Os 48 km que separavam Vila Velha de Guarapari, que geralmente leva 50 minutos, eu fiz em um pouco mais de 30. Eu conhecia bem o percurso, e mesmo sabendo que a estrada era um pouco perigosa, resolvi arriscar, e acelerar um pouco mais. A Ansiedade era tanta que eu não consegui nem mesmo ouvir música, eu só pensava em chegar logo e resolver a minha situação com a Aline.

Desde o momento que decidi ir atrás dela, eu havia colocado na cabeça que não iria esconder o que aconteceu entre Maya e eu, falaria exatamente o que aconteceu desde o dia em que a conheci, e mesmo sabendo que a verdade poderia por fim ao meu namoro, eu não esconderia o fato de ter beijado ela.

Estive em Guarapari muitas vezes, e ao chegar na cidade não foi difícil encontrar a chácara. Quando parei o carro em frente ao portão, fiquei cerca de dez minutos pensando na melhor maneira de começar uma conversa com Aline. Outro fato que me preocupava, era o motivo que fez ela desaparecer daquela forma, e qual seria a reação dela ao me ver.

A noite começava a cair, e o silêncio era quase uma tortura, e ainda dentro do carro tentei ligar pra ela, eu não queria que ela se assustasse com a minha chegada repentina, e torcia para que ela escutasse o barulho do carro.

Quando estacionei em frente a casa, acionei o portão, e tentei me encontrar naquele ambiente até então desconhecido. Achei interessante o fato da construção ser recuada, e a piscina ficar na parte da frente, e percebendo esse detalhe imaginei que dependendo do local onde ela estivesse, não iria ouvir caso eu chamasse do lado de fora.

Caminhei em direção a porta da sala, e estranhei a alguns detalhes no ambiente. A porta estava encostava, as luzes acessas, e uma música tocando em alguma parte da casa que eu não consegui definir exatamente onde era.

Subi as escadas, apreensiva ao ponto de sentir calafrios, e conforme o música ficava mais próxima, eu imaginava que poderia encontrar qualquer situação, até mesmo a que eu não queria.

Quando cheguei em frente a uma porta, onde  provavelmente seria o quarto dela, a mesma também estava apenas encostada, e para não assustá-la eu chamei o nome dela de forma cautelosa.

_Aline, sou eu Nick.

E como resposta, o silêncio, o que me deixou mais apreensiva do que eu já estava. Fui na direção do banheiro e quando bati na porta e não obtive resposta, meu coração parecia que iria saltar do peito e então decidi abrir.

_Aline

A cena que vi quando abri a porta, provocou um misto de alivio e de tranquilidade. Aline estava cochilando dentro da banheira, com a cabeça apoiada na borda e havia duas garrafas de vinho no chão. Provavelmente ela estava na banheira a algum tempo, porque a pele estava arrepiada, provavelmente por causa do contato com a água que já estava fria.

_Aline_ chamei outra vez.

_Nick, achei que era sonho.

_Vem sai da banheira.

Quando a envolvi com uma toalha, e ajudei ela a sair da banheira, percebi que ela estava um pouco molinha por causa das duas garrafas de vinho.

_Amor, eu preciso te explicar tudo que aconteceu.

_Agora não, vem vou ajudar você a tomar um banho quente, depois vai tomar um café e somente quando estiver bem, iremos conversar, tenho todo tempo do mundo para te ouvir. Eu também tenho algumas coisas para conversar com você, mas preciso ter certeza que você está bem.

Ajudei Aline no banho e depois de secar o corpo dela, procurei uma camiseta para ela vestir. Por ficar localizada em uma área aberta e próximo da praia, estava um pouco frio, e após colocar ela na cama, fechei as janelas do quarto e voltei pra perto dela.

_Você está bem? , vou fazer um café e já volto para conversarmos.

_Não demora, já fiquei muito tempo longe de você.

Desci as escadas literalmente com o coração na boca, não conseguia pensar em uma forma de contar para Aline que eu havia beijado outra garota, que eu havia traído ela. Coisa que eu jamais imaginei que faria.

