Capitulo 30
Capítulo 30º
Alice
- Não precisa ir agora. – escutei a voz de Heloísa.
Ela estava deitada na cama, os lençóis bagunçados indicavam a grande quantidade de movimentação que houve ali. Fitei a negra que esperava por uma resposta minha. Eu já estava terminando de vestir minha calça.
- Se eu ficar mais, vamos trans*r de novo e eu vou acabar dormindo aqui.
- E isso seria tão ruim? – questionou ficando de joelhos e me puxando pela arreata da calça. – Posso fazer aquela coisa que você adora. – tocou seus lábios nos meus.
- Qual delas? Adoro tudo o que você faz. – afirmei e ela sorriu. – Mas nos combinamos nada de dormir juntas.
Esse era de fato uma das regras sobre o nosso envolvimento. Heloísa costumava dizer que para me levar para cama teve que assinar um contrato. Mesmo sendo brincadeira dela, tenho noção de que aquela era a minha forma de evitar um envolvimento maior. No caso uma paixão. Não que nossos encontros fossem recentes, nada disso. Já estava com mais de um mês que nossas tardes eram regadas a intensas horas de sex*.
- Eu sei que combinamos. Mas dormir juntas não vai fazer você se apaixonar por mim.
- Sei que não. Mas prefiro...
- Não correr o risco, eu sei. – saltou da cama. – Vai sair hoje?
- Sim. Fiquei de encontrar o pessoal na boate. Quer dá uma passada lá depois que sair do pub?
- Não posso. Hoje tem música ao vivo. E só saio de lá de manhã.
- Uma pena.
- Sim. Uma pena. Iria adorar iniciar meu dia fazendo um sex* delicioso com você. – falou provocativa. – Quem sabe a tarde?
- Quem sabe. – dei de ombros. – Agora eu vou indo. Beijos.
- Beijos.
Dirigi tranquila enquanto pensava em toda essa insistência de Heloísa para que eu ficasse mais tempo. Sei que as horas que passamos juntas são extraordinárias, mas talvez estivesse no momento de tentar amenizar nossos encontros. Ao chegar em casa fui direto para o quarto. Mas não demorou e a porta foi aberta de forma abrupta.
- Você sabia?
- Sobre?
- Alice, não minta para mim. Eu sou sua mãe. – vi suas narinas subindo e descendo em um sinal total de que ela estava com raiva.
- Eu sei que você é minha mãe, mas não tenho como dizer algo que nem sei do que se trata.
- Acabei de vir da casa da sua tia. – droga. Anna, pensei comigo mesma. Mas logo mudei meu foco, já que pela cara da mammy ela seria capaz de ler até meus pensamentos.
- E?
- Ela está se envolvendo com a Anna.
- Mammy, isso não é da sua conta. – dei de ombros.
- Não. Mas é uma falta de vergonha. Olha a diferença de idade delas duas. Sua tia acabou de sair de um divórcio. Se é que saiu, já que a mamãe me contou que os dois saíram para jantar um dia desses.
- A idade não tem importância. Você se incomodaria caso eu me envolvesse com alguém mais velha, tipo a Rebeca por exemplo?
- Alice deixa de bobagem. A diferença de idade de vocês nem é tão grande assim.
- Lógico que é. O único problema que você vê no namoro das duas é a sua preocupação com a tia Iara. Mas pelo que sei a Anna está sendo fiel a ela. Já a titia, não tenho certeza.
- Não sei o que deu nessa família. Só falta daqui a pouco o papai deixar a mamãe.
- Palavras têm poder, dona Isabella. – ela me encarou séria. – Mammy, por falar em Rebeca, tem a visto?
- Não. Ela está ficando uns dias na sede da empresa. Resolvendo algumas coisas com o Ruan.
- Hum. Tudo bem. Outra coisa.
- Diz.
- Acho que já está passando da hora de você e a mamma saírem de férias. – comentei e ela apenas concordou. Saindo do quarto em seguida.
Me atirei de volta na cama. Preciso saber da Anna sobre o tal jantar da minha tia com o ex-marido. Se ela fizer minha amiga sofrer não vou me importar com o fato dela ser minha tia, vou acabar com a raça dela.
