EPISÓDIO 19 - Agnes
A semana prometia ser movimentada para Fernanda e seus companheiros de investigação. O primeiro compromisso foi encontrar no prédio da Defensoria pública, Agnes Silveira, a testemunha do incêndio do Nossa Senhora das Graças.
Fernanda foi acompanhada de Ferreira, o primeiro empecilho já impacientava a morena:
-- Porr*! São quase dez horas! Só a gente trabalha no serviço público desse país? – Fernanda resmungou com o colega.
-- Calma Nanda, ela pode estar atendendo algum cliente, ou em uma audiência...
-- Ahan... Ferreira nós chegamos aqui as 8:30...
Enquanto Fernanda se preparava para discorrer sobre o atraso da defensora ao trabalho, uma mulher se aproximou, por trás da policial. Ferreira a observou abobalhado, pela expressão do colega, Fernanda supunha que se tratava de uma beldade.
-- Precisei atender um cliente na delegacia, pontualmente as 7:30 instruí-lo para uma audiência que acontecerá à tarde. Perdoe-me fazê-los esperar, mas, como não havia hora marcada, só me apressei quando fui avisada sobre a presença de vocês. Agnes Silveira, em que posso ajudar?
A beleza da mulher deixou os detetives sem palavras por segundos literalmente. A calça social justa, delineava suas curvas bem moldadas, a fina blusa ressaltava seu belo colo envolto em um colar delicado, o cabelo castanho em estilo “Chanel” repicado deixando a nuca desnuda davam um charme a mais, a pasta de couro no mesmo tom do scarpin finalizavam o visual elegante e charmoso. O silêncio persistiu até Ferreira pigarrear e se apresentar.
-- Ram ram, desculpe-me doutora Agnes, agente Ferreira da polícia civil, divisão de homicídios, e esta é minha colega Agente Garcia.
-- Bom dia, policiais. Em que posso ajuda-los?
-- Você foi testemunha na adolescência do incêndio do Colégio Nossa Senhora das Graças, e bem, estamos fazendo uma investigação e nos ajudaria se você nos esclarecesse alguns detalhes sobre o ocorrido.
Fernanda disse, a mudança de postura da advogada foi visível: empalideceu, mexeu nervosa nos cabelos e respondeu notoriamente incomodada:
-- Mas... Depois de tanto tempo, quinze anos? Por que agora esse caso está sendo investigado? Há algum novo elemento?
-- Doutora Agnes, a senhora entende que existe o segredo de investigação, não podemos revelar isso, mas, como um membro do ministério público, a senhora entende que detalhes são muito importantes em qualquer processo, nesse caso especificamente, seus esclarecimentos seriam muito úteis.
Fernanda argumentou com seu poder de persuasão peculiar.
-- Vamos até meu escritório. Eu sinceramente não vejo como posso ajudar, mas quero contribuir no que puder.
Mais calma, mas ainda ansiosa, Agnes indicou a direção da porta do seu escritório, convidando os policiais a entrarem.
-- Agente Garcia, seu rosto me é familiar... – Agnes comentou depois de se acomodarem nas cadeiras do seu pequeno escritório.
-- Meu rosto é muito comum doutora. – Fernanda desconversou, não queria que Agnes a associasse ao incêndio – Vamos ser diretos porque imagino o quão atarefada a senhora seja e não queremos tomar muito do seu tempo.
-- Pois não.
-- Como já falamos, estamos investigando o incêndio do colégio Nossa Senhora das Graças, em 1997, conferimos no inquérito que a senhora foi testemunha da tragédia, consta na investigação que foi a senhora que acionou o corpo de bombeiros. – Ferreira começou a falar.
-- Sim, foi uma tragédia, perdi uma colega na época, já faz muito tempo, o que vi, relatei para polícia na época.
-- Eu li seu depoimento doutora. A senhora relatou que viu a fumaça e ouviu os gritos do pátio do colégio, e já que estava diante de um telefone público, resolveu a senhora mesma ligar para os bombeiros. – Ferreira continuou, enquanto Fernanda tentava se lembrar daquele rosto entre as alunas do antigo colégio.
