O seu amor reluz que nem riqueza

Asa do meu destino, clareza do tino

Pétala, de estrela caindo bem devagar

Oh, meu amor, viver é todo sacrifício

Feito em seu nome

Quanto mais desejo um beijo seu

Muito mais eu vejo gosto em viver

Por ser exato, o amor não cabe em si

Por ser encantado, o amor revela-se

Por ser amor, invade

E fim!...

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O despertador acordou as meninas, programado para tocar a música Pétala, de Djavan. O dia não começou diferente dos demais, já estava quente quando Daisy e Beatriz levantaram para continuar a viagem, tinham marcado de conhecer a Praia dos Anjos, prainha ainda mais tranquila, ao lado de Armação das Pedras.

Acordaram muito cedo, quando ainda clareava. Um silêncio absoluto reinava na pousada, o vento marinho balançava as treliças de madeira da janela, e o barulho mais parecia um lamento. Daisy esticou o corpo, buscando as costas de Beatriz para beijar, dando delicadas mordidinhas no ombro, a namorada espreguiçou com vontade de permanecer na cama. Levantaram e correram para o chuveiro morno, deixando que as águas fizessem uma massagem no corpo de ambas.

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- Amor, como eu vivi tanto tempo evitando você?

- Esquece minha linda, pensa que tudo só acontece na hora certa, e essa é a nossa.

- Obrigada meu bem, por entender os meus momentos, por entender tantas vezes o meu silêncio e falta efetiva em te oferecer uma palavra, por não estar contigo na tua pior fase quando adulta, mas, eu não sabia... – Beatriz não deixou que Daisy continuasse o assunto, colocou seu dedo impedindo as palavras de sair e silenciou a namorada com um beijo gostoso.

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         Pegaram a estrada após se amarem, o sol pintando de amarelo o céu azul, refletindo sobre as águas do mar, se despediram de Armação das Pedras chegando cerca de 1h depois a Praia dos Anjos. Pararam em uma padaria, perto da pousada que ficariam para tomar café, na mesa ao lado dois amigos conversavam.

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- Você viu no Jornal dos Anjos que uma transexual chamada Thiaga foi atingida, também na Cachoeira do Diabo?

- Eu não gosto daquele lugar, eu hein, parece amaldiçoado, várias pessoas morreram ali.

- A trans morreu?

- Não, porque um guarda florestal chegou na hora, ela apenas desmaiou.

- Quer dizer que prenderam o bandido?

- Sim, um neonazista, ele alega ser o responsável por todos os assassinatos, mas, pelo visto não é verdade, o doido falou várias coisas que não batem, pra mim, só queria aparecer.

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         Daisy gravou uma parte da conversa, enviando para Maria Rosa, que agradeceu, chamando Samira, o programado era almoçar com as amigas, e ir até a Delegacia de Praia dos Anjos, qualquer pista poderia ser importante.

         Beatriz ficou feliz, de poder ajudar de alguma forma, segurou a mão de Daisy e contornaram a padaria, andando em passos preguiçosos em direção ao mar, as duas haviam ficado abaladas com as histórias que envolviam a morte de Dany, em suas andanças pela cidade os moradores só falavam no assunto, e foi difícil não ficar sensível com um caso marcado por tanta violência.

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- Eu não consigo entender a Dany, esse lance de gênero fluido pra mim é tão complicado. O pior é que sinto que estão cada vez mais longe de uma resposta. Quem odiava tanto ao ponto de matar com tanto requinte de crueldade?

- Não sei amor, não dá para entender...

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         Observaram um vulto passando em direção a parte de trás da pousada, em paralelo de onde estavam. A pessoa estava curvada, vestia um moletom vermelho, e andava rápido abraçada a algo que não conseguiram identificar. Daisy apressou os passos sendo seguida por Bia, e se aproximaram por trás, sem que a pessoa notasse. Talvez a convivência com amigas policiais tenha dado coragem de se expor tanto.

       A mocinha puxou um plástico de dentro do moletom, estava abraçada a foto de alguém, com a mão em concha tentava acender uma vela, obtendo êxito apenas na segunda tentativa. Daisy se aproximou sorrindo, perguntando se queria ajuda, a garota levou um susto, quase derruba a vela, e dois pingos grudaram na mão, - ai ai ai que droga – gem*u com a dor, esperando a cera secar para retirar.

- Desculpa, não queríamos te assustar – Ela hesitou, afastando um pouco das namoradas, só aí perceberam que era uma travesti bem jovem.

- Estava rezando para Santa Sara, minha família é evangélica, então venho aqui para fazer orações para minha protetora, ninguém nunca apareceu nesses meses todos.

- Não se preocupe, somos do bem, aceita um lanche?

