Mais caótico, nenhum alívio
— Eu não acredito que você fez isso, Alana!
Matheus estava estarrecido com o que eu tinha acabado de dizer a ele. Ele tragava o cigarro e jogava a fumaça para longe, em um misto de um sorriso desacreditado e divertido.
— Mas sim, aconteceu – peguei o cigarro de sua mão e o traguei, devolvendo-o.
— E aí, como foi?
— Foi ótimo – joguei a fumaça para longe – Ficamos ali durante um tempão.
Ele olhou de soslaio para mim, e voltou a rir.
— Você já está emocionada, Nana. Eu conheço você.
— Conhece muito bem mesmo – voltei a rir – Mas tudo no seu tempo.
— E a Lavínia? Acabou o romance?
— Claro que não – disse enfática – Mas o que sinto por ela é diferente.
— Diferente como?
— Ela é intensa, viva, toda vez que a toco eu sinto como se eu fosse derreter. A Catarina seria algo que me prendesse no chão.
— Palavras bonitas para dizer que você está apaixonada pelas duas – Matheus disse em um tom irônico, o que me fez empurrar ele de leve.
— E se eu estiver?
— Sabe que sempre alguém vai sair magoado, e esse alguém provavelmente vai ser você.
Encostei-me na parede, cruzando os braços. Mordi os lábios e suspirei. Passamos alguns segundos em silêncio até que Matheus, terminando o cigarro, fez a seguinte pergunta:
— Alana, você nunca parou pra pensar que elas podem ser a mesma pessoa?
Olhei sério para ele, que se mantinha sério, mas logo comecei a rir.
— Você está louco, Matheus? Claro que não, olha essa viagem!
— Por que a garota nunca tira a máscara então?
— Porque ela não gosta de se mostrar, é divertido omitir a identidade.
— Mas... – ele aproximou-se de mim, se encostando na parede ao meu lado – Pensa só, vocês já se veem faz um tempo, certo?
— Sim.
— E quando você passou mal, coincidentemente quem te socorreu foi a Catarina, certo?
— Sim, que estava com amigos segundo ela.
— Que você não viu, certo?
Fiquei em silêncio, concordando com a cabeça.
— Ela é esquisita Alana, e se Lavínia for uma espécie de alterego dela pra dar vasão aos desejos reprimidos dela?
— Não bota ideia errada na minha cabeça, Matheus – franzi as sobrancelhas.
— Não estou botando nada, só estou sugerindo.
— Isso nem faz sentido, como elas seriam a mesma pessoa? E a voz, e os olhos?
— Ela pode performar uma voz diferente, usar lentes, não sei, se tornar outra pessoa.
— Você está viajando, quero tomar isso que você tomou.
— Alana, e se você for o objeto de estudo dela principal? De como ela ia conseguir limpar alguém só modificando algumas coisas?
— Para de falar besteira, Matheus – franzi o cenho ainda mais – Isso não faz sentido, cara.
— Tudo bem então, era só uma hipótese que queria compartilhar.
Cerrei os olhos, e suspirei. E se aquilo fizesse sentido?
Puxei um cigarro do bolso e acendi.
— O que foi? – perguntou Matheus.
— Não é nada, só estou pensando.
— Faz sentido, não é?
— Cala a boca, Matheus. Claro que não faz sentido – balancei a cabeça e voltei a tragar o cigarro em silêncio.
*
— Alana, chegou cedo hoje.
— Estava de saída e resolvi parar logo por aqui.
— Mas a Lavínia ainda não chegou...
— Não tem problema.
Sentei-me no lugar onde costumava ficar habitualmente, e acendi outro cigarro. Estava ansiosa, pegando o telefone e olhando para notificações que não chegariam. Passou-se mais de uma hora até que ela apareceu, passando a passos largos para dentro de sua cabine.
Assim que ela entrou, bati uma vez, duas vezes, três vezes, ela não atendeu. Bati com mais força.
— Lavínia, sou eu. Quero conversar com você.
— Estou ocupada.
— É um assunto sério.
— Alana, eu não...
Bati com força mais uma vez.