Desbloqueei o telefone procurando o nome de Anna. Mas acabei passando pela conversa de Rebeca. Desde o dia que saímos para correr e eu disse que teríamos mais uma prova para concluir a aposta, ela simplesmente sumiu. Agora sei ao menos o motivo. Com certeza deve estar trabalhando muito.
Não nos falamos há alguns dias, e nas poucas vezes que nos falamos ela me pareceu bem distante e fria. Não fez piadas e muito menos provocações. Nem ao menos me chamou de pirralha como era de costume. Assim decidi que era melhor esperar até que ela falasse comigo. Deixei os pensamentos a respeito de Rebeca de lado e voltei minha atenção para o celular. Disquei o número de Anna e ela me atendeu no segundo toque.
- Aonde você está?
- Na Iara. Você não vai acreditar...
- Vou sim. A mammy viu vocês.
- Isso. Disse tantos absurdos a Iara. Que ela estava passando por uma crise de meia idade, que não estava pensando com clareza. Como se eu fosse o ponto da crise dela.
- Acredito no que me diz. Ela veio me acusar de saber de tudo.
- Imaginei. Acha que ela teria coragem de contar ao Cadu?
- Esse é o medo da tia Iara? Afinal pelo tempo que estão juntas já era para ele saber disso não acha?
- Sim. Mas ela fala que ainda não encontrou o momento certo. – revirou os olhos.
- Olha, não quero me meter. Mas você sabe sobre um jantar que ela teve com o George?
- Como assim?
- A mammy comentou sobre ela ter saído com ela. Segundo o que a vó Helena contou.
- Vou tirar essa história a limpo.
- Só vai com calma. Tá?
- Pode deixar. Vai mesmo sair com os meninos?
- Sim. Miguel disse que vai levar uma amiga para me apresentar.
- Mais uma para dormir e cair de amores por você. Igual a Heloísa.
- Heloísa não me ama. O que temos é apenas sex*.
- Sei. –riu em seguida. – Boa farra. Juízo e não faça nada que eu não faria.
- Vai sobrar pouca coisa. Rainha da safadeza. – brinquei e ela sorri encerrando a ligação.
Acabei dormindo em seguida. Meu corpo estava cansado de toda a atividade com Heloísa. Quando acordei já era noite. Desci para o jantar e encontrei minha adorada família toda reunida.
- Pensei que ia sair hoje.
- Vou sim mamma. Mas primeiro preciso fazer companhia a vocês durante o jantar.
- Pode assumir, você ficou pela comida e não por nós. – Bernardo comentou rindo.
- Você me pegou. – eles riram.
- Já que todos estão aqui. Queremos informar que semana que vem sua mãe e eu iremos viajar.
- Até que enfim. – Arthur falou. – Isso significa que vamos ficar na casa da vovó?
- Sim. E o Biel também. Já que o tio Isaac e a tia Mile irão conosco.
- Pensei que era uma viagem de lua de mel.
- Na verdade, é uma viagem sem crianças. – a mammy comentou sorrindo.
- E quem é criança aqui? – Arthur questionou com a cara de bravo.
- Vocês, serão sempre meus bebês. – apertou a bochecha dos dois. Agradeci por estar longe suficiente dela.
- Mas eu vou poder ficar em casa, não é?
- Desde que tenha responsabilidade. Sim. – a mammy me fitou séria.
- Sempre sou responsável. – dei de ombros.
- Nós sabemos, mas não custa nada frisar isso. – as duas sorriram para mim.
O jantar seguiu sem mais acontecimentos. Após nossa refeição os quatro foram assistir um filme. Eu me despedi alegando que precisava me arrumar para sair com os meninos. Tomei outro banho, vesti a roupa que já havia separado. Fiquei pronta antes do combinado e decidi dá uma passada no pub antes de ir para a boate. Essa noite não vou beber. Pois os meninos garantiram que irão enfiar o pé na jaca. E alguém precisa ser o motorista do rolê.
- Espero que o seu atendimento seja bom, para eu poder te dar uma ótima gorjeta. – brinquei me apoiando no balcão do bar. Heloísa virou para mim sorrindo.
- Uau! Você está linda. – comentou sem tirar seus olhos de mim.
- Obrigada. – agradeci sentindo meu rosto corar.
Se instalou um clima estranho, nossos olhares travaram uma batalha silenciosa. Os dela pareciam analisar a minha intenção em ter me arrumado demais para sair sozinha com os meninos. Ficamos nesse embate por alguns minutos.
