Alice

Cheguei em casa sem vontade ver pessoas. Tirei a roupa e me joguei pelada na cama. Chorei mais um pouco do que me restava de lágrimas e adormeci, cansada de tanto sofrimento. Acordei com o Sol já se pondo. Tomada agora por uma raiva, invadindo espaços outrora dominado pela tristeza e decepção, mandei mensagem para Bia, apenas com o intuito de massagear o ego.

Alice: Oi. Esse é meu novo número. Salva aí. Ass: moça bonita.

Imediatamente, ela respondeu.

Bia: Oi, moça bonita. Já salvei. Fiquei esperando você vir buscar sua "blusa" rs.

Alice: Buscar ou tirar?

Bia: Que bom que entendeu meu recado rsrs

Alice: Você não vale 1 real, né?!

Bia: E você liga pra isso? Já tem quem valha por mim.

Alice: Adianta eu ligar? Você é assim e eu não posso mudar.

Bia: E se pudesse, mudaria?

Alice: Não...

Bia: rsrsrs sabia! Você gosta.

Alice: É bom pra quando estiver a fim de algo rápido e direto.

Bia: Opa!! Sempre que quiser. Não precisa nem conversar.

Alice: Assim que é bom rsrs Mas me lembrei que ainda estou com raiva de você.

Bia: Pq? Só pq fiz o que tive vontade?

Alice: Até então, eu achava que você era diferente.

Bia: Nem dormi desde então rsrs .. zuera.. Sorry!! Não tive a intenção de magoar.

Alice: Fazer o que né. Da próxima avisa que não gosta de saltar, assim não te levo.

Bia: Poxa! Ia pedir pra me levar outras vezes rsrs Mas tudo bem! Entendo que isso é novo pra vc, moça bonita.

Alice: Não sou tão coração gelado como vc pensa.

Bia: Oun..que bonitinha! O que importa é que você é quente onde me interessa.

Alice: rsrsrsrs Você é terrível.

Bia: Eu sei, e é por isso que vc gosta.

Alice: Vou cuidar da vida por aqui. Depois nos falamos mais.

Bia: Ok! Sempre que quiser.

Larguei o celular de lado e fui preparar algo para comer, em seguida, arrumar a mala para Maceió. O Vôo é amanhã à 9h e ainda não arrumei nada. Separando as roupas para levar, meus pensamentos tornaram-se acelerados, apesar do coração dilacerado.

Não consigo mensurar o quanto me sinto, sido feita de idiota e usada. Laura brincou com meus sentimentos e eu não percebi, por estar cega de encantos. Foi se achegando de mansinho, como quem não quer nada, me envolvendo de um modo que quando vi, já estava totalmente envolta com os sentimentos aflorados e, sem forças para me desvincilhar de suas investidas.

Após tudo o que aconteceu, ainda deu showzinho de ciúmes. Só rindo mesmo! Tanto auê para no final das contas vê-la nos braços de outra. Nem faço ideia quem seja, e não pretendo saber . Não quero vê-la tão cedo. Se queria sex*, era só falar. Teria sido muito mais fácil e rápido. Agora, armou um circo, pra me envolver e no fim, a palhaça de toda armação, fui eu.

