Fique por Leticia Petra
Capitulo 2 - Agridoce.
Quarta-feira, 2 de março de 2022.
— Mal começamos o ano e já vamos ficar de molho. – Caio brincava com os pés na água.
Estávamos na piscina da minha casa.
— E você tá reclamando? É um nerd mesmo, Caio. – Tirei a blusa branca de botões que vestia, ficando apenas de short e a parte de cima do biquini. – Tá preparado pra conhecer o restante da minha família?
Ele conhecia apenas a Marina.
— Acho que não tinha uma data pior, Olivia. – Ele riu. – Mas já me preparei mentalmente.
— Bem, talvez assim você conhece a chata da minha prima e o gato do marido dela. – Beberiquei o suco. – Não vai ser tão ruim, por ele é claro. João é um balsamo para os olhos.
— Qual o seu problema com a sua prima? – Lembrei de alguns anos atrás e quis bater em mim mesma.
— A gente transou depois de um dia de bebedeira. – Caio abriu a boca.
— Olivia, não sabia que era do vale. Como assim eu nunca soube disso? – Ergui as duas sobrancelhas.
— É porque não sou, Caio. Ao menos acho que não, afinal nunca nem parei pra pensar sobre minha sexualidade, mas o que aconteceu foi sob efeito do álcool, disso eu tenho certeza. – Deitei na cadeira. – Por qual outro motivo aconteceria? Zoe e eu nunca nos suportamos, éramos o verdadeiro significado de cão e gato. Era aniversário dela e em algum momento, eu não me recordo bem, estávamos em seu quarto e... bem, algumas coisas não lembro com clareza.
Foi uma puta idiotice.
— Só sei que aconteceu e depois daquele dia, as coisas entre nós apenas pioraram. Ela ficou ainda mais esnobe do que já era.
Meu amigo me olhava espantado.
— Foi só uma babaquice de duas adolescentes babacas. – Finalizei.
— E foi bom? – A cara de safado dele me fez rolar os olhos. – Pelo jeito foi, lembra até da data. Bem-vinda ao vale, você é bi.
— Eu realmente não recordo de muita coisa, apenas borrões. E bi? – Será? Fiquei de pé. – Vamos ao shopping e depois ao estúdio? Quero te mostrar uma coisa.
— Sim! Uma bi, mas ainda não sei se é de bien puta ou bissexual.
Gargalhei alto com a besteira de Caio.
— Seu idiota, vamos logo.
— Vamos sim, eu precisava mesmo comprar um presente pro Rodrigo. – Saímos da área da piscina, indo para o interior de casa.
— Poderia chamar ele pra vir a noite. – Meu quarto ficava no segundo andar.
Nem os meus pais e nem a minha irmã estavam, ainda bem.
— Ele trabalha até duas da manhã, tadinho. Quer comprar um carro... – Caio sempre falava com muito orgulho do namorado.
— Então quem sabe uma próxima. – Passei a trocar de roupa.
Passamos no shopping e depois fomos até o estúdio que frequentava a bastante tempo e o Caio ficou impressionado com toda a estrutura. Havia uma parte dedicada somente para a academia e outra para vários estilos de danças, mas naquele horário não havia ninguém e era justamente por esse motivo que fui àquela hora. E eu amava dançar, acredito que era muito boa naquilo, mas também não queria seguir carreira ou algo do tipo. A real era que eu não fazia ideia do que queria.
— Vamos dançar? Eu sei que você dança muito bem. – Caio olhou para espelho gigante a nossa frente.
— Então finalmente vou poder te ver dançar. – Ele sorriu. – Modéstia a parte, sou um pé de valsa. Me conceda essa dança, senhorita?
Eu amava esse idiota.
Ligamos o pequeno aparelho de som e passamos a nos mover, conforme a música “River” tocava. Imitamos uma coreografia de um grupo de dança americano, em especial de uma dançarina chamada Stevie Doré. O meu amigo de fato dançava extremamente bem. Dançamos até a exaustão, nos jogando no chão depois. Ele era a minha melhor companhia e eu o adorava.
— Depois da faculdade, vamos morar juntos? – Nos encaramos.
— Tá falando sério? – Sorri.