- Hoje você monta um harém. Me chama se não der conta. – sorriu e eu relaxei brevemente.
- Pode deixar que eu chamarei. Mas acredito que posso dar conta do harém. Enfim, só vim te dar um oi. Preciso ir ou vou chegar atrasada. – sorri para ela, que retribuiu e mandou um beijo no ar.
- Vai lá. Divirta-se.
- Com certeza.
A boate ficava apenas a alguns quarteirões do pub. Dirigi até lá sem pressa. Parei em um sinal e me distrai com uma mensagem que chegou. Escutei as buzinas atrás de mim e deduzi que o sinal havia aberto. Acelerei o carro e me assustei quando vi alguém ainda atravessando a faixa de pedestres.
- Meu Deus! – gritei freando o mais rápido que consegui. Senti meu corpo ser jogado para cima do volante.
Soltei o sinto sentindo meu braço doer. Sai do carro para ter certeza que a pessoa não havia sido atingida. Mas paralisei quando vi quem era a pessoa que eu quase matei. Virgínia estava na minha frente encarando os joelhos, um deles apresentava um pequeno corte. O que deduzi ter acontecido devido ao rasgo que a calça que ela usa tinha.
- Virgínia?! Você está bem? Eu não te vi. – me aproximei ficando na mesma altura que ela.
- Estou sim. Mas acho melhor tirar o seu carro do meio da rua. – me sorriu, aceitando a mão que eu prontamente lhe estendi. Os motoristas estavam buzinando alto.
- Claro. – dei as costas. – Vem?
Pareceu analisar minha proposta, sentei e ela continuava parada no mesmo lugar. Acenei para que ela entrasse. Saiu do transe que se encontrava e veio até o carro ocupando o banco do passageiro.
- Você tem certeza que não se machucou? Posso te levar para o hospital. – questionei quando dei a partida.
- Relaxa, está tudo bem. Foi apenas um susto. E a culpa foi minha, não reparei que o sinal já havia aberto.
- Tudo bem. O que importa é que não aconteceu nada. – fiz silêncio e só então percebi que continuei o caminho para a boate. – Você quer que eu te deixe em algum lugar?
- Para aonde está indo?
- Para a Encantos.
- Eu também. Vou encontrar com o...
- Cadu. – conclui, querendo matar o Miguel por não me avisar que ela também estaria lá.
- Você também?
- Sim. Eles me convidaram. – sorri sem graça.
- A santíssima trindade. – comentou com um meio sorriso. – Se preferir posso dizer que não deu para ir.
- Não. Não precisa disso. Podemos ser civilizadas, não é?
- Claro.
Concordou e o silêncio mais uma vez se instalou. Durante o curto percurso seguimos cada uma presa em seus pensamentos. Procurei um estacionamento e saímos do carro. Minha mente me traia ao aspirar o cheiro dela que impregnou no carro.
- Eles devem estar chegando. – ela falou quando paramos. – Como você está?
- Bem. Estou bem, e você?
- Eu estou bem também. – mais uma vez aquele silêncio constrangedor. – Olha ele. – apontou para uma rua que dava acesso a entrada da boate.
- Vamos?
- Vamos.
A fila estava gigantesca. Virgínia e eu caminhávamos lado a lado. Mas mantínhamos uma distância segura. O silêncio ainda permanecia nos presenteando com sua existência o que na minha humilde opinião era simplesmente desconcertante. Parecíamos duas estranhas como se nunca tivesse acontecido nada entre nós.
- Alice, Virgínia. Juntas? – Miguel questionou com os olhos arregalados.
- Na verdade, quase a atropelei. E por coincidência ela vinha para o mesmo lugar que eu. – o repreendi com o olhar.
- Você está bem? – Cadu questionou se aproximando da amiga.
- Sim. Estou. Não se preocupe. – sorriu sem graça.
- Já que está tudo bem, será que podemos entrar? – Rick indagou. – Estou louco para dançar.
- Claro. – concordamos em coro.
Os três rapazes seguiram de mão dadas formando uma fila evitando que nós perdêssemos. Virgínia sorriu sem graça quando estiquei minha mão para que ela segurasse. Coisa que ela o fez com certa relutância.
