Faça isso novamente
Eu iria ficar me drogando pra sempre, fugindo de tudo o que sinto, e ia acabar nisso? Minha existência está fadada a isso? Soava injusto até para mim.
Não tem mais nada além desse infindável sofrimento ao qual sempre me encontro, no eterno retorno ao ponto inicial? A vida era só isso, sofrer e chorar? Tentar ser feliz ao lado de alguém e sempre tentar suprir a ideia da pessoa perfeita ao meu lado, que faça tudo aquilo que eu quero?
Elas também são pessoas como eu, que tem medo e anseios, também devem ter suas inseguranças. E se ela estivesse com medo do que podia acontecer?
Não, ela é uma filha da puta, como todos foram comigo e continuarão sendo.
Estou a um passo de acabar com tudo isso, mas ainda assim estou relutante. A vida sóbria parecia horrível, mas a ideia de que estou vivendo minha vida de merd* achando que está tudo ótimo é pior ainda. É como se eu estivesse enfiada na caverna de Platão porque eu quisesse, e nossa função é justamente sair da caverna.
Não queria que minha vida fosse só isso. Não quero descartar outras semanas de tentativa, eu sempre me sentia pior... Eu não sei o que fazer, a tentação está na minha frente, a um pequeno passo de me tirar de toda essa agonia ao qual eu me mantenho.
Eu não sou aquilo que dizem que eu sou. Não sou uma perda de tempo, não vou afastar todos para sempre, não quero ser alguém descartável, uma curtição. Eu queria ser alguém relevante.
Mas eu nunca vou ser alguém relevante.
Senti algumas lágrimas caindo ao ver aquela situação. Eu poderia estar alta...Eu queria estar em outro mundo, mas o mundo em que vivo é feio e ruim, e vai só piorar. Isso tudo poderia ter um fim.
Eu queria que tudo isso tivesse um fim.
Peguei o telefone e liguei para Alan, que rapidamente atendeu.
— Alan, por favor, tem como você voltar logo para casa? Eu acho que não estou bem.
*
— Você é mais forte do que imagina, Alana.
Alan segurava minha mão, sentada ao lado da cama enquanto estava deitada.
— Se eu fosse tão forte quanto dizem, não estava nessa situação.
— Não se menospreze tanto.
Alan tinha me visto do jeito que estava, com a diferença de que tinha me deitado no chão e me debulhado em lágrimas. Penso que se ele tivesse chego um pouco mais tarde, eu teria desistido.
— No que tanto pensa? – perguntou Alan, acariciando meu cabelo.
— Penso que minha vida é um grande espiral de merd*, que eu só me meto em confusão, que eu até sinto saudade da minha antiga vida comparada a essa, e de que às vezes eu só queria o apoio de pais normais...
— Esse último ponto não podemos ajeitar, infelizmente, mas temos um ao outro, esqueceu? Sempre vamos ter um ao outro.
— Você sempre vai cuidar de mim como se fosse nosso pai?
— Alguém tem que fazer isso – ele segurou minha mão – E estou muito orgulhoso de você.
Alan foi até mim e me deu um abraço longo e apertado. Não demorou muito para que eu sentisse meu ombro ficando molhado.
— Não sei o que faria se você sumisse da minha vida.
— Relaxa, ainda vou continuar te perturbando – dei alguns tapinhas no ombro dele.
— É sério, Alana. Você é muito importante para mim, eu só quero o seu bem.
— Eu vou ficar bem, Alan, não se preocupe.
— Não quero te perder pro vício, você é minha família. Temos só um ao outro, esqueceu?
Fechei os olhos, deixando-me levar pelas palavras dele e o toque fraternal do seu abraço.
— Eu sei.
— Você promete que vai procurar ajuda? – ele dizia ainda soluçando.
— Eu prometo.
E ali fiquei até dormir.