-- Sim, foi isso o que aconteceu.
-- Mas, pela planta do colégio, que apesar de reformado, mantém a mesma estrutura, o pátio do colégio de onde a senhora afirma de visto a fumaça e ouvido gritos, é distante consideravelmente do teatro, há uma quadra poliesportiva entre o pátio e o prédio que abriga o teatro, logo, ver a fumaça seria difícil, exceto se o incêndio estivesse avançado e as chamas altas, ouvir gritos então seria impossível... – Fernanda prosseguia quando foi interrompida pela advogada.
-- Espere um pouco... O que vocês estão insinuando? Acham que menti no meu depoimento de anos atrás? Eu era uma adolescente, testemunha de uma tragédia, estava sob estresse pós-traumático, eu posso ter me atrapalhado em algumas palavras, mas não menti em nada.
-- Calma doutora, não estamos insinuando nada, como antecipamos, gostaríamos de alguns esclarecimentos só isso. – Ferreira ponderou.
-- Não é o que o tom de vocês sugere! – Agnes levantou-se nervosa.
-- Ora doutora, nosso tom? Somos investigadores, perdoe nosso tom, já é meio que próprio do nosso diálogo, vício da profissão. Agora se a senhora puder esclarecer essa confusão de palavras na descrição do evento traumático, poderá nos ajudar a entender alguns fatos.
Senhora da situação, Fernanda insistiu, reconhecendo que o nervosismo da advogada indicava que algo estava sendo escondido.
-- Foi um dia traumático, agora que vocês questionaram isso, não consigo ter certeza de onde vi a fumaça, só sei que vi e antes de encontrar alguma freira, vi o telefone público e decidi eu mesma ligar para os bombeiros. Deduzi que não havia ninguém lá no teatro, até ouvir gritos. Por certo, estava mais perto do que eu relatei e não no pátio.
Agnes falou com a voz trêmula. Obviamente não convenceu Fernanda, como boa investigadora, ela aprendera a distinguir sinais de insegurança nas falas de quem ela inquiria nas suas investigações.
-- Acho que a senhora já respondeu o que queríamos, agradecemos a colaboração doutora. Se a senhora se lembrar de mais algum detalhe, esse é meu cartão, tem os telefones da delegacia, por favor, não relute em me ligar.
Fernanda entregou o cartão e propositalmente esperou Agnes conferir o nome impresso nele:
-- Fernanda? Fernanda Garcia? Mas... É você? A Nanda? – Agnes perguntou surpresa.
-- Esse é meu nome, e sim, meus amigos me chamam de Nanda, estudamos no mesmo colégio, e fui testemunha do incêndio como você, mas só soube recentemente que havia mais uma testemunha, além de nós as vítimas.
-- Você não voltou mais ao colégio depois do incêndio, por certo, não soube por esse motivo. Você não se lembra de mim? – Agnes perguntou curiosa.
-- Minha memória fotográfica é ruim, e acho que apaguei muita coisa da época do Nossa Senhora das Graças, pelo trauma como você pode imaginar. Desculpe-me, não me lembro de você mesmo...
-- Ainda joga vôlei?
-- Sim, na praia, por que? Você joga?
-- Éramos do mesmo time Nanda...
Agnes comentou com um tom decepcionado pelo fato da policial não se lembrar dela. Fernanda deixou a sala com Ferreira e comentou:
-- Acho que essa história da doutora aí merece ser “escavacada” heim parceiro?
-- Pode ser verdade Nanda, já faz muito tempo, ela pode mesmo ter se confundido...
-- Caraca homem é tudo igual mesmo... Até tu Ferreira?
-- Do que você está falando Nanda?
-- Só porque a mulher é bonita você está sendo tão compassivo... Homem quando vê mulher bonita só pensa com a cabeça de baixo... Francamente Ferreira, que decepção! Com sua experiência como investigador, não percebeu como a doutora ficou nervosa, gaguejando, articulando uma desculpa?
-- Que exagero!
Ferreira resmungou, mas não contra argumentou, no fundo ficou meio abobado com a beleza da defensora.
