Capitulo 10
Estou horrível simplesmente horrível, olheiras enormes se destacam em meu rosto, fora a dor de cabeça torturante que me atormenta desde o instante em que abri os olhos.
Paro de encarar meu destruído reflexo no espelho e tomo uma ducha, após trinta minutos estou tentando entrar em uma calça jeans preta, olho pela janela e observo o céu cinza, os dias frios enfim chegaram. Termino de me arrumar e vou até à cozinha onde encontro Dome e Ellen tomando café.
— O que atropelou você, Emma? — Dome diz, sua cara está tão horrível quanto a minha.
— Acredito que algo parecido com o que atropelou você! — Respondo mal-humorada. — Bom dia, Ellen.
— Olá querida. Será que posso opinar sobre os males que atormentam cada uma de vocês?
— Quais seriam esses males. Oh! Grande, Ellen? — Dome desdenha.
— Abstinência e Curiosidade. Você querida Dome, está sem sex* desde que conheceu a médica super. Hétero, nós saímos você conhece garotas, mas não passa de beijos, enquanto a você meu doce Emma, você tem ânsia por certas descobertas, descobertas que podem ser Altamente satisfatórias e perigosas.
— Você está completamente enganada. — Dominique se defende.
— Concordo. — Digo me servindo de café amargo.
— O pior cego é aquele que não quer ver. — Ellen diz dando de ombros.
—Bom dia a todas. — Penélope surge segurando Anastásia pelo braço, elas se aproximam lentamente, Penélope se mostra paciente com o ritmo dela, observo a cena, Dome e Ellen começam a colocar mais comida na mesa.
Anastásia se senta ao meu lado, não consigo olhar em seus olhos por mais de um segundo, sinto seu perfume e meu corpo aquece com o tão famoso calor da excitação. Levanto-me chamando a atenção de todos os presentes.
— O que foi, Emma? — Dome fala com a boca cheia de cereal.
— Nada, só preciso ir para o trabalho mais cedo.
— Tem certeza que é só isso?
— Sim, Dominique. Tenham um bom dia.
Cheguei na floricultura, antes mesmo de Jennie, deixei alguns funcionários surpresos, apenas os cumprimentei e me tranquei o restante do dia no meu refúgio. Não sai para almoçar, comi apenas um sanduíche que Jennie fez a gentileza de trazer, eu estava entusiasmada com uma nova pesquisa sobre mistura de espécies de flores e aquilo prendeu minha atenção de uma forma tão incrível que quando cheguei em casa já passava das 21:00.
Dome estava na sala com vários documentos em cima da mesa de centro, ainda trajava um de seus terninhos. Passei diretamente para cozinha, ataquei o que encontrei na geladeira e me dirigi ao meu quarto.
Durante às duas semanas seguintes fiz exatamente isso, só mudava os planos nos fins de semana, geralmente passava o sábado e domingo com Michael em seu apartamento, tentava ser uma boa noiva e ele parecia satisfeito. Durante a semana me trancava no laboratório ou ia para a estufa, sabia que eu estava fugindo da Anastácia, mas não me sentia capaz de encara-la, eu sei que quebraria se visse em seus olhos a acusação e o desapontamento pelo que fiz naquele dia há quase três semanas.
Eu chegava tarde em casa quase todas as noites, saia bem cedo pela manhã e ficava sabendo como ela estava por Penélope. Tilly perguntou o motivo do meu afastamento, apenas desconversei e disse ter muito trabalho. Penélope também notou a distância que criei de Anastásia, por vezes citou que ela estava sentindo minha falta. A vi poucas vezes em todos esses dias, eu tentava criar uma barreira que conseguisse segurar meus sentimentos quando encarasse aqueles olhos, mas só de pensar neles eu já me sentia fraca.
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Um mês havia se passado e minha decisão de manter distância só parecia pior do que a decisão de Dome em fingir que Paige não existia aceitando ser advogada dela.
Ellen continuava com suas teorias malucas sobre nossos relacionamentos. Enquanto Dome está cada dia mais irritada, nada está bom, reclama da comida, do tempo, das próprias roupas, das roupas dos outros, reclama por me ver em casa, reclama por não me encontrar em casa, só fala de Paige e não quer ouvir o nome dela. Às vezes me pego rindo da sua instabilidade, ela está realmente apaixonada e não sabe lidar com isso.
— Está ouvindo isso?
— Isso o que Dominique?
— Esse gotejar.
— É apenas a torneira da pia, você não deve ter fechado direito.
— Então a culpa é minha? — Ela diz batendo no balcão da cozinha.
— Qual o problema?
— Não tem problema nenhum.