— Claro que estou. Podemos alugar um apartamento, mobiliar do jeito que a gente quiser e ter uma vida mais livre. — Sonhei e fui longe.
— As coisas com o meu pai, você sabe, são um pouco difíceis, então seria ótimo morar com a minha melhor amiga. – O encarei.
— Posso conhecer a sua casa? — Ele ficou surpreso.
— Claro, Olivia. É claro que pode.
— Então vamos marcar um dia de comidas de procedência duvidosa e series?
— Quando você quiser, aliás, tenho várias sugestões para maratonar.
Caio sorriu.
Saímos do estúdio e quando chegamos a minha casa, meus pais e minha irmã estavam presentes. Apresentei o meu amigo a eles e a expressão do meu pai já era esperada. Minha mãe foi gentil e o deixou à vontade. Subimos, tomamos banho e nos vestimos para a festa da insuportável da Zoe.
— Nossa, eu fico besta com o exagero dessas mansões. – Caio olhava para a mansão do meu tio.
Decidimos vir depois da minha família.
— Seus pais vão morrer quando ver essa tatuagem na sua costa, Olivia. – Sorri.
Vesti um vestido com fenda atrás justamente contando com isso. Como estaríamos em meio a tanta gente, não teria represálias diante dos amigos da família. Eu estava brincando com fogo, mas havia ligado o foda-se.
— Vamos? – Ele me deu a mão e eu a segurei.
— Você tá muito hetero, Caio. – Rimos.
— Serei seu namorado gostoso essa noite, minha dama. – Ele fez graça.
Adentramos a mansão, indo para o quintal onde ocorria a celebração. Alguns olhares caíram sobre nós e eu adorei. Caprichei na minha aparência, pois queria chamar a atenção.
Eu sou uma mulher bonita, disso eu sabia e usava ao meu favor.
Olhei em volta, procurando meus pais e rostos conhecidos. Não vi minha prima, mas o marido dela estava a poucos metros e me olhou da cabeça aos pés. Caio, que não era bobo, colocou sua mão em minha cintura.
— Tão másculo. – Sussurrei.
— Sou bom nisso. – Se gabou. — A globo está me perdendo.
Ri baixinho.
— Olivia, nossa, como você cresceu. – João se aproximou, me “comendo” com os olhos. – Tá ainda mais linda do que me lembro.
Sorri.
— Você tá muito gato, João. Esse é meu amigo, Caio... – Ele olhou para o meu amigo.
— Prazer, cara... – João estendeu a mão.
— Prazer, irmão. – Caio foi tão firme, que me fez querer rir.
“Não posso perder a pose.”
— Zoe está lá em cima, pois precisava trocar a roupa. Acho que ela vai adorar saber que está aqui. – Ergui a sobrancelha.
— Você sabe que a Zoe e eu não nos suportamos, João. – Ele riu, mostrando os dentes brancos e perfeitos.
“Isso não é hora pra tá desejando homem alheio, Olivia...”
Cantarolei em minha mente.
— Bem, bem-vindo de volta, João. Vamos, Caio? – Deixei João com cara de bobo. Ele é bonito e tudo, mas não estava nenhum pouco afim de ter problemas com a Zoe.
Nos afastamos.
— Olivia, preciso ir ao banheiro. – Caio fez uma careta engraçada.
— Calma, vou com...
— Precisamos conversar, Olivia. – Meu pai me segurou discretamente pelo braço.
— Vou levar o Caio no banheiro, papai. – Desfiz o contato.
— Venha comigo e não faça escândalos. Agora, Olivia. – Aspirei o ar com força.
— Caio, espera um pouco? – Meu amigo apenas concordou com um acenar de cabeça, visivelmente desconfortável com a situação.
Segui meu pai mansão a dentro, subindo as escadas e quando chegamos no corredor dos quartos, ele me empurrou contra uma das paredes. Fiquei assustada, mas não demonstrei, eu não daria esse gostinho a ele.
— Que porcaria é essa na sua costa, sua insolente? – Não abaixei minha cabeça.
— É cego? É uma tatuagem, oras. – Fiz um gesto displicente.
Ele me segurou pelos ombros, com muita força.
