Capitulo 38
— Então ela não deu em cima de você. — Ally falou em um tom que até parecia desapontado enquanto de forma um pouco distraída mexia seu suco com um canudo.
— Por que diabos você pensou nisso? Você e a Mia. — Helena rolou os olhos e respirou um pouco fundo enquanto encostava-se melhor no encosto da cadeira, os olhos fixos na melhor amiga sentada a sua frente.
As duas estavam almoçando juntas em um restaurante próximo a galeria de Helena e aproveitavam para por a conversa em dias, afinal, o último dia havia sido bem cheio, mesmo que tivessem passado parte dele juntas.
— Por que normalmente é o que sempre acontece, um romance aluna e professora que ela não queria confessar antes por que tinha medo já que você antes era casada.
— Fanfiqueira. — Helena acusou e riu com as próprias palavras junto com Ally.
— A Mia é ciumenta?
— Sim, ela já demonstrou quando nem tínhamos de fato um romance. — Helena respondeu com simplicidade, mas logo em seguida deu de ombros. — Mas não parece algo possessivo.
— Vocês sempre tiveram um romance, só eram cegas. — a ruiva rebateu como se isso fosse bem obvio. Ao mesmo tempo em que molhava a batata frita no molho, já haviam terminado de comer, mas a batata havia sobrado. — Mas enfim, como foi com a Letízia?
— Foi bom rever ela, ela disse que sempre notou os sinais de abuso, mas que não conseguia me alcançar para oferecer ajuda. — explicou com calma e baixou o olhar para encarar a mesa, franziu um pouco o cenho. — E eu não a culpo, de verdade, ninguém conseguia ou conseguiria me ajudar naquela época e eu me fechei pra todo mundo, inclusive até para você.
Ally acenou com a cabeça, concordando com as palavras da amiga.
— Ela disse que nunca esqueceu de mim...
— Romance.
— Disse que não conseguiu ir a minha exposição por que não estava na cidade.
— Totalmente apaixonada com certeza.
— Ally, eu realmente vou parar de falar!
Ally gargalhou.
— Tudo bem! Parei, juro.
Helena rolou os olhos e balançou a cabeça de forma negativa antes de continuar:
— Ela basicamente me ofereceu um emprego como professora na universidade, algo sobre em todos os anos de ensino dela, ela nunca viu um talento como o meu...
— Você tem todo o meu apoio. — Ally interrompeu a amiga novamente.
Helena sorriu com carinho para a amiga e respirou um pouco fundo antes de negar com um aceno de cabeça.
— Mas eu não vou aceitar.
— Por que não? Você é super atenciosa quando é relacionado à pintura, lembra quando você tentou me ensinar a pintar? Foi incrível, eu que não levo jeito.
— Você é horrível.
Ally deu de ombros enquanto acenava positivamente com a cabeça no meio de um gole em seu suco, em seguida riu.
— Em outro momento, talvez eu aceitasse. Agora eu não me sinto preparada e nem confortável com a ideia, eu mesma já trago muita responsabilidade para mim mesma lidar.
— Que tolice, Helena, não seja idiota, você é mais do que capaz de lidar com um desafio novo assim.
— Tão delicada. — Helena tinha um sorriso pequeno nos lábios enquanto olhava fixamente para a amiga.
— Oh, falando em capacidades e coisas do tipo. — Ally largou tudo o que fazia para ajeitar-se novamente, mas agora com mais empolgação. — Advinha quem vai ser a homenageada da Exposição Anual de Artes?
— A Licca? Ela fez três exposições esse ano, todas foram extremamente bem sucedidas, seria bem merecido.
— Vai ser você.
Helena arqueou ambas as sobrancelhas.
— Ta brincando? — questionou e em seguida franziu o cenho.
— É tão absurdo assim? Você faz doações absurdamente generosas todo mês, Helena, ajuda centenas de artistas amadores por aí, é um grande exemplo a ser seguido e está surpresa?
— Meu Deus. — Helena riu por não saber como reagir. — Como você soube?
