Capitulo 2
Capítulo 2
Manoela entrou sem bater. Sua mãe tomava uma xícara de chá e olhava pela janela a movimentação da rua lá embaixo. Não se movimentou um milímetro de onde estava.
-Sente-se. - disse friamente.
Manoela fez o que lhe fora mandado e ficou esperando que ela terminasse o chá e resolvesse falar com ela. Estava puxando um fio de um furo no joelho de seu jeans, quando percebeu que ela levantou de junto da janela e sentou-se na grande cadeira de couro caramelo atrás da escrivaninha.
A sisuda Senhora cruzou as mãos em frente ao queixo e estudou-a com olhos de gelo.
-Manoela, você tem ideia da quantidade de trabalho que eu tive que deixar para trás para resolver as suas trapalhadas? - perguntou Maria Isabel.
-Desculpe, Dona Maria Isabel - respondeu Manoela com o queixo erguido desafiando-a.
-Você nem ao menos imagina ou se importa com tudo que eu tive que fazer para que o nosso melhor cliente não abandonasse o hotel do litoral? UM ANO, Manoela, tive que negociar e baixar o preço da estadia pela metade nesse período de tempo. Sabe quanto dinheiro vamos perder? Quantos funcionários vamos deixar de contratar?
-Desculpe, Dona Maria Isabel - respondeu Manoela ironicamente.
-Manoela, não ouse ser insolente comigo. - Maria Isabel falou duramente. - Você não passa de uma garota mimada, que pensa que sabe tudo. Você não é mais uma criança, quando vai se dar conta disso e parar de atrapalhar a vida dos outros?
-Desculpe mãe, se atrapalho tanto a sua vida. Por que não me manda para outro colégio interno? - falou irônica - Ah, é, eu já me formei, que pena... - levantou-se.
-SENTE-SE e pare de se fazer de vítima Manoela. Você tem ideia do que a maioria das pessoas faria para ter o que você tem? - perguntou Maria Isabel encarando duramente sua filha.
-Sempre isso, mãe. Sempre me jogando na cara as migalhas que me dá! - disse furiosa.
-MIGALHAS, Manoela?! Você ao menos lembra quantos carros você comprou no ano passado? Claro que não. Você lembra quantas vezes estourou o limite do cartão de crédito? Não, né?! Você não leva nada a sério! Acha que a vida é só farra? Ah, mas as coisas vão mudar...
-O que vai fazer? Vai me deserdar? - perguntou com um dar de ombros. - Eu não me importo.
-Não se importa? Quero ver quantos desses seus “amiguinhos” vão continuar ao seu lado depois que você não puder mais bancar as festinhas deles...
-São meus AMIGOS, mãe, não “amiguinhos” como disse. Eles não se importam com o meu dinheiro, se importam comigo, são minha família... - respondeu furiosa.
-Baixe o tom, Manoela. Me diga quantos deles foram te visitar quando você sofreu o acidente de carro no outro ano? Nenhum, Manoela. Nenhum. O único que se dignou a vir de Florianópolis foi o Cristiano, seu primo. E a Nicole, pelo menos, ligava todos os dias, apesar de estar na África ajudando a fundação da mãe dela.
-Eles estavam ocupados, mãe. E o Cristiano tinha que vir, é praticamente meu irmão. -respondeu Manoela.
-Ele não TINHA que vir. Ele veio por que gosta de você. Largou tudo. Você não sabe o que é a vida Manoela. Quem se importa larga tudo para ajudar aqueles que ama.
-Vai me dizer que foi por isso que veio, mãe?! Por que me ama? Está meio tarde para começar a demonstrar, não acha? - falou encarando-a, segurando as lágrimas que teimavam em encher-lhes os olhos.
-Claro que eu amo você, Manoela, você é minha filha. É a última lembrança de seu pai. Eu sempre estive com você quando precisou.
-Quando precisei? Isso depende do ponto de vista, mamãe. Onde estava você nas minhas apresentações da escola? Onde estava quando meu primeiro dente caiu? - perguntou secando uma lágrima que escorreu pelo lado esquerdo de seu rosto. –Foi a Marlene quem me deu meu primeiro absorvente, foi ela que me ouviu chorar pelo meu primeiro namoradinho...
-Eu estava cuidando do seu futuro, Manoela! Futuro este, que você está jogando fora em festas, bebedeiras e sabe lá Deus o que mais. - respondeu Maria Isabel ignorando as lágrimas da filha.- Sou muito grata à Marlene por ter me ajudado a cria-la, mas esse é um assunto entre ela e eu.
Manoela a olhava como um animal ferido, mas contido. O olhar úmido mesclado à uma expressão de quem queria atacar.
