Capitulo 63
A Última Rosa -- Capítulo 63
Fábio virou-se para encarar a irmã, os lábios entreabertos.
-- Você não vai me abandonar?
Ao olhar no fundo daqueles olhos azuis e tristes, Jessica sentiu pela primeira vez a dor e a delícia de ter um irmão!
-- Você me quer ao... -- ela não conseguiu fazer o restante da pergunta.
-- Vamos, continue -- ele disse, suavemente.
Jessica deu meia dúzia de passos e, então parou e olhou para ele, seus olhos brilhantes e intensos. Fábio sustentou-lhe o olhar, esperando.
-- Todas as pessoas no mundo estão destinadas a errar, isso é característica humana. Desta forma, todos os indivíduos merecem ter uma segunda chance, para assim poder reconhecer e resolver seus erros -- ela abriu a boca. Fechou-a. Olhou para o chão -- O sangue nos impõe a irmandade, mas é o amor que realmente importa -- ela murmurou, hesitante, tirando os olhos do chão -- Se você está realmente arrependido e quer mudar de vida, eu não vou te abandonar. Mas entenda, não existe arrependimento verdadeiro sem que você aceite as consequências do mau que você fez e que pague por eles -- ela fez uma expressão obstinada, com um olhar duro ao encará-lo.
Fábio olhou ao redor. Por um momento, ficou simplesmente parado no lugar e, então, andou até Jessica. Ele não resistiu quando a irmã se aproximou e segurou a sua mão. Fábio decidiu concordar e abaixar a cabeça.
-- É verdade, Jessica, agi como um maldito desalmado, assassino covarde e cruel e, me arrependo muito disso -- ainda de cabeça baixa, olhou de esguelha para a irmã, esperando que ela dissesse alguma coisa, mas ela olhava para frente, distante apesar do sorriso -- Eu vou pagar, sim. Vou pagar todo o mal que causei à Marcela e a todas as outras pessoas. Vou aceitar a decisão do juiz e cumprir a minha pena -- percebeu que os dois olhos azuis fixaram-se em seu rosto, analisando-lhe a expressão -- Você acredita em mim? -- perguntou ele, depois de um breve silêncio.
-- Se eu não acreditasse, não estaria aqui -- ela disse, num tom baixo cheio de emoção.
-- Então, vamos logo! -- ele disse, estendendo o braço em torno dela, e pousando-lhe os dedos esticados na curva das costas para empurrá-la gentilmente na direção dos policiais -- Você levará cigarros para mim na cadeia?
-- Você fuma?
-- Não, mas posso começar caso seja necessário.
Jessica sorriu, pois ele estava sendo bastante gentil e seus olhos transmitiam sinceridade, então, balançou a cabeça negativamente.
-- Não, não será preciso. Eu visitarei você e levarei balas e chocolate.
-- Adoro chocolate branco.
-- Vou lembrar disso -- respondeu Jessica.
O policial se aproximou com um par de algemas brilhantes nas mãos.
-- Estou pronto -- Fábio estendeu os punhos -- Podemos ir.
Fábio deu um tapinha gentil no rosto da irmã antes de entrar na viatura. Salete juntou-se a ela quando o carro de polícia sumiu no portão.
-- Que pena! Queria tanto ter me despedido dele -- lamentou Salete, com voz angustiada.
-- A senhora logo vai poder visitá-lo. Vai demorar um pouco até ele ser transferido para a penitenciária.
Salete levantou a cabeça e sorriu com a informação, mas logo ficou séria.
-- Ele ia mesmo se jogar do penhasco?
-- Acredito que sim -- Jessica se virou e olhou em direção ao oceano -- Porém, ele percebeu que o suicídio é uma triste ilusão porque somos seres imortais, e a vida continua, absolutamente, além da morte do corpo físico. Não tem como fugir.
-- Graças a Deus -- disse Salete, sufocando Jessica em um abraço apertado -- Graças a Deus que você salvou o meu querido filho -- ela segurou Jessica pelos ombros, sacudindo como se fosse uma criança -- Ele merece uma segunda chance.
Jessica olhou-a meio sem jeito, ela estranhou a atitude de Salete, mas gostou de sua forma de agir, moralmente correta e imparcial.
-- Na verdade, dona Salete, essa "segunda chance" não foi dada por nós ou pela vida, ela foi concedida por ele mesmo. É fruto das novas escolhas que Fábio fez. Não vai ser fácil, mas com o nosso apoio ele vai conseguir.
-- Sim, ele vai -- respondeu Salete, com um leve sorriso nos lábios -- Você perguntou por Samuel, porque? -- perguntou. Olhando muito, muito curiosa.
-- É uma longa história, dona Salete. Acredite em mim, é demais para a sua cabeça.
A senhora levantou as sobrancelhas e encolheu os ombros.
-- Tudo bem, mas quero que veja uma coisa -- ela deu alguns passos em direção à casa, parou e se virou para Jessica -- Venha, você ficará impressionada com o que eu tenho para te mostrar.
