada e brigou diversas vezes com a madrasta por este motivo. Por anos recebeu ódio gratuito de seus meio-irmãos, que se for observar não têm alguma ligação de sangue, e o desleixo do patriarca quanto a sua criação, apesar de tudo havia alguém para cuidar, a caçula Anastasia, único fruto do casamento de seu pai e Sofie. Após completar a maior idade a moça saiu para conhecer o mundo, viajou para todos os países qual tinha curiosidade de conhecer e teve contato com diversas culturas, de alguma forma preencheu um vazio dentro de si, porém sua felicidade não durou muito, ao voltar para casa recebeu a trágica notícia que seu pai, o poderoso Andrea Matarazzo, havia partido em um trágico acidente de carro e todo o império que construiu ficou nas mãos de uma cobra ruiva vulgo sua madrasta, mesmo tendo uma fortuna imensurável em mãos a mulher conseguiu manchar o nome da família e destruir a multinacional no mercado. A este ponto da vida a italiana já tinha passos traçados e um ótimo emprego que lhe trouxesse estabilidade, mesmo sendo nova no ramo do jornalismo passou a ser disputada e escolheu a oferta que mais lhe agradasse, qual deu a oportunidade de viajar pelo mundo. Longe de todos que fizeram parte do passado se reconstruiu e deu uma nova cara ao legado da família, mas contra ponto disso Sofie e seus filhos continuavam os mesmos, tentando seguir o caminho mais fácil e patriarcal, casar para poder enriquecer novamente.
- Eu não acredito que Ângela estava lá, mamãe! - gritou Madison entrando no quarto onde dorme com o noivo - Garanto que foi ela quem fez isso comigo... - então passou a chorar, fora a maior vergonha que passou na vida.
- Ela nem chegou perto da sua mesa. - a mais jovem da família, Anastasia, defendeu sua irmã, não poderia deixa-la ser incriminada injustamente.
- Faça-me o favor, Stacy! - foi a vez de Sofie falar - Aquela bastarda nos odeia.
- Apenas a vocês, desde que me conheço por gente a maltratam, assim como fazem com Nicolau.
- Foi você quem a convidou, não é mesmo? - indagou a noiva percebendo finalmente como ela havia parado naquele fim de mundo para sua festa, apenas sua irmã teria esta ousadia sabendo da relação que ela têm.
- Sim, mas não foi para te provocar. Ela estava de passagem por Ohio e o vôo para a Itália foi cancelado. - por mais que as palavras da garota fossem sinceras, não conseguiam acreditar.
- Anastasia! Pare de mentir, sua ingrata. - a matriarca acabou se irritando e pegou a caçula pelo braço lhe empurrando na cama - Tenha ao menos consideração por tudo que fiz por vocês, então esqueça que existe estas duas pestes na sua vida.
- Eles são meus irmãos, assim como Maddie e os outros, se não fosse por eles não receberia nenhuma herança.
- Recebi uma herança por ser sua mãe, caso contrário nem existiria. - as palavras da mulher lhe atingiram diretamente e ela saiu do quarto batendo a porta com força, por vezes não aguentava mais sua família, principalmente a mãe - Às vezes acho que essa menina não saiu de dentro de mim.
- Mais uma na lista, deveria ter a deixado com um dos bastardos do Andrea. - disse Madison entrando no closet do quarto e escolheu um conjunto de linho na cor cinza para dormir - Logo vou expulsar aquela vaca, nem deveria estar aqui!
- Espere! Não faça isso...
A mente da ruiva foi a mil com pensamentos mirabolantes, durante a festa ela percebeu o olhar da ex-enteada sobre Chloe, quem a filha odeia e sente ciúmes, acreditando que seja a única pessoa que possa impedir o casamento sem ao menos fazer nada. Notou o clima entre elas durante a dança e a saída repentina, até mesmo os pequenos toques trocados. Ângela poderia ser o band-aid na relação da filha com o herdeiro Ricci, evitando que se esfarele antes que possa acontecer o casamento e eles enriquecerem novamente.
- O que foi, mamãe? - a loira já havia se vestido e agora amarra o cabelo com um elástico.
- Ângela tem que ficar...
- Até a senhora com isso, af! - Madison se jogou na cama e abraçou um dos travesseiros, prestando atenção na matriarca.
- Você não percebeu ela com aquela amiguinha do Alex? - e ali se encontrou a resposta para os problemas delas, por enquanto. Haveria seus prós e contras.
- Está me dizendo que para evitar que Alex me largue por aquela loira franzina terei de aguentar a Ângela?! - ela ficou desacreditada em tal proposta, mas ao pesar na balança pareceu um bom negócio, apenas um mês até o casamento e um provável romance para distrair, em breve conseguiria tudo que estimou - Mamãe, isso é genial! Dois coelhos em uma cajadada só...