Pior ainda, ela sabia que eu iria na sua sala, falou que poderia entrar sem avisar. Só Deus sabe se aquela despedida que presenciei, foi seguida de uma foda bem dada na sua sala. Eu seria, mais uma, no caso. E, é até uma ofensa colocar Deus no meio dessa situação. Se ela queria despertar o pior em mim, conseguiu. Por uns dias me deixei sensibilizar a ponto de quase acreditar em conto de fadas, e encontro de almas. Que patética. Laura, conseguiu ser pior do que a Bia. Vou manter o contato profissional e mostrar a ela que sou mulher de honrar com meus compromissos. Se já tinha intenção de fazer um bom serviço, agora ela despertou meu lado competitivo. Ela que aguarde, pois irá se surpreender com o resultado. Agora quero sair até em revista, e vou conseguir. Tudo bem que quem vai lucrar com isso é ela, mas meu foco é mostrar que sou muito melhor do que ela imaginou. Voltando de Maceió, meu foco será essas duas empresas. Laura Veigas, ainda terá que me parabenizar pelo feito. Nem nos meus sonhos mais ridículos, sequer imaginei que Laura fosse assim. Que decepção! Esse é o verdadeiro sentimento que tenho, no momento. O mais puro retrato da ilusão. Sua pose de imponente na sociedade e a personalidade dócil, no particular, engana a todos. Será que aquela lindona que estava com ela, também é uma dessas iludidas? Como fui besta de acreditar que eu era a única. O que me passou na cabeça?? Uma mulher como Laura, ter apenas uma pessoa? Envolveu até a Didi no meio disso. De duas alternativas, só uma pode ser verdadeira: Didi não sabe desse outro lado da afiliada ou, sabe e concorda. Que vergonha! Vontade voltar no tempo e ter me poupado. Dona Chica é outra que ainda vou conversar de pertinho, não agora, pois estou muito ressentida, mas preciso a alertar para não se iludir com a patroazinha, pela qual está caída de amores. Meus pensamentos foram interrompidos com uma mensagem da Bia.

Bia: Vem aqui. Me deixou cheia de vontades...

Alice: Vontade de quê?

Bia: De você.

Bia não é o tipo de mulher para se envolver, já percebi isso. Mas ela tem um sexy appeal impressionante. Mesmo já tendo me surpreendido, negativamente com ela, é um tipo de mulher quase que impossível de resistir. Ela não promete nada além de prazer e safadeza. É o perfil ideal para o momento, e quem sabe, por muito tempo. Até que eu consiga esquecer a palhaçada pela qual me deixei levar, é o que vou buscar: safadeza e encontros vazios.

Alice: Estou organizando umas coisas referente meu trabalho. Se der tempo, te aviso.

Me lembrei que Bia mora em frente a Laura, e não quero correr o risco de vê-la, pelo menos, não hoje. Apesar de ser uma ótima ideia, ela me ver com a Bia, só pra sentir um pouquinho do que senti. Tive até que silenciá-la de tantas mensagens que me mandou ao longo do dia. Se ela acha que vai continuar me iludindo, está muito enganada. A última mensagem, a 8 minutos atrás, vi pela barra de bloqueio da tela:

Laura: Por favor, onde você está? Preciso falar com você. Não seja tão rude comigo, vai?! Me dê uma chance de explicar o que aconteceu.

É muita petulância pra uma pessoa só. A vontade é responder xingando, mas não vou me rebaixar a esse nível.

Terminei de arrumar a mala, organizei as coisas e antes de decidir se vou, ou não na casa da Bia, me aventurar nos prazeres baratos, liguei pra Carol que está sumida.

- Oi amor da minha vida - ela atendeu - Resolveu dar o ar da graça?

- Oi né? Sumida - falei brava - Só porque agora tem um boy magia, esqueceu a miga?

- Jamais!!! Mas me diga, como você está? Como foi lá na fazenda com a dona Chica? Se divertiu?

- Nem te conto, o que aconteceu.

- Conta sim, conta logo.

Contei a ela tudo o que rolou, como foi, toda a ilusão que me meti, envolvida em um sentimento que só existe dentro de mim, desde o primeiro beijo até o trágico final, nessa manhã nublada.

- Não acredito que a Laura fez isso! Que ódio! - falou quase aos berros do outro lado - Eu vou lá tirar satisfação com ela.

Gargalhei com sua fala. Carol consegue me fazer rir, até quando não tenho vontade.

- Vou usar o advogado dela para processá-la por apropriação indevida de sentimentos - sugeri.

- Isso! Vamos usar o Léo pra isso - concordou sorrindo.

- E vocês, como estão???

- Ah miga!! - falou com voz apaixonada - Estou nas nuvens. Ele é maravilhoso.

