Capitulo 65
A Última Rosa -- Capítulo 65
Virando-se da frente da janela, Pepe olhou para o pai e notou que ele chorava em silêncio, pois seus ombros tremiam.
-- Desde que você saiu de casa, parece que perdi um pedaço de mim -- o homem murmurou com um soluço abafado -- Eu te amo, filho -- ele falou baixinho, lágrimas quentes tombando-lhe dos olhos -- Amo muito, muito. Perdoe-me, por favor.
Parando na porta do escritório por um momento, Inês endireitou os ombros e forçou um sorriso para disfarçar a própria tristeza. Cruzando as mãos nas costas, entrou.
-- Estão se entendendo, senhores? -- arriscou perguntar, olhando do pai em prantos para o filho. Eles a olharam, atônitos, os rostos molhados e angustiados.
-- Entendendo?! -- repetiu Pepe, em tom incrédulo. Olhou para o pai, que o fitou de forma triste -- Como se fosse fácil perdoar a quem nos magoou e nos feriu! Saiba que o tempo cura as feridas, mas as cicatrizes deixadas por elas não somem. Você me feriu com a crueldade das coisas que saíram da sua boca, com sua falta de empatia. Eu não sou rancoroso, mas vou dar tempo ao tempo. Vou pensar, acalmar o meu coração, depois, procuro o senhor.
-- Sim, sim. Eu entendo -- Antenor resmungou, meio confuso com aquela inesperada reação. Pigarreou e prosseguiu: -- Você sempre foi uma bênção e uma alegria para nós -- ele respirou fundo, e novas lágrimas rolaram por seu rosto -- Eu respeitarei o seu tempo, meu filho -- murmurou e saiu do escritório de cabeça baixa, as mãos metidas nos bolsos da calça de tergal.
Inês encostou-se na escrivaninha. O olhar que Antenor lhe deu ao fechar a porta a fez refletir.
-- Ninguém, infelizmente, tem o poder de modificar o que ocorreu no passado. Alguns fatos dolorosos grudam na memória e continuam a causar sofrimento ao longo da vida, principalmente aqueles provocados pelos pais. Ao contrário do que prega o senso comum, o perdão não é algo que acontece naturalmente, mas uma decisão. Colocá-la em prática não é tarefa das mais simples, mas traz imensos benefícios para a vida. Um deles é se livrar da sensação de que nunca será feliz porque não será capaz de corresponder ao que o seu pai queria que você fosse.
Pepe olhou para cima, e Inês percebeu que havia sombras embaixo de seus olhos.
-- Nunca vou esquecer o que ele me fez -- ele respondeu, seco.
-- Perdoar não significa necessariamente esquecer, mas suportar e saber conviver com a lembrança ou ação incômoda. "Perdoar nos ajuda a reconhecer o que há de bom no outro e até em nós mesmos. Aprendemos a gostar dos outros verdadeiramente e a aceitá-los como são" -- Inês tocou de leve o ombro do rapaz -- Sim, você está ferido, foi magoado no seu íntimo, sofreu muito e é natural que não queira passar por isso de novo. Mas a amargura e a mágoa são um péssimo mecanismo de defesa. Elas nos deixam pessoas amargas, inflexíveis e cegas. Só quem já conseguiu perdoar verdadeiramente alguém sabe a sensação de leveza e tranquilidade que isso traz.
Pepe ouviu em silêncio, sentindo-se inexplicavelmente triste e arrependido.
-- Vai lá -- disse Inês, percebendo que ele não estava convicto de sua decisão -- A vida passa muito rápido para perder tempo com sentimentos ruins.
Antenor caminhava a passos lentos em direção ao carro quando ouviu a voz de Pepe atrás de si.
-- Pai.
Antenor se virou de imediato.
-- Eu te amo, pai. Eu amo você com seus defeitos e tudo.
Antenor abriu os braços para Pepe, que correu para ele, e os dois ficaram abraçados por um longo momento.
-- Perdoe esse velho bobão -- ele comentou, quando a tempestade de emoções abrandou- se.
-- Eu também não sou flor que se cheire -- Pepe observou, enxugando os olhos com o lencinho.
