Fique por Leticia Petra
Capitulo 1 - Família, doce família.
Em Belém.
Por que os pais sempre projetam sobre seus filhos os próprios sonhos? É difícil de entender que também temos os nossos, que não é justo essa projeção? Não que eu soubesse o que quero, infelizmente ando mais perdida que o Nemo, mas ainda assim, ainda assim queria ser respeitada. Nem todos nasciam com paixões ou destinados a algo.
Se é que isso de destino existe.
Por um momento as palavras da minha mãe não chegaram ao meu cérebro. Podia ver sua boca se movimentando, até que finalmente pude voltar ao momento atual.
— Olivia, você precisa entender o seu pai, ele quer que você seja uma mulher bem sucedida. – De novo e de novo. Quantas vezes já foram? A quinta vez em uma semana? – Que custa demonstrar algum interesse? A empresa também é sua.
— Mãe, estou tão cansada do papai sempre me tratar como se eu fosse alguma marionete sem vontade própria. Eu já disse que não tenho o menor interesse nos negócios familiares. Fábio nem ao menos me quer naquela empresa. Ele quer apenas competir com a filha do tio Bernardo. – Levei a mão a nuca, botando uma breve pressão naquela parte.
Aquela conversa estava me deixando ainda mais puta.
— O chame de pai, minha filha. – Aspirei o ar com força, ficando de pé.
De tudo o que eu disse, aquela foi a única parte que ela ouviu.
— Vou pro ensaio dos meus amigos e não volto hoje. – “Amigos”. Essa parte me fez ter vontade de rir.
Ela me olhou daquela forma que sempre me fazia ceder, mas daquela vez não.
— Eu te dou uma carona até lá. Vou ter que voltar para a empresa. – Apenas acenei em concordância.
Saímos da mansão com destino ao centro de Belém, onde minha mãe me deixou em uma esquina. Na verdade, eu menti para ela e não iria ao ensaio da “banda” de alguns conhecidos da faculdade. Chamei um carro por aplicativo e fui me encontrar com o cara que estava saindo há algum tempo. Sei que deveria deixar de bancar a adolescente que namora as escondidas, afinal tenho 22 anos, mas infelizmente, minha família tinha sérios problemas com pessoas de fora da classe social deles. Um clichê que o passar dos anos ainda não foi capaz de mudar.
— Então você veio mesmo. – Luciano me deu passagem.
— Jamais dispensaria uma ótima tarde de sex*. – Tirei a jaqueta jeans que usava e joguei sobre o sofá surrado.
— Quer beber algo primeiro? – Ele estava apenas de cueca box, deixando em evidencia um enorme volume.
— Aquela coisa que você chama de vodca. – Ele gargalhou.
— Pelo que parece, o seu dia não tá nada bom. – Luciano me entregou um copo transparente com o liquido puro.
Bebi em um único gole.
— A burguesinha tá com a vida difícil. – Desdenhou, se ajoelhando a minha frente e tirando a minha saia. – Deixa eu te deixar relaxadinha, minha deusa.
Ele me puxou para a beirada do sofá, tirando a minha calcinha e depois o top tomara que caia que eu usava. Luciano colocou uma de minhas pernas sobre seu ombro e passou a língua sobre toda a minha intimidade.
Um gemido baixo escapou.
— Eu adoro ch*par você, minha deusa...
Fechei os meus olhos, sentindo-o brincar com meu sex* e me deixando cada vez mais excitada. Aquele era o único momento em que conseguia esquecer dos meus pais, das inúmeras e chatas desvantagens de ser uma pessoa rodeada pela a “alta sociedade”.
— Fica de quatro pra mim. – Fiz o que ele me pediu. – Agora dá aquele sorriso que eu adoro.
Novamente o obedeci.
— Que tesão, Olivia. – Mordi meu lábio quando senti o membro duro e grosso invadir meu sex*.
Nesse momento, me desconectei de tudo.
No dia seguinte.
— Soube que iremos ter uma palestra do seu tio, Olivia. – Caio brincava com uma caneta. – Perdi a do ano passado, estava muito cara.