-E pare de chorar. Já chega desta conversa, já falamos disso milhares de vezes. Está na hora de você amadurecer Manoela, ter responsabilidades. Cansei de sempre ter que limpar suas bagunças... As coisas vão mudar por aqui. Essa fase de menininha rebelde acabou.
Manoela olhou-a com os olhos negros cintilando raiva e sem entender o que sua mãe pretendia.
*******
Lianna olhou para o relógio, faltavam cinco minutos para a hora marcada. Suas mãos estavam frias.
-Acalme-se - pensou - Você está pronta. Se preparou para isto sua vida toda.
Respirou fundo e se apresentou para a secretária.
-Bom dia, sou Lianna, tenho uma reunião marcada para as 9h. - disse sorrindo.
-Bom dia, vou avisar à senhora que você já chegou.
Lianna viu-a pegar o telefone, discar e depois de um tempo responder:
-Sim, eu sei Senhora, mas a Srta. Lianna está aqui para a reunião. - ouviu atentamente o que a pessoa do outro lado da linha dizia - Ok, eu aviso. Obrigada.
Desligou o telefone e virou-se para Lianna, dizendo:
-A Senhora está terminando de resolver um assunto e já lhe chama. Pode se sentar, por favor, fique a vontade. - sorriu para ela.
Depois de 10 minutos esperando, a secretária se aproximou chamando-a:
-Lianna, a Senhora a receberá agora, pode entrar.
-Muito obrigada... - olhou para a placa na mesa dela. - Muito obrigada, Graça.
Bateu duas vezes na porta e esperou. Em seguida a porta foi aberta por Manoela.
Então Lianna teve certeza de que tudo daria errado.
*******
Manoela deu graças a Deus quando o telefone tocou, assim teria um descanso do sermão enorme que sua mãe passava. Pedia internamente que fosse um grande fornecedor e que sua mãe precisasse deixar a conversa das duas para depois. Para meses depois, de preferência.
-Graça, estou ocupada. - disse Maria Isabel quando atendeu o telefone.
Seguiu-se um pequeno silêncio.
-Ah, ela já chegou. - olhou no relógio. - Bem na hora, diga-lhe que espere mais alguns minutos, já estou terminando aqui com Manoela. Obrigada.
Desligou o telefone e olhou para a filha. Estudou-a durante alguns minutos. A pele clara, os cabelos e olhos intensamente negros. Lembrava muito o pai. Deixou escapar um longo suspiro.
-Manoela, você não pode continuar vivendo desta maneira. - falou. - Você é a única herdeira de toda esta rede de hotéis. Somos muito conhecidos. Há muita coisa que você deveria saber. Mas você nunca se importou. Eu fui relapsa, deixei que levasse sua vida como bem entendia e, no máximo concertava suas burradas. Mas isso acabou. Estou cansada. Você vai assumir os negócios da família.
Manoela não acreditou. Isso era muito pior do que esperava. Ela não estava preparada, sua mãe sabia. O que ela pretendia?
-Mas, mãe... - começou a dizer, sendo interrompida por Maria Isabel.
-Sem desculpas, Manoela. - disse séria - Já ouvi muitas, não acredito em nenhuma.
-Mãe, você sabe que eu não tenho condições... você quer apenas me ver falhar.- disse encarando-a.
-Não, minha filha, não quero vê-la falhar. Quero ver você crescer, amadurecer, se tornar a mulher que seu pai esperava que fosse. Responsabilidades não prejudicam ninguém.
-Papai já morreu há muito tempo, não use a memória dele para me atingir. - disse, revoltada.- Eu não sou criança, tenho direito de escolher o que quero fazer da minha vida.
-Mais respeito comigo, Manoela. Ainda sou sua mãe. - falou de forma firme. - Você tem escolha. Você não precisa aceitar o que lhe proponho.
Manoela se preparou para o golpe.
-Mas no caso de você não aceitar, cancelarei todos os seus cartões, sua mesada. Venderei seu carro, que está no meu nome. Não morará mais no hotel. Terá que trabalhar para se sustentar.
Manoela ouviu tudo que ela disse, mas não acreditava. Isso não podia estar acontecendo com ela.
-Você não pode fazer isso comigo... Papai me deixou ações. Tenho direito a pelo menos o lucro da minha parte das ações da empresa. - falou desesperada
-Claro que tem. Só há um pequeno probleminha nessa sua lógica, Manoela. Seu pai esclareceu no testamento que você só receberia sua parte na empresa quando EU a julgasse capaz disso ou na minha morte. Como pode perceber nenhuma das opções está disponível no momento. Todos os lucros das suas ações irão pra uma conta que só será liberada para você quando eu morrer.