De volta ao quarto, eu evitava me aproximar, não achava justo tocar o corpo dela sem que antes contasse tudo o que aconteceu. Somente naquele momento, observando ela tomar café, é que percebia que a saudade que eu sentia dela, era muito maior do que eu imaginava.

_Amor, me perdoe por ter sumido, mas eu precisava ficar um tempo sozinha.

_Aline, antes de termos essa conversa, eu preciso muito te falar algo.

_Aconteceu alguma coisa?

_Sim, eu vou te contar tudo, eu só preciso que me deixe falar até o final.

Depois que você sumiu, eu passei a semana inteira trancada em casa, não dormia direito, quase não comia, fiquei péssima, me culpei muito por ter sido tão impulsiva. Mas, não havia muito o que fazer, minha única alternativa era esperar você voltar. Um dia eu estava na praia e conheci uma turma, e acabei fazendo amizade com eles. Nessa turma havia uma garota, a Maya, ela estava passando uns dias aqui porque iria viajar para fora do país, e um dia antes dela ir embora com o irmão, eu fui para a despedida deles e acabou rolando um beijo entre eu e ela.

_Aline, eu sei que posso estar colocando um ponto final no nosso namoro, mas eu não posso esconder o que aconteceu.

_Você me traiu?_ Aline perguntou olhando diretamente nos meus olhos.

_Traí, não passou de um beijo, mas foi uma traição.

_E você me fala isso assim, com essa naturalidade.

_Naturalidade, eu estou me culpando desde o dia que beijei ela...

_Sabe o que é engraçado?, você surtar por causa de uma foto, de uma mão na cintura, e agora me diz que ficou com alguém.

_Foi apenas uma mão na cintura, mas se dependesse dela...

_MAS EU NÂO QUIS.

_Eu sei_ falei com a voz embargada.

_Você poderia ter dito não, você tinha o poder de escolha como eu tive.

_Acha que não me culpo?

_Sério que sentiu culpa?

_Eu jamais me isentaria de culpa, mas não posso mudar o que aconteceu, e sei que a minha fraqueza terá consequências.

_Eu só queria me afastar, arrumar a bagunça que virou e depois voltar pra você, eu não me perdoo por tudo que aconteceu. Eu só precisava de um tempo para me encontrar, mas você não conseguiu cumprir o que sempre defendeu tanto, a fidelidade, isso pra mim só tem um nome, hipocrisia, falar algo que você não consegue praticar.

_Tem mais alguma coisa pra falar, eu preciso ir embora, a resposta que eu vim buscar eu já tenho.

_DROGA_ Aline arremessou a xicara contra a parede e caiu em um choro de cortar o coração, e ao tentar toca-la, ela foi enérgica.

_Não faz isso, não encosta em mim, por favor.

_ Eu vou embora, vou deixar você em paz, só preciso que se acalme.

_Eu vou ficar bem, não se preocupe.

_Todo mundo está preocupado com você.

_E você se preocupou comigo quando estava beijando outra.

_Quem me garante que não rolou nada com a sua...

Antes que eu terminasse a frase, senti uma bofetada no meu rosto, e a minha única reação foi colocar a mão no rosto ainda quente.

_Nunca mais duvide do meu caráter, você não tem esse direito.

_A chave do carro está aqui, e o outro vou mandar entregar na sua casa. Espero que o estrago não seja grande ao ponto de você me odiar.

_Acha mesmo que eu vou deixar você sair daqui com essa chuva, a noite. Fica em um quarto de hospedes, amanha você vai embora.

_Não se preocupe, posso dormir na sala.

_Você que sabe, agora se me der licença_ Aline ficou de costas demonstrando que a conversa havia chegado ao fim.

Desci as escadas sem conseguir raciocinar direito, e pensando em contrariar o pedido dela, seria muito difícil passar a noite tão perto e ao mesmo tempo tão distante. Mas, ao abrir a porta vi que a chuva estava mais intensa, corri até o carro para pegar a minha mochila. Decidi passar a noite embaixo do mesmo teto que ela, seria loucura sair com o tempo naquelas condições.