Senti uma pontinha de inveja da minha amiga por isso. Hoje pela manhã estava exatamente assim, me sentindo nas nuvens e achando Laura maravilhosa. Mas não demorei a cair do céu.

- Fomos passear de moto, com o clube, descemos pra praia. O Léo pegou um ap pelo airbnb, de frente pro mar, e foi muito maravilhoso. Acho que nunca dei tanto em um final de semana só - gargalhou - Pelo menos nisso estamos iguais né?!

- Sim, nisso sim - ri com o coração doído pelas lembranças - Mas agora também, voltei a falar com a Bia.

- Não, miga! Não faz isso com você.

- Por que não? Pelo menos ela eu sei que não vale nada - dei de ombros - Pelo menos ciúmes pra Laura dá pra fazer.

- Alice, você não é assim - falou com voz séria - Não caia nessa armadilha.

- Armadilha foi me deixar levar pelos encantos dela, miga. Você tem noção de que ela me levou pra uma ilha deserta? Tivemos praticamente uma lua de mel. Poxa, é muito filha da puta - os olhos sentiram mais uma vez a emoção ressentida - Me envolveu de um jeito, que eu cheguei até acreditar que era de verdade.

- Foda né, mas não vai pra Bia, não. Lembra que temos que descobrir ainda como ela foi parar lá na palestra com o cara que te bateu?

- Sim, mas daí eu mesma descubro - dei de ombros, sentindo as lágrimas rolarem - Vou viajar amanhã cedo. Caso não me encontre por aqui é por isso. Volto quinta.

- Tá bom. Tenha cuidado. Amo você e vai ficar tudo bem, viu?!

- Também te amo. Acho que só você mesmo é minha alma gêmea.

- Somos mesmo - falou sorrindo - Casa comigo?

- Caso! Vamos casar e você fica com o Léo de amante.

- Combinado. Você voltando de Maceió a gente se casa.

- Beijo, maluquinha do meu core. Me deseje sorte pra palestra.

- Você vai arrasar!! Beijo, gostosaaaaaa.

Carol é a parte boa da minha vida. Não importa o quão ruim e acabada eu esteja, falar com ela, sempre me faz bem. Preciso avisar minha mãe que vou viajar mas não quero que ela ouça minha voz de acabada. Mães são meio bruxas, conseguem sentir como estamos, mesmo à distância. Ontem cheguei ao extremo de dar o telefone para a Laura falar com ela, crente de que o que estava construindo era tão real, a ponto de envolver minha família. Hoje, me sinto ainda mais ridícula por isso. Minha mãe não merece ela por perto. No final de semana invento alguma desculpa para sua ausência e pronto. Por hoje, vou mandar só uma mensagem para que não fique preocupada com meu sumiço por aqui.

Alice: Mãe, tudo bem? Estou indo pra Maceió à trabalho. Recebi um convite para palestrar em um evento. Vou amanhã cedo e volto quinta. Não se preocupe com nada, está tudo ótimo e estou realizando um sonho. Peça a Deus por mim. Beijo. Te amo.

Deixei o celular na cama, e fui para o banho. Estava terminando de lavar a cabeça quando ouvi o interfone tocar, insistentemente. Fechei o chuveiro e me enrolei na toalha, apressada em atender a portaria. Saí escorregando, descalça, com o coração acelerado.

- Pois não? - atendi esbaforida.

- Oi dona Alice. A Laura está na portaria e deseja entrar.

- Não está autorizada. Por favor, anote esse nome aí e não permita sua entrada.

- Tudo bem. Posso falar então que você não se encontra?

- Pode falar que fui pro espaço, que virei pó, que fui pra put.. Não, não diga isso. Diga apenas que não estou.

- Tudo bem. Fica tranquila.

- Obrigada.