— Você quer conversar sobre a Paige?
— Emma… — Dome diz em um tom assustadoramente calmo.
— Não, Dome. Chega, ok? Entenda que ela é hétero. Entrar nesse jogo acabará machucando você.
— Eu já entendi, sei exatamente o que tenho a perder, Emma. — Dome sai da cozinha realmente chateada e me arrependo na mesma hora de tudo que disse.
— O que houve com ela? — Penélope pergunta.
— Está apenas chateada. — Digo recolhendo os copos sobre o balcão — Como está Anastásia?
— Muito bem! Em breve não irá precisar mais dos meus cuidados.
— Ela vem evoluindo bem depressa, fico muito feliz com essa evolução.
— Acredito que em breve ela possa retornar as atividades normais, sair sozinha, conhecer alguém...
— Como assim conhecer alguém? — Meu tom soa indignado.
— Ela chama muita atenção. Quando saímos sempre tem alguém querendo ajudar com as compras. Você sabe como são os homens quando veem uma mulher bonita como ela.
— Não, eu não sei. Onde está levando ela?
— Passeamos pelo quarteirão, ou vamos nas lojas próximas.
— Alguém deu em cima dela? — Digo me sentindo cada vez mais irritada.
— Alguns foram gentis ajudando com as sacolas e outros até deram números de telefone. Guardei os números caso ela se interesse mais tarde.
— Jogue fora!
— Emma?!
— Ela está muito frágil para ter relacionamentos e você não devia guardar números de telefones de estranhos, devia cuidar dela, esse é seu trabalho! — Penélope me olha cheia de tristeza e mais uma vez noto que machuquei alguém. — Me desculpe.
— Com licença, Senhorita Clark. — Penélope volta para o quarto de Anastásia.
— Porr*, Emma.
Minha cabeça parece que explodirá a qualquer instante, me sinto perdida e confusa. Pego as chaves do carro, preciso sair de casa, mas não quero ir para o trabalho, preciso ficar longe por um tempo desses ambientes rotineiros.
Mandou uma mensagem para Jennie avisando que não irei hoje, como trabalhei bastante no último mês ela até aprova minha folga.
Resolvo então encarar algumas horas de viagem para visitar Amélia, assim que chego na estrada de terra que leva até a casa sinto a tensão enfim se esvair, o ar puro e gelado me atinge assim que saio do carro. Então uma Amélia com expressão preocupada surge na varada.
— Hey. O que houve? — Ando em sua direção e me jogo em seus braços. Lágrimas caem sem autorização e soluços começam a se fazer presente. — Vejo que você precisa de leite e biscoitos. — Amélia diz enquanto afaga meus cabelos.
— Sim, eu gostaria muito de leite e biscoitos. — Digo fungando feito uma criança. Leite e biscoitos sempre me fazem sentir melhor, além disso, também me fazem falar o que realmente sinto.
— Venha, acabaremos com alguns biscoitos.
Amélia me deixa encolhida no sofá, depois aparece com um enorme copo de leite e uma travessa de deliciosos biscoitos com pedaços de chocolate. Comemos em silêncio, vez ou outra um soluço inconveniente quebra a paz do ambiente.
— Agora me conte.
— Sou uma aproveitadora.
— Como assim? — Ela me olha confusa.
— Anastásia, eu a beijei… Sabe a moça que atropelei.
— Sei quem ela é, querida. O que tem demais beija-la?
— Eu a beijei na… b… o… — Enterro meu rosto no encosto do sofá.
— Não entendi.
— Na bo… c..c
— Ora, Emma. Diga logo de uma vez!
— NA BOCA. — Grito.
Amélia cai na gargalha, ela ri, realmente ri da minha confissão. Ela não está me julgando ou fazendo um discurso sobre como isso é errado, ela só está rindo de mim, como se minha confissão fosse uma grande piada. Ela está praticamente rolando no chão.
— Emma, querida. Você não é uma aproveitadora! — Ela diz parando de rir aos poucos.
— Ela nem teve tempo de reagir, simplesmente ataquei seus lábios. Isso me torna uma grande idiota, filha da mãe que se aproveita da falta de movimentos alheios. Anastásia me entregou um adorável bilhete agradecendo por minha ajuda e fiquei tão feliz que acabei beijando-lhe a boca. Mal olho para ela, faz um mês lhe dirijo apenas palavras vagas.
— Você é sempre tão exagerada! O que você fez foi um ato de impulso, guiado inteiramente por seu coração. Querida, você gosta dela de um jeito que ainda não entende ou se nega a entender. Emma, ouça! O que você fez foi algo terno, movido apenas pela emoção, não existiam pensamentos ou desejos maldosos naquele momento. Diga isso a Anastásia, aposto que ela entenderá.