— Recebi a carta hoje de manhã com o anúncio. — a ruiva deu um sorriso satisfeito. — Eu estou muito orgulhosa de você.
Helena riu, riu por que não sabia o que falar e muito menos o que fazer diante aquela situação, mas estava feliz, estava muito feliz, escondeu o rosto por alguns segundos enquanto pensava em tudo aquilo.
— Quando vai ser? — questionou e ergueu a cabeça para encarar a amiga.
— Você ainda tem bastante tempo pra digerir e eu realmente não me importo de ceder o meu convite para você levar a Mia.
— Resta saber se ela... — a morena parou de falar quando ouviu o toque do celular e olhou para o lado onde seu celular estava ao lado do de Ally no cantinho da mesa. — Falando nela... — disse baixo ao ver o nome da namorada no visor. — Oi, amor. Estávamos falando sobre você.
— Você não vai acreditar no que aconteceu!! — a voz chorosa de Mia soou do outro lado da linha. — Tudo errado, Helena, está dando tudo errado e eu odeio quando isso acontece, eu planejei tudo milimetricamente para hoje ser perfeito e eles furaram comigo de última hora! Eu estou tão envergonhada, o que eu vou falar para a Daisy? Que eu não posso fazer o serviço hoje simplesmente por que os marceneiros sumiram? Isso não é nada profissional da minha parte, isso vai manchar a minha imagem. — Mia falava tudo extremamente rápido, claramente afetada pelo o que estava acontecendo.
— Mia, amor! Calma, calma. Respira fundo. — Helena automaticamente respirou fundo como se Mia fosse capaz de ver isso, mas sorriu de canto quando ouviu a respiração da namorada no outro lado da linha. — Agora com mais calma e mais devagar, o que aconteceu?
— Eu te disse que tinha um serviço hoje na casa de uma cliente, a Daisy, iria montar todo o ambiente que eu modifiquei com a ajuda dos marceneiros para a montagem dos móveis projetados, do serviço de mudança e dos pintores, são uma equipe só, mas agora, exatamente agora eles me notificaram que não vão poder vir por causa de um imprevisto, agora quando eu já estou na casa dela pronta para começar, isso é absurdamente inaceitável.
Helena encarou Ally em sua frente, a ruiva lhe encarava com curiosidade como se quisesse ouvir a conversa e Helena apenas sorriu apesar do problema da namorada, sorriu por que era a cara dela entrar em desespero por que algo não estava indo como ela havia planejado, respirou um pouco fundo enquanto pensava em todas possibilidades.
— Ok... — falou baixo e olhou rapidamente ao redor. — Eu acho que eu posso te ajudar, me passa o endereço por mensagem e eu te dou uma resposta em alguns minutos.
— Como você vai conseguir me ajudar?
— Apenas mande, amor. — ouviu o suspiro do outro lado da linha antes da ligação ser encerrada.
— Já estão se chamando de amor? — Ally questionou naquele tom sugestivo, mas logo continuou. — O que aconteceu?
— Não conseguia mais chamar ela pelo nome, parecia antiquado. — falou baixo de forma um pouco distraída enquanto mexia no celular. — Ela surta quando as coisas não saem como ela planejou, tinha um serviço grande hoje e quem iria fazer furou com ela. — disse baixo antes de colocar o celular no ouvido. — Felizmente talvez eu possa resolver isso.
— Eu também surtaria se isso acontecesse. — Ally franziu um pouco o cenho.
— Sabe que às vezes penso que você combina mais com ela do que eu? — Helena franziu o cenho ao falar aquilo em voz alta.
Ally deu de ombros.
— Prefiro ela como cunhada.
****
— Você sabe que foi por causa desse seu perfeccionismo que eu optei por seus serviços não é? — a mulher negra questionou enquanto olhava para a mulher do outro lado da mesa, bem na sua frente.
Mia deu de ombros enquanto balançava a sua xícara de café para que o líquido escuro se remexesse dentro da mesma.