Não é possível que agora minha vida será assim. Nem banho posso tomar em paz que essa mulherzinha vai ficar me perseguindo. Corri para o quarto, que a janela dá pra ver a rua da portaria e olhei pra baixo, tentando vê-la. Apesar da altura, reconheci a imponência de longe, entrando em um carrão preto. Comemorei por estar indo embora sem conseguir me ver. Pensasse nisso antes me fazer de besta. Demorou para ligar o carro e sair. Fechei a janela e voltei para o banho. O coração apertado, pois no fundo, a vontade genuína era tê-la recebido e acabar o banho com ela. Meu desejo era que estivesse comigo, me proporcionando o prazer da sua companhia. Queria estar conversando bobeiras e fazer uma comida simples para contemplar seus olhos brilharem ao experimentar. Queria tanto, mas a verdade é que, querer não significa poder e ter. Infelizmente, fui vítima de um golpe. Terminei o banho, triste e com vontade me esconder do mundo, mais uma vez. Meus sentimentos estão assim, incertos e variáveis.

Fui pro quarto e vi o celular em cima da cama, lotado de notificações:

14 ligações perdidas de Laura

Mensagens não lidas:

Mãezinha: Que delícia de mensagem filha. Deus te abençoe e guarde na viagem. Espero você e a Laurinha aqui domingo. Avisa que chegou lá. Beijo.

Laura: Só pra te avisar: não vou desistir fácil assim de você.

Estou indo na sua casa.

Cheguei!!

Não vai me receber? Eu sei que está aí.

O porteiro falou que você mandou falar que não estava, rs. Achei fofo.

Aguardo ansiosa o dia que vou ter a chance de falar com você de novo. Não espero que me perdoe, só queria conversar. Sinto sua falta. Fiquei sabendo da sua conquista referente as empresas. Parabéns.

Espero te ver na empresa. Se cuida. Fica bem. Beijos com saudade.

Bia: Vou ter que sair. Nosso encontro fica pra outro dia. Beijo, moça bonita.

Carol: Laura me mandou msg querendo saber onde você tá kkkk

Bateu arrependimento por lá. Respondi que não sabia hehe

Sorri com algumas, senti raiva com outras, e, ainda com o sentimento de querer me esconder do mundo, coloquei o relógio pra despertar às 6h, dei uma olhada na foto que tirei da Laura na ilha e fui dormir, com a lembrança do momento maravilhoso que vivemos, é tudo o que me resta: lembranças.

-- x--

Amanheceu uma chuva torrencial. Da janela do quarto, mal dava pra ver o prédio lateral ao meu. Pela experiência, já sabia que demoraria chegar no aeroporto, e por ser um vôo pago pela organização que me contratara, eu não poderia perder. Coloquei uma roupa simples de aerolook, o básico de sempre: jeans, all star, camiseta e jaqueta. As malas já estavam todas organizadas. Pedi um motorista de aplicativo e nem tomei café. Mais seguro tomar café no aeroporto do que me atrasar. De fato, o trânsito estava insuportável. Enchentes e muito congestionamento. O trajeto que de moto, faço em 40 minutos, levou 2 horas no carro. Cheguei em Guarulhos, faltando apenas uma hora para o vôo. Fiz logo meu checkin e fui pra sala de embarque aguardar com tranquilidade. A chuva estava tão intensa, que parecia baldes de água sendo derrubados do céu. Final de verão. Como já bem disse, melodicamente Tom Jobim: "São as águas de março fechando o verão..". Fui numa rede de cafeteria tomar um expresso, forte e sem açúcar e voltei para as desconfortáveis cadeiras de espera da sala de embarque. Coloquei o airdots e me distraí ouvindo músicas aleatórias. Minha atenção só voltou quando na cadeira da ponta da fileira de cadeiras à minha frente, sentou uma moça lindíssima que me fez contemplar sua beleza, até mesmo involuntariamente. Na verdade, percebi que não tinha quem não a olhasse, com admiração. Negra como um jambo-vermelho maduro, pele brilhante, cabeça raspada nas laterais e um leve moicano, brincos grandes e um colar de muitas tiras, aparentemente de lã, coloridos, vestida em um conjunto de calça e blazer social, verde folha. Uma chiqueza. Sentada com as pernas cruzadas, finérrima. Concentrada, lendo um livro. Que mulher linda! Não diria que é mais linda que Laura, porque ninguém se compara à insuportável maravilhosa que roubou meu coração, porém, essa é tão linda quanto. Acredito que olhei um pouquinho demais, pois ela parou a leitura e dirigiu o olhar para mim e me sorriu, baixando os olhos em seguida, novamente para o livro. Suei até frio com esse olhar. Na verdade, fiquei com vergonha de ter abusado do olhar grudado nela. Disfarcei e troquei de lugar, de costas à ela, só assim iria conseguir não olhar tanto. Por sorte, e para diminuir meu mico, anunciaram embarque imediato no meu vôo. Fui logo para fila e antes de entrar no tubo de embarque, aproveitei que nunca mais a veria mesmo, e dei uma outra olhada naquela mulher lindíssima que, certamente, antes de descer do céu pra terra, errou o caminho e passou várias e várias vezes na fila da beleza. Ela novamente me olhou e dessa vez me sorriu, um sorriso tímido, correspondido pelo meu sorriso, também tímido, porém corajoso.