— Você vai tirar essa porr* da sua pele, Olivia. Não vou permitir que se desvie pra essas coisas de bandido. Coisa de gente sem caráter. – Não pude segurar o riso, despertando a irá do meu pai. – E quem disse que você poderia trazer aquele moleque?
— O senhor não tem uma tatuagem, qual sua desculpa pra ser esse filho da puta?
E pela segunda vez, ele me bateu.
— Eu odeio você... – Coloquei minha mão sobre o rosto.
— Tio Fábio, tudo bem por aqui? – Não desviei meu olhar do dele, que ficou assustado por outra pessoa ter visto aquilo.
— Sim, minha sobrinha. Só estávamos conversando, não é filha? – Não respondi nada. – Não deixe seu amigo esperando lá embaixo.
Ele se foi e logo sumiu no fim do corredor que dava as escadas.
— Continua a mesma fedelha de sempre, não é? – Fechei meus olhos, controlando a minha raiva. O meu rosto doía. – Sempre levando dura. Quando vai amadurecer?
— Não lembro de ter te perguntando alguma coisa, priminha. – Então olhei para ela.
Zoe estava diferente da última vez que havia a visto.
— Só vai ser levada a sério quando se levar a sério, pirralha. – Seu olhar me analisou por alguns segundos. – Quem diria, agora você tem seios.
— Vai se foder, Alexandra. – A babaca gargalhou.
Eu não iria deixar ela sair por cima, então reuni toda a calma que não tinha e sai da incomoda presença, sem pressa.
— Bela tatuagem!
Apenas rolei os olhos, chegando ao fim do corredor e descendo as escadas.
“Você vai me pagar por isso, papai.”
Levei o Caio ao banheiro e depois de alguns goles de vinho, fui para a pequena pista de dança. Uma música lenta, sensual tocava e eu não podia perder aquela. Passei a me mover lentamente. Segurei meu amigo pelo pescoço e passamos a curtir a música.
— Amiga, quer dar o que falar? Tenho certeza que não serei mais convidado pra essas festas da sua família, mas odiei a forma que seu pai falou. – Franzi o cenho.
Não contei do tapa.
— O que exatamente você tem em mente, Caio? – Ele sorriu.
— Pode me beijar. – Ergui as sobrancelhas.
— Está brincando comigo? – Ele sorriu ainda mais largo.
— Mas capricha, viu. Irei fazer esse sacrifício. – Olhei rapidamente ao redor e algumas pessoas nos olhavam.
Em uma mesinha, meus pais, meu tio e babaca da Zoe, conversavam.
— Você é ainda mais louco que eu. – Sorri.
— Somos bests, lembra?
Segurei a nuca de Caio e ri alto, o beijando em seguida. E não foi um beijo qualquer, foi um digno de um prêmio. Quando nos afastamos, olhei ao redor e a atenção da minha família estava sob nós.
Segurei a mão de Caio e saímos da festa, como se nada houvesse acontecido.
— Deus, a cara de todo mundo foi muito engraçada, Olivia. – Gargalhávamos, sentados no meio fio da rua.
— Acho que agora aceito ir pra sua casa. – Meus olhos lacrimejavam de tanto rir.
— Vamos, pegamos um carro na entrada do condomínio. – Chamamos um carro pelo aplicativo e poucos minutos depois, estávamos indo para a casa do Caio.
O bairro era um pouco perigoso e bastante humilde. Chegamos à uma casa de madeira, de cor azul claro. Ao entrarmos, encontramos um homem na pequena sala. Ele nos olhou com curiosidade.
— Pai, essa é a minha amiga, Olivia. – Ele pareceu feliz.
Na certa, achava que eu era namorada de Caio.
— É um prazer, menina. Fica à vontade. – Sorri, estranhando a gentileza. – Sua mãe já tá dormindo.
— A gente só vai comer algo e dormir, pai. – O homem de pele clara e barba grande, entrou em uma das portas. – Bem-vinda a minha humilde residência.
Olhei novamente ao redor, sorrindo.
— O que vamos comer? – Caio, que até aquele momento parecia um pouco envergonhado, riu.
— Vou fazer achocolatado e dois sanduiches de queijo com presunto. Vamos?