Procurei um banheiro, e apos tomar banho, fui até a cozinha tentar achar alguma coisa pra comer, a noite seria longa e era melhor evitar circular pela casa. Dormir seria a ultima coisa que eu conseguiria fazer depois da conversa que tive com Aline, o pior era não saber como ela estava.

Circulei tanto pela sala que perdi a noção do tempo, e vencida pelo cansaço acabei cochilando no sofá. De madrugada comecei a sentir frio, apesar de estar com um edredom, meus pés estavam gelados, e eu  não queria acordar a Aline para pedir outro edredom. Me encolhi o máximo possível para tentar manter o corpo aquecido, e consegui voltar a dormir.

Em um determinado momento ouvi a voz dela perto de mim.

_Nick, vem para o quarto, aqui embaixo está frio.

_Não deveria ter saído da cama, volta, eu vou ficar bem.

_Você está quente _Falou colocando a mão na minha testa.

_Como pode fazer tanto frio no litoral.

_Nick você está com febre, por isso está sentindo tanto frio. Vem, vamos subir, no meu quarto tem remédio.

_Não precisa deve ser apenas emocional, aconteceram tantas coisas, o corpo acaba sofrendo as consequências.

_Está tomando os remédios?

_Não iria adiantar muita coisa, eu bebi, pouco mais bebi.

_Claro, a despedida da sua amiguinha.

_Quer despejar tudo que está sentindo, fique a vontade, mas faz de uma vez só. Já me culpei o suficiente, mas não vou ficar me torturando por causa de um erro que não tem como consertar.

_Pra você é fácil esquecer, já se colocou no meu lugar, tem noção do que eu estou passando e agora mais essa.

_Não tenho noção porque você simplesmente sumiu, sem falar nada, evaporou sem deixar rastro.

_Eu só precisava ficar sozinha, pelo menos por um tempo, acha mesmo que seu eu quisesse desaparecer estaria em um lugar tão obvio.

_Mas você mesma falou que desde a morte deles não conseguiu voltar aqui.

_Aqui era o refugio deles, era o lugar que eu mais sinto a presença deles, precisava de uma luz. Minha esperança era que você fosse atrás de mim, e me encontrasse, como de fato foi, só que um pouco tarde, antes teve um obstáculo chamado Maya.

_Que inferno, eu não transei com ela,

_Só o fato de olhar e desejar outra mulher já é uma traição.

_Então tá, desisto, vou dar uma volta, depois quando você estiver com a cabeça mais tranquila conversaremos.  

_Sabe que horas são? Vai sair com febre, no frio...

_Preciso respirar.

_ Me acusa de fugir e agora vai fazer a mesma coisa.

_Essa postura de tentar me tirar do sério, não combina com você.

_Que merd*... será que é tão difícil entender...amo você demais, e o fato de saber que outra pessoa tocou em você me dilacera. Eu não fugi, eu só queria um tempo.

_E eu dei, respeitei a tua decisão.

_Mas não me respeitou.

_CHEGA...se não quiser me perdoar, eu entendo, se não quiser ficar comigo, eu também entendo, mas ficar jogando o tempo todo na minha cara o que aconteceu não vai resolver o nosso problema. Talvez não acredite, mas eu amo você, amo muito e sempre estive disposta a enfrentar qualquer coisa por você. O que aconteceu foi um erro, mas está feito.

_O que passamos, provavelmente não é metade do que ainda vamos passar, eu só queria ter a certeza de que quer ficar do meu lado.

_Nunca duvide disso_ Falei chorando_ Preciso ir, quando estiver pronta, estarei te esperando.

Aproximei-me do sofá pra pegar a minha mochila e quando fiz um movimento para coloca-la nas costas, não percebi que um dos bolsos estava aberto. Eu estava tão atordoada que não vi que algo havia caído, e já estava com a mão na maçaneta da porta quando escutei a voz da Aline.

_Nicole, antes de ir pode me explica o que significa isso?

_

Fim do capítulo