Os acasos da vida, nos faz corajosos. Quem nunca deu uma paqueradinha em sala de embarque de aeroportos, que atire a primeira pedra. É o lugar mais improvável de você cruzar duas vezes com a mesma pessoa. Ou seja, considerando o tamanho do planeta, e o fluxo de pessoas que diariamente passam pela sala de embarque do maior aeroporto do Brasil e da América do Sul, segundo mais movimentado da América Latina, é praticamente impossível que irá ver mais uma vez qualquer pessoa que você tiver a chance de trocar olhares. No entanto, a única matéria que fiquei em dp na faculdade de Administração e depois na pós em Finanças, foi em estatísticas e probabilidades. Exatamente! Meus cálculos estavam completamente equivocados, pois, após entrar metade dos passageiros do avião, o lugar ao meu lado ainda estava vago. Eu olhava a chuva cair e escorrer pela janelinha estreita do avião, já com o assento na posição de decolagem, cintos afivelados e distraída, quando percebi que ao meu lado sentou-se alguém. Virei lentamente a cabeça para cumprimentar o passageiro que seria companheiro de viagem por 3 horas ininterruptas e, para minha surpresa, era a furadora de filas da beleza. Fiquei tão sem graça, que senti meu rosto corar imediatamente. Ela sorriu mais uma vez, e cumprimentou com um singelo - Oi. Apenas duas letrinhas, em uma mini palavra, suficientes para que fazer secar a garganta e gelar. Respondi extremamente tímida, outra mini palavra - Oi, seguido de um tímido sorriso e imediatamente voltei olhar a chuva na janela.

Pela misericórdia dos céus, que mulher linda - pensava repetidamente, nervosa com meus cálculos errados. Não era possível que, entre as quinhentas pessoas que estavam naquela sala, a única que fiquei olhando, descadaramente, estava agora, ao meu lado. O avião alinhou-se na pista e logo decolou, com muita turbulência devido a forte chuva. Durante as 3h de viagem, me mantive calada e ela também. Só falou com a comissária de bordo que veio oferecer "water or coffe?" e ela, limitou-se a dizer "water" e voltou a atenção para sua leitura. Curiosa que sou, tentei discretamente ler o que ela lia, mas não entendi qual língua era escrita. Entendi que era estrangeira, até mesmo pelo estilo que apresentara.

Após pouco mais que os cento e oitenta minutos de vôo, pousamos no aeroporto de Maceió, com o tempo aberto, e um calor de 37º, na sombra. Ela levantou-se e antes de sair, falou - Tchau - com um sotaque diferente do convencional e sorriu mais uma vez. Respondi "tchau" acenando com a mão e também lhe sorri. Dessa vez, certamente, meus cálculos estariam certos e então, aproveitei mais uma vez da última vez que a veria e a acompanhei com os olhos, até descer da aeronave. Estava com tempo de sobra, então, não me apressei em descer. Deixei que quase todos os passageiros se fossem, e só então, me levantei e também sai. Peguei minha mala na esteira e peguei um táxi na saída, rumo ao hotel.