A residência dos Romano tinha uma sala enorme e confortável. Uma senhora simpática serviu café e pães quentes.
-- Tia Inês.
-- O que, Pepe?
-- Um espírito pode empurrar a gente?
Inês sentou-se e serviu-se de um pãozinho doce, enquanto o rapaz encheu sua xícara com café fumegante.
-- Sim, segundo o que Kardec publicou na Revista Espírita em janeiro de 1860, um espírito pode nos empurrar e até mesmo nos bater. Foi perguntado a ele se é possível que o mesmo desfira um soco sensível ao encarnado e ele respondeu de forma afirmativa.
-- A tia conhece algum caso que comprove isso? -- Michelle tomou um gole do café quente e saboroso.
Inês fitou-a por sobre a mesa com um sorriso meigo.
-- Na Revista Espírita do mesmo ano, descreve-se um ocorrido no qual um proprietário de uma casa considerada como assombrada à época recebe uma forte bofetada de uma mão invisível ao adentrar em um dos seus aposentos, mesmo sozinho no local. Além destes, diversos outros relatos publicados em outras edições da Revista Espírita descrevem interações físicas sensíveis aos encarnados causadas por espíritos interessados e capazes de realizá-las -- a senhora mexeu-se no assento, sentindo-se subitamente curiosa -- Mas porque a pergunta, Pepe? -- Inês estudou o rapaz, observando os reflexos dourados que o sol produzia nos cabelos dele, nos olhos expressivos e nas feições delicadas como porcelana.
Pepe deixou a xícara de café de lado e olhou sério para ela.
-- Por várias vezes hoje senti alguém tocar em mim e não tinha ninguém por perto naquele momento.
-- Estou de prova, dona Inês -- afirmou Wancleyson.
-- Como acontece essa interação, tia? -- Michelle franziu o cenho, como se estivesse intrigada com a própria pergunta.
Inês adoçou o café com ar pensativo. Era uma pergunta que nunca fizera a si mesmo, mas a resposta foi imediata.
-- No Livro dos Médiuns, Kardec nos esclarece que a interação entre o espírito e a matéria ocorre por meio de forças fluídicas de natureza desconhecida ainda por nós. Quando o espírito está encarnado, a sua vontade de atuar sobre o meio físico é transmitida do espírito ao corpo por meio do perispírito. Quando desencarnado, a atuação sobre a matéria ocorre por meio da vontade do espírito que leva a uma interação fluídica com o objeto a ser manipulado.
-- Já virou bagunça -- disse Pepe -- Agora, esses desencarnados ficam por aí cutucando a gente, pegando na minha bunda quando bem entendem?
Inês queria fuzilar Pepe com o olhar e, ao mesmo tempo, sorrir. Mas sua intuição avisava que não devia fazer nenhuma das duas coisas. Ele era apenas um leigo curioso e assustado com as interferências espirituais na vida dos encarnados.
-- Os espíritos protetores atuam em benefício de nossa integridade física. Sejam eles nossos anjos da guarda ou espíritos com os quais nos afinamos pela sintonia de nossas atitudes, sua ação só ocorre com a permissão da Divina Providência.
Valquiria serviu-se de café e sentou-se ao lado de Michelle. Estava sem fome.
-- Cadê a Jessica?
-- Está no escritório com a dona Salete -- respondeu Michelle -- Queria ser uma mosquinha pra entrar naquela sala e ouvir o que elas estão conversando.
-- Credo, amiga, você é terrivelmente curiosa! -- disse Valquíria, sorrindo.
-- Vai dizer que você também não está curiosa?
Valquíria não respondeu, apenas sacudiu os ombros.
Salete retirou uma pilha de papel do cofre e colocou sobre a mesa.
-- O que é isso? -- perguntou Jessica, aproximando-se dela.
-- Sente-se, vou te contar uma história.
Jessica obedeceu, puxando uma cadeira. Salete apoiou um cotovelo na mesa e começou a falar pausadamente.
-- De onde você conhece o Samuel Felipe Vaz?
Jessica esfregou a nuca enquanto pensava o que responder.
-- A senhora pode achar que sou louca, mas Samuel tem me acompanhado e me aconselhado há muito tempo -- ela suspirou fundo e por um momento achou que sua resposta causaria risos em Salete. Mas mesmo assim decidiu continuar -- Por muito tempo eu não estava receptiva e disposta a senti-lo. Eu não sentia a sua presença. Eu não conseguia contato porque o meu coração não estava aberto para que ele chegasse a mim.
-- Porque acharia você louca? -- Salete inclinou a cabeça e falou em tom sério: -- A espiritualidade está presente na vida de todo mundo e muitas discussões sobre esse tema pairam sobre a nossa humanidade. Sabemos que existem inúmeras religiões espalhadas pela Terra, mas praticamente em todas elas existe o chamado "mentor espiritual". Sou católica e acredito em anjos. A tradição cristã descreve os Anjos da Guarda como grandes amigos, colocados por Deus ao lado de cada homem para o acompanharem em seus caminhos, por isso devemos recorrer a eles.