-- Quero uma devassa na vida dessa mulher, saber tudo dela, já sei quem vai me ajudar nisso...
Fernanda disse antes de entrar no carro, ligando imediatamente para Dulce.
-- Fala que achou a Agnes, Nandita! – Dulce atendeu.
-- Achei sim, estou saindo do escritório dela, Dulce, acho que ela esconde algo, preciso que você investigue tudo dela, se é casada, com quem, os casos que ela atuou, facebook, instagram, twiter, quero tudo! Ficha policial ela não tem, já que trabalha no ministério público, mas aquela fuçada geral você pode dar e me repassar tudo, no final da tarde, encontre-me na casa dos meus pais, ela deixou escapar que jogava vôlei comigo, tenho fotos antigas lá em casa, quem sabe vendo a foto dela na época a gente se lembre de algo, vou tentar contatar as meninas do time, enfim, vamos fuçar!
-- Era meu sonho, ouvir você me pedindo pra fuçar a vida de alguém! – Dulce brincou.
-- Fico te esperando, as 17h na casa de mamacita ok?
-- Fechado!
Dulce desligou o celular sob o olhar atento de Gisele.
-- Era a Nanda?
-- Era. Ela localizou e conversou com a tal Agnes, descobriu que ela jogava no mesmo time de vôlei, vou fazer uma pesquisa sobre a tal e depois vou encontrar a Nanda na casa dos pais, pra vermos fotos antigas, para ver se lembramos dela, enfim...
-- Dulce! Deixa que eu vou! Ou pelo menos me dá uma hora a sós com a Nanda no quarto dela da casa dos pais, no meio das nossas fotos antigas, no cenário onde nos amamos, é a minha chance de apelar para nossas memórias e despertar o que ela sente por mim...
-- Gi, não faz isso...
-- Dulce eu não vou desistir da Nanda sem lutar!
-- Eu não ia te dizer isso pra não te decepcionar, mas, vou ser obrigada a falar pra você não criar expectativas...
-- O que?
-- A Nanda, ela tem alguém... Está apaixonada Gi, não me disse quem era, mas desconfio que seja mesmo a Letícia.
-- Apaixonada?
-- Ela não falou com essas palavras, mas deixou subentendido... Não força a barra Gi, ela está em outra.
-- É uma dedução sua, não vou desistir da Nanda por uma dedução sua.
-- Gi, ela me disse que estava com alguém e que me apresentaria no momento certo...
-- Mas ela não disse que estava apaixonada, Dulce ela me amou, ou quem sabe ainda me ama e esse sentimento está adormecido, por favor, a que horas vocês vão se encontrar?
-- As 17h. Mas, Gi, você está se iludindo...
-- Então, chegue só as 18h, me dá uma hora com a Nanda no meio das nossas lembranças, onde nosso amor nasceu, é tudo que preciso pra ter a certeza de que o que eu sinto não é delírio nem ilusão, ainda há algo para eu e a Nanda vivermos juntas.
-- Gisele desencana! Você só vai conseguir irritar a Nanda com essa insistência...
-- Dulce eu preciso dessa chance, dessa oportunidade, se eu não estiver certa, eu te prometo que desisto e vou me contentar em ser só o passado da Nanda e tentar reconquistar ao menos nossa amizade e só.
Dulce revirou os olhos e suspirou alto.
-- Gisele, eu chegarei lá às 18h, e você não me envolva nisso, não quero que a Nanda perca a confiança em mim justo agora que ela está me deixando participar da investigação...
-- Pode deixar!
Gisele deu um beijo no rosto da amiga em agradecimento, interiormente se preparava para o encontro com Fernanda, no qual o passado seria seu aliado.
***********
Fernanda estava na sua mesa, concentrada na busca de informações sobre o incêndio, e sobre a vida de Agnes Silveira, quando sentiu o perfume inebriante e familiar que lhe incendiava, sabia, era a namorada se aproximando.
-- Bom dia Agente Garcia... – Letícia falou com um sorriso arrebatador nos lábios.
-- Bom dia doutora Letícia...
