Capitulo 34
CAPÍTULO 34
MARINA
O ano letivo estava a todo vapor, o mês de outubro corria e a preparação para o final das provas anuais já tinha sido disparada. Nós já não tínhamos tanto tempo para ficar juntas, os trabalhos e deveres escolares estavam nos distanciando. Bia estava no 3º ano e a cobrança em cima dela era demais, havia dias que passava o dia no colégio, chegava muitas vezes quase oito da noite e vinha tão cansada que mal tomava banho, apenas desmaiava nas minhas pernas.
Aos sábados e alguns domingos sempre acontecia um intensivo e revisão da matéria, acompanhado de simulado, semelhante ao do ENEM. Todas as classes de 3º ano formaram seus grupos de estudos e, para meu desgosto, a Ana Clara caiu no grupo da Bia, isso me chateava muito, ver que muitas vezes algumas garotas do terceiro passavam a noite na casa da Bia estudando.
Nessas vezes, Ana Clara fazia questão de dizer a todo mundo que dormiria na casa da Bia. Postava no Instagram fotos da Bia distraída, ou sorrindo de alguma bobagem, ou só pensando. Colocava na legenda: “Minha futura médica”. Eu fervia de raiva, também tinha fotos do grupo, mas a maioria era da Bia.
Elas estavam sendo sabatinadas para prestar o ENEM, minha loira queria realmente ser médica pediatra e dessa forma tinha que estudar dobrado. Para mim também não estava sendo fácil, com a proximidade do 3º ano, as coisas complicaram, sempre fui boa aluna, o problema era meu irmão, Marcos, que não ligava para nada e estava na mesma sala que eu. Ele já havia repetido o segundo ano duas vezes, então a coordenação fez a bondade de me colocar como mentora dele para o incentivar a estudar e, com isso, quando eu e Bia tinha uma folga, eu estava ensinando o meu irmão.
Estava ficando puxado para nós duas, que agora só namorávamos pelo celular. Para acabar de completar essa situação toda, meu colégio promoveu uma gincana com as oito salas do 3º ano e o ganhador deles, seria agraciado com um final de semana em Canoa Quebrada, com direito a acampamento ao ar livre na reserva de camping daquela praia. Imagina a loucura, com todos querendo ganhar. Tudo que arrecadassem seria reinvestido para a colação de grau no fim de ano e para a festa.
Foi formado o grupo de seis e uma líder em cada grupo. Biatriz ficou com o grupo dos pandas-brancos, como cada sala tinha 24 alunos eram 4 grupos mistos. Saíram nos supermercados arrecadando alimentos e eu sabia quem fazia parte do grupo da Bia. Todo o colégio participou da votação, o critério de escolha foram as notas e frequência, cada turma pegou dois alunos com média abaixo de sete para nivelar cada grupo e tornar as salas homogêneas e estava tranquila com isso.
Numa dessas folgas de deveres e estudos, estávamos deitadas na minha cama quando ela soltou sem querer:
— Amor, você precisava ver a Claudete falando com a dona do açougue para pedir a carne do sopão. Ela estava com tanta vergonha, mas tanta vergonha que gaguejava, foi então que Ana Clara tomou a frente e conseguiu. Foi muito engraçado.
Ela sorria e me abraçava beijando meu rosto enquanto falava, porém uma dor apertou meu peito e os pelinhos do meu braço se arrepiaram, igual gato com medo. Um nó se fez na minha garganta e meus olhos ficaram marejados.
— Ana Clara está no teu grupo? Desde quando ela está no teu grupo? — Eu disse engasgada.
— Ela trocou, no grupo dela tinha só ela de garota e no meu tinha só o Thiago, aí eles trocaram. Não vi nada de mal, por quê? — Bia falou sem perceber o problema.
— Por quê?! Porque ela é e sempre foi a fim de você, bolas! Não nega isso para ninguém! Pensa que eu gosto quando ela vem para cá estudar e manda mensagem para meninas dizendo que vai dormir aqui? — Eu nem percebi que estava gritando, mas não liguei. — Pensa que eu gosto, quando ela posta suas fotos dizendo “minha futura médica”?! Eu não gosto! Nunca gostei! Agora essa? Então, se vocês ganharem vão passar o fim de semana na praia acampadas e dormindo na mesma barraca?! Acha certo isso?!
— Vem cá minha panterinha negra, não fique assim. — Ela tentou me acalmar. — Eu só vejo você, pode ter mil Anas Clara e meu coração só será seu... Que história de fotos são essas?
Peguei meu celular esquecido em cima da mesa do computador e abri na pasta da Ana Clara. Quando fomos olhar juntas, tinha mais uma que eu não havia visto ainda, nessa Bia estava debruçada na mesa e Ana Clara bem atrás cheirando os seus cabelos. Pareciam um casal.
Bia, notando minha reação de querer sair dos seus braços, me apertou mais ainda e passou para minha frente, tentando de toda forma me beijar enquanto tentava explicar.
— Amor, eu não sabia dessa foto! Nem vi quando tiraram! Eu vou falar com ela, pode deixar. Eu não trairia você, acredita em mim! Por favor! Aqui no meu peito só cabe você. Acredita vai amorzinho. — Foi distribuindo beijos nos olhos, no nariz e boca.
Bia dizia que ia ter uma conversa muito séria com Ana Clara, que já tinha percebido suas indiretas, mas fingia não perceber, afinal, não era segredo para ninguém no colégio que ela era apaixonada pela menina do 2º ano. Precisava ter uma conversa séria com a garota.