Jessica assentiu, feliz com as palavras de Salete.
-- Eu não sabia que ele era perfumista, então, esse é o motivo de nossa afinidade e sintonia.
-- E o que ele deixou inacabado -- completou Salete, para surpresa de Jéssica.
-- Como assim?
Ela pegou uma das folhas de cima da mesa e entregou para Jessica.
-- Samuel Gostava de escrever todas as suas fórmulas à mão, usando canetas de cores diferentes para simbolizar mudanças de humor ou estilo. Ele não queria nem ouvir falar em máquina de escrever.
Jessica olhou o papel na sua mão.
-- A fórmula do perfume perfeito!
-- Não entendo nada de fórmulas, mas o seu pai entendia muito. Segundo ele essa é a fórmula, não terminada, do perfume: Amor Eterno. Samuel estava elaborando esse perfume para o grande amor de sua vida.
-- Porque Enrico não continuou o trabalho dele? -- Jessica perguntou, olhando nos olhos dela.
-- Não sei, Enrico apenas disse que não pertencia à ele -- sob os olhares atentos e curiosos de Jéssica, Salete recolheu todas as folhas e colocou dentro de uma valise preta -- Hoje, depois do que me contou, tenho certeza que essa fórmula pertence à você. Pega, faça com que o desejo de Samuel finalmente se concretize.
Houve um momento de hesitação antes dela pegar a valise.
-- Eu sinto que devo isso ao Samuel. Eu sinto que esse é o desejo dele -- Jessica deu um abraço de agradecimento na jovem senhora -- Vou enviar o convite para o nosso casamento. Eu e a Michelle ficaremos muito felizes com a sua presença.
Salete sorriu afetuosamente.
-- Claro! Estarei lá, se Deus quiser!
Pergunta da autora:
Se você fosse criar um perfume exclusivo para o seu amor, como seria esse perfume?
Recomendo
O romance "Um Perfume Inesquecível", da psicografia de Ismael Batista da Silva e ditado pelo espírito Otília, é uma comovente história de amor envolvendo um perfumista que elaborou um perfume exclusivo para seu amor, perfume esse que perdurou até no além, transformando-o em um sinal, uma marca da presença espiritual da amada. O protagonista, por orgulho, acabou se envolvendo com grandes comprometimentos e teve sua reparação em uma existência posterior como trabalhador espírita. A obra mostra a importância da mediunidade responsável para superarmos nossas pendências espirituais, o valor da instituição familiar para a realização dos grandes acertos espirituais do pretérito. Além dos mecanismos utilizados no mundo espiritual para nos reeducar e para nos refazer diante da vida.
Créditos do capítulo:
https://www.kardecriopreto.com.br/um-espirito-pode-nos-empurrar-ou-ate-nos-bater/
https://www.febnet.org.br/blog/geral/como-neutralizar-as-mas-influencias-espirituais/
https://opusdei.org/pt-br/article/o-que-e-um-anjo/
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Vanderly
Em: 26/11/2021
Olá Vandinha, tudo bem?
Olha, amei o capítulo, e fiquei feliz pela decisão do Fábio em assumir as consequências dos seus atos.
Quanto ao perfume, eu gosto de aromas discretos, e se eu fosse criar um perfume para a minha amada, certamente seria uma mistura de alecrim, mate verde e lírio.
Espero que o Pepe leve um tabefe nas orelhas de algum espírito para ele levar as coisas mais a sério. Risos.
E autora, quando vai voltar a dar continuidade no Diálogo com os espíritos?
Aguardo ansioso pelos próximos capítulos.
Beijos e um ótimo final de semana.
Vanderly
Resposta do autor:
Olá Vanderly
Desculpa por ter largado a história, prometo que em 2022 vou voltar com tudo e terminá-la.
Abraços fraternos. Até mais.
Mille
Em: 23/11/2021
Oi Vandinha
Espero que o desejo do Samuel seja realizado e a Jéssica possa criar o perfume do amor perfeito.
E deu tudo certo com o Fábio, ele vai pagar pelos erros cometidos e terá apoio da irmã e mãe.
É Pepe cuidar do teu traseiro.
Bjus e até o próximo capítulo
Resposta do autor:
Olá Mille
Obrigada pelo comentário.
Beijos. Até mais.
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NovaAqui
Em: 23/11/2021
Que bom que Fábio aceitou seguir vivo e ao lado da família. Por enquanto terá de pagar por seus erros.
Faria um perfume amadeirado. Usaria sândalo e musgo de árvores/ plantas. Ele deixaria um rastro onde meu amor passasse. Aí entra o Pepe: "essa fragrância é para você não perde-la de vista!" Kkkkkk
Agora é fazer o perfume perfeito que será usado no dia do casamento
Resposta do autor:
Sim, NovaAqui! O perfume perfeito.
Paz e Luz. Até mais.
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