- Obrigada, mas, não tenho dinheiro não moça.

- É um convite.

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        As três sentaram em uma lanchonete a beira mar, um atendente chegou, entregando o cardápio, fazendo cara feia para a jovem travesti, que abraçou a foto de Santa Sara, se encolhendo. Daisy franziu a testa, e o atendente mudou rapidamente a postura, embora com um pouco de deboche.

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- O que a senhorita deseja?

- Um milkshake de chocolate e um Bauru, se puder adicionar queijo.

-  O Bauru já tem queijo...e as senhoras desejam alguma coisa? – Daisy e Beatriz pediram uma água de coco, apenas para acompanhar a jovem que ainda não sabiam o nome.

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- Como se chama querida? Sou Daisy e essa é minha namorada, Beatriz – Falou com a voz cheia de orgulho, era como se estivesse assumindo publicamente sua condição, sentindo na boca o gosto palpável da liberdade e do amor.

- Vocês formam um casal lindo, eu me chamo Leonarda, mas, pode me chamar de Léo, eu gosto do som no meu nome, seja no feminino ou no masculino.

- E mora com os seus pais?

- Sim, eles construíram um quartinho pra mim na parte de trás de casa, os irmãos da igreja queriam que me expulsassem, me batessem, mas, eles se contentaram em me deixar distante.

- Entendi, e o que você faz?

- Estudo e trabalho, estou no terceiro ano do Ensino Médio, estudo a noite e de dia faço um curso de cabelereiro, maquiagem e design de sobrancelhas, a tarde trabalho em uma papelaria, a Beco Diagonal.

- Em Armação das Pedras?

- Isso, conhece?

- Sim, e você conheceu a Daniella?

- Era uma querida, trabalhamos juntas por pouco tempo, um amor de pessoa, era tão boa que nem preconceito sofria, só de uns poucos.

- Quem por exemplo?

- Sabe esse neonazista que atingiu a Thiaga, outra transexual na Cachoeira do Diabo? Bem, é o Marcondes, ele era apaixonado pela Dany, mas, ficava com raiva dele mesmo por isso, que eu saiba eles ficaram uma única vez, e ele pirou, se juntou com uns carecas nazi e deu nisso aí.

- Será que foi ele quem matou a Dany? – Bia perguntou, percebendo que a mocinha ficou vermelha como pimentão, depois abraçou o corpo, embalando a si mesma.

- Pode falar, não vamos te entregar pra ninguém.

- Ele estava comigo, queria ser passivo, e foi o que aconteceu, depois ficou irado, quebrou o quarto do motel, saiu e pagou o prejuízo, ele é de família rica, e eu fui embora.

- Você se importa de dizer isso tudo para duas amigas policiais?

- Aí moça, olha o que aconteceu com a Dany, se com ela que era filha de gente rica, fizeram tudo isso, imagine o que não fariam comigo?

- Tem razão, mas, teu nome não vai aparecer em nada, ainda vai ajudar a descobrir quem matou Daniella.

- Fica conosco até a hora do almoço, não está tão longe disso...

- Claro, vamos passear na prainha e conversar.

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      O tempo passou rápido, as três catavam conchas e sentaram mais perto do mar observando alguns pescadores que entravam com suas jangadas para buscar Beleco, uma espécie de peixes natural de Praia dos Anjos, conhecido por sua carne agridoce. Léo contou que tinha 19 anos, apesar de parecer muito menos, também comentou de Dany e da amizade sincera que as envolvia. Logo Maria Rosa e Beatriz chegaram, sendo apresentadas a travesti, que contou tudo o que havia relatado a bem pouco tempo.

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- Estava pensando em almoçar no Boi na brasa – Falou Maria Rosa – soube que o daqui é bom demais – Léo confirmou, inclusive explicando o endereço do lugar.

- Vou só em casa tomar um banho e colocar uma roupinha melhor, a gente se encontra no restaurante.

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         As quatro viram a trans andar pelas ruas, até desaparecer na esquina da principal.

- Essa não volta nunca – Maria Rosa falou de forma séria.

- Volta sim, ela não tem culpa de nada, e parecia muito disposta a nos ajudar.

- Ela já ajudou Daisy, tem medo que a gente a convença a depor.

- Bom, podemos ir na Beco Diagonal, ela disse que trabalha por lá.

- Podemos tentar, mas, acho que ela não volta nem na livraria, é apenas uma intuição.

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         Estavam no restaurante quando Daisy apontou para a mesa ao lado, Maria Rosa olhou e reconheceu o vizinho de bairro, não tinham certeza do nome, mas, era ele. Júnior virou o rosto, sorrindo ao olhar os quatro objetos de sua admiração, e seguiu em direção a mesa, não sabia se seria ousado de sua parte, mas, foi até lá hipnotizado, deixando o novo amigo a ver navios.