— Por favor.
Houve um silêncio no lugar, até que ela destrancou. Estava tudo escuro, e dava pra sentir que ela estava atrás de mim.
— Por que está me evitando? – perguntei ao nada que estava em minha frente. Não havia quaisquer feixe de luz no lugar.
— Temo que tomei más decisões – ela sussurrava em algum lugar ali.
— O que você quer dizer com más decisões?
Ouvi um sussurro pesado atrás de mim, em seguida de sua figura passando ao meu lado.
— O que você acha?
— Diga-me você – olhei para o lado, sem chances de ver qualquer coisa.
— Acho que estou com um problema.
— Que seria?
— Envolvi-me com você mais do que deveria.
Senti um arrepio passar por toda minha espinha quando ela proferiu tais palavras. Ouvi seus passos aproximando-se de mim, e senti suas mãos tocando meu rosto. Fechei os olhos e toquei seu rosto, que estava descoberto.
— Lavínia... – disse sussurrando – Você não é o que aparenta ser, não é?
Seus dedos tocaram meus lábios, arrastando por eles e por meu pescoço, até que ela sussurrou em meu ouvido.
— Não.
E como em um golpe fatal, sussurrei com trêmulas palavras:
— Eu conheço você?
E ela voltou a sussurrar em meu ouvido.
— Ainda não.
Quando levantei as mãos sobre seu rosto, ela afastou-me de perto de si.
— O que foi? – perguntei.
— Assim você vai acabar sabendo demais.
Mordi os lábios, suspirando alto. Quando sentia seu toquei, não conseguia pensar em outra coisa.
— Eu não vou conseguir lidar com isso muito tempo.
— Com o quê?
— Com esse seu jogo sexual contra mim.
Suas mãos passaram pelo meu ombro, e em seguida por meu torso, puxando-me para si.
— Pensei que estivesse se divertindo.
— Você que acabou de dizer que estava se envolvendo até demais.
— Quero dizer que me importo com você, a não ser que você tenha conhecido outra pessoa.
Mantive-me em silêncio.
— Você conheceu outra pessoa, Alana?
— É cedo pra dizer alguma coisa – confessei.
Ela empurrou-me contra a parede, e senti seu respirar ofegante ao meu lado.
— Sério? – disse ela, em um tom quase ameaçador.
— Está com ciúmes? – segurei suas mãos, dizendo em um tom sarcástico
— E se eu estiver?
— Então... – segurei suas mãos de volta – Me mostra realmente quem você é, aceite que eu conheça você melhor antes que você queira exigir qualquer coisa?
Ela manteve-se em silêncio, desvencilhando-se das minhas mãos.
— Você tem razão.
— Por que você quer continuar nesse jogo comigo? Sabe que gostarei de você de qualquer jeito.
— Não teria tanta certeza...
— O que te faz afirmar isso?
Ela abriu a porta, deixando um feixe de luz passar.
— Conversamos sobre isso outro dia.
— Lavínia...
— Por favor, Alana – ela dizia em um tom suplicante – Isso não é tão fácil para mim quanto parece.
Sai sem dizer nada, com a cabeça a mil.
Caminhei para fora do lugar, acendi outro cigarro, não conseguia me concentrar em nada, nem em um lugar para tomar caminho. Entre uma tragada e outra, sentia minha cabeça girando pela confusão na qual tinha me metido. Por que ela não se mostrava pra mim? O que ela esconde? Eu deveria insistir nisso? E se sim, por que deveria insistir?
Lavínia mexia com coisas que ficavam adormecidas em mim, e toda vez que sentia seu toque, eu esquecia de qualquer coisa, motivada totalmente pela libido. Eu poderia estar confundindo, afinal muitas vezes ao pensar que estamos apaixonados, estamos apenas desejando aquela pessoa. O cérebro pode ser uma armadilha mortal.
Mas ainda queria tirar minha dúvida. Caminhei por um caminho diferente do de casa, parei em frente a um prédio e interfonei.
— Alô? – disse a voz do interfone.
— Catarina? Sou eu, a Alana. Posso entrar?
Fim do capítulo
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