Quase dois meses, esse era o tempo que eu passei sem vê-la. Justamente na noite que decido sair para me divertir o universo a joga na minha frente. Literalmente. Agora tenho que controlar a loucura que está meu coração apenas por sentir o calor de sua mão na minha. Ao entramos na boate soltei sua mão rapidamente. Como se fosse um martírio mantê-la presa a minha. O que de fato foi.
- Estou afim de beber. Você vem comigo comprar algo? – Cadu chamou-a.
- Sim. – o acompanhou.
- Sinto muito não ter te dito. Mas sabia que se eu contasse você iria desistir. – Miguel foi logo me explicando quando ficamos sozinhos.
- Com certeza. Tem ideia de que faz quase dois meses que eu não a via? E do nada ela se joga na frente do meu carro. Agora estou aqui com o coração saltando no peito. Detesto isso. – falei exausta.
- Olha, tenta relaxar. Aproveita a noite. Conhece outra pessoa. Afinal acredito que a Amélia deva chegar daqui a pouco.
- Espera, a Amélia vem? – questionei sem acreditar.
- Sim.
- Você ainda é meu amigo? – indaguei com ar de deboche.
- Alice, desculpa. Mas achei que você tinha superado.
- Isso eu também pensei. Até vê-la. – sacudi a cabeça quando meus olhos se prenderam em sua silhueta no bar. Minha mente divagou até a noite que nós nos entregamos em sua casa.
- Vamos lá fora.
- Quero ir embora. – respondi sentindo uma imensa vontade de correr para o mais longe possível.
- Não precisa de tudo isso. Você está aqui por mim. Lembra? – me fitou esperando uma resposta.
- Certo. Por você. – forcei um sorriso.
Havia prometido que sairia com ele. Há dias evitava as baladas. E como agora ele estava namorando, assim como Anna não tínhamos mais tanto tempo livre. Ainda mais que ele tem dois namorados para dar atenção. Não é que eu esteja reclamando, afinal usei minhas horas extras para trans*r com Heloísa.
Meu celular começou a tocar. O tirei do bolso da frente da calça que eu estava usando. Na tela aparecia a foto de Anna. Ela já havia ligado quase dez vezes e mandado várias mensagens. Retornei à ligação.
- Você já está na boate?
- Sim. O que aconteceu?
- Aconteceu que sua tia é uma cadela. – falou furiosa. – Tem como você vir pagar a minha entrada? Estou aqui fora. Esqueci minha carteira em casa.
- Claro, estou indo aí. – Miguel me fitava apreensivo.
- A Anna. Está lá fora. Vou busca-la.
- Vai lá, estaremos aqui.
Caminhei pelo meio da multidão. Levei algumas cantadas toscas de alguns machos heterotops, mas os ignorei e segui para minha missão. Observar aquele tipo de homem me faz cada vez mais desejar gostar apenas de mulheres. Anna estava me esperando próxima a fita que dividia a entrada da boate da fila. Mandei que o segurança deixa-se passar.
- O que aconteceu? - indaguei assim que se pôs ao meu lado.
- Vamos para um lugar menos barulhento. – segurou minha mão e seguiu para o banheiro. – Sua tia está tentando reatar com o George.
- Oi? - meu queixo quase caiu. - Como você descobriu isso?
- Depois do que você me falou eu a questionei. Porém ela negou. Mas acontece que eu vi algumas mensagens dele no celular dela. Falando sobre o quanto a noite deles havia sido maravilhosa e que estava louco para repetir a dose. – ela apertava a borda da pia me encarando pelo reflexo do espelho. Seus dedos já estavam quase sem cor devido à força que fazia.
- Anna, eu sinto muito.
- Estou com ódio. Como ela pode brincar comigo desse jeito?
- Não sei. As pessoas parecem adorar fazer os outros de brinquedo. – me aproximei tocando seu ombro. – Por falar em brincar com os sentimentos dos outros a Virgínia está aí.
- Com os meninos?
- Sim com os meninos. Eu quase a atropelei. Acho que o universo está me achando uma piada.
- Pois somos duas. Quer ir para outro lugar?
- Estamos aqui pelos meninos. Não é?
- Sim. E por mim também. Quero beber até o meu lindo par de chifres cair. – secou as lágrimas e sorriu amargurada.
- Vamos.
