“Escrever é esquecer. A literatura é a maneira mais agradável de ignorar a vida. A música embala, as artes visuais animam, as artes vivas (como a dança e a arte de representar) entretêm. A primeira, porém, afasta-se da vida por fazer dela um sono; as segundas, contudo, não se afastam da vida - umas porque usam de fórmulas visíveis e, portanto, vitais, outras porque vivem da mesma vida humana. Não é o caso da literatura. Essa simula a vida. Um romance é uma história do que nunca foi e um drama é um romance dado sem narrativa. Um poema é a expressão de ideias ou de sentimentos em linguagem que ninguém emprega, pois que ninguém fala em verso.”
Fernando Pessoa
Prólogo
Aquela semana finalmente tinha acabado, saí da empresa mais cansada do que o normal, só queria chegar logo em casa e aproveitar o final de semana sozinha, coisa que a muito tempo não acontecia comigo.
Segui para o estacionamento, alguns colegas passaram se despedindo animados, estavam indo para um barzinho e eu só querendo chegar em casa.
Meu celular tocou em algum lugar dentro da bolsa, quando o peguei, estranhei o número, mas atendi:
– Alô?
– Boa noite, posso falar com a senhora Chermont?
– Claro, sou Samantha Chermont, quem gostaria?
Como de costume coloquei a mão em minha nuca, estava dolorido.
– Estou ligando em nome do Dr. Paulo Olivier, pode aguardar na linha um instante?
– Sim claro, eu aguardo.
A ligação foi transferida, entrei no meu carro colocando minha bolsa do lado, não demorou muito uma voz masculina chamou minha atenção do outro lado.
– Pequena Chermont, cariño. – Sorri reconhecendo-o, fazia tempo que ele não me ligava.
– Dr. Olivier, quanto tempo!
– Muito tempo mesmo, cariño. Desculpa o adiantar das horas, espero não estar atrapalhando!
– De forma alguma, é sempre uma satisfação falar com o senhor. – Mais um grupo de colegas passaram por ali se despedindo, concluí. – Estava a caminho de casa.
– A tão chegada hora do descanso, a senhorita está bem?
– Um pouco cansada, essa semana foi um tanto corrida para mim! – Sorri inspirando fundo, perguntando em seguida: – E o senhor, como está?
– Eu estou ótimo, minha filha. Somente o cansaço da idade. – Sorriu do outro lado gracejando, fiquei curiosa com a ligação, mas não demorou muito, prosseguiu. – Estou ligando porque surgiu um pequeno imprevisto e pensei em você para a solução dele.
Sorri, sempre direto em seus assuntos, fui direta também.
– Em que posso ser útil?
– Gostaria de saber como está a sua agenda para a semana que vem, e se poderia disponibilizar algumas horas para apresentar uma palestra na segunda de manhã, para minha equipe? – Analisei o pedido dele e como não respondi de imediato, prosseguiu se desculpando. – Desculpa estar lhe pedindo esse favor assim, por telefone e em cima da hora, como havia dito, tive um imprevisto.
– Tudo bem Dr. Olivier, estava lembrando que tenho que ir ao Rio de qualquer forma, só não tinha data prevista ainda. Deixe-me ver aqui.
– A vontade, minha filha.
Sorri, olhei a minha agenda, e como não iria trabalhar naquela semana, resolvi marcar meu compromisso para a terça, anotei e voltei ao telefone.
– Estou livre na segunda Dr. Olivier, assim aproveito e “mato” a saudade do senhor e do Rio.
– Ficarei muito grato a você, cariño. Iria pessoalmente lhe falar, mas preciso viajar ainda hoje para Curitiba e só voltarei no domingo à noite.
– Seria uma honra, Dr. Olivier, do que se trata a palestra?
– Análise de Cenários e Mercado, acredito que a senhorita esteja por dentro do assunto. – Sorriu, o acompanhei e ele finalizou dizendo. – De qualquer forma, minha assistente pessoal estará lhe enviando por e-mail o material que já está pronto para a senhorita estudar e se precisar, acrescentar as suas próprias anotações.