Letícia passou pela mesa de Fernanda deixando um papel cair, deu uma piscadela de olho para a morena que correspondeu entendendo o sinal. Fernanda recolheu o papel enquanto acompanhava o rebol*do da médica andando até o elevador, desfilando suas curvas naquela saia justa e camisa colada. Suspirou e leu o que tinha no papel deixado por Letícia:
-- “Saudades da minha morena, te quero”.
Fernanda sorriu, imediatamente sacou o celular e enviou uma mensagem de texto para o celular da namorada:
-- “Também te quero minha ruiva, saudades, rola um beijo de sobremesa do almoço?”
A resposta não tardou:
-- “Já está na hora seu almoço? A sobremesa está pronta, venha buscar”.
Fernanda empurrou a cadeira para trás rapidamente com o corpo e seguiu para o sétimo andar, duas batidas na porta e ouviu a voz da namorada autorizando sua entrada. Colocou só a cabeça para dentro da sala dizendo:
-- Cadê minha sobremesa?
Letícia abriu o sorriso que arrebatava Fernanda, levantou-se imediatamente e abraçou a namorada sussurrando:
-- Como o dia fica longo sem te ver... Quanta saudade pode crescer no intervalo de algumas horas?
-- Meu bem, estamos na metade do dia ainda... Não ia aguentar até a noite sem te ver... Mas, quero minha sobremesa.
Letícia encarou Fernanda com paixão, acariciou seu rosto com ternura e beijou os lábios da namorada suavemente, lentamente, movimentos de lábios e línguas coordenados, saboreavam-se, deleitaram-se naquele sabor doce daquele beijo, mais doce do que qualquer sobremesa fina.
-- Uau... – Fernanda suspirou com a testa colada na testa de Letícia – Com uma sobremesa dessas, eu dispenso todos os pratos principais...
-- Vem cá, senta aqui perto de mim, percebi você tensa na sua mesa... Algo na investigação?
Fernanda segurou a mão da namorada e sentaram-se lado a lado no sofá.
-- O que está acontecendo, não é só preocupação com o trabalho não é?
-- Como você consegue perceber essas coisas em mim? Por que eu não consigo te esconder o que eu sinto heim? – Fernanda perguntou acariciando o rosto da namorada.
-- Não sei... Mas posso sentir... Você ás vezes é transparente como água para mim, outras vezes se fecha em copas, e é difícil me aproximar da Fernanda, e só a agente Garcia com essa aparência inabalável fica à mostra...
-- Eu não sou inabalável meu bem... Nem escondo segredos, só não me abro facilmente para que as pessoas não vejam o quão sentimental eu sou... – Fernanda riu.
-- Você não precisa esconder seus sentimentos de mim, não vou feri-los nunca, estou descobrindo o amor de verdade com você Fer, estou em redescobrindo ao seu lado, é algo tão intenso e grandioso que às vezes me assusto.
-- Você não está sozinha nesse cenário Lê. Está tudo diferente em mim. Estou procurando tudo que há de melhor em mim pra te mostrar e te dar.
-- Não precisa se esforçar, você tem me dado o que nunca tive antes, você em todas as suas faces, tem feito eu me apaixonar todos os dias um pouco mais...
Fernanda ruborizou, Letícia segurou o rosto da morena entre suas mãos e depositou um beijo delicado nos seus lábios.
-- Agora me diz, o que está aumentando sua tensão, sua angústia?
Fernanda deitou a cabeça no colo de Letícia e desabafou:
-- Culpa. Eu, as meninas, simplesmente sumimos da vida da família da Mari quando ela morreu, eles enfrentaram tanta coisa, a Mari era tão especial, acho que não nos dávamos conta do que nossa amizade era pra ela...
-- Meu bem, vocês eram adolescentes, não se martirize por isso, o que mais vocês poderiam fazer? Tenho certeza que a amizade de vocês fez muito bem a ela, vocês a acolheram, no meio de mundo adolescente, pertencer a um grupo é fundamental para enfrentar todas as mudanças.
-- Penso que tenho uma dívida com a Mari, pelo que aconteceu a família dela. Meu instinto diz que estamos muito perto de descobrir segredos que envolvem bem mais do que os assassinatos, mas também sobre a morte da Mari.