Saímos do banheiro de mãos dadas como de costume. A levei em direção ao local que os meninos estavam, mas ao avistar Virgínia e Amélia conversando bem próximas eu estanquei sem conseguir mover minhas pernas, por mais que meu celebro desse o comando não conseguia sair do lugar. O que fez com que Anna esbarrasse em mim.
- Aí! O que deu em você? – indagou reclamando.
Como não obteve resposta, ela olhou na mesma direção que eu olhava fixamente e viu a mesma cena que eu. Amélia segurou a nuca de Virgínia que sorria para ela ao ouvir algo que a outra disse. Logo os lábios se uniram em um beijo delicado. Em seguida houve uma intensa troca de olhares. Eu não estava preparada para ver nada daquilo. Se eu soubesse que ela iria pisotear meu coração minutos depois de eu quase tê-la atropelado teria sido mais eficiente na tarefa que o universo me deu.
- Não, não somos obrigadas a ver a felicidade dessa pilantra que partiu seu coração. Miguel que nos desculpe. Vamos para o camarote. – saiu me puxando escada a cima.
Na minha mente o beijo das duas passava em lupe infinito. A troca de olhares, os sorrisos demonstrando toda a felicidade delas, a cumplicidade. Elas estavam juntas, mas desde quando? Essa era a minha maior dúvida. Será que demorou até que isso acontecesse? Todas essas indagações me deixaram zonza.
- Alice? Acorda. Preciso de dinheiro. – entreguei a carteira no automático.
Anna me guiou até o bar da área vip. Pediu duas bebidas e me entregou uma delas me encorajando a virar.
- Não quero. Estou dirigindo. – dispensei devolvendo o pequeno copo, sabia que misturar álcool com tudo aquilo que ardia dentro de mim não seria uma boa ideia.
- A gente deixa o carro aí. – colocou de volta na minha frente.
- Não posso. Da última vez tentaram arrombar, lembra? – comentei me lembrando da bronca que levei das minhas mães.
- Virgínia está aos beijos com a Amélia lá embaixo. – falou me fitando.
Droga! Ela sabia como me convencer. Sem pensar peguei o copo de sua mão e nem me importei com o que tomei, ingeri todo de uma única vez batendo o objeto na mesa. Sentindo meu corpo aquecer de dentro para fora, me recostei ao banquinho que estávamos sentadas.
- Moço, deixa a garrafa. – chamou o homem que nos olhou como se duvidasse da nossa capacidade de tomar tudo aquilo.
- Você a escutou. – conclui.
Anna nos serviu mais uma vez, brindamos a nossa infelicidade no amor e viramos mais um shot. Assim aconteceu com mais três depois desse. Não trocamos uma única palavra, apenas batíamos um copo no outro e em seguida mandávamos para dentro todo o líquido.
- Querem acabar com toda a bebida da boate? – escutei uma voz atrás de mim.
- Rebeca. – sorri ao ver a mulher.
Os cabelos estavam com um corte diferente, mais curto. A maquiagem leve ressaltava a cor de seus olhos. O batom vermelho marca bem sua boca carnuda. Usava um vestido colado ao corpo realçando suas curvas. E que curvas se diga de passagem.
- Olá.
- Pensei que estava em Ouro Preto. E por falar nisso, obrigada por me avisar. – fui ríspida. Talvez o álcool já tivesse fazendo efeito, ou simplesmente a saudade que ela me causou tenha falado mais alto e me irritado.
- Cheguei hoje. Na verdade, chegamos, Tália estava comigo. Pensei que suas mães teriam avisado que não estava na cidade.
- Por que elas avisariam? – indaguei ainda mais irritada. Lembrando da forma fria que ela me tratou nos últimos dias. Foi cada balde de gelo que se eu tivesse juntado já teria formado um segundo Polo Norte.
- Prazer, eu sou Anna, melhor amiga da Alice. – parecendo entender que aquele embate iria longe, minha amiga tomou a frente tentando mudar de assunto e chamar nossa atenção.
- Claro, perdão. Eu sou Rebeca. – sorriu simpática. Senti seus olhos presos em mim. – Querem companhia? Percebi que estão sem mesa. Podem se sentar conosco, caso desejem. – me encarou esperando uma resposta.
- Depende, sua amiga está solteira. – Anna disse erguendo o copo para Tália que fez o mesmo para ela.
- Sim. Está. – Rebeca sorriu passando os dedos na nuca. Como se coçasse o couro cabeludo.