*
Acordar cedo era estranho para mim. Deveria ser a primeira vez em anos que acordava ainda pela manhã, isso sem contar quando estava amanhecida ou coisa do tipo.
Levantei, e a coceira tinha cessado mais, porém o amargor da minha boca e a dor de cabeça da noite anterior de choro se mostrava presente. Meu corpo possuía firmes marcas da batalha que tinha travado contra mim mesmo, então segui até a cozinha, peguei café e pão, e liguei a televisão.
Não passava nada de interesse nos canais, até que parei em um canal de desenhos. Automaticamente lembrei da minha infância, quando sentava na frente da televisão e ficava por horas assistindo os desenhos, tomando chocolate com bolachas.
E as brigas entre meus pais ainda pela manhã, como poderia esquecer disso? O caos era instaurado atrás de mim enquanto mergulhava naquele mundo fantasioso proporcionado por aquela acolhedora tela. Alan perdia as meias, se chateava e xingava, meus pais xingavam de volta e quando via, todos nós estávamos discutindo, como devia ser.
Quantas vezes apanhei pra ter que usar a farda do colégio? Impecável, é claro, o colégio militar não admite baderneiros. Questiono-me se realmente tudo isso valeu a pena, levando em consideração o que me tornei.
Ouvi batidas na porta, uma, duas vezes. Não costumava atender ninguém, ainda mais naquela hora da manhã, mas a pessoa insistiu.
— Alan, é você? Esqueceu a chave?
Olhei pela mesa, mas não vi a chave, então fui até a porta e a abri.
— Oi, no que eu posso...
Perdi a fala antes disso. Ao me deparar com aquela figura, nada disse.
Era Catarina.
— Posso entrar?
*
Fiquei parada em frente à porta, com a imagem dela em minha direção. Ela usava uma jaqueta jeans de um número maior que o seu, com seu óculos caído em seu nariz, o cabelo desgrenhado, a expressão vazia. Fazia frio, e ela enfiara as mãos nos bolsos da jaqueta, só que dessa vez, ela não encarava a mim, e sim ao chão.
Ainda era cedo da manhã, mal tinha tomado café e não sabia se queria ter aquele momento quando mal levantei da cama.
— O que você quer?
— Quero conversar com você.
— Olha, eu tive uma noite péssima, realmente não quero ter que...
— Por favor, Alana.
Olhei para trás, e para frente, e suspirei, dando os ombros.
— Tudo bem, pode entrar.
Ela entrou e tirou a jaqueta assim que fechei a porta.
— Você quer alguma coisa? – perguntei enquanto atravessava para a cozinha para ir à geladeira. Ela sentou-se no sofá e ali ficou.
— Não, muito obrigada.
Tomei um copo d’água e encostada na bancada da cozinha a encarei. Catarina batia com as mãos nas pernas, tamborilando a ponta dos dedos sobre os joelhos, mas mantinha-se firme olhando para a frente. Coloquei o copo na pia e a passos lentos, fui até a sala e sentei do lado contrário.
— Então? – perguntei, olhando para ela, que não me encarava. Ela hesitou e tirou do bolso o embrulho amassado.
— É sobre o que você me deu. Eu não posso aceitar.
— Não é nada demais.
Tentei me manter o mais concisa que pude, sem querer deixar que nada vazasse das minhas palavras. Eu tinha que me manter firme, séria, tentar ser madura o suficiente pra encarar tudo isso sem ter uma crise e sair correndo, por mais forte que isso se mostrasse.
— Pode ficar pra você.
— Não, eu... – ela afastou o embrulho pra mim – Eu não posso ficar.
— Eu já disse, Catarina – respondi em tom ríspido – Eu não me importo com isso, pode ficar, não significa nada para mim.
— Mas para mim, significa.
Catarina levantou o olhar. Estava com os olhos marejados e pressionava os lábios, olhando para o embrulho e logo após para mim.
— Isso não é... Tão fácil...