**********************
Fernanda chegou á casa dos pais um pouco antes do horário marcado com Dulce, não escapou do interrogatório da mãe sobre Letícia e a relação delas. Sem paciência mesmo com as intervenções da avó, Fernanda foi curta e direta, deixando Augustina ainda mais incomodada com a firmeza da filha ao afirmar os sentimentos pela médica:
-- Mamacita, eu não me importo com as suas hipóteses ou impressões que a senhora tenha a respeito da Letícia, eu gosto dela, e pela primeira vez na minha vida desde que a Gisele me deixou, penso em dividir minha vida com alguém. É bom que a senhora se desarme desses preconceitos e comece a ver a Letícia como sua possível nora e não como namorada minha a ser hostilizada pela senhora. Vou para meu quarto, quando a Dulce chegar, pede para ela subir.
Augustina ficou sem palavras, boquiaberta, começou a lavar a louça resmungando palavrões em espanhol, sob os risos silenciosos da mãe, que vibrava pela felicidade que a neta expressava.
**************
Em meio a dezenas de caixas, dessa vez, Fernanda foi provida de uma máscara e luvas, dadas pela namorada, para evitar uma nova crise de alergia com o contato de papéis empoeirados, mesmo que mais bem cuidados que os arquivos da polícia.
Localizou as fotos do antigo time de vôlei, e procurou pelas escassas lembranças a identidade de cada uma daquelas meninas. Precisava mesmo de Dulce ali, ela tinha uma excelente memória. Animou-se quando ouviu as batidas na porta, de costas foi recebendo a amiga com um elogio:
-- Pontual! Muito bem, estamos evoluindo Dulcinha!
-- A Dulce vai se atrasar um pouco, ela disse que encontrou algumas informações importantes sobre os casos que a Agnes atuou, mas ela vem, pediu que eu avisasse.
Gisele falou entrando no quarto. Fernanda se surpreendeu com a presença da escritora ali.
-- Ela te fez vir aqui só pra me dizer isso? Não podia me ligar?
-- Na verdade me ofereci pra vir, se é pra relembrar coisas do nosso passado, acho que posso ajudar também.
-- Então senta aí – apontou para o lado contrário da cama – E olha essas fotos, veja se você reconhece alguém, e alguma história dessas pessoas...
Gisele se sentou, mas, ao lado de Fernanda. Pegou as fotos e disfarçou olhando para elas, mas com o rabo de olho, observava a policial.
-- Esse quarto... Nossa, me traz tantas lembranças... – Gisele comentou, tentando introduzir o assunto do passado delas juntas – Essa cama...
-- Gi, olha as fotos, essa garota aqui do meu lado, eu me lembro, era levantadora do time, Cássia, ela viajou conosco para São Gonçalo nos jogos interclasse do Nossa Senhora, essa aqui também me lembro, era uma chorona, qualquer quedinha ela já mancava, deixava a gente na mão... Essa aqui, é a Roberta, parceirona! Era a maior pontuadora do time, você se lembra de mais alguém?
-- Sim, essa aqui, do lado da Roberta, a Alice, era do clube de literatura comigo.
Aos poucos elas iam identificando os rostos, relembrando histórias de campeonatos, de competições e eventos da escola que ligavam as memórias daquelas fotos. Gisele aproveitava para inserir naquele contexto, histórias do namoro delas, sutilmente depois de um sorriso desconfortável, Fernanda mudava de assunto. Mas, no meio das fotos, uma perdida, daquelas que a Fernanda tinha certeza ter se desfeito depois de Gisele deixa-la: uma foto das duas, Gisele beijando a bochecha da morena que exibia uma careta cômica, no que parecia ser o espelho do vestiário da escola.
-- Eu me lembro desse dia! Você não jogou, estava se recuperando de uma crise braba de rinite alérgica, fiquei no vestiário com você te consolando...
-- É, eu odiava quando me cortavam do time, pow, uns espirros de nada...
Gisele se aproximou e supreendentemente repetiu o gesto da foto, afastando a máscara do rosto da policial.