Sentei no pequeno sofá e engatamos uma conversa, enquanto ele fazia nosso lanche. O meu celular não parava de tocar e então decidi desligar. Outro dia ouviria os inúmeros sermões, mas agora não.
Agora só que experimentar um momento de paz.
— Vamos assistir a uma serie? – Sugeri assim que Caio sentou ao meu lado.
— Que tal maratonar Dark?
— Ótima escolha...
Ficamos até tarde e quando nos demos conta, já se passava das três da manhã. Decidimos ir dormir, pois assim que o dia amanhecesse, iria para a casa de Luciano. Por causa do carnaval, a faculdade estaria fechada.
3 de março.
Não pude conhecer a mãe de Caio, pois quando sai de sua casa, ela ainda estava dormindo e eu não queria incomodar. Passei em uma lanchonete, comprei algumas coisas e levei para a casa de Luciano.
Ele já me aguardava.
— Seu pai me ligou. – Abri a boca levemente. – Me ofereceu dinheiro pra te deixar em paz.
— E o que você fez? – Ele me servia café. – E como ele conseguiu seu número?
— Também não sei. Aceitei o dinheiro e prometi que iria te deixar em paz. – Luciano riu. – Lembra daquele canil aqui perto? Dei tudo pra eles.
Não pude deixar de sorrir.
— Você me surpreende a cada dia mais, Luciano. – Aquele homem era sem dúvida alguém que eu não sabia nada.
— Faz alguns meses que a gente fica, Olivia, e aprendi a gostar de você. Deixou de ser só sex*, mas é claro que ainda quero muito sex* com você, mas não somente isso. Não, eu não estou te pedindo em namoro e nem nada. – Luciano beijou meus lábios. – Só saiba que pode contar comigo.
Não sabia o que dizer ou pensar, as palavras dele me pegaram totalmente desprevenida. O homem à minha frente tinha muito mais conteúdo do que imaginei. Seria eu tão superficial a ponto de nunca ter notado absolutamente nada?
“Como sou idiota.”
A sala de reuniões estava cheia de acionistas e membros da família. Era mais uma boas-vindas e sinceramente, já estava cansada daquilo, mas tive de manter a pose. Trabalharia na rede de supermercados como uma ponte entre a presidência e todo o resto. Saberia tudo o que era importante, para que no futuro chegasse à presidência com plenos conhecimentos de todos os setores.
Teria que provar o meu valor, afinal ser uma mulher nesse meio não era uma vantagem.
— Soube que não encontraram a Olivia. – João cochichou, enquanto meu pai falava.
— E o que eu tenho a ver com isso? – A pirralha estava muito mais bonita, mas era só isso.
“Continua a mesma irritante de sempre.”
— Bem-vindos, minha filha amada e meu genro. – Houve uma salva de palmas.
João ficou de pé, arrumou o terno.
— Quero dizer que é uma honra tomar posse da vice presidência. Será um privilegio trabalhar com cada um de vocês. – João puxou o saco. — Me preparei muito e garanto, serei merecedor de toda a confiança colocada sobre mim.
Imitei João, ficando de pé.
— Obrigada pela oportunidade. Darei o meu melhor, podem ter certeza disso. – Fui breve.
Houve uma breve salva de palmas.
Deixamos a sala de reuniões e eu fui apresentada a minha sala pelo meu pai. O lugar foi modificado especialmente ao meu gosto. Olhei cada pequeno detalhe e aprovei as escolhas.
— Você vai precisar de uma assistente. – Meu pai sentou na poltrona. – Fábio me pediu que você contratasse a Olivia.
Ergui a sobrancelha.
— Papai, você já notou que o Fábio não suporta a Olivia? – Sentei em minha cadeira.
— Já, Alexandra e não entendo, se ele não queria adotar a menina, por que o fez? Acredita que eles ainda não tiveram coragem de contar a ela sobre a adoção? Sua tia vem adiando isso. – Pensei por um momento.
Certamente seria um choque para a pirralha.
— Ontem o vi batendo nela. – Meu pai ficou surpreso. – Bom, isso não é da minha conta. O que acha sobre contratar ela? Não quero ninguém incompetente trabalhando comigo.
— Apesar do trabalho que dá, Betina me garantiu que as notas dela na faculdade são excelentes. Logo estará formada. – Pensei por alguns segundos.