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- Oi meninas, posso sentar com vocês?

-  Claro...

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         Júnior sentou, conversaram assuntos banais, até que o rapaz sentiu que ali era a hora certa de se revelar, sentiu o rosto corar, estava vermelho, branco, rosa, e com muita vergonha, mesmo assim, juntou coragem para contar o que havia feito, tanto na casa de Maria Rosa com a bebê reborn, como na casa de Daisy, no jarro. As quatro escutavam sem acreditar, Bia e Samira estavam irritadas, querendo processar Júnior, chamar a Polícia local. Com as mãos escondendo o rosto, Júnior chorava apavorado, foi aí que a ficha caiu, chorou sem conseguir entender o que tinha dado na cabeça dele para se entregar assim, de mão beijada. Maria Rosa cortou um pedaço de carne, encaixando a cabeça na mão, apontando o garfo em direção ao rapaz que tremia por inteiro.

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- Espere, preciso do silêncio de todas...foi você, não foi?

- O que? Desculpa Maria Rosa, não sei o que me deu, eu sempre admirei o amor de vocês, eu quis tanto isso, sei lá, observar me fazia sentir participando de algo tão intenso. Me perdoa, eu sei que errei.

- Não vou te entregar Júnior, vejo sinceridade em suas palavras, ih, só uma coisa, parece que seu boy foi embora...Hahahahah...

- Deixa, ele é um chato, mauricinho metido.

- Mas, você não entendeu, estava perguntando se foi você quem mandou aquele dossiê do Caso Dany.

- Sim Maria Rosa, queria de alguma forma compensar tudo o que fiz.

- Então, você vai apagar todas as maneiras de nos observar, e vai ter que trabalhar para a Polícia, você é hacker, não é?

- Sim.

- Então, vai reverter tudo o que fez de ilegal, e vai passar a trabalhar para nós.

- Mas, é impossível, não tenho como devolver todo o dinheiro que peguei aos bancos.

- Então, lamento, vou ter que prendê-lo...

- Espera, posso transferir tudo para instituições de caridade, por uma rede internacional, não vão nem saber de onde veio.

- Ótimo, a partir da semana que vem te contrato para a área de Ti da Polícia, o dinheiro, não é essas coisas todas.... mas, vai ser honesto. E obrigada pela boneca, eu amei, ela é linda.

- De nada – Respondeu, com o rosto rubro de vergonha.

- Meninas, vamos perdoar Júnior, ele deve ter uma história de vida complicada, não é verdade?

- Sim...tenho...

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         Após fazer tudo conforme combinado com Maria Rosa, deixou na sua conta apenas o dinheiro proveniente de sua família, em seguida apagou todos os meios de observar as meninas, tantos no notebook quanto pelo celular.

Perdoado, passaram horas em uma conversa franca, Júnior se arrependeu com sinceridade, prometendo que procuraria uma psiquiatra para se cuidar, e voltaria para fazer as pazes da sua família. Sem saber, ao dar essa chance, Maria Rosa havia curado seu coração. O resto do tempo foi tomado para a análise do caso.

         Estavam empolgados quando saiu no noticiário local a coletiva do Delegado, Marcondes matou apenas Rafaella, porque a transexual tinha feito um vídeo dos dois fazendo sex* e estava ameaçando jogar na internet, o suspeito afirmou que não tinha nada a ver com o caso de Vivi e Dany, que havia assumido a autoria apenas para chamar atenção dos seus companheiros de partido.

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- Amanhã pensamos nisso, hoje vamos comemorar com nosso novo amigo. O poeta Mário Quintana dizia que a amizade é um amor que nunca morre. E é verdade!

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Well you're magic he said

But don't let it all go to your head

'Cause I bet if you all had it all figured out

Then you'd never get out of bed

Well, no doubt

Of all the thing's that I've read what he wrote me

It's now sounding like the man I was hoping

To be

I keep on keeping it real

'Cause it keeps getting easier he'll see

He's the reason that I'm laughing

Even if there's no one else

He said, you've got to love yourself

You say, you shouldn't mumble when you speak

But keep your tongue up in your cheek

And if you stumble on to something better

Remember that it's humble that you seek

You got all the skill you need

Individuality

You got something

They call it gumption

They call it anything you want

Because when you play the fool now

You're only fooling everyone else

You're learning to love yourself...

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A todos os meus amigos que se foram e aos que permanecem comigo, o meu muito obrigada. Sem vocês tudo seria muito mais difícil.

Beijos, Sabrina

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...: ♫ MÚSICA DO CAPÍTULO ♫:...

Pétala – Djavan

Song for a friend – Jason Mraz

Fim do capítulo