— Eu não gosto disso Bia, ela pode bolar alguma coisa para ficar contigo, sei lá, te pegar a força de uma maneira que você não tenha saída, te beijar e alguém tirar uma foto e ela postar, pois sabe que se acontecer a gente se separa. Ela pode inventar da mesma forma que eu inventei meios para ficar com você — Falei com receio.
— Olha amor, não vai acontecer nada. Vem, vamos aproveitar esse tempo que nós podemos estar juntas e deixa o resto para lá. — Nos beijamos.
Eu mesma iria falar com ela, dar um basta em tudo isso. Se fosse preciso eu metia a mão nas fuças dela, ora se eu ia aguentar desaforos.
[...]
O 3º ano A, que era a turma da Bia, ganhou a gincana por merecimento e empenho dos alunos. O colégio, no final das contas, decidiu que os 3 primeiros lugares tivessem o direito a viagem igualmente, como recompensa pelo esforço de cada um, os alunos estavam eufóricos, afinal era um sábado e um domingo longe da família, a euforia era grande, apenas eu não compartilhava da felicidade. Biatriz tentou de todo jeito me convencer que não me preocupasse, que nada mau aconteceria, mas nada me alegrava, estava com o peito apertado e cada vez que olha para a assanhada da Ana Clara, mais tinha a impressão de que algo iria acontecer.
Chegou o momento da viagem, de mochila nas costas Biatriz veio se despedir prometendo um monte de coisas, dava para ouvir a galera gritando o nome dela todos impacientes para a viagem sai do abraço para que ela partisse. Quando o ônibus dobrou a esquina, não consegui conter as lágrimas que rolaram no meu rosto, não pude segurá-las, e junto ao choro surgiu uma dor que eu nunca tinha sentido, uma coisa que apertava o peito ao mesmo tempo que queimava e com esse sentimento entrei em casa e me tranquei no quarto.
Fabiana
Marina passou por mim sem olhar para os lados, parecia que o mundo estava se acabando eu bem sabia que o motivo, era o fato de a Bia ter ido para o tal acampamento e uma menina chamada Ana Clara ter ido também, a gente quando é adolescente só pensa besteira, se Bia dizia que amava e enfrentou o diabo para ficar com minha flor, o que custava ela acreditar nisso? Mas não tinha o que fazer todo esse escarcéu, por nada, com certeza deveria estar se acabando em choro. E eu só conseguia pensar em uma pessoa para me ajudar a acabar com isso.
— Está ocupada? — Fui logo perguntando. — Pode vir aqui? Sim é urgente.
Alguns momentos se passaram e uma loira linda chegou à minha casa.
— Alguém chamou? — Luíza disse animada. Dei um pulo do sofá e se abracei com a loira que acabara de chegar. Quase a derrubando. — Isso é que eu chamo de boas-vindas. O que foi que aconteceu, minha balinha de café? — Enquanto falava, tirava uma mecha do meu cabelo que caia e entrava no olho.
— Ouça, desde que a Biazinha entrou naquele ônibus que ela chora nesse desespero e eu não sei o que fazer, nunca senti essa dor, como eu posso ajudar?
A loira apurou os ouvidos e ouvia um soluço dolorido de um peito rasgado de dor, sabia o que ela estava sentindo em seu peito, já havia sentido a mesma dor. Foi para o quarto seguida por mim, deu duas batidas na porta.
— Marina filha, abra, sou eu Luíza estamos preocupadas. Abra, por favor. — Aguardamos um pouco e uma Marina de olho inchado abriu a porta. Luíza a abraçou. — Venha cá meu bebê, você sabe que eu gosto de você como se fosse minha filha. Aliás, vocês todos são um pouco meus filhos. Senta aqui no colo da tia. — Sentamos uma de cada lado.
Luíza, Marina e eu, no entanto a pequena deitou no meu colo. Luíza ficou fazendo carinho enquanto ela chorava em silêncio, depois de algum tempo ela conseguiu falar.
— Eu queria ter ido junto! Lá tem a Ana Clara que é afim de ficar com ela e vai fazer de tudo para conseguir. A Bia não é de ferro e ela me falou que antes ela ficava com qualquer uma que não significava nada para ela.
— Mas agora ela tem você e não te machucaria. Dê um voto de confiança a ela. — Luíza disse.
— Eu sei, já me disse um monte de vez, mas é que dói tanto aqui dentro. Só de pensar que agora ela está rindo e se divertindo, contando piadas, as meninas tudo ao seu redor se oferecendo! Aí meu Deus! Só de pensar isso dá vontade de ir correndo e tirar ela de lá a força.
— Tire isso da cabeça, chame suas amigas e vá dar uma volta, ver gente, conversar. Amanhã ela está de volta e deve estar cheia de saudades igual a você. Ano que vem é você que vai passar por tudo isso, todo esse processo faz parte da juventude de vocês. — Luíza a calmava enquanto eu apenas concordava.
— Olha filha, se você não quiser sair vamos juntar um grupo e vamos jogar cartas até você dormir. Que tal? — Sugeri.
— Vou chamar a Rosely, — Marina disse enxugando as lágrimas. — tia, a senhora acha que a Bia está sentindo minha falta?
— Talvez até mais do que você, mas ela não podia desistir. Você também não pode, vai ter coisas que só serão vividas por cada uma e isso não enfraquece o casal. Só o deixa forte.
Passei a mão na cintura da minha amiga e descemos conversando, enquanto uma Marina sorria no telefone contando a crise de choro e ciúmes que acabara de ter, mas já tinha passado.
Fim do capítulo
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