— Ok, papai... você pode dizer ao Fábio que a filha dele pode ser minha assistente. – Abri o notebook. – Vou dar uma olhada em alguns dados da empresa e me antenar no que se passa.
— Tudo bem, minha filha, vou te deixar trabalhar. – Ele foi até a porta. – Alexandra? Fico feliz que esteja de volta.
Aquele momento era raro e desconcertante.
— Obrigada, pai. – Foi somente o que pude dizer.
O vi fechar a porta e me joguei para trás, aspirando o ar com força. Éramos tão parecidos, que chegava a ser assustador. A minha exceção sempre foi a minha mãe, ela era a pessoa que mantinha a nossa família unida.
— Por que tantos suspiros? – João entrou em minha sala.
— Não é porque você é o vice presidente, que pode entrar da forma que quiser. – Ele gargalhou.
João nunca levava a sério as coisas que eu falava, não importava o quão fortes eram e isso me irritava.
— Não fica com inveja, docinho. Vim te atualizar das fofocas. – Ele se jogou a poltrona. – Pelo que parece, acharam a Olivia.
— Por que é tão obcecado por aquela garota? - Rolei os olhos.
— Ela tá maravilhosa, não viu? Para, Alexandra... você viu como a Olivia cresceu. Aquela rebeldia dela me deixa louco. – Lembrei-me da noite anterior e do beijo quase pornográfico entre ela e aquele rapaz. – Você fica com mulher, tenho certeza que não resistiria a ela.
João não sabia da minha pequena noite de bebedeira, na qual resultou em Olivia e eu no meu quarto.
— Olivia é uma mulher lindíssima, mas uma cabeça oca. – Já estava cansada daquela conversa. – Volta pra sua sala, eu quero trabalhar.
— Você será uma grande presidente, Zoe. – Ergui a sobrancelha.
Apenas rolei os olhos e voltei a estudar os gráficos da empresa.
7 de março.
Alguns dias se passaram e com eles o carnaval. Me dediquei a estudar tudo o que dizia respeito ao meu cargo e além. Fábio havia me informado que Olivia estaria na segunda-feira para uma entrevista e como fora dito, quando cheguei a minha sala, pude vê-la na recepção.
Apenas trocamos olhares.
— Valentina, em dez minutos você pode autorizar a entrada da candidata. – A secretaria me olhou como se não tivesse entendido.
— Sim, senhorita Cavalcante. – Abri a minha sala, fechando em seguida.
Deixei meu blazer no cabide no canto e como pedi, meu café com leite já estava na minha mesa e quente do jeito que mandei. Sentei, abrindo o notebook e passei responder alguns e-mails. Os 10 minutos passaram e a porta foi aberta.
Olivia me olhou com desdém, enquanto eu apenas me mantive séria.
— Sente, por favor. – Ela estava até parecendo uma mulher de negócios com aquele terninho feminino.
Sim, não tinha como negar, apesar de ser irritante, Olivia é uma mulher linda.
— Vai ficar me encarando até quando? – Ela já estava sentada.
— Trouxe o currículo que pedi? – Olivia abriu sua pasta e me entregou.
O olhei rapidamente e era um bom currículo, para quem nunca havia trabalhado.
— Qual chantagem seu pai usou pra te convencer? – Não podia perder a chance de provoca-la. – Cortar sua mesada?
— Não que seja da sua conta, não é mesmo? Olha, vamos apressar isso. Eu quero ir embora, ainda tenho um compromisso. – Não pude deixar de rir.
— Então não serve pra trabalhar, já que nem tempo pra entrevista você tem. – Ela rolou os olhos.
— Com licença, senhorita Cavalcante? O senhor Fábio Cavalcante pediu para falar com a senhorita. – Olivia pareceu ficar inquieta.
— Só um momento, Valentina. Obrigada... – A secretaria fechou a porta. – Vamos falar sério, Olivia.
Ela me encarou.
— O Fábio veio te vigiar, pelo que parece. Quer que ele entre? – A garota não abaixava a cabeça, sempre me olhando de igual para igual.
— Só vamos acabar com isso... por favor.
O que se passava?