- Estou indo. – Anna saltou do banco e caminho até a mesa que as duas estavam. Vi minha amiga se atirar ao lado de Tália que sorriu e se cumprimentaram com dois beijos no rosto. Mas a troca de olhar entre elas foi intensa.
- Senti sua falta. – Rebeca falou quase que em uma confissão. Eu desviei meus olhos das duas que estavam sentadas na mesa. Fitei a mulher a minha frente que mantinha um ar cansado. Mas ao mesmo tempo feliz. Como se seus olhos tivessem um brilho diferente aquela noite.
- Mas não fez muita questão de falar comigo. – sustentei meu olhar ao dela.
- Você não tem ideia do tanto de trabalho que eu tive. Eu sei, sou uma péssima amiga. – comentou com um ar mais leve, um sorriso dançava em seus lábios.
- Com certeza, a pior. – frisei. – Inclusive sua estátua já foi removida do meu jardim. – brinquei e ela gargalhou daquele jeito, jogando a cabeça para trás e quase fechando os olhos.
- Prometo fazer algo à altura de uma nova.
- Por falar em nova. Gostei do visual. Ficou...
- Ousado?
- Ia dizer moderno. E lindo. – afirmei e ela enrubesceu.
- Obrigada. Podemos nos juntar as meninas?
Acenei deixando que ela caminhasse na minha frente. Tália e Anna já estavam em um papo divertido. Me apresentei a Tália que me sorriu simpática. Continuamos bebendo e conversando. O álcool já preenchia quase noventa por cento do meu pequeno corpo. Até que o assunto relacionamento foi tocado na mesa.
- Aposto que de todas as desilusões a minha é a pior. – Anna disse com um sorriso amargurado.
- Não tanto quanto a minha que me fez mudar de cidade.
- Essa é boa. – Anna concordou. – Não mudaria de cidade por causa da vaca da tia da Alice. – me fitou.
- Espera! Você namorava a tia da Alice? – Rebeca questionou com os olhos arregalados.
- Sim. Há quase quatro meses, mas hoje descobri que ela está tentando reatar com o marido pelas minhas costas.
- Vacilo. Namorar mulher hetero, e ainda por cima em fase de divórcio.
- Na verdade, o problema não é namorar mulher hetero. É namorar. – afirmei.
- Isso não é verdade. Acredito no amor. – Tália comentou.
- Você vai quebrar a cara mil vezes e continuar acreditando no amor. – Rebeca afirmou.
- Claro, não posso sonhar em ter alguém para compartilhar a minha vida?
- Pode. Mas não acredito no para sempre. – a mulher se serviu novamente. Não sabia ao certo o que ela bebia. – Acredito que as coisas duram o tempo que tem que durar. Digamos que quando você conhece alguém novo, e se apaixona. É como ir em uma loja e escolher um produto, ele já vem com o prazo de validade. Mas, algumas pessoas cuidam melhor do produto, o que faz com que a durabilidade dele seja maior. Só que enquanto isso, outros usam de qualquer jeito. E consequentemente ele vai durar menos. O que foi o seu caso com a tia da Alice. – concluiu seu pensamento e nos três estávamos presas as informações.
- Quero um produto que dure. – Tália disse pensativa.
- Alguns vem com defeito de fábrica. Aí precisamos trocar. E assim a vida segue.
- Nossa, essa reflexão me deixou mais depressiva que o chifre que tomei. – Anna comentou, fazendo com que houvesse uma troca de olhar entre nós e em seguida rimos a valer de sua fala. – É a verdade. Mas agora eu quero saber o desastre de todas vocês. – rodou com o dedo apontado para nós.
- Eu terminei um namoro recente. Ela nem esperou que o meu cadáver esfriasse e já está namorando outra. – Tália disse nos arrancando risadas. – Beca, sua vez agora.
- Fui noiva, descobri que ele me traia. E que a amante, que era também namorada há cinco anos estava grávida.
- Então no caso o defeito foi de fábrica? – Anna questionou se referindo a ultima reflexão que Rebeca fez. A mulher sorriu concordando com um gesto de cabeça. – Alice, sua vez.
- Todo mundo sabe. – dei de ombros.
- Quando a gente fala em voz alta o peso do chifre diminui. Fonte: as vozes na minha cabeça. – impossível não rir do comentário de Anna.