Mãe e filha olharam uma para outra e começaram a tramar o plano para prender Alexander de vez, o primeiro passo seria afastar Chloe da vida do noivo, fazer ele se desapaixonar da loira, e continuar fazendo a maioria acreditar que ela é o caminho certo, um anjo em pessoa. O terceiro ainda teria de ser preparado, pois exige muito mais detalhes e cuidado, elas pensaram em tudo, o casamento do ano lhes deixariam novamente no topo da sociedade, agora com novo sobrenome e histórico, como se fossem troféus na vitrine da elite.
No fim da noite Catherine já estava bêbada com todo aquele champanhe e vinho de sobra deixados no local, ela canta feliz com uma garrafa em mãos e camarões na outra, a certo ponto até já havia perdido seus saltos e o óculos que deveria estar no rosto.
- Poetry in your bodyYou got it in every wayAnd can't you see? It's you I'm watchingI am hot for you in every way (Poesia em seu corpo
Você tem isso em todos os sentidos E você não pode ver? É você quem eu estou observando)
Cantou a jovem o começo da primeira estrofe sem errar e acabou esquecendo o resto da música, riu de si mesma por isso, uma música tão boa e ela mal sabe a letra. Alguns garçons que limpavam as mesas riram das caretas que fez tentando busca-la no fundo da mente. As duas mulheres assistiam o showzinho dado gratuitamente de camarote, sentadas na estrutura improvisada da banda, não sobrou nada de instrumentos, praticamente todos já haviam ido embora, menos os empregados.
- Sua irmã é louca! - disse a morena entregando uma taça cheia para Chloe - Aliás, vocês são muito parecidas.
- Você é a primeira pessoa que fala isso. - elas riem e olham mais uma vez para Cath que continuou a cantar alguma música aleatória como forma de improviso - Somos opostos, ela faz o que lhe vem a cabeça e eu...
- Pensa muito antes de fazer algo? - completou após pegar uma mecha solta do cabelo loiro da outra a colocando atrás da orelha - Você faz o tipo todo certinha, mas gosto disso.
- Acho que deveria agradecer. - a perfumista abaixou a cabeça envergonhada e tentou disfarçar olhando para Catherine quase caindo de bêbada.
- Você fica mais bonita assim, com o rosto vermelho. - pela primeira vez a moça teve coragem e olhou diretamente nos olhos da italiana, buscando algo que nem ela mesmo sabe - E quando me olha curiosa, deixa sua íris mais clara.
- Não sei de onde tira tantos elogios. - Ângela sorri mostrando seus perfeitos dentes alinhados e as belas covinhas, o que encantou Charlton.
- De você, estou tentando te conquistar. - Direta! Pensou a loira rindo consigo, não poderia crer no que está ouvindo.
- Pelo menos você é sincera...
- Isso foi um elogio? - Ângela arqueou uma das sobrancelhas esperando uma resposta, tendo quase certeza que seria com gaguejos ou mais rubor.
- Sim, Srta. Matarazzo! Foi mais que um simples elogio, disse sua melhor qualidade. - por algum milagre Chloe não fez nada daquilo que foi esperado, falou de forma segura, talvez fosse algum efeito da bebida que ingeriu ou algo assim - Posso te chamar de Angie?
- Pode sim, porém essa não é minha melhor qualidade, mas tudo bem, talvez você conheça algum dia. Mas é ótimo...
A perfumista não resistiu ao sorriso convencido de Ângela enquanto falava de si mesma brincando, nem aos lábios pintados de vermelho, a puxou para si e pela terceira vez na noite colou seus lábios, desta vez foi algo mais natural e sensitivo. O beijo se aprofundou quando a italiana puxou o cabelo de Chloe exigindo mais contato, um toque possessivo, mas não em excesso.
- Ei vocês duaasss! - gritou Catherine de longe jogando uma garrafa perto delas - Eu estou solteira há dois meses, assim me fazem sentir mal.
- Garanto que você arranjará alguém logo. - revidou Angie se separando da loira que já tinha acabado com o batom da boca de tanto beijar.
- Espera! Você está pegando minha irmã? - a morena sempre fora muito distraída e quando bêbada as coisas só pioram - Oh meu Deus! Isso é o máximo... - então voltou a cantar ignorando tudo o que havia acabado de dizer, seu estado no momento era de Dory, com perda de memória recente.
- Ela é realmente louca.
- E você nem conheceu Cassandra ainda. - ao ouvir o nome da outra irmã Cath gritou "Viva Cassie, viva eu, viva tu!" e apontou para as mulheres - Ela é pior que isso, pena que não pode beber.