-- Não, não, eu que não fui inteligente o suficiente para reconhecer a joia que estava bem embaixo do meu nariz -- disse, com um sorriso trêmulo -- Um tolo -- declarou Antenor -- Devia ter procurado você há muito tempo, mas estava com vergonha e medo da sua reação -- fez uma pausa, olhando-o atentamente -- Espero que tudo seja diferente de agora em diante.
-- Também espero, pai -- ele afirmou, confiante.
-- Eu já desconfiava de tudo, filho -- afirmou Antenor, lançando a Pepe um olhar compreensivo -- Na verdade, sempre suspeitei que você não aceitou nenhuma de suas admiradoras porque queria agarrar aquele moço que trabalha na panificadora do Chico. É verdade, né?
-- É verdade -- admitiu Pepe, intrigado com o jeito do pai que parecia um menino peralta.
-- Nesse caso, desejo que vocês dois voltem a se falar.
-- O Dino ainda trabalha para o seu Chico? -- ele perguntou com um sorriso animado.
Antenor balançou a cabeça confirmando. Pondo as mãos nos bolsos da calça, ele pareceu considerar uma ideia que tivera.
-- Vai domingo lá em casa, sua mãe vai preparar uma galinha caipira com mandioca do jeitinho que você gosta.
-- Adoraria! -- o rapaz exclamou, rindo -- Adoraria não. Adorei! -- Pepe abraçou-o, olhando para Inês, que sorria, radiante da porta.
Jessica parou seu carro esporte vermelho no estacionamento do fórum. Michelle permaneceu encolhida no canto do carro, com a cabeça voltada para o prédio moderno, com uma fachada suntuosa de vidro e esquadrias de alumínio.
-- Está pronta?
A pergunta de Jessica fez com que Michelle tremesse dos pés à cabeça naquela manhã ensolarada de fim de novembro. Não era tanto a pergunta, mas a ideia de ficar frente à frente com Maicon, que lhe gelava as mãos e lhe acelerava o coração, além do fato de que nunca sequer esteve diante de um juiz prestando depoimento.
As duas desceram do automóvel, passaram pela porta de vidro e dirigiram-se ao elevador. Enquanto subia, Michelle recordou-se da última vez que esteve diante de Maicon e da expressão sombria e cruel que ele fizera. Naquele dia, pensou que morreria.
Pôs de lado a terrível recordação, tal como o receio de enfrentar o juiz. Minutos mais tarde, estavam em frente à porta de vidro da sala de sessão. Entraram e viram-se rodeadas pela atmosfera e o som silencioso da seriedade. A carpete macia amortecia os passos ao aproximarem-se do advogado. Doutor Gerson estendeu-lhe a mão, num gesto amigável.
-- Bom dia! -- ele disse, erguendo os ombros e levantando o queixo -- Estão atrasadas.
Jessica tirou os óculos escuros, deixando-os pendurados na gola da blusa.
-- Desculpa, eu e a Michelle...
-- Pegamos um trânsito terrível -- completou Michelle -- Prazer em conhecê-lo pessoalmente -- manteve a voz serena.
-- O prazer é todo meu, Michelle -- disse com educação -- Como conversamos por telefone, as coisas já estão bem encaminhadas. O juiz vai condenar você a prestação de serviços à comunidade ou doação mensal de cesta básica.
-- Só isso? -- questionou Michelle com as sobrancelhas arqueadas.
Gerson sorriu, dando tapinhas no ombro dela.
-- O seu erro foi fugir e não denunciar o Maicon. Você é a vítima e não a criminosa.
Embora Michelle se sentisse aliviada, ainda não podia comemorar.
-- O senhor já conversou com o juiz?
-- É prática comum, especialmente pelos advogados mais antigos, o "despacho" com o juiz, também conhecido informalmente como "embargos auriculares". É direito do advogado "dirigir-se diretamente aos magistrados nas salas e gabinetes de trabalho, independentemente de horário previamente marcado ou outra condição".
-- Hum, não sabia disso.
-- É só você responder as perguntas de forma clara e verdadeira, o resto deixa comigo. Vai dar tudo certo -- ele disse, indicando uma outra porta -- Vamos!
Inês acordou com um barulho estranho no chão. O piso do quarto parecia estar se abrindo. Em seguida, sentiu algo ou alguém deitar ao seu lado na cama.
O que quer que fosse, era real, pois sentiu o frio na pele do braço assim que aquilo encostou nela. Era como o contato de outra pele, mas gelada e muito pegajosa.