Estávamos no intervalo das aulas.
— Sim, uma puta chatice e que ainda por cima é cobrado. – Ele riu. – Meu tio é legal, mas ainda assim vai ser difícil passar uma hora ouvindo aquele blá, blá, blá.
— Deve ser difícil ser tão cobrada como você é. Seu pai é um tremendo idiota. - Levei o copo de suco a boca. – Ainda bem que você vai se formar em breve e vai poder meter o pé na jaca.
— Quem me dera que isso amenizasse depois da formatura. Caio, como é ser alguém que pode decidir o que quer pra vida? – Ele me olhou por alguns segundos e depois para o seu caderno.
— Eu não tenho muitas escolhas, na verdade. Ser pobre limita as minhas alternativas. – Sua risada me fez sorrir.
— Você é tão feliz sempre, acho que é uma das coisas que adoro em você. – Ele me abraçou.
— E eu adoro como você é tão fofa comigo, porque sei que sou um privilegiado. – Meu único e verdadeiro amigo.
— Olivia? Você não foi nos ver no ensaio de ontem. – Amanda olhou para Caio com desdém.
Ele nem ao menos se importava.
— Tive um outro compromisso, Amanda. – Fiquei de pé. – Vamos pra aula, Caio? Você é o primeiro da turma, tem que manter isso. Não pode perder seu posto, futuro grande empresário.
— Adoro como infla meu ego, Olivia. – Ele guardou as suas coisas na mochila.
Saímos da presença incomoda de Amanda, pois eu odiava a forma que ela sempre esnobava Caio. Não que eu fosse algum exemplo de ser humano, estava muito longe disso, mas tratar alguém de forma rude por conta de classe social estava além do meu nível de crueldade.
— Essa garota é tão esnobe. – Caio disse assim que entramos na sala em que teríamos a última aula. – Ela nem ao menos disfarça o olhar carregado de preconceito.
— Se ela soubesse o que o namoradinho anda fazendo. – Sentamos na primeira fileira.
— Como assim? O que você sabe? – Ele sussurrava.
— Que ele é gay, mas vive trancado em Narnia. – Caio levou a mão a boca.
— Não acredito que deixei mesmo isso passar. Você tem certeza, Olivia? – Acenei em positivo. – Minha nossa senhora.
— Nunca te contei isso. – Ele apenas fez um gesto de “zíper” na boca.
Depois da aula, Caio e eu rachamos um carrinho de aplicativo. Fui para casa, mesmo desejando não ir. Eu queria poder me libertar de todas aquelas amarras, sair de casa e fingir que a minha família não existia. “Ok. Eu sei que não é assim que uma pessoa adulta resolve as coisas.” A minha mãe e a minha irmã, embora também me cobrassem, eram os motivos pelos quais ainda não havia chutado o pau da barraca.
— Olivia, precisamos conversar. – Fábio entrou em meu quarto sem ao menos bater.
Sua expressão já entregava o assunto.
— Os quartos têm portas por um motivo, sabia? – Ele veio para cima de mim e me segurou pelo pulso com força.
Respirei fundo e mascarei minhas emoções.
— Chega dessas gracinhas, sua garota mimada. – Tentei me soltar, mas foi inútil. – Eu não quero que você se encontre com aquele Zé ninguém outra vez, me ouviu?
— E desde quando faço as coisas que me pede, papai? – Ele apertou ainda mais e depois me jogou contra a cama.
— Ele tem o dobro da sua idade e quer apenas usar você. – Ergui a sobrancelha.
— Ufa! Que ótimo, papai, porque eu também só quero usar ele. – Sorri, me ajeitando sobre a cama. – Para horas e horas de sex*.
Meu pai veio até a mim e em seguida pude sentir o meu rosto queimando, deixando meus olhos cheios de lágrimas.
— Sua depravada, escute bem o que estou dizendo: fique longe dele. Já está avisada, Giovana. – Eu odiava quando ele me chamava pelo segundo nome.
— É Olivia!
Ele deixou o meu quarto, batendo a porta com força. Eu queria entender o motivo de ser tratada assim. Meu pai nunca demonstrou nenhum tipo de afeição por mim. Desde pequena, nunca questionei, como uma covarde, eu só guardava tudo para mim.