- Porquê?
- Está grávida, seis meses e meio, são gêmeas. - Chloe não conseguia evitar de sorrir ao falar da família, principalmente das sobrinhas que estão perto de nascer, seria uma das madrinhas e teria o direito de escolher o segundo nome de uma das bebês.
- Eu amo bebês, se a genética for boa e puxarem a vocês duas elas serão lindas.
- Esperamos! Se nascerem com a cara do pai serão crianças tristes. - as duas riem e a perfumista levanta-se ajeitando o vestido todo amarrotado pelo tempo que ficou sentada.
- E que nomes ela pensa em dar? - a jovem sorriu pela curiosidade de Angie quanto as filhas da irmã, parece realmente interessada. Um brilho no olhar.
- Ela preferiu manter em segredo. - disse desanimada - Mas tomara que combine com Aurora, é o segundo nome que escolhi para um dos bebês. Se tivesse uma filha escolheria este.
- É um nome diferente e criativo. Gostei!
- Ele é um nome forte, como Ângela. - deste vez a italiana levantou e seguiu caminho com ela até onde a caçula Charlton continuava a fazer coisas sem sentido.
- Minha irmã ainda sabe como beijar? - perguntou de forma inocente e deu alguns pulinhos felizes por ela finalmente ter ficado com alguém depois de tanto tempo.
- Sabe sim e muito bem. - a loira fez careta pela indagação indecente de Catherine, mas já era de se esperar levando em conta sua língua solta.
- Pare de me fazer passar vergonha!
- Você já faz isso sozinha! Aliás, tenho que achar aquela Eleanor, precisamos tirar mais uma com a noiva. - ela gesticulava sem parar e finalmente soltou a bebida no que considerou ser uma mesa, mas era um arbusto, sem óculos não enxerga quase nada.
- Hora de ir para dentro, mocinha.
Chloe pegou a irmã pela cintura e pôs um braço dela sob seu ombro, a caçula continuou a pular e quase cair, além de murmurar coisas sem sentido.
- Quer ajuda, Srta. Charlton? Vocês duas estão meio bêbadas, não acho isso seguro.
- Eu dou conta dela. Tchau! - a loira foi lhe dar um beijo de despedida na bochecha, mas Ângela virou o rosto propositalmente e lhe deu um belo selinho demorado.
- Eu ainda estou aqui!
- Tchau, Chloe! - as duas acabaram ignorando Catherine e sorrindo que nem bobas uma para outra.
A mais velha das irmãs foi quem guiou o caminho todo até chegar na mansão, passariam a noite em um quarto juntas e no dia seguinte seus cômodos de residência pela semanas seguintes seriam sorteados, poderiam pegar qualquer desconhecido como colega. Chegando ao corredor cheio de entradas elas tiveram certa dificuldade em encontrar a porta com o mesmo número grafado que sua chave dada por um dos empregados durante a festa. Após algum tempo e várias tentativas falhas acharam o cômodo delas. Era um quarto não muito grande, com duas camas de casais, lado a lado, a da direita perto da grande janela que cobre do chão ao teto e outra de frente a uma lareira já acesa, ao lado desta foi colocada uma televisão 42 polegadas e uma estante de livros, com algumas coleções. Tudo muito colorido, o toque especial de Paloma Ricci. Catherine se jogou na cama confortavelmente e esticou os braços, mas de tão tonta que se encontra rolou para o lado caindo no chão.
- Eu estou bem!
- Sei que sim, está acostumada a cair... - Chloe fez o mesmo com a irmã, sem a parte do cair com tudo no chão - Você acha que consigo alguém?
- Tenho certeza, sempre foi a mais bonita das irmãs. Agora me deixe dormir.
Foi engraçado ver a morena se ajeitando no carpete e fechando os olhinhos, o sono tomou conta, mas não da perfumista. Ela ficou pensando em seu dia e como foi diferente, primeiro conheceu a mulher que vai casar-se com seu melhor amigo, a meia-irmã dela, a quem beijou sem aos menos conhecer, tomou alguns porres e teve uma noite parecida com as do tempo em que era adolescente, quando levava a irmã mais nova escondida para balada. Por alguns instantes teve medo do que poderia acontecer dali em diante e imaginou se veria Ângela mais vezes, se aquilo tudo foi consequência do álcool ou se ela apenas a ignoraria. Mas logo sua mente se esvaziou e ficou apenas imaginando beijar novamente aquela boca, aquela bela boca pintada de vermelho que lhe dera muitos arrepios em uma noite só.
Fim do capítulo
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Marta Andrade dos Santos
Em: 16/09/2022
Eita gostou Chloe e Angela já ganhou essa.
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