Instalei-me assim que cheguei, no quarto reservado para mim, muito confortável, com varanda com vista para a piscina do hotel, cama king size, decoração clean, modo praia. O hotel, localizado beira mar, é um resort. Tem tudo para o conforto e disponibilidade para passar pelo menos uma semana de curtição, e o melhor seria se fosse com a Laura. Pena que vim à trabalho, mas tentarei aproveitar o que conseguir e meu coração ferido, permitir. Minha palestra será amanhã, na quarta-feira, no encerramento. O evento vai até quinta, no entanto, a quinta-feira está reservado para oficinas. E hoje, a abertura será às 20 horas, com um coquetel na beira da piscina, pós palestra inicial com o tema de "Jovens lideranças - alianças internacionais nos intercâmbios culturais". Aproveitei para conhecer a cidade e curti a praia um pouco, até o entardecer. Voltei para o quarto me arrumar para o evento que começaria em breve. Assim que me arrumei, vestida adequadamente para o evento, em um conjunto de calça e colete rosa, com camisa branca e gravata florida e oxford marrom claro, o conjunto todo da mesma alfaiataria feminina da capital, que tenho uma vasta coleção. Acredito que para os homens é muito fácil se arrumar. Basta colocarem um conjunto de terno, muito bem cortado, e estão prontos. Por que as mulheres precisam combinar o vestido com a ocasião, e sandália e lingerie? Praticidade é meu nome, e requinte é o sobrenome. Desde que encontrei essa alfaiataria feminina, me realizei. Nem ligo de a cada conjunto, pagar o equivalente ao preço da minha moto, estar bem vestida é o que vale.

Cheguei no salão de eventos e me apresentei. Fui muito bem recebida por uma hostes, loira, vestida de vestido tubinho preto, longuete, cavado, com uma plaquinha de metal identificando seu nome: Yasmin. Deu-me boas vindas, e entregou o kit personalizado do evento, com caderneta, caneta, crachá e uma bolsinha necessaire com o nome do hotel. Sentei-me e aguardei o início. Essa espera me sufocou. O dia inteiro me ocupei o suficiente para não permitir que meus pensamentos me dominassem, no entanto, agora, sem ter o que fazer, a não ser esperar o evento começar, a saudade de Laura me fez companhia. O ambiente me fez lembrar do evento proporcionado por ela, na qual eu palestrei, e quase nos beijamos. Sorri com a lembrança que me causou calores. O calor, me lembrou do nosso beijo no descampado, com um sol escaldante e nós rolando pela grama, sorrindo e beijando e beijando e sorrindo. Ah Laura! Por que fez isso comigo? Por quê? Me perguntava, sem respostas. Quem é essa mulher que te tirou de mim? Se não é o que eu vi e ela tem o que se explicar, o que foi que eu vi então? Minha alma chora sua ausência e meu corpo estranha não tê-la por perto. Que saudade do seu cheiro impregnado na minha pele, do jeito forte que me pegava e me fazia pequena entre seus braços. Que vontade ter mais uma vez, só uma vez que fosse, seus beijos na minha boca e seu sabor na minha língua. Reconheço que sou orgulhosa, mas desejo-a comigo mais do que tudo. Entre meus desvaneios, o evento começou, com show de luzes e música alta. O cerimonialista fez abertura, dando boas vindas a todos e explicou a cronologia dos acontecimentos. Após todos os ajustes necessários anunciou:

- E para a palestra de abertura "Jovens lideranças - alianças internacionais nos intercâmbios culturais" , recebam com muita alegria, nossa convidada internacional, diretamente de Luanda, na Angola, Zeuma Viana, nossa querida Zee.

Outro show de luzes, muitos aplausos e sobe ao palco, ninguém mais que a lindíssima moça do avião. Arregalei os olhos e, mais uma vez, corei de vergonha.

Fim do capítulo