— Você pode começar amanhã, Olivia. Depois da faculdade, até as seis e meia. – Ela me olhou com surpresa. – Vamos deixar seu pai entrar e dar a boa notícia.
Fui até a porta e deixei o Fábio passar.
— Bom dia, Zoe... – Ele encarou a filha.
— Sua filha tem um ótimo currículo, Fábio, e irá ser a minha assistente. – Ele sorriu.
— Tenho certeza que ela irá aprender muito com você, Zoe. Vim somente verificar se a minha menina havia vindo no horário. – Ele foi até ela, beijando sua cabeça. – Vou contar as novidades a sua mãe.
Olivia não respondeu, apenas ficou de pé. Fábio deixou a minha sala, me agradecendo.
— Zoe, eu queria te pedir algo. – Ergui as duas sobrancelhas.
Sentei na beirada da minha mesa, cruzando as pernas.
— O que seria? – Olivia tirou de dentro da sua pasta um papel.
— Esse é o currículo de um amigo. Ele é muito inteligente e dedicado... – Peguei o papel, olhando rapidamente. – Nunca te pedi nada e prometo que não voltarei a fazê-lo. Já estou dispensada?
— Claro, pode ir. – Olivia deixou a minha sala.
Olhei novamente para o currículo e vi ali um grande talento.
— Caio Moraes Pinho. Seria o rapaz que estava aos beijos com a pirralha? Valentina? – Chamei a secretaria pelo telefone.
— Sim, senhorita?
— Chame o vice presidente em minha sala, por favor.
— Pois não, senhorita. – Desliguei a chamada.
Depois de alguns minutos, João entrou e eu entreguei o currículo a ele. Como um bom homem de negócios, pode enxergar o que também vi.
— Você tá precisando de um assistente e acho que ele é o candidato perfeito. – João me encarou.
— Não é o cara que estava aos beijos com a Olivia? – Apenas acenei em concordância. – Vou chama-lo para uma entrevista essa tarde. Quem te pediu isso? Ela?
— Sim, ela esteve aqui e indicou. Acredito que esse rapaz irá somar bastante. – João ergueu as sobrancelhas.
— Se eu não te conhecesse, acharia que tá sendo legal. – Aspirei o ar com força.
— Ainda bem que você me conhece. – Fiquei de pé. – Vamos dar uma volta pela empresa? Quero passar em alguns setores.
— Por que? – João tirou o blazer.
— Encontrei uma pequena divergência e quero averiguar pessoalmente. – Ele ficou preocupado.
— Pode me contar? – Fui até a minha mesa, pegando alguns documentos.
— Aqui está todas as informações. Quando chegarmos em casa, dê uma olha. – João pegou os documentos da minha mão. – Vamos tomar uma atitude depois de pensarmos com clareza.
— Eu vou com você...
Passamos parte da manhã conhecendo cada setor. A rede de supermercados contava com mais de 100 lojas espalhadas pelo Pará, Maranhão e Amapá. Meu avô fundou a primeira loja há 40 anos e desde então, jamais saímos do mercado.
Somos a número 2 do país.
— Por que não a firma de advogados? Ou a emissora? – Estava na sala de estar com o meu pai.
João havia saído, certamente foi para algum barzinho.
— Nunca me vi como uma advogada ou qualquer coisa do ramo, papai. – Beberiquei o vinho. — Quem sabe a emissora futuramente.
— Em breve, você assumirá o meu lugar na presidência. Sua mãe estaria muito orgulhosa, ela sempre dizia que você seria uma empresária ainda melhor que ela. – Ele estava muito diferente, mais acessível.
Algo havia acontecido? O que mudou nesses 4 anos?
— Eu vou deitar, papai... – Deixei a taça sobre a mesa de centro. – Pega leve no vinho, tá te deixando um pouco emotivo.
Ele sorriu.
— Você e eu somos mesmo parecidos. – Franzi o cenho.
— Frios e focados? – Eu não queria ter aquela conversa.
— Bons atores...
Meu pai me encarou por vários segundos e novamente sorriu. Não sei se era apenas uma sensação, mas parecia que ele queria me contar algo. Decidi não pensar muito sobre e subi, pois queria descansar.
O dia seguinte seria muito longo.
8 de março.