— Acha mesmo?
— Claro! Só não se afaste dela, que ideia mais idiota!
— Obrigada, Amélia.
— Estou aqui para isso. Como vai Dominique?
— Insuportável.
— Sem sex*? -Afirmo com a cabeça. — Oh céus.
Algumas horas depois me despeço de Amélia e retorno para casa, mais uma vez está chovendo, quando finalmente chego a noite já se faz presente.
— Oi, pessoal. — Digo para avaliar o quão Dome ainda está brava comigo.
— Oi, Emma. — Ellen responde animadamente.
— Humm. — Dome resmunga.
— Desculpe, por hoje mais cedo Dome.
— Humm.
— Sei que fui uma total idiota com você.
— Humm.
— Sei também que você está se fazendo de durona.
— Humm..
— Mas, se voltar a falar comigo lhe darei algo que você gosta muito.
— Hum?
— Fui até a casa de Amélia e ela fez…
— Biscoitos com gotas extras de chocolate — Ela se levanta do sofá e tenta pegar os biscoitos que tenho em mãos, mas como sou mais alta e rápida sua tentativa fracassa.
— Você me perdoa?
— Não sei se serei capaz.
— Amélia disse que só poderia lhe dar os biscoitos depois que me perdoasse.
— Ok...Eu desculpo, você.
— Tome seus biscoitos.
— Gotas extras de Chocolate? — Ellen pergunta curiosa.
— São uma criação de Amélia, para devolver Dome ao eixo.
— Hey!
— Onde está Anastásia? — Mudo rapidamente de assunto.
— Lá fola… — Dome diz com a boca cheia, sua pronúncia fica engraçada. — Praticando naquele saco.
— Você deixou? Sarah está com ela?
— Emma, ela não precisa mais ser acompanhada. Quanto tempo faz que não vê Anastásia? Ela já está completamente independente.
Não acredito que ela já consegue ir até à garagem sozinha, a vi praticando algumas vezes, mas não pensei que ela chegaria tão longe em tão pouco tempo. Tomo um banho rápido, visto calça moletom e uma camiseta desbotada.
Vou até à garagem, ouço o barulho de batidas, entro silenciosamente e lá está ela. Seu cabelo em um rabo de cavalo, ela também veste uma calça de moletom. Fico de boca aberta ao ver os socos e os chutes que ela desfere no saco de pancadas. Ela está se movendo de forma ágil, nem parece aquela garota em que precisei dar banho ou ajudei a se alimentar, ela estava por conta própria agora.
Resolvo me aproximar, assim que nota minha presença ela para. Trinta e um dia se passaram desde a última vez que em fitei esses olhos, acreditei que seria mais fácil encara-los agora, mas me enganei profundamente. Anastásia, se aproxima de mim com rapidez, ela não está mais frágil, na verdade, eu me sinto frágil diante do poder que ela está exalando. O olhar firme em mim, sei que ela quer me dizer algo mais ainda não consegue.
— Oi! — Digo timidamente. — Eu gostaria de pedir desculpas mais uma vez por tê-la beijado. — Encoro seus olhos e um vejo irritação neles, eu sabia, ela me odeia. — Juro que não queria aquilo. — Nesse momento ela passa por mim, é aí que noto que ela ainda não se recuperou totalmente, ainda está mancando um pouco. A sigo para dentro de casa, vejo ela subir as escadas com um pouco de dificuldade. — Anastásia, por favor me ouça. — Estamos no topo da escada. — Olha, sei que foi errado… — De repente um clarão invade a casa, depois um estrondoso trovão. Agarro-me ao pescoço de Anastásia, a pego de surpresa e acabo desequilibrando nós duas. Assim que percebo a queda iminente, a solto e a empurro pelos ombros, ela segura no corrimão enquanto escorrego pelos degraus.
— EMMA! - Não sei o que me atinge mais a dor do impacto ou a força da surpresa por ouvir meu nome ser dito por ela. Antes de fechar meus olhos vejo Anastásia se aproximar.
— Emma...
Sua voz ecoa mais uma vez, e o pouco que minha limitada consciência ainda me permite registrar, é que seu tom rouco atravessou meu corpo com mais intensidade do que qualquer outra coisa que já ouvi na vida e é com esse pensamento que me entrego a escuridão.
Fim do capítulo
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Marta Andrade dos Santos
Em: 09/11/2021
Vixe! Queda de escada sem me faz lembrar de Nazaré kkkkkk
Resposta do autor:
Kkkkkk ícone
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