-Droga! Você não me deixa escolha, sou obrigada a aceitar o que me oferece! - bateu a mão na mesa e ignorou a dor que espalhou por seu pulso.
-Não é obrigada, minha filha. Você pode trabalhar. Aí sim será a única responsável pela sua vida. Não é isso que você sempre diz querer? - falou Maria Isabel.
-Trabalhar? Eu sou uma Alcântara. Sou rica. - falou com o rosto vermelho de raiva.
-Você não é rica até que eu morra Manoela. - falou Maria Isabel friamente. - Então qual sua decisão? Não posso mais perder tempo, tenho uma importante reunião agora.
-Você não me deixou escolha, não é?!
-Vamos Manoela, diga.
-Como eu vou comandar a empresa? Não sei nada de administração, contabilidade, hotelaria, nada disso! - falou passando as mãos pelo rosto, derrotada.
-Então você aceita a minha proposta? - inquiriu Maria Isabel.
-Não tenho como recusar tamanha honra. - respondeu Manoela, irônica.
-Então está certo, Manoela. Mas não pense que tolerarei seu comportamento atual, você vai fazer as coisas direito. Vou te dar uma chance. UMA chance, Manoela. Você terá ajuda, até porque não perdi minha sanidade, não vou largar tudo que seu pai e eu construímos em suas mãos inconsequentes. Vou contratar uma nova administradora, com especialidade em hotelaria e com algum conhecimento prévio de como isto tudo funciona. Ela lhe ensinará tudo o que você precisa saber e me passará relatórios contínuos de seu aprendizado e desenvolvimento. - explicou Maria Isabel.
-Uma babá?! Você contratou uma babá para mim? Que maravilha. - bufou Manoela.
-Comporte-se. Essa é uma das atitudes que não vou mais tolerar. - falou MariaI Isabel, olhando duramente para a outra. - Você não quer ser tratada como criança, mas se comporta como uma.
Manoela ficou em silêncio observando-a com os braços cruzados. Sabia que quando sua mãe decidia algo, dificilmente mudaria de ideia.
-Você vai gostar dela, é uma boa moça. Conheço a família dela há bastante tempo, sei que é esforçada, inteligente, confiável e honesta. - falou a dona do hotel, pegando o telefone e pedindo à secretária que deixasse a moça entrar.
-E se eu não conseguir mãe... Você disse que tenho só uma chance. - perguntou a morena de forma mal humorada.
-É bom que consiga. - disse a mãe, com a sobrancelha direita arqueada, desconfiada que a filha aceitara rápido e fácil demais.
Ouviram a batida na porta e Maria Isabel mandou que a filha a abrisse. Manoela levantou-se e se dirigiu devagar até a porta, ouvindo em seguida uma segunda batida. Abriu. Era a jovem camareira que quase a atropelara mais cedo.
-Mãe você pediu algo? - virou-se para a mãe. - A camareira está aqui!
A senhora Maria Alice levantou-se, foi até a porta, sorriu para a garota e apertou-lhe a mão.
-Entre Lianna, estávamos a esperando. - disse.
A garota agradeceu e Manoela viu-a entrar sem nenhuma bandeja ou carrinho, apenas uma pasta. Continuava próximo à porta, sem entender a situação. Sentiu o chão sumir sob seus pés quando a mãe disse:
-Feche a porta, Manoela, minha filha. Venha cumprimentar Lianna. É com ela que você trabalhará daqui para frente.
Fim do capítulo
E aí, o que estão achando? Devo continuar postando?
Comentar este capítulo:
paulaOliveira
Em: 06/01/2022
Está me deixando curiosa, estou gostando.
Resposta do autor:
Que bom! :D
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olivia
Em: 29/12/2021
Olá autora, gostei do primeiro e amei o segundo. Sua escrita é adorável. Essa Manuela é um perigo, já vendo um belo casal cheio de marra! Gostei da D. Mãe, brava igual siri na lata. Kkkkk mas, estou curiosíssima para saber como vai ser a interação das meninas!! Parabéns pelos primeiros capítulos, estão impecáveis!!!!!! Bjs
Resposta do autor:
Obrigada! Que bom que estás gostando! Dá pra ver de onde Manoela herdou a personalidade forte, não é?! Nos próximos capítulos vão aparecer personagens muito cativantes também, aguarde ;) Bjos!
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Nath D
Em: 29/12/2021
A história já me deixou curiosa sobre como será todo processo de amadurecimento da Manu. Esperando o que os próximos capítulos irão mostrar :)
Resposta do autor:
Obrigada! Olha, Manuzinha não vai facilitar, não hein! Kkkk A princípio, postarei segunda, quarta e sexta! bjos
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