— Não sabe o quanto te odeio.
Fiquei de pé, indo até a porta e a trancando. Não chorei, não esperneei, apenas deitei para não pensar em nada daquilo. Já havia me cansado há muito tempo de tentar entender.
— Bernardo me disse que a Zoe voltará para o Brasil em poucos dias. – Marina comentou, os fios castanhos escuro estavam presos em um coque solto.
“Zoe? Não acredito que aquela idiota vai voltar. Mais uma pessoa pra infernizar a minha cabeça. Mais um motivo pro papai me cobrar.”
— Nossa, ainda bem que ela decidiu voltar. Acho que vai somar bastante na empresa. – Minha mãe sorriu.
— Soube que o João vai ser vice-presidente da Cavalcante. Bernardo também quer que a filha assuma a presidência. Parece que você terá concorrentes, filha. – Meu pai disse a Marina.
Aquele assunto chato era pauta de todos os dias: trabalho, trabalho e trabalho.
— Uma disputa saudável não faz mal a ninguém. Também me preparei pra poder assumir o cargo, papai. Em parte, aprendi muito com você. – Na boa, eu queria mesmo vomitar e não estava faltando muito. — E teremos muitas opções, afinal ainda temos a emissora e a firma de advocacia.
— Mãe, eu posso deitar? Não estou me sentindo bem. – Ela franziu o cenho.
— O que você tem, filha? Vou chamar a Mara e...
— Dor de cabeça, mamãe. Não precisa incomodar a Mara, eu vou tomar um analgésico e descansar. – Fiquei de pé. – Boa noite.
— Depois eu levo um chá pra você, Olivia. – Marina sorriu, mas logo em seguida fez uma expressão séria. – Por que seu rosto tá vermelho?
— Eu cai da cama um pouco antes de descer pra jantar. – Tentei sorrir para dar veracidade ao que dizia. – Não se preocupa... bem, vou indo.
Mandei uma mensagem para Luciano, confirmando nosso encontro do dia seguinte. Há um tempo, ele havia me convidado para morar com ele, como amigos com benefícios e no primeiro momento achei uma loucura, mas parando para pensar melhor, seria um grande alivio sair dessa casa, dessa vida.
Sair da minha própria mente...
Alguns dias se passaram e eu mantive as minhas idas à casa de Luciano. Era o meu refúgio em momentos de tormenta: sex* sem compromisso e alguém para me ouvir. Esse se tornou nosso pacto silencioso.
Sexo ao invés de terapia, ou o sex* fosse terapêutico.
— Hoje é o dia da palestra do seu tio. – Caio olhou em seu relógio. – Daqui a dez minutos.
— Precisamos mesmo ir? – Suspirei.
— Vamos lá, nem que seja pra você tirar sarro. – Ele me abraçou exageradamente, cheirando o meu pescoço.
— Tudo bem, tudo bem. – Peguei minha bolsa.
— Já disse que amo esse perfume? Te deixa sexy.
— Você tá virando bi? – Ergui a sobrancelha.
— Bien puta.
Abafei o riso.
— Idiota.
Fomos para o auditório e o espaço estava totalmente cheio, o que não era nenhuma surpresa. Falei com algumas pessoas durante o percurso e quando finalmente sentamos, o reitor passou a fazer a apresentação do meu tio.
O auditório todo aplaudiu.
— Muito obrigada pela hospitalidade. – Meu tio Bernardo sentou na poltrona, cruzando as pernas de forma elegante. Ele sempre foi um homem muito bonito, assim como minha mãe. – É um grande prazer estar aqui. Me pediram para falar um pouco do início da minha trajetória na Cavalcante e como consegui dar continuidade ao legado do meu pai. Adianto a vocês, não foi nada fácil estar à frente de três grandes empreendimentos...
A minha família era a dona de três grandes empresas no Pará, nos deixando no topo da burguesia. Meu avô iniciou o “legado” dele com uma emissora, filiada a uma grande de São Paulo, seguindo para uma firma de advocacia e uma rede de supermercados. Coisas totalmente distintas, mas que devo admitir, ele soube gerir perfeitamente bem.