- Namorei uma vez, o namorado era gay e foi exposto me traindo com um cara.
- Caramba! – Tália abriu e fechou a boca. – Você namorava o filho do prefeito?
- A própria chifruda. – gesticulei como se me mostrasse para ela. – Mas como desgraça pouca é bobagem. Eu me apaixonei, e hoje tive que vê-la aos beijos com a nova namorada.
- Mellie está aqui? – Rebeca questionou. O que me fez deduzir que ela já sabia que as duas estavam namorando.
- Sim. Lá embaixo com os meninos. Meu primo é melhor amigo da Virgínia, e meu melhor amigo namora com o meu primo.
- Que rolê, maluco. – Tália concluiu em choque. – Chega de falar de chifre. Quer dançar? - questionou olhando para minha amiga.
- Claro. Vocês vêm?
- Eu passo. – já que para dançar teríamos que ir para a parte de baixo da boate e eu odiaria ter que ver Amélia e Virgínia juntas mais uma vez.
Rebeca esperou que as duas saíssem e veio para mais perto. Na tentativa de podermos falar sem precisar gritar. Por mais que os cheiros se misturassem no ambiente, meu nariz consegui separar o cheiro dela, logo que se aproximou.
- Sinto muito por tê-las visto. – comentou com a voz baixa.
- Não tanto quanto eu. – revirei os olhos tentando apagar o beijo delas da minha mente. – Nunca pensei que fosse encontrá-la hoje. – suspirei pesadamente. – E eu que pensei que a noite seria divertida. – revirei os olhos.
- Mas ainda pode ficar, não é? Que tal a gente encontrar alguém interessante?
- Não estou a fim.
- Vamos lá. Você está linda. Não pode se produzir toda e acabar ficando tão desanimada assim. – bateu seu ombro no meu, me incentivando.
- Essa é a sua tentativa de ter sua estátua de volta no jardim?
- Sim! – afirmou rapidamente. – Quem quer beijar hoje, homem ou mulher?
- Não vejo ninguém interessante. – comentei passando os olhos pelo lugar.
- Que tal aquela japonesa, não para de olhar para você. – apontou na direção.
- Ela não está olhando para mim.
- Claro que está. – afirmou.
- Não, está olhando para você.
No mesmo instante que me escutou dizer isso, sua face adquiriu um tom avermelhado. Acho que ela não era acostumada a ser admirada por mulheres. Mesmo sabendo que não era bem a praia dela, acredito que ela não seria homofóbica caso uma chegasse nela.
- E que tal aquela? – apontou para outro ponto.
Observei a menina que ela me mostrava. Cabelos longos, castanhos. Roupas no estilo skatista e um sorriso perfeito. Me lembrou muito a Virgínia.
- Deus me livre. Ela é a cara da Virgínia. – Rebeca juntou os olhos como se tentasse dessa forma enxergar melhor.
- Você tem razão. Vamos para a próxima. – rodou os olhos pelo local novamente.
- Chega. – toquei sua perna. Seus olhos foram para meus dedos que delicadamente tocavam seu joelho. – Não quero ninguém. Podemos apenas ficar aqui conversando.
- Cla...- pigarreou tentando arrumar sua voz que saiu falha. – Claro. – afirmou me olhando. – Como está o lance com a Heloísa?
- Na mesma.
- Sexo sem compromisso?
- Exatamente. Mas a Anna disse que ela está apaixonada por mim. – conclui bebendo outro shot.
- Quem não se apaixonaria? – indagou com os olhos presos nos meus.
A resposta para essa pergunta eu não tenho. Mas para a minha, sim. E naquele momento o que aconteceria se ela, Rebeca, a toda poderosa heterossexual se apaixonasse por mim? O que aconteceria?
Fim do capítulo
Então. Estou viajando. Por isso ontem não teve capítulo. Vim matar a saudade da minha família. Como o tempo está corrido não vou responder os comentários antigos. Mas para compensar minha falta ontem vou postar 3 capítulo hoje. Dois pela minha divída com vocês e um que é correspondente a amanhã, já que irei para o meio do nada. kkkk
Espero que apreciem sem moderação. E só para deixar claro, não tirem conclusões precipitadas sobre nenhum dos capítulos, leiam tudo, sem me odiar. kkkk
Bom final de semana. e comentem muito. Quando eu voltar para casa responderei todas com carinho. Beijosss
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