— Na culinária, em especial em um restaurante como o Palermo, a perfeição é exigida até nos mínimos detalhes, então foi algo inevitável na minha vida. E por isso eu odeio que absolutamente qualquer coisa saia do que eu programei.
Daisy riu por breves segundos antes de acenar com a cabeça.
— Eu entendo e inclusive acho muito fofo. Mas está tudo bem de verdade, Amélia, caso não consigam entregar hoje, eu não vejo problema algum em ter você novamente aqui outro dia.
— Você só está sendo gentil, Daisy. — Mia rolou um pouco os olhos e olhou um pouco ao redor, as duas estavam na varanda tomando um café. Foi nesse momento que os olhos de Mia focaram-se em uma figura conhecida até demais e bem distraída olhando para o celular e em seguida olhando em volta. — O que... — ergueu-se de repente.
— O que foi? — Daisy questionou e olhou na mesma direção que Mia.
Mia não respondeu, só se afastou e foi andando um pouco rápido, desceu os degraus da varanda e foi nesse momento que seus olhos se encontraram com os da namorada.
— Aí está você! — a mexicana falou, o sorriso largo aparecendo em seus lábios enquanto caminhava em direção a namorada.
— O que está fazendo aqui? — Mia questionou, ambas as sobrancelhas se arqueando, mas mal teve tempo de falar algo quando dois furgões entraram em seu campo de visão e pararam bem em frente à casa de Daisy.
— Helena!!! — a voz extremamente animada e grave soou no momento em que o motorista de um dos furgões saltara do veículo após estacioná-lo. Ele era imenso e tinha traços que muito se assemelhavam ao de Helena e Mia entendeu o motivo quando nada entendeu quando os dois começaram a conversar em sua língua nativa, o Espanhol.
Mia continuava sem entender muita coisa enquanto via Helena abraçar calorosamente o homem e falar rápido demais com ele, em seguida abraçou o outro que se aproximou e foi tirada do chão por alguns segundos em um abraço tão caloroso quanto o anterior, pareciam familiarizados até demais.
— Mia... — Helena chamou a namorada. — Esses são Miguel e Ramon, são irmãos, eles são carpinteiros incríveis.
— Carpinteiros, eletricistas, pintores, pedreiros, faxineiros, às vezes cozinheiros ou o que der mais dinheiro. — o maior deles falou rapidamente, um sorriso tão caloroso no rosto que parecia que ele conhecia Mia há muito tempo. — Muito prazer em conhece-la. — ofereceu a mão para a Designer. — Helena falou que você precisava dos nossos serviços, viemos correndo, nunca se deve deixar um cliente na mão, ainda mais amiga da Helena.
— Então eu estou com essa bola toda? — questionou a mexicana.
— Não deveria estar, quanto tempo faz que você não vai a um piquenique? As crianças estão enormes, a Rúbia está com saudades de você!
Helena respondeu falando algo em espanhol que fez os dois homens gargalharem, enquanto continha a risada, Helena foi dando passos em direção a namorada.
— Não fique com essa cara de surpresa, eles são incríveis no que fazem.
— Eu não sei como te agradecer. — Mia falou baixo e encarou a namorada, o que recebeu como resposta foi uma piscada com o olho direito que a fez entender que sim, ela sabia como agradecer.
— Então, onde começamos? — Miguel questionou, os outros homens já tiravam dos furgões, várias ferramentas e já se prontificavam para começar.
— Não... Nós precisamos conversar antes, negociar valores, forma de pagamento...
— Calma lá, chica, primeiro o trabalho pesado, depois a burocracia, não podemos deixar ninguém esperando. — o mesmo homem falou.
— Vamos lá? — Ramon se aproximou enquanto prendia o cinto de ferramentas em torno da cintura.
Mia estava tão surpresa que ainda nem sabia como agir, quando ligou mais cedo para Helena não foi na intenção de pedir que ela arrumasse uma solução e sim por que precisava de algum tipo de consolo para não surtar e não pensou e ninguém mais além de sua namorada, então ter ela trazendo uma solução incrível como aquela lhe trazia sentimentos que ela sequer sabia descrever, mas era muito bom.