— O senhor é muito elogiado por sua trajetória à frente da rede de supermercados, o senhor não almeja ficar como presidente dos outros dois legados de seu pai? – Caio perguntou.
Alguns alunos ficaram ofendidos por ele ter sido o primeiro a perguntar. O meu amigo ganhou bolsa integral depois de ter sido nota mil no Enem e conseguiu a vaga com muito mérito. A gente se conheceu no primeiro dia e depois disso, não nos separamos mais.
Meu tio o respondeu gentilmente e até mesmo perguntou se ele queria fazer mais alguma pergunta, o que deixou os demais ainda mais putos. Eu me divertia com as expressões e até mesmo cochichos.
— Olha, rapaz, você tem um grande futuro pela frente. – Bernardo comentou, deixando Caio todo bobo.
A palestra continuou e outro alunos tiveram a oportunidade de fazer seus questionamentos. Uma hora depois, finalmente chegou ao fim e fomos dispensados. Rachei novamente um carro de aplicativo com Caio e fui para a casa de Luciano.
— Você acabou comigo, Olivia. – Estávamos jogados no chão da sua sala.
— Posso ficar até a noite? – Ele sorriu, tomando um gole da cerveja que já deveria estar quente.
— Vem um cliente pra tatuar daqui a meia hora. Você pode ficar até quando quiser. – Fechei meus olhos. – Mas terá que se vestir.
Sorri.
— Vou tomar banho e já volto. – Beijei sua boca rapidamente e levantei, indo para o banheiro.
Depois comemos algo e esperei Luciano terminar a tatuagem.
— Obrigada, meu parceiro. Você manda muito. – O cara pareceu realmente ficar satisfeito.
— Quando quiser outra, sabe onde vir, parceiro. – Ele o pagou e foi embora.
— Também vou querer uma. – Luciano me olhou e sorriu.
A princípio, ele não pareceu acreditar.
— E o que a minha burguesinha irá querer? Uma borboleta? – Rolei os olhos e ele gargalhou.
— Quero que faça uma dessas aqui. – Apontei para o decalque de uma serpente.
— Sua primeira tatuagem e vai querer algo tão exótico? Você não cansa de me surpreender, Olivia. – Tirei a blusa.
— Quero que termine antes da nuca. – Deitei na cama destinada aos clientes. – Irei pagar, como qualquer outro cliente.
— Com toda certeza, a minha visão de você de costa só irá melhorar. – Havia muita malicia em sua voz.
Ele preparou o material e iniciou o trabalho e quase uma hora depois, foi finalizado. Olhei o resultado no espelho e simplesmente adorei. Se Fábio visse, o que certamente iria, ficaria puto e só de imaginar, me deixava muito satisfeita.
“Ele iria pagar por todas as ofensas e pelo tapa de ontem.”
Em Portugal.
Aquilo havia se tornado uma mania muito esquisita e eu precisava parar, talvez voltar a praticar boxe. Em que momento decidi vir a esse supermercado? Foi tudo no automático. Dentro de uma bolsa em meu closet havia inúmeros ursos de pelúcia. A cada vez que ocorria aquelas discussões entre João e eu, um novo ia parar lá. Foi a forma que encontrei de deixar o cigarro de lado.
Meu celular tocou, mas não me movi um centímetro para atender.
— Hoje não, pai. – Soltei o ar com força.
Continuava a me perguntar por quanto tempo mais ele e eu nos aturaríamos. Era obvio que não nos amávamos e não tínhamos o menor respeito um pelo outro há mais de dois anos e meio. Casamos cedo, ele com 23 anos e eu com 20, namoramos por um ano e imprudentemente, decidimos casar. Achei que o amava.
— E então? Já tem uma resposta? – A moça que me atendeu dentro do supermercado, perguntava a outra.
Era um supermercado brasileiro em Lisboa. Um refúgio para quem sentia saudades do Brasil.
— Julia, você venceu mais essa. – Franzi o cenho.