Suas palavras saíam trêmulas, as mãos rápidas com o embrulho em mãos, passando de um lado para o outro.
— Você não faz ideia do quão difícil essa situação é para mim, Alana.
Cruzei os braços, encarando-a.
— Eu não sei, o que sei é que eu sou uma viciada problemática que só causa problema na vida dos outros. Era isso?
— Você sabe que eu não quis dizer isso – ela respondia rápido. Eu ri com ironia.
— Claro que não, você só usou um jeito mais bonito de falar que sou uma fodida que tenho que me afastar de você – levantei-me – E quer saber? Eu não vou mudar mesmo, Catarina. Sou uma perca de tempo, e provavelmente vou morrer de overdose antes do trinta por não aguentar mais a minha vida, agora com licença...
Quando fui caminhar até a porta da entrada de casa, ela segurou meu pulso, sem força, como me alertasse. Olhei para ela, que continuava do mesmo jeito. Catarina respirou fundo e balançando a cabeça, falou:
— Eu estou apaixonada por você, Alana.
Parei onde estava, olhando para ela sem reação, que continuou falando, com os olhos marejados:
— E sabe o que é o pior? Eu sei como tudo isso funciona – ela foi soltando meu pulso, voltando a olhar para o chão – Eu sei que tudo isso são funções químicas do meu cérebro porque me atraio por você, e quero estar com você, e...
Catarina colocou as mãos no rosto, suspirando.
— Eu sei de tudo isso, eu sei que depois a sensação de euforia e prazer vai embora, mas eu não consigo ir contra o que sinto por você. Quando você saiu da sala, eu... – ela mostrou o embrulho pra mim – E isso, eu senti o que eu não deveria sentir. Eu não sei o que fazer com isso que sinto por você, é por isso que eu falei aquilo de ser viciado. Eu deveria ajudar você, deveria ajudar os outros, mas como farei isso se eu não consigo controlar o que eu sinto?
Fiquei em silencio, encarando-a. Nunca tinha visto Catarina baixar a guarda da maneira que fazia agora, como se tivesse escolhido que deveria fazer isso, como uma trégua.
— O que você quer que eu faça? – perguntei para ela.
— A pergunta não é o que eu quero que você faça, e sim o que você deve fazer – ela disse me olhando de soslaio.
Dei alguns passos até chegar nela, e me abaixei, olhando-a bem de perto.
— Não, a pergunta é o que você quer que eu faça.
Ela suspirou, balançando a cabeça e voltou a me olhar.
— Sinceramente?
— Sim.
— Quero que faça amor comigo até eu chorar de prazer.
Arqueei as sobrancelhas, surpresa.
— É sério?
Catarina balançou a cabeça positivamente, fechando os olhos por um momento e logo os abrindo, deixando-os cerrados.
Mordi os lábios e encostei minhas mãos nos seus ombros, arrastando-as até o seu pescoço, com ela fechando os olhos mais uma vez, ofegando baixinho. Aproximei-me dela e toquei os seus lábios ternamente, no qual ela correspondeu me beijando ainda mais. Ela puxou-me para beijar ela ainda mais, sentindo o toque de sua língua contra a minha ficando ainda mais intenso, urgente.
Enquanto nos beijávamos, ela foi se levantando, comigo a guiando com o toque de minhas mãos pela sua cintura. Abracei-a, e nosso beijo se tornou intenso a ponto que ambas deixavam escapar breves ofegos, anunciando que ali queria mais coisas vindo à tona.
Encostei-a contra a parede, e senti suas pernas prendendo contra as minhas. Arrastei minha boca até o seu pescoço e o beijei, o que a fez gem*r baixinho e puxar meu cabelo, tomando-me para ela continuar me beijando entre os suspiros que insistiam em sair.
Tomei a força que tinha e a prendi contra minha cintura, levando-a até o meu quarto, empurrando a porta com os ombros, sem deixar de beijá-la com ainda mais tesão.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Sem comentários
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook: