Boatos Maliciosos

No laboratório...

Ao sair do refeitório, Evelyn encontrou o segurança, e enquanto caminhava ao seu lado no corredor do laboratório, conversou um pouco com o cara.

— Você parecia bem entretido com a Jéssica na boate, no sábado à noite. Vocês estão saindo juntos? — A morena tentou parecer casual.

— Bem que eu queria, mas a ruiva é bem difícil de dobrar. Só conversamos um pouco, nada demais. — Igor comentou distraído. “Além disso, a ruiva só parecia ter olhos para a morena.” Com esse pensamento na cabeça, ele olhou com mais atenção para a colega cientista.

— Hm, entendi. — Não foi o que a morena havia visto naquela noite. Os dois pareciam bem íntimos naquele lugar. “Mas, o que ela tinha a ver com isso?” Evelyn ainda se ressentia um pouco, por não lembrar dos acontecimentos daquela noite, após as duas saírem da boate. Se tinha uma coisa que ela odiava, era não conseguir ter controle sobre si mesma, em certas ocasiões. Ela se contentava com o fato, que durante os seus trinta e dois anos, foram poucas as vezes que isso havia acontecido. Mas, com a ruiva parecia diferente, ela tinha a sensação que faltava algo... a conversar sobre aquela noite. Talvez estivesse ficando louca, ou algo parecido.

...

Na noite de quinta-feira daquela semana, Jéssica foi para o quarto pensando na morena que voltaria da ilha no dia seguinte. Estava com medo do que ela pensaria, caso contasse a verdade sobre aquela noite... Imaginava que Evelyn a culparia de ser incapaz de controlar os instintos do corpo, ou a acusaria de se aproveitar do seu momento de embriagues... Temia a reação dela, e não sabia o que fazer...

Jéssica se deitou na cama e se cobriu com o edredom, e a única coisa que ela desejava, era conseguir dormir tranquila naquela noite. Deitada de bruços com a cabeça apoiada no travesseiro, Jéssica tentou desviar os seus pensamentos da morena. Aquela semana para a ruiva, os dias sempre acabavam em noites mal dormidas.

Cansada, Jéssica fechou os olhos e caiu num sono pesado e agitado, com sonhos confusos, que se misturavam aos momentos de paixão com a morena. No final dos sonhos, Evelyn sempre ia embora decepcionada com a ruiva.

Na sexta-feira, Jéssica acordou sobressaltada, e confusa, sentou-se na cama. Estava suada e sentindo um peso enorme sobre a sua cabeça. Precisava contar para amiga o que havia acontecido entre elas.

No final daquele mesmo dia, Jéssica já havia mudado de ideia, quando Evelyn chegou em casa e comentou com ela, que iria sair com o seu irmão Joe.

...

Sexta-feira à noite, quando Evelyn já estava saindo, ela insistiu com a ruiva jogada de qualquer jeito no sofá, assistindo um filme na tv.

— Você não quer mesmo, ir com a gente para o Boate? — A morena tentava não demonstrar, o quanto sentia falta da ruiva, durante os dias que ficava ausente na ilha. — Prometo não beber tanto, quanto da última vez. — disse Evelyn.

Queria mesmo, que a ruiva fosse, porque quando estavam juntas, sinceramente, gostava de conversar com ela.

Jéssica olhou enigmática para a morena. Ela permanecia muito séria, e pouco havia interagido com a amiga, naquela noite.

— Estou cansada... vou dormir cedo. — Ela repetiu, antes de ver Evelyn sair do apartamento, para se encontrar com o seu irmão Joe, na portaria do prédio.

Era algo totalmente novo para a morena, aquele sentimento, e aquela necessidade de estar perto de Jéssica, que lentamente, crescia dentro dela. Era um sentimento forte... e arrebatador.

...

Mais tarde naquela noite, Jéssica foi tomar água na cozinha quando deu de encontro com a amiga entrando no apartamento.  

— Oi, Jéssica... — Falou desanimada.

— Oi, Evelyn. — Ela respondeu, antes de tomar um gole d’água. E após notar seu ar abatido, perguntou olhando para a morena. — Aconteceu alguma coisa? — Jéssica estava chateada com Evelyn, mas não conseguia ficar indiferente ao que acontecia com ela. Ao final das contas, ela era sua amiga.

— Eu estou bem. Só tive uma pequena discussão com um colega de trabalho, que também estava na Boate. — A ruiva a olhou preocupada.

— Quer falar sobre essa discussão com o cara? — Evelyn havia discutido com Igor, que havia insinuado que ela estava com ciúmes da ruiva com ele. Depois, contou pra morena que todos já sabiam que elas estavam juntas, e perguntou se ela tinha vergonha, de ter um caso com outra mulher. Por último, mandou-a tomar cuidado, porque os irmãos Sampaio não prestavam.

— Já esta tarde, e você disse estar cansada. Vamos deixar esse assunto para amanhã.

— Não está tão tarde, assim. — Argumentou a ruiva. Entretanto, a morena não sabia como contar para a amiga, o que estavam falando a respeito delas, e que quase saiu correndo da Boate, após ouvir os comentários maliciosos de Igor sobre a relação entre as duas. Na verdade, a morena ficou com medo da reação da amiga, quando soubesse dos falatórios que estavam agitando aquela pequena cidade litorânea.

— Melhor deixar para amanhã... — Ela falou incerta.

— Se você não quer falar sobre o que aconteceu, tudo bem. Não vou insistir. — Declarou Jéssica, saindo de perto da morena para colocar o copo vazio na pia da cozinha.

Quando voltou para a sala, viu que ela havia sentado no sofá e olhava pensativa as próprias mãos, que estavam unidas sobre as suas pernas.