A outra mais baixa comemorou. Fiquei observando a notória intimidade entre elas.
“Namoradas?”
— Então você tá aqui. – João havia se aproximado e eu nem ao menos havia percebido. – Isso tá ficando ridículo, Zoe.
— Não me lembro de ter te pedido pra vir até aqui. – Ele passou a mão sobre os fios curtos e negros. Um degrade sutil.
Os olhos escuros e analíticos, me inspecionavam.
— O que? Que tá olhando? – Me irritei.
— Quer romper nosso acordo? Só mais um ano, Zoe. Por favor... – Respirei fundo.
— Eu te odeio. – Empurrei os ursinhos para ele. – Vou chegar tarde essa noite, então não me espere. Ou talvez nem volte.
— Só toma cuidado pra não ser vista. – Apenas o olhei. – Ok, ok... não tá mais aqui quem falou. Te espero amanhã. Precisamos arrumar nossas malas, o seu pai até preparou um quarto pra nós.
— O qual não iremos compartilhar.
Subi em minha moto, uma Suzuki personalizada, e pouco depois, deixava o estacionamento do supermercado. Fui para um apartamento que comprei há uns anos, sem o conhecimento de ninguém da minha família, nem João o conhecia. Era pequeno, mas muito confortável, pois havia sido decorado por uma profissional do ramo.
Liguei para um número já conhecido.
— Traga o seu primo até aqui. – Ouvi uma risada do outro lado da linha.
Me encarei no espelho.
— Chegamos em alguns minutos. O quanto de tesão tem aí? – A voz grossa, carregada de sotaque, soou pelo aparelho.
Sorri.
— O suficiente pra deixar os dois no chão. – Desliguei a chamada.
Meia hora depois, Murilo e Vicent, entravam em meu apartamento. Nunca gostei de perder tempo e eles sabiam bem disso, pois foram tirando suas blusas e deixando aqueles abdomes sarados a mostra.
Tirei o roupão que vestia, ficando totalmente nua.
— Não canso de dizer... – Murilo tirou o short, deixando seu volume parecer. – Teu corpo é um tesão, Alessandra.
Ele me chamava apenas pelo segundo nome, desde sempre.
— Eu sei que sim.
Momentos mais tarde, os dois homens de corpos esculturais estavam jogados em minha cama. Depois de um longo banho, fui para a sala ver o céu de Lisboa. Estava um pouco nublado e certamente, choveria pela madrugada. Um cigarro queimava entre os meus dedos, pois não o encostei na boca.
Ainda o eliminaria visualmente.
Peguei o meu notebook, sentei na poltrona de frente para a grande janela com uma vista modesta da cidade. Entrei nas minhas redes sociais e vi algo curioso. Dei zoom, botei minha mente para funcionar.
— Olha, que mundo pequeno. – Reconheci a figura que estava em uma foto postada no perfil de um conhecido dos tempos de festas em Belém. – Será que os conservadores chatos da nossa família sabem que você tá de rolo com um Zé ninguém?
Sorri.
— Pelo que parece, sua noite foi muito bem aproveitada. – João me encarava.
Ele estava somente de roupão e pelo que parecia, não estava só.
— Tenha certeza que sim, meu bem. – Me joguei no sofá, ligando a televisão. – Ela tá no banho?
Sentia meu corpo levemente dolorido.
— Está e logo irá embora. Não se preocupa, ela tá usando o meu banheiro. – O seu membro podia ser visto pela fenda do roupão.
— Cobre isso, não querendo desdenhar desse seu amigo, mas eu realmente não quero ver. – Ele gargalhou e apertou o nó do roupão.
— Assim que o seu pai passar a vice presidência pra mim, a primeira coisa que farei e jogar na cara do meu irmão. – Ele sempre dizia aquilo depois de alguma briga com o meu cunhado.
— Pelo visto, trocaram farpas outra vez. Bem, também estou ansiosa pela presidência da Cavalcante, futuramente você pode ficar à frente da emissora ou da firma de advocacia, os supermercados serão meus. – Fui até a cozinha. - Meu pai me disse que a Marina anda muito interessada no cargo.