— Certo... — a Designer olhou em volta rapidamente e em seguida para trás, viu Daisy totalmente curiosa parada na varanda e não pensou duas vezes antes de dar as costas aos rapazes. — Vamos. — falou e já saiu andando com rapidez em direção a varanda.
Helena sorriu com certo orgulho enquanto observava tudo, viera apenas para mediar à interação entre os dois e pretendia ir embora logo já que não via como poderia ajudar mais do que havia ajudado, mas no momento em que Daisy cumprimentava os homens, os olhos de Mia procuraram á namorada e quando a encontraram, a expressão silenciosamente perguntava: “O que está fazendo aí? Vem logo”.
Helena acabou rindo enquanto balançava a cabeça em negativa e logo ia andando para juntar-se a todos. Sentiu um calor no coração que a fez sentir-se extremamente bem vinda e realmente com vontade de passar o dia inteiro ao lado da namorada, mesmo que não pudesse ainda gritar para todos ali que as duas namoravam e que estava ali por isso, por que moveria o mundo se fosse preciso, apenas para ajudar Amélia.
Assim, a bagunça começou. Helena não teve mais um segundo sequer de tempo de conversar com Mia, mas adorava observar a forma mandona com a qual a namorada tomava conta da situação. Observava em silêncio tudo o que se passava e participava apenas quando precisava, mas estava encantada, a forma como Mia expressava-se tão bem e detalhava seu projeto para os rapazes como se fizesse aquilo à vida toda e claramente dominasse cada detalhe. Ela explicava tudo tão bem que fazia até Helena sentir-se capaz de fazer serviço dos carpinteiros. A artista plástica ajudava como podia dando pequenas dicas em relação à pintura até finalmente todos estarem ocupados demais em seus próprios trabalhos e fazendo Helena e até mesmo Mia já não serem mais necessárias.
— Seja modesta, por favor. — Daisy falou enquanto se aproximava da mesa onde Mia estava sentada e focada em seu notebook. Daisy trazia consigo um bolo recheado o qual colocara bem no meio da mesa. — Eu fiz pra você, mesmo sabendo da pressão que deve ser cozinhar para uma cozinheira.
— Ora, pelo amor de Deus. — Mia riu enquanto tirava os olhos do notebook. — Só pela aparência já da para ter certeza de que está uma delícia, mas realmente não precisava se dar ao trabalho.
— É claro que precisava, preparei também um lanche para os rapazes, servirei logo mais, eles parecem tão empenhados que estou com medo de atrapalhar em algo... Café para acompanhar?
— Eles são incríveis, eu estou surpresa de verdade. — Mia fechou o notebook e inclinou-se um pouco para guarda-lo dentro da bolsa que estava na cadeira logo ao lado. — Sim, por favor!
— Voltarei logo. — Daisy se afastou novamente, voltando para dentro de casa. Estavam no quintal da casa, um grande e amplo quintal que tinha espaço demais para pouca coisa e estavam mudando isso fazendo um espaço coberto a parte que serviria como um ateliê e local de estudos para a filha de Daisy.
— Então... — Helena foi se aproximando após deixar seus amigos de lado, os olhos focaram-se no bolo bem no meio da mesa e arqueou uma sobrancelha. — Muito solícita a Daisy.
— Sim, ela é incrível. — Mia concordou de imediato e sorriu com orgulho logo em seguida, mas passou bem longe de perceber a conotação por trás daquelas últimas palavras de Helena. — Onde você conheceu eles? Eles são incríveis! — olhou para os homens trabalhando no outro lado do quintal, o barulho não a incomodava, na verdade estava acostumada.