-- Gi, para, por favor.
-- Você não tem saudades? – Gisele falou ainda com o rosto bem perto do rosto de Fernanda.
-- Foi uma época boa Gisele, tenho saudades sim dos momentos da minha infância, da minha adolescência, como qualquer pessoa tem.
-- Nanda, estou falando disso aqui – apontou para a foto – Nós duas. Olha esse quarto, quantas vezes nos amamos aqui... Nosso primeiro beijo, exatamente aqui onde estamos sentadas...
-- Gisele isso de novo!? Já conversamos sobre isso, por favor...
Gisele não deu espaço nem tempo para Fernanda argumentar, avançou na boca da morena segurando-a pelo pescoço forçando um beijo voraz, o qual Fernanda a princípio ofereceu resistência, mas acabou se entregando, deixando vir à tona a saudade que estava guardada. O beijo foi longo, Gisele impunha seu desejo sobre o corpo da ex-namorada, saboreando o gosto das memórias felizes junto com a sua recém certeza de que os corpos ainda se desejavam. Mas, Fernanda interrompeu o beijo de maneira brusca, empurrou Gisele e se levantou da cama.
-- Chega Gisele. Se você veio aqui para ajudar, será bem vinda, mas se veio com esse tipo de intenção, está perdendo seu tempo.
Gisele deixou escapar um sorriso, meneou a cabeça e respondeu:
-- Meu amor, seu corpo me deu as respostas que eu precisava. Está aí, tudo guardado. Nossa história não acabou.
-- Quem determina o término e o início das minhas histórias não é o meu corpo, é o meu coração, são meus sentimentos, e te adianto que hoje eles são todos para outra pessoa, não para você. O que acabou de acontecer foi um erro, que não vai se repetir, e que não mudou em nada o que já conversamos, nossa história está no passado.
-- É ela não é? É a doutora que te impede de se entregar a mim... Você está se enganando, escondendo o que sente por mim.
-- Sim estou namorando a Letícia, mas, não é ela que me impede de nada, nem muito menos estou me enganando, a verdade está dentro de mim, eu estou apaixonada pela Letícia, e superei minha história do primeiro amor que tive com você.
Quando Gisele tentou argumentar, Dulce, como se estivesse esperando o melhor momento para entrar ouvindo de fora a discussão das duas, bateu à porta entrando em seguida sem esperar autorização.
-- Desculpe-me o atraso, mas, Nanda, trouxe um dado importante: Agnes Silveira, foi a advogada de defesa indicada pelo estado para defender Mauricio da Silva, o irmão da Mari. E não só uma vez...
-- Que descoberta interessante... – Fernanda pensou alto.
-- E tem mais... Foi ela quem reconheceu o corpo dele na penitenciária, a família autorizou isso, alegando não ter condições de fazê-lo. – Dulce complementou.
-- Mais interessante ainda! – Fernanda disse intrigada.
Dulce pegou uma das fotos espalhadas na cama, enquanto Gisele enxugava as lagrimas do rosto, amargando sua recente desilusão amorosa.
-- Ei! Essa pentelha aqui era o chicletinho, lembra Nanda? – Dulce apontou para uma menina franzina no canto da foto. – Estava sempre de trancinhas, apelidamos ela de chicletinho, ela estava em todos os lugares que estávamos.
-- Eu me lembro sim! Gente, como era o nome dela? Só chamávamos de chicletinho, mas o nome... – Fernanda comentou.
-- Essa é a Agnes! – Gisele disse ao ver a foto. – Lembro dela porque ela estava no clube de literatura também, e ela repetia sempre o nome dela quando eu a chamava por : “ei de trança”, vendo o rostinho dela, agora me lembro!
As três se entreolharam, e a conclusão de pensamentos era uma só. Agnes era o ponto chave a ser desvendado para entender o incêndio e os assassinatos. Dulce foi a primeira a pensar alto:
-- Se estamos falando de algum tipo de vingança do chicletinho, pelo bulliyng que aprontamos com ela, a relação com o seu livro Gisele, acabou. Agora seremos nós as próximas vítimas.
Fim do capítulo
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