— Olha, a emissora é tentadora, mas a vice presidência das unidades de supermercados será a minha prioridade e brevemente, chegarei as outras. Não se preocupa, deixarei a empresa no topo para a sua gestão. – O encarei. - E a Olívia também vai querer uma fatia? - João sempre teve uma queda pela filha mimada da minha tia.
Imediatamente, recordei de uma certa data, balancei a cabeça querendo me desfazer daquelas lembranças.
— Pelo que soube, ela não quer nada com a vida. Tá pouco se importando com as empresas. Ainda sonha em tê-la, é? – Ele sorriu largamente.
— Sim, vou começar a corteja-la assim que voltar a Belém. – Ergui a sobrancelha.
— Pra comê-la e deixa-la depois. – Voltei minha atenção ao sanduiche.
— Fazer AMOR, com toda certeza irei, mas deixa-la, isso não sei. – Até parece.
Rolei os olhos.
— Vou fingir que acredito. – Dei uma mordida.
Depois que a mulher que estava com João deixou o apartamento, decidimos ira ao supermercado comprar uma mala. A dele havia ficado cheia com suas roupas. Fizemos umas compras simples para o jantar também.
— Vamos nesse caixa aqui, não tem ninguém. – Falei, mas ele me freou.
— Vamos naquele ali. – Ele apontou discretamente.
Só podia ser uma piada. João era terrível.
— Olá, boa tarde... – João fingiu que olhou para o crachá da garota. – Natalia.
— Ah, boa tarde, senhor. – Ela abriu um sorriso para ele e depois me olhou por breves segundos, até desviar.
Era a menina do dia anterior.
— Trabalha a muito tempo aqui, Natalia? – Passei a pôr as compras na esteira.
— Há alguns meses, senhor. – Ela parecia concentrada no ato de bipar os produtos.
— Senhor não, me chame de João. – Então ela o olhou com um ar de “é sério?”.
Senti uma imensa vontade de rir, pois ele ainda não havia notado que a garota não era muito chegada a homens.
— Ossos do oficio, João. – Ela falou, sorrindo.
— Ah, agora ficou muito melhor. – As compras estavam no fim. – Escuta, já pensou em trabalhar em um escritório? Como assistente pessoal?
João era ainda pior que eu quando queria levar alguém para a cama.
— Na verdade, não sei se tenho qualificações pra isso. – Aquele papo todo já estava me deixando entediada. – Cheguei a Lisboa com outros objetivos.
— João, vou até a maquinha de ursos. Você paga a conta. – Olhei para a garota e me afastei.
Tentei a sorte cinco vezes e consegui três.
— Não sei como você consegue. – Franzi o cenho e olhei para pessoa ao meu lado.
Era a garota baixinha que estavam com a garota do caixa ontem.
— Já dei mais de cem euros pra essa máquina estupida e só consegui um. – Ela também estava com o uniforme do mercado.
— Acho que tenho sorte. – Ela me olhou e sorriu, mostrando uma covinha na bochecha esquerda.
Bonita.
— Pegue, fique com eles. – Os olhos da garota brilharam.
— Nossa, muito obrigada. – Ela os pegou e parecia mais uma criança com eles.
Não deveria ter mais que dezoito anos.
— Zoe, vamos? – João estava com um sorriso satisfeito.
Sinal de que havia conseguido o que queria.
— Foi um prazer. – Falei para a menina e me afastei.
Colocamos as compras no porta malas e deixamos o supermercado. Quando cheguei em casa, apenas comi algo leve e fui deitar para dormir. Precisaria de toda a minha energia para o dia longo que seria o seguinte.
Seria meu último dia no escritório.
— Sente e fique à vontade, senhor Lopes. Quer uma água, café ou suco? – Ele sorriu.
— Não, senhorita Cavalcante. Muito obrigada pela atenção. – Podia sentir o cheiro de espuma de barbear. – Vim apenas me despedir da senhorita.
Me forcei a sorrir.
— Alguém já lhe disse que és belíssima? – Ergui a sobrancelha e o sorriso morreu no mesmo segundo. – Sempre senti vontade de convida-la pra uma noite mais intima. Agora creio que seja uma boa hora. O que acha?