Cheguei à empresa pouco depois das 8 da manhã e trabalhei em cima da descoberta que fiz. O meu pai em breve saberia, porém decidi reunir provas e apresenta-las no tempo certo. Seria um prazer desmascara o verme.
Ouvi batidas na porta.
— Pode entrar.
Olhei rapidamente as horas e era 12:32hrs.
— Boa tarde, Zoe. – Olivia entrou, novamente vestida como uma mulher séria.
Saia preta, blusa de botões preta, os cabelos negros amarrados em um rabo de cavalo e saltos.
— Separei algumas tarefas pra você ir pegando o jeito. – Fiquei de pé, indo até a estante de documentos.
— Boa tarde, Olivia. Como vai? Seja bem-vinda... – Ela deixou sua bolsa no cabide e sentou.
Apenas ignorei seus dizeres.
— Quero que organize em ordem alfabética e cuide de toda a minha agenda. Reuniões, jantares e afins– Lhe entreguei um tablet. – Tem alguma dúvida?
— Jantares? – Voltei a minha poltrona.
— Sim, há muitos interessados nas ações da nossa empresa. Futuramente, serão liberados mais dez por cento e temos inúmeros candidatos. Inclusive, você participará de todas as reuniões. – Olivia veio até mim. – Leve a sério.
— Vai ser uma longa experiencia. – Ela ligou o aparelho. – Vou precisar dos seus contatos.
— Já está tudo aí... agora, você já pode iniciar. Sairei para almoçar e volto em duas horas. – Eu podia ver em sua cara a insatisfação e isso me divertia.
Sim senhora. – Coloquei meu blazer.
— Não faça nenhuma besteira...
A cutuquei antes de sair.
Quando cheguei ao estacionamento, notei que havia duas pessoas discutindo. O rapaz segurava o braço de uma garota, que o empurrou. Ele levantou, indo para cima dela com muita raiva.
— Acho bom que não faça isso. – Ele parou no mesmo instante.
Estava vestido com roupas sociais.
— E você pensa que é quem? – Me aproximei.
— Você trabalha aqui, rapaz? – A moça também me olhava.
Ela vestia roupas grandes, muito maiores que ela, me deixando claro que não era namorada dele.
— Trabalho, mas o que te interessa? – Tirei os óculos, erguendo minha sobrancelha. – Senhorita Cavalcante...
— Qual é o seu nome? – Rapidamente, ele perdeu a pose de valentão.
— Wilame... me chamo Wilame.
— Passe no RH, Wilame... está demitido. – Eu sabia que meu pai jamais seria contra a minha decisão.
— Mas senhora, eu só...
— Não me faça repetir, rapaz. Você ia agredir essa moça e esse tipo de conduta jamais será aceita na nossa empresa. – Ele olhou para a moça e novamente para mim.
O carinha saiu de nosso campo de visão.
— Obrigada, senhorita. – A bela mulher com fisionomia familiar, sorriu.
Apenas acenei em concordância, indo até o meu carro e dando partida. Meu telefone tocou e o nome de João apareceu na tela.
— Pode fala...
— Doce como sempre, meu Deus. – Rolei os olhos.
— Vai direto ao ponto. – Minha paciência era zero.
— Contratei o rapaz... ele realmente é bom.
— Eu disse que era, você fez um grande negócio. – Ouvi a risada dele.
— Tua humildade me choca. Bem, era só o que tinha a dizer.
— Te vejo mais tarde...
Finalizei a chamada.
Fim do capítulo
Serão dois capitulos por semana, nas quintas. :)
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Lea
Em: 24/03/2022
E o ódio da Olívia pelo pai só cresce. Agora estou curiosa para saber em quais circunstâncias Olívia foi adotada!!
Toda a família sabe dessa adoção menos a Olívia,isso vai gerar uma revolta maior na garota!
O que a Zoe tem de arrogante tem de competência. Ela descobriu algum desvio na empresa em algumas horas de trabalho. Quem será o " verme"?
Esse ódio que essas duas tem uma pela outra,será que reverterá em amizade?
No meio disso tudo gostei da indicação do Caio para trabalhar na empresa, Olívia gosta do amigo de verdade! Agora é só ele mostrar o seu talento!
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