A morena usava uma blusinha social azul-bebê, em conjunto com uma saia de cintura alta de cor preta, que ia até os seus joelhos. Mas sentada, a saia havia subido um pouco, deixando à mostra, parte de suas coxas alvas e bem delineadas. A ruiva achava a morena, uma mulher muito bonita e muito elegante. Uma das coisas que mais chamou sua atenção, foi a cor dos seus olhos. Havia se encantado por ela.

Jéssica sabia que estava perdidamente, atraída pela morena. E ela nunca havia se sentido atraída por mulheres, mas começou a duvidar de si mesma, em relação a Evelyn. Para a ruiva, tudo começou na última noite que saíram juntas e foram parar numa boate lotada de conhecidos em comum. Lembrou da morena indo para o banheiro, seguindo outra mulher... o amigo Fábio, dizendo que ela era lésbica... Lembrou quando...

Mas, se intensificou quando soube que a morena havia aceitado sair com seu irmão Joe. Ela lutava para não admitir, que estava com ciúmes da morena.

— E Joe, ele te trouxe pra casa? — Perguntou chamando atenção dela.

— Não. Ele ficou com a Raquel. — “Então, era isso!” pensou Jéssica. “Joe, sendo Joe... e Evelyn, sofrendo por ele.”

— E você ficou assim..., por causa dele. — Constatou.

— O quê? — A morena perguntou aérea. — Não! Claro que não! — Evelyn respondeu, quando entendeu o que Jéssica poderia estar imaginando. — Eu já lhe disse, que discuti com um amigo. — Aquilo a fez pensar um pouco, e a fez perceber, que não tinha motivo para adiar aquela conversa. Precisava falar com ela, antes que houvesse um mal-entendido maior.

— Mudei de ideia, Jéssica. Nós precisamos conversar! E tem que ser hoje... — A morena falou agitada.

— Okay! Pode falar. — Evelyn demorou alguns segundos, antes de começar.

— Hoje, lá na Boate… eu fiquei sabendo sobre alguns comentários, a nosso respeito.

— Sobre você, e Joe?

— Não. — Silêncio. — Sobre nós duas, Jéssica. — Jéssica mexeu a cabeça, deixando claro, que não havia entendido do que se tratava.

— E o que estão falando? — Ela perguntou começando a ficar preocupada. A morena baixou a cabeça, e olhou novamente para as próprias mãos. — Fala, Evelyn!

— Que estamos juntas. — A morena respondeu angustiada. — Que somos amantes...

— Oh! É isso? — Jéssica perguntou surpresa.

— Sim. Não sei como começou, e não imagino quem começou a espalhar, esses comentários maliciosos, a nosso respeito. — A garota suspirou desanimada. — Mas Jéssica, eu não queria que isso acontecesse. Não esperava, por essa situação. — Pensativa, a ruiva olhou para o chão, e Evelyn a olhou apreensiva.

— E, de que forma esses comentários, te atingiram? — Jéssica perguntou cautelosa.

— Não sei o que dizer. Foi a primeira vez, que me vi numa situação tão embaraçosa, quanto essa. — “Embaraçosa?“ Pensou a ruiva.

— E, o que você pretende fazer?

— Acho que vou procurar outro lugar para ficar, nos finais de semana. — Jéssica concordou, num lento movimento de cabeça para cima, e para baixo. — Eu já deveria ter feito isso, quando você chegou de viagem.

— Posso te ajudar a procurar. — A ruiva mostrou-se prestativa — Quando você quiser.

— Obrigada. — A morena não conseguia deixar de imaginar, o que seu pai iria dizer a respeito daquela história. — Mas, prefiro procurar sozinha. Acho que devíamos nos afastar por um tempo.

Aquilo sim, atingiu Jéssica de uma maneira que ela não conseguia entender, ou explicar.

Mas, não podia julgar a amiga. Ela mesma estava dividida, em relação aos boatos. Principalmente, após o que havia acontecido entre elas na volta pra casa, na noite do sábado anterior, e que a ruiva ainda não havia tido coragem de contar para a morena. Era isso que ela queria evitar, ao ficar em silêncio sobre o ocorrido naquela noite. Ainda assim...

— Eu quero que você saiba, Evelyn... que eu não dou a mínima para o que estão dizendo a nosso respeito. Não é verdade, e nós duas sabemos disso. Já quanto a você sair desse apartamento, e procurar outro lugar para ficar... você, é quem sabe. Por mim, você pode ficar o tempo que quiser.

— Não sei se estou preparada, para enfrentar uma situação dessa.

— Se fosse verdade, e nós duas estivéssemos juntas, eu lutaria para calar a boca desse povo. Mas... — Comentou Jéssica.

— Mas...?

— Mas, não estamos juntas, e eu sinceramente não sei o que fazer. Não quero te deixar numa situação difícil.

— Se, entendi direito, você só está preocupada comigo? — Caso fosse verdade, aquilo seria uma novidade na vida da morena.

— Sim. Não dou a mínima, para o que estão falando.

— Talvez, você mude de ideia quando sentir na pele os comentários. — Falou desanimada, lembrando o que havia sentido quando conversou com Igor, na boate.

— Sou uma pessoa diferente de você, Evelyn. — Falou com calma. — O que você tem que entender, é que eu nunca fiquei com uma mulher antes, mas não sou totalmente fechada a essa possibilidade. — “Não após ter conhecido você!” pensou Jéssica. — Além disso, não pretendo ficar aqui por muito tempo. Então..., não me importo com o que falam. — A morena olhou admirada para a mulher que conhecia a tão pouco tempo, mas que já se mostrava se importar... e muito, com ela. Muito diferente de pessoas, que ela conhecia a vida toda.

...

Fim do capítulo