De repente, o quarto foi invadido por um cheiro pútrido fortíssimo. Inês estava assustada e sem coragem de abrir os olhos. Mesmo sem olhar para o lado, teve certeza de que era o espírito da Marcela. Sabia que ela não tinha o poder de fazer-lhe mal, mas também não queria que ela ficasse ali. Começou a rezar com muita concentração. Os olhos continuavam fechados.
-- Senhor, afaste de mim esse espírito sofredor, mostre a luz...
Inês sentiu-se mal e, quando tentou se mexer, não conseguiu mover os músculos do corpo. Abriu os olhos e viu uma figura, uma mulher alta. Ela não podia ver seu rosto nem distinguir detalhes da sua roupa, mas sentia claramente que era Marcela.
Inês seguia sem poder se mexer. O espírito aproximou-se novamente e sentou-se na cama.
-- O que você quer Marcela? -- tentou se levantar usando toda a força do seu corpo, mas sentia uma energia pesada a segurar.
-- Finalmente consegui retornar, a partir de agora a Jessica vai me pagar por tudo que me fez. Ela vai ter uma doença grave e sua vida vai virar um inferno. Usarei a Michelle para matá-la para que ela venha para este lado e eu possa fazê-la sofrer da mesma forma que estou sofrendo -- ela disse com rosto severo, passando um olhar de ódio extremo.
Inês continuou fazendo força e mentalizando o movimento de sair da cama, para longe daquele espírito vingativo. Sentia apenas uma energia muito ruim.
De repente, sentiu uma dor intensa, como uma cãibra extremamente forte.
Então, seu corpo pulou da cama e caiu sobre uma mesinha, a um metro e meio de distância.
-- Em nome de Deus Todo-Poderoso, afastem-se de mim os maus Espíritos, servindo-me os bons de antemural contra eles.
Espíritos malfazejos, que inspirais maus pensamentos aos homens; Espíritos velhacos e mentirosos, que os enganais; Espíritos zombeteiros, que vos divertis com a credulidade deles, eu vos repilo com todas as forças de minha alma e fecho os ouvidos às vossas sugestões; mas, imploro para vós a misericórdia de Deus. Dizendo isso, Inês percebeu o espírito sumir como se estivesse entrado no chão do quarto. Esse acontecimento tão forte e impactante a impressionou tanto que ela, tremendo de medo, ficou por um bom tempo caída sobre a mesinha.
Quando chegaram em casa, Michelle comunicou o resultado do seu julgamento, disse que prestaria serviços à comunidade e que faria isso com todo prazer.
Valquíria e Vitória logo correram para providenciar os brindes. Até Inês apareceu, e aos poucos foi deixando de lado a tristeza para participar da comemoração.
Exultante, Pepe saiu rodopiando pela sala, com Michelle em seus braços.
-- Nossa garota merece ser feliz! -- ele ergueu a cabeça, para que Michelle não visse seus olhos marejados.
-- Isso mesmo, Pepe. Michelle merece toda a felicidade do mundo -- Jessica falava de um jeito que não deixava margem à dúvida sobre seu amor.
Michelle sorriu confiante e feliz, encostando a cabeça no ombro dela.
-- Maya, meu amor. Maya Simas. A partir de hoje, a Michelle não existe mais.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Lea
Em: 01/01/2022
Feliz Ano Novo Vandinha!!!!
Que bom Pepe e o pai se entenderam!!!
O que será preciso fazer para Marcela seguir o caminho da luz?? Ela era obssecada pela Jéssica,mas será que não tinha nem uma dose de amor,uma dose que a leve para o descanso verdadeiro da sua alma??
Obs: o casamento agora sai, né? As duas foram absolvidas!!
[Faça o login para poder comentar]
Mille
Em: 29/12/2021
Oi Vandinha
Será que a Marcela não deixa a Jéssica ser feliz, e fica aí nesse mundo de espírito mal querendo vingança. Muita reza pra ela.
Agora a Maya volta e Michelle será só lembrança.
Enfim Pepe deu a chance se perdoar o pai e recomeçar.
Bjus e até o próximo capítulo
Feliz ano novo e que venha com muita saúde, paz e amor.
[Faça o login para poder comentar]
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook:
[Faça o login para poder comentar]