O homem à minha frente era presidente da empresa em que eu trabalho desde que cheguei a Lisboa, quando ainda estava na metade da faculdade. Fiz estagio e depois fui promovida quando finalizei o curso de administração. Se tratava de um grande império de pedras preciosas. A maior de toda a Europa.
Uma empresa multimilionária.
— Senhorita Zoe?
Ele raramente comparecia, pois o vice sempre tomava conta de absolutamente tudo. Era bonito, mas um babaca completo.
— Quero deixar bem claro que sou uma funcionária, ou melhor dizendo, uma ex funcionaria, senhor Lopes, e nossa relação será estritamente profissional até meu último segundo aqui. Qualquer coisa fora disso, serei obrigada a lhe denunciar publicamente por assédio sexual. – O homem arregalou os olhos. – Fui diretora do seu setor de finanças por dois anos e exijo respeito.
Ele ficou de pé, ficando muito vermelho. Arrumou a gravata de forma nervosa.
— A senhorita não deveria falar assim comigo. Sou um ótimo partido, não sabe quantas mulheres adorariam ser cortejada por mim. Sabe o que posso fazer com uma mulherzinha abusada como você? – Sorri, cruzado minhas pernas.
Dá para acreditar nesse cara?
— Eu o adoraria ver tentando, senhor Lopes. – O desafiei. – Aliás, acredito que meu pai adoraria saber disso. E sua esposa também...
Ele não se atreveu a responder mais nada, virou sobre os calcanhares e deixou a minha sala.
— Ridículo. – Fiquei de pé.
— O que aconteceu? – Minha secretaria entrou em minha sala. – O homem passou furioso.
— Bom, ele decidiu procurar outra sala pra visitar. – Ela arqueou as sobrancelhas. – Ele é um completo idiota. Não sei como foi capaz de criar um império desses.
— Alguns idiotas tem sorte e isso é triste. Vou sentir sua falta por aqui.
Tereza era o mais perto de uma amiga que eu tinha.
— Também irei, você é a melhor pessoa desse lugar. Espero que em breve chegue ao cargo que almeja.
Ela sorriu e como sabia que eu não era chegada a momentos afetivos, não se aproximou, apenas deixou a minha sala.
Sai para almoçar e não voltei ao escritório, pois a nova diretora iria assumir o cargo aquela tarde. Rodei a cidade por um tempo e quando percebi, estava no estacionamento daquele supermercado outra vez. Desci do carro e fui até a máquina de ursos.
— A senhorita voltou. – Olhei para o lado e aquela menina baixinha me olhava, com um sorriso largo. Qual era mesmo o seu nome? – Teve um dia ruim?
Eu deveria apenas dizer-lhe que não era da sua conta, mas tudo que eu fiz foi:
— Muito ruim. – Ela fez uma expressão engraçada até.
— Aqui também foi um dia ruim. – Coloquei dois euros na máquina. – Minha amiga teve problemas por causa de um cliente.
Franzi o cenho.
— Ela foi agredida e agora tá na sala do gerente. – Olhei novamente para ela.
— Um cliente? – Ergui a sobrancelha.
— Uma mulher muito insuportável. Aquele moço que sempre vem com você estava aqui e a ajudou. – Claro, ele bancou o herói.
— Julia? Podemos ir? – A menina do caixa estava a poucos metros.
Seu olhar era abusado, analítico.
— Minha amiga e eu queríamos fazer uma proposta a senhorita. – A baixinha falou.
Sua expressão doce havia dado espaço a outra.
— Diga... – Fiquei curiosa, muito curiosa.
— Desde que passou a frequentar o supermercado, ficamos te observando. – Ergui a sobrancelha. – Já falamos muito de você. Estava ganhando coragem pra lhe perguntar isso.
— É mesmo? E o que exatamente vocês falaram sobre mim? – Ela sorriu.
Sua mão veio até a ponta dos meus fios escuros, enrolado alguns em seu dedo.
— Natalia e eu queríamos um ménage com você. – Fiquei um pouco surpresa. – Seria incrível.
Nunca transei com duas garotas ao mesmo tempo, na verdade, a primeira e única vez que transei com uma mulher foi...
“Essa lembrança idiota.”
— Você é muito corajosa, garota. Eu podia te denunciar por assedio, sabia? – Ela mordeu o lábio.
— E você irá me denunciar? – Olhei para a tal Natalia, que mantinha a distância de antes, e depois para a menina.
— Não, não irei. – O que eu tinha a perder? Seria somente mais uma experiencia para a minha vida.
— Então vai aceitar nosso convite? – Apenas sorri.
Olhei as horas.
— Meu apartamento é aqui perto.
— Agora? – Ela perguntou espantada.
— Agora.
— Você é mesmo interessante.
Alguns minutos depois, chegamos ao meu apartamento. As duas não perderam tempo, o que achei ótimo. Elas passaram a me despir, enquanto me beijavam em todas as partes que os seus lábios conseguiam alcançar.
Eu estava excitada e muito molhada, o corpo feminino era diferente, mas sensual eu diria.
— Você é um pedaço do paraíso. – Natalia lambeu meu mamilo. – Uma delícia de mulher.
Fechei meus olhos quando senti a boca de Julia sobre o meu sex*, ch*pando com uma habilidade que a olhando, jamais iriamos supor que tivesse. Toda aquela “doçura” se transformou em algo que beirava o selvagem.
— Deixa eu rebol*r em você. – Seu pedido foi carregado de sensualidade.
Quando percebi, Julia havia encaixado seu sex* no meu e Natalia esfregava sua intimidade contra a minha boca, enquanto gemia de forma contida. O cheiro de sex* se espalhou pela sala, os gemidos se misturaram.
Um pecado delicioso.
Posso dizer que quando terminamos a nossa maratona, a noite já havia caído e eu estava exausta e sexualmente satisfeita. Momentos depois, ambas deixaram o meu apartamento. Sem questionamentos, sem cobranças, do jeito que deveria ser.
“Que fome”
Me olhei no espelho do banheiro.
A verdade sobre a minha vida, verdade essa que eu jamais ousaria deixar escapar por meus lábios, era a de que havia um vazio enorme nela. Todo o dinheiro, os bons carros, a mansão em que nasci, todos os bens que o dinheiro me trouxe, jamais foram capazes de me fazer sentir viva de verdade. Nunca me senti parte de algo, sendo assim, tudo na minha vida era status e fingimento.
— Dinheiro e poder.
Uma vida fútil, sem muitas paixões amorosas e rodeada de pessoas iguais. Acho que esse é o preço a se pagar pelo sucesso e talvez sorte. Sorte por ter nascido em uma família milionária, romantizar pobreza não fazia parte da minha rotina. Eu amava a vida de privilégios em que o universo me colocou.
Mas trocaria tudo isso para que o vazio deixasse de ser vazio.
“Você me faz falta, mãe.”
Fim do capítulo
E vamos de mais um projeto.
Boa tarde.
:)
Comentar este capítulo:
Marta Andrade dos Santos
Em: 31/03/2022
A família é um mal necessário. Juro até o momento procuro pela necessidade.
Resposta do autor:
Kkkkkkkkkkk um mal necessário.
Acho que você resumiu perfeitamente.
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Lea
Em: 24/03/2022
Boa tarde!
Primeiro capítulo intenso,como tudo que já li que você escreve!
Olívia e Zoe são primas e bem parecidas,vamos dizer que, Zoe é mais "responsável.
Olívia pode não ser filha do Fábio?
Por isso esse "tratamento" diferenciado. Estupido e grosseiro.
Ele não iria ficar pocesso só pq ela não quer se empenhar para ingressar nos negócios da família,e se envolver com alguém de classe social diferente da dela.
E esse acordo da Zoe com o João,tem haver com divórcio,ele só dará o divórcio se ela o colocar na presidência das empresas?
Sexualmente falando a Zoe não perde tempo. Adorei. A mãe faleceu ou a deixou?? A Zoe tem alguma mulher (romanticamente) falando que ela já amou??
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