— Tem uma comunidade mexicana aqui que eu conheci logo quando cheguei na cidade, me acolheram como uma família, praticamente todos os fins de semana eu ia a piqueniques com aquele dois. — Helena indicou com a cabeça, os dois irmãos trabalhando. — Parei de ir depois que o Trevor começou a implicar com isso, nunca voltei desde então. — deu de ombros enquanto sentava-se em uma da cadeiras ao redor da mesa, ajeitou-se logo e cruzou as pernas devagar.
— E se arrepende? — Mia questionou em tom baixo.
Helena acenou positivamente com a cabeça, tinha um olhar que silenciosamente dizia que tinha muito a falar, mas não era hora e Mia entendeu isso com facilidade, apena concordou com a cabeça como se silenciosamente as duas combinassem de conversar sobre aquilo depois. Mas logo Mia desviou o olhar e abriu um sorriso enquanto via Daisy vir até a mesa mais uma vez, mas desta vez trazendo uma bandeja com o que faltava.
— Eu acabei nem tendo tempo de apresentar vocês duas, que desleixo o meu! — afobou-se um pouco na cadeira e se ajeitou. — Helena, essa é a Daisy, é uma advogada incrível, já trabalhamos juntas algumas vezes, ela é mãe da Michelle, a felizarda que está ganhando tudo isso. — Mia apontou para o trabalho dos rapazes. — Daisy, essa é a Helena... — Mia travou com a boca aberta e olhou para a namorada como se questionasse como deveria apresenta-la, olhou em seguida para Daisy e sentiu um certo alvoroço em seu estômago.
— É um prazer! — Helena tomou a frente de repente por saber o motivo de Mia ter hesitado, mas não se importou, apesar de sentir que tinha algo dentro de sí que queria ter ouvido Mia lhe apresentando como namorada. — Sua filha deve ser incrível para merecer tudo isso e você com certeza deve ser uma mãe maravilhosa.
— O prazer é meu, Helena! Eu devo te agradecer por ter salvado esse dia e principalmente ter salvo essa garota de um surto. — olhou para Mia de forma insinuativa, o que fez a Designer rolar os olhos, mas fez Helena rir. — Você aceita café?
— Por favor, eu adoraria. — aceitou com educação e encarou a namorada brevemente, a designer tinha um olhar um pouco distante e Helena sabia bem o por que.
— A Michelle é muito criativa e muito inteligente, uma verdadeira prodígio, desde pequena foi muito criativa, ama pintar, desenhar, criar coisas, as paredes da minha casa sofreram quando ela era criança, vivia rabiscando tudo. — riu com as próprias palavras enquanto servia o café. — Fez aulas de piano, de bateria, violoncelo, aprendeu tudo, mas nunca parecia o suficiente. O quarto dela ficou pequeno demais para tanto, então falei para ela que se ela mantivesse as notas perfeitas na escola, eu lhe daria um bom lugar para a mente dela trabalhar.
— E como uma boa prodígio, ela fez muito mais do que notas perfeitas. — Mia falou baixo enquanto servia ela mesma e as outras duas com uma boa fatia do bolo de chocolate.
— Exatamente, não só ficou em 1 lugar na escola, como também venceu um concurso de debate e um de matemática.
— Meu Deus, você tem certeza que a sua filha é humana? — Helena questionou com um ar de riso, mas tinha um sorriso largo nos lábio.
Daisy riu.
— Acredite, eu já pensei que não, mas a bateria de exames pela qual eu fiz ela passar comprovou bem que ela é sim humana. — respondeu, arrancando uma risada tanto de Mia quanto de Helena. — Eu nunca achei que como mãe solteira, eu conseguiria cria-la tão bem.
— Ah, mãe solteira? — questionou e encarou Mia brevemente antes de voltar a encarar a advogada.
— Isso, inseminação artificial, doador anônimo. — respondeu com calma antes de dar um gole no café que havia feito, em seguida olhou para o relógio em seu pulso. — Ela deve estar chegando do colégio a qualquer momento.
— Quantos anos ela tem?
— 16, mas parece ter muito mais.
Mia concordou com um aceno de cabeça.
— Ela me faz pensar em como eu era quando tinha a idade dela. — Mia comentou.