– Ficarei aguardando então, Dr. Olivier. Darei o meu melhor. – sorri.
– Confio na senhorita. Serei eternamente grato por esse favor, claro que será remunerada por esse trabalho.
– Quanto a isso o senhor não precisa se preocupar.
– De forma alguma, toda e quaisquer despesas, enquanto a senhorita estiver aqui no Rio, será por minha conta. Aceite por favor, pois não aceitarei um não de sua parte.
Sorriu galante como sempre, não pude recusar.
– Certo, Dr. Olivier – sorri complementando. – Havia esquecido o quão difícil é dizer não ao senhor.
Ele sorriu e eu o acompanhei, conversamos por mais alguns minutos e nos despedimos. Transferiu novamente a ligação para sua assistente pessoal, essa que iria me mandar o material de estudo e providenciar passagens e hospedagem, além de deixar a minha disposição um motorista.
Depois de tudo acertado, finalizamos a ligação e segui para casa, chequei meu e-mail, e como prometido, o material estava disponível, felizmente já tinha um material prévio que eu poderia usar na palestra, só faltava ajeitar os slides.
Tomei banho, preparei algo para comer e deitei para descansar. Normalmente naquele horário, a casa era tomada de risadas infantis, mas naquele final de semana, em específico, foi diferente. Inspirei fundo, estava sozinha e isso fez com que o cansaço me tomasse, adormecendo assim que fechei os olhos.
No dia seguinte acordei com mais disposição, arrumei o material necessário para a palestra e me tranquilizei quanto a isso. Fazia tempo que não ia ao Rio, devido a correria do trabalho e alguns problemas pessoais. Mas fiquei feliz, iria com tempo para rever alguns amigos.
No domingo segui para o aeroporto, embarcaria no voo das dezesseis, se tudo corresse conforme minha agenda, na terça faria a reunião e na quarta tiraria um tempo livre para mim. Estava precisando mesmo sair um pouco, minha vida andava muita agitada ultimamente, tanto emocional quanto profissional, precisava me distrair.
Meu nome é Samantha Suzie Chermont, embora carregue o sobrenome de meu avô, não mantemos contato devido a um desentendimento familiar que tivemos alguns anos atrás. Ele é francês, um tanto quanto autoritário, e teimoso por assim dizer. Não aceitou uma decisão que eu havia tomado e rompemos nossa, já difícil relação. Sinto falta dele, apesar de tudo, mas não poderia me deixar levar somente pelas suas vontades.
Sou formada em Relações Públicas, essa profissão é a que mais me dedico atualmente. Trabalho também com captação de verbas para ajudar Organizações Não Governamentais e Assistência a menores desabrigados. Tem sido uma luta atrás da outra para conseguirmos ao menos, um pouco de atenção para causas assim.
Moro em Guarulhos alguns anos, na verdade, depois que me formei, me mudei para cá, mas morei no Rio desde minha infância. Estou com planos de voltar para a cidade maravilhosa muito em breve, preciso na verdade. Guarulhos me trouxe muita alegria, mas estava na hora de voltar para casa.
Recentemente completei trinta e dois anos, meus olhos e cabelos são castanhos, tenho 1,70m de altura. Gosto de correr para acalmar a mente e às vezes quando tenho tempo, faço trilha com um grupo de amigos bem ativos. Cuido bem do meu corpo, apesar de ultimamente não estar em dia com outras atividades além de correr. Sou observadora ao extremo, chego a ser bem chata com certas situações. No quesito teimosia, herdei de meu avô. Apesar da pouca idade, já passei por tantas provações em minha vida que vi muita coisa no decorrer dela.
Senti um solavanco, estava tendo uma pequena divagação, abri os olhos no momento em que o avião decolou, sorri sentindo uma maravilhosa sensação de liberdade e uma forte sensação de que aquela viagem me traria surpresas agradáveis. Inspirei fundo fechando os olhos novamente, tinha tempo que não sentia essa adrenalina, fatos e momentos dos quais eu nem lembrava mais passavam em minha mente me fazendo ficar saudosa.