— Totalmente certinha e obcecada por perfeição? — Helena implicou.
Mia a encarou com aquele olhar de: “Sério?”.
— Mãe cheguei! — a voz diferente fez com que o casal parasse de se encarar e focasse na nova figura que vinha com um sorriso largo e praticamente saltitando em direção a mesa onde as três mulheres estavam conversando. — Que incrível! — ela inclinou-se por trás da mãe e abraçou-lhe os ombros antes de lhe dar um beijo no rosto.
— Oi, minha linda. Estávamos falando sobre você, você foi extremamente pontual como sempre. — Daisy falou baixo, com um tom de voz tão cheio de orgulho que fez Helena sentir uma pontada em seu ventre.
— Estava contando os minutos pra vir pra casa. — ela disse e se afastou da mãe para poder cumprimentar Mia com um abraço apertado, mas que não foi preciso Mia erguer-se de onde estava. — É bom te ver novamente, Mia.
— Eu digo o mesmo, Chelle! Eu tava louca pra ver a sua reação, essa sempre é a melhor parte do trabalho. — Mia riu brevemente com as próprias palavras e em seguida olhou para Helena pronta para apresenta-la a menina. — Essa é...
— Muñoz! — a garota exclamou, os olhos se arregalando ao encarar Helena.
As três mulheres e encararam na mesa.
— Você me conhece... — Helena começou em tom baixo, mas não teve como continuar.
— É claro! Meu Deus! Você está na minha casa! — a expressão ainda estava surpresa. — Eu sou uma grande fã, o que você faz é incrível.
Mia engasgou com o café.
— Você conhece o trabalho dela? — Mia questionou em tom incrédulo e ajeitou-se rapidamente para pegar um guardanapo e limpar o café que havia escapado de sua boca. — Você não tem idade para isso.
— Ela não tem idade? — Daisy questionou, o olhar se tornando alarmado ao intercalar entre a filha e Helena.
Helena fez uma careta, uma típica careta que alguém fazia quando se declarava culpado.
— Helena é uma artista plástica famosa que atualmente está pintando quadros um pouco ousados. — Mia explicou a Daisy rapidamente enquanto se limpava e notava que havia sujado a própria roupa.
— É claro que não! São quadros que transmitem sentimentos que passam muito longe da ousadia, transmitem sentimentos profundos que fazem o expectador se identificar com a história dela sem nunca ter passado por um terço do que ela passou, é uma obra de arte que nos faz viajar nos sentimentos obscuros da mente humana... — a garota tentou explicar-se de forma um pouco afobada.
— Meu Deus, eu amo essa garota. — Helena comentou baixo, mas estava boquiaberta.
— Eu realmente vou fingir que não estou orgulhosa da sua percepção artística e vamos conversar mais tarde sobre o que você anda vendo na internet...
— Mãe! Ela não é só famosa, ela é revolucionária! — a garota tentou se justificar mais uma vez, o que definitivamente deixou Helena ainda mais boquiaberta do que antes.
— Michelle, certo?! — Helena chamou a atenção da jovem. — Eu não sei nem como te agradecer pelas suas palavras, mas depois de você ter falado tudo isso e pelo o que sua mãe já me contou, tudo o que eu mais quero agora é ver o que você faz.
Automaticamente Michelle olhou para a mãe, ao mesmo tempo em que Helena também olhava para Mia como se as duas estivessem pedindo permissão para saírem dali, Mia riu com o ato da namorada, mas logo em seguida acenou de forma positiva com a cabeça.
— Não tome demais o tempo dela e lembre-se que vamos conversar depois! — Daisy alertou logo após dar a permissão que a filha queria.
— Toda conversa do mundo, mãe! — a filha garantiu enquanto já ia se afastando de forma claramente afobada e Helena já erguia-se quase do mesmo jeito.
Mia ficou com um sorriso um pouco bobo ao ver como Helena havia ficado animada com aquela situação, algo que realmente havia a pego de surpresa, mas foi muito bom ver.
— Isso foi muito inesperado. — Daisy comentou enquanto observava as duas sumindo de seu campo de visão ao entrarem dentro de casa.
— É, essa é a Helena. — Mia sorriu de forma orgulhosa por isso antes de inclinar-se um pouco para pegar sua xícara de café novamente para dar um novo gole.
***
— Como você conheceu o meu trabalho? — Helena questionou enquanto subia as escadas logo atrás da adolescente.
— Não é difícil ouvir falar sobre você, eu acompanho todas as notícias e também assino a revista artística onde às vezes tem notícias, eu queria ter ido para a sua exposição, mas foi na noite do dia do meu campeonato de debate.
— Campeonato esse que você venceu, não é?
Michelle riu com orgulho e girou na ponta dos pés assim que entraram no corredor, o sorriso largo nos lábios fez Helena sorrir de volta.
— Eu me esforcei o suficiente. — deu de ombros e logo voltou a andar em direção ao último quarto do corredor. — Você já teve dificuldades para pintar?
— Já. Houve uma época que olhar para uma tela parecia uma tortura. — respondeu com sinceridade como se tivesse respondido uma pergunta qualquer. — Foi massacrante.
— O que aconteceu? — Michelle abriu a porta do quarto e esperou que Helena entrasse, o quarto era bem grande, mas tinha muita coisa, apesar de tudo bem organizado, haviam várias pinturas, haviam desenhos, instrumentos musicais textos colados nas paredes, fotografias, livros, muitos livros, ursos, posters, troféus e deixou Helena bem admirada, principalmente por que retratava muito bem a bagunça que deveria ser na cabeça daquela garota e justificava muito bem o fato de ela precisar de um espaço maior, não havia espaço para mais nada.
— Isso eu não preciso te responder, você conhece a minha história. — Helena falou de forma um pouco distraída enquanto se aproximava do cavalete em um canto onde havia um quadro inacabado, mas que era uma grande bagunça de cores e formas.
Silêncio. Helena nem percebeu o silêncio de imediato, estava com toda a sua atenção naquele quadro como se imediatamente entendesse tudo o que se passava na cabeça de Michelle. Quando percebeu o silêncio vindo da garota, procurou-a com o olhar e notou que ela a olhava de forma atenta, claramente esperando um veredito sobre seu quadro.
Helena sorriu de canto.
— Sua cabeça é uma bagunça, não é? — questionou em tom baixo enquanto desviava o olhar novamente para encarar o quadro da garota. — Tantos sentimentos... Como consegue se manter sã?
— Focando em uma coisa de cada vez, ao menos é o que meu terapeuta aconselha. Você gostou?
A artista plástica acenou com a cabeça.
— É incrível e muito fácil de se identificar, eu realmente não esperei menos que isso. — mal conhecia Michelle, mas repentinamente sentiu um orgulho pela menina, isso a fez rir de sí mesma.
— O que foi?
— É que é incrível descobrir talentos assim, que não deveriam estar escondidos dentro de um quarto que já não cabe mais nada. Me sinto orgulhosa e nos conhecemos apenas a dez minutos.
— Você tem algum conselho? — a garota questionou por que pela primeira vez em muito tempo não soube o que responder diante as palavras de Helena.
— Sempre ande com um caderno na bolsa, para todo lugar que você for, eu tenho centenas de cadernos amarrotados de desenhos em casa, mas é bom, nunca se sabe quando você vai simplesmente precisar aliviar seus pensamentos. — deu de ombros antes de dar meia volta, parou apenas para abrir a própria bola pendurada no ombro direito e retirou dele o caderno de tamanho mediano e capa marrom. — Esse é novo, só estou a menos de uma semana com ele, então tem poucos desenhos e algumas anotações não muito importantes. — disse baixo enquanto o abria, seu lápis estava preso entre as folhas, rapidamente assinou algumas folhas e então fechou o caderno e o estendeu em direção a Michelle. — É seu.
— Meu Deus! É sério? — a garota segurou o caderno, a expressão surpresa e os olhos arregalados.
— Continue de onde eu parei. — piscou pra ela e deu um sorriso orgulhoso enquanto ia até a janela do quarto ao perceber que a mesma dava para o quintal onde Mia estava com os outros. Assim de longe a encarou explicando alguma coisa aos rapazes que trabalhavam. — O que a Mia achou do seu quarto? — questionou repentinamente em tom baixo.
— Ela disse que eu tenho um gosto peculiar.
Helena riu com a resposta da garota, do jeito que Mia era organizada, aquele quarto era o maior pesadelo dela com certeza.
— A criatividade é peculiar, meu local de trabalho é uma verdadeira bagunça, eu nunca consegui deixar organizado por mais do que dois ou três dias. — franziu um pouco o cenho e desviou o olhar para encarar Michelle que estava com aquele olhar fascinado enquanto folheava o caderno de Helena e encarava cada desenho com imenso cuidado. Por um momento lembrou de sí mesma encarando as obras de arte que a sua tutora fazia, era com aquele mesmo olhar fascinado que a encarava quando ela pintava, sorriu de canto ao sentir aquele calor dentro do peito e automaticamente seus olhos buscaram Mia novamente, foi aí que seu coração pulou no peito quando viu a cena:
Mia estava inclinada sobre a mesa onde havia um projeto aberto e explicava fervorosamente alguma coisa aos rapazes, ao seu lado estava Daisy a rondando como uma leoa querendo a sua presa, a mão tocava as costas de Mia de uma forma que era familiar demais a Helena, fora daquele mesmo jeito que Helena a tocara no primeiro encontro em sua casa, de um jeito que claramente dizia: “Eu quero te tocar mais.”.
— Sua mãe é solteira? — Helena questionou em tom um pouco baixo, os olhos vidrados naquela cena enquanto sentia aquela sensação incômoda em seu interior.
— Sim, há algum tempo. Ela diz que não tem tempo pra namorar, mas eu tenho quase certeza que ela tem uma grande queda pela... — a voz da menina parou no momento em que virou a pagina e notou a página inteira com diversos desenhos de Mia, de vários ângulos. — Mia. Ah... Eu ia perguntar como você acabou aqui em casa, mas acho que agora faz sentido.
Helena desviou o olhar diante as palavras de Michelle e quando a encarou, a garota lhe mostrava o caderno aberto com a página repleta de desenhos de Mia. “Que deslize”, Helena pensou. Acabou dando uma pequena risada enquanto voltava a olhar para aquela mulher rondando a sua namorada.
— Ela me ligou desesperada por que o pessoal que trabalha com ela meio que sumiu e ela odeia que as coisas saiam do planejado. Eu quis ajudar trazendo eles pra resolverem o problema dela, vim junto para me certificar de que iria dar tudo certo. — falou um pouco baixo e franziu um pouco o cenho com a forma com a qual Mia e Daisy sorriam uma para outra, sua boca chegou a amargar.
— Há quanto tempo vocês namoram?
— Semanas. Ainda é segredo, de certa forma e por certos motivos. — balançou a cabeça como se quisesse espantar alguns pensamentos e afastou-se da janela. Há quanto tempo não sentia um sentimento ruim como aquele? Isso a deixava tão desconfortável, principalmente por que ativava memórias que ela realmente não queria lembrar.
E após passar mais algum bom tempo com Michelle, trocando informações, dando algumas lições e ensinamentos, conseguiu dar uma boa desculpa para Mia dizendo que precisava ir embora e Mia não estava muito em posição de ir contra a vontade de Helena, afinal, estava ocupada. Assim, finalmente e mexicana pode caminhar sozinha para casa e pensar muito bem no que havia acontecido, no ciúmes que sentiu e que definitivamente não queria sentir novamente.
Fim do capítulo
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HelOliveira
Em: 26/04/2022
Daysi longa da Mia por favor..
Gente será que a Mia não percebeu isso....Helena viu de longe e tem todo meu apoio
Parabéns autora mais um cap top
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