Depois de alguns minutos, voltei a minha atenção para o meu notebook, precisava analisar mais uma vez os slides da apresentação na segunda. De certa forma, queria que fosse perfeito, sentia dentro de mim que teria que dar o melhor, e assim o faria.
Beatriz OlivierMeu celular tocou em algum lugar, passei a mão para alcançá-lo, a ligação foi encerrada antes mesmo de ver quem era, ainda com os olhos fechados o deixei de lado, estava quase cochilando novamente, virei na cama esticando meu corpo cansado olhando para o relógio e revirando os olhos dizendo:
– Droga... atrasada!
Levantei rápido e na pressa acabei tropeçando no lençol caindo feio, sorte que ainda em cima da cama. Sim, eu sou muito desajeitada.
Estava bêbada, mas não pensem vocês que era de álcool, e sim de sono mesmo, cheguei de uma viagem quase quatro da manhã, essas viagens rápidas de trabalho acabavam com qualquer pessoa. Isso porque tinha voltado para o Brasil há poucos dias, o fuso horário ainda era uma complicação na minha vida. Enfim, tentei chegar ao banheiro inteira, tomei banho rápido, voltei para o quarto e olhei em volta dizendo desanimada:
– Preciso de alguém para organizar minhas coisas.
Procurei uma roupa, por sorte ainda tinha algumas organizadas na mala e a briga agora era para achar uma meia. Peguei a primeira que vi e calcei. Ajeitei meus cabelos, coloquei uma jaqueta, estava frio aquela manhã, meus óculos para ajudar na claridade e minha bolsa.
Quando saí do elevador no estacionamento, lembrei que estava sem carro. E agora? Poderia chamar um Uber, mas como eu sou sempre do contra, voltei para meu apto, peguei minha bicicleta e ao montar nela senti aquela brisa da manhã no rosto, acordei completamente. Sorri, fazia tempo que não pedalava. Olhei para o relógio, tinha uma hora para chegar na empresa.
Quando estava a duas quadras dela, deu fome, enviei uma mensagem para uma amiga que trabalha na cafeteria lá perto, para adiantar os pedidos. Quando cheguei ela me aguardava com tudo pronto. Dei um beijo em seu rosto agradecendo e segui para a empresa. No trajeto até minha sala parei cumprimentando alguns amigos e rindo um pouco. Resultado, me atrasei ainda mais, agora era esperar para levar o famoso “puxão de orelha” de meu avô.
Meu nome é Beatriz Olivier, tenho vinte e nove anos, olhos azuis, ao contrário dos de meu avô, que eram verdes. Fiquei com a tonalidade dos olhos de minha mãe. Tenho 1,80m e peso proporcional a minha altura, na verdade sou bem magra, meus cabelos são castanhos e repicados na altura dos ombros.
Não era muito fã de atividades físicas, apesar de ter praticado tênis alguns anos, quase me tornei profissional, mas a empresa de meu avô me atraía mais. Um escritório e todas aquelas oportunidades de estar e trabalhar ao lado dele, fizeram com que eu seguisse carreira na área administrativa.
Hoje, depois de muito batalhar para conseguir esse posto, administro a empresa da família, onde trabalho quase cinco anos. Nos dois últimos, passei fora do país, a frente da filial na Espanha e também concluindo minha pós-graduação, fiz essa escolha com o apoio de meu avô, logo depois de ter perdido minha avó, mas agora estou de volta, ainda me adaptando a rotina, por isso os atrasos. Mas apta ao cargo e cheia de expectativas, assim era minha vida.
Fim do capítulo
“Nada na vida é mais excitante e gratificante do que um pensamento introspectivo, inesperado, que faz de você uma pessoa modificada — não apenas mudada, como também melhor.”
Arthur Gordon Webster
Aqui encerro o primeiro de muitos que ainda virão... Bjs a todas, se cuidem... e para quem quiser assistir o Trailer book, dá uma olhada em minhas redes sociais...
;)
Bia
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