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Amor incondicional por caribu

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Palavras: 4668
Acessos: 4169   |  Postado em: 17/07/2021

Trinta e seis

 

 

Inicialmente, Beatriz sentiu como se todos os olhares de todas as pessoas daquela praia estivessem focando nela. Depois, muito rapidamente se convenceu de que essa era somente a sensação chata que vem com a insegurança, e nem se deu ao trabalho de olhar ao redor para ver se alguém, de fato, a observava. Sabia que possivelmente não havia e, se houvesse, ela não podia fazer nada a respeito. Como psiquiatra, reconhecia que muitas das frustrações vinham justamente porque as pessoas têm mania de querer controlar os pensamentos/sentimentos dos outros, quando ainda temos tantas dificuldades para trabalhar, primeiro, essas questões internamente.

Mas reconhecia que aquela era sempre uma experiência fatigante, ela se sentia sempre muito vulnerável de biquíni, como se desprovida de alguma armadura que as roupas do dia a dia forneciam. Que a blindavam, justamente porque protegiam seu corpo, agora desnudo, dos olhares alheios.

Ela não podia moderar o julgamento das pessoas, se é que o havia, então ao chegar bem perto do mar se abaixou e se molhou, lavando todos os pensamentos ruins com a água salgada. Primeiro, só juntou as mãos em concha, e se refrescou molhando o cabelo. Sentiu a respiração entrecortar, no contraste do calor do sol com a água, gelada, que desceu num fio, pelo meio das suas costas. Depois, como se não ouvisse os comentários dos amigos, que estavam por ali, caminhou determinada, avançando pelas ondas, pelo mar que ia se inclinando conforme suas pernas faziam um esforço diferente para andar dentro da água.

Afundou por alguns instantes, sentindo lá embaixo a leveza do corpo, o silêncio repentino, a areia macia debaixo dos seus pés, entre os dedos das suas mãos. A paz! Pela primeira vez, em dias, se sentiu em paz.

Se esquecia dessas sensações quando ficava muito tempo sem se banhar no ar, quando observava sua imensidão de longe, da janela do seu apartamento. E quando voltava, sempre por alguns segundos considerava a possibilidade de ir à praia mais vezes. Era revigorante!

Ao sair para a superfície, recebeu o choque do som alto das ondas, e trechos de algumas conversas, que a puxaram de volta à realidade. Boiou, enquanto as ondas não vinham, admirando aquele céu tão azul acima dela. Parecia até que brilhava!

 

- Oi, ser místico das águas! – Fernanda cumprimenta, se aproximando dela. Tinha as bochechas rosadas do sol, e os olhos estavam miudinhos, devido à claridade.

- Olá, moça bonita! – Beatriz responde, sorrindo para ela – Você vem sempre aqui?

- Nos arredores, sim – Fernanda sorri e se abaixa na mesma altura de Beatriz, que mantinha a água na altura dos ombros – Você fica linda, salgada de mar! – ela diz, e Beatriz sorri mais uma vez.

- Você também, corada de sol. Gosto que seja minha – Beatriz toca levemente sua mão por baixo da água, mas logo se afasta dois passos para o lado.

- Sinto muito – Fernanda fala, indicando a areia com os olhos – Sinto por termos encontrado com eles aqui.

- Nossa, eu também!

- Podemos ir embora, se quiser.

- Vamos, agora – ela responde, sem pestanejar.

 

            Fernanda riu, e fez um gesto com a cabeça para Samanta, próximo dali, que se despediu de todos os que estavam ali com ela. Parecia íntima de pessoas que tinha acabado de conhecer, e isso fez a irmã sorrir. Aquela era uma qualidade que ela admirava: o poder de Samanta em se enturmar.

            Saíram juntas do mar, com Beatriz um pouco mais à frente (talvez porque estava com pressa). Renato veio atrás, logo na sequência, e combinaram de almoçar juntos dali duas horas, num restaurante que tinha comidas ótimas, apesar do atendimento lento. Beatriz soube que o amigo se atrasaria para o compromisso quando o viu passando mais bronzeador pelo corpo, antes de reassumir seu posto em sua colorida cadeira de praia.

            Pela primeira vez, ao que se lembrava, em toda a sua vida, Samanta não caminhou segurando a mão da irmã. Sentiu medo de ser mal interpretada, de as pessoas acharem que elas namoravam, e ficou triste. Por Fernanda, e a família que ela estava começando, e por todas as pessoas que sofriam discriminação. Aquele passeio à praia tinha sido de muito sol e reflexão.

            Embora o namoro de Fernanda e Beatriz não fosse recente, ela mesma não tinha ainda saído com elas, ou seus amigos. Conhecia muitos gays, tinha contato com muitas lésbicas, mas sempre os encontrava em seus habitats, por assim dizer. Era sempre numa balada LGBT, ou num barzinho friendly. Nunca assim, na “vida real”. E foi um baque para ela. Ainda estava digerindo aquilo tudo.

            Fernanda, que pareceu captar algo vindo da irmã, caminhou bem perto, ao seu lado, com o braço em sua cintura, o dedão enfiado no canto do bolso. Nas duas esquinas que precisaram atravessar, antes da casa de Beatriz, ela apertou o quadril da gêmea, como sempre fazia, para alertar que vinha carro. Mas era tudo novidade, e nem mesmo o gesto, conhecido, trouxe algum senso de normalidade para Samanta.

            Nunca tinha visto aquele prédio tão bonito – provavelmente porque ficava quase na “esquina” da praia, já bem próximo da mata (e longe da civilização comum). O primeiro portão abriu assim que se aproximaram. Ela não achou o porteiro. Subiram três degraus depois do jardim e passaram pelo segundo portão, que não só abriu, como também se fechou sozinho.

No hall tinha um sofá que Samanta desacreditou. Era enorme! Daqueles que aterrorizavam sua mãe, quando eventualmente visitavam alguém em família. Era todo daquele tecido que Nívea certamente colocaria uma mantinha em cima, “para conservar”.

            Samanta riu, e ao entrar no elevador se sentiu quase num clip musical futurista da MTV dos anos 90. Várias luzes, espelhos recortados, câmeras por todos os lados. Fernanda e Beatriz falavam alguma coisa, mas ela estava focada no painel, que se movia, apesar de parecer que estavam paradas. Quando a porta enfim se abriu, ela só conseguiu pensar: “hum, cobertura!”. E por algum motivo a frase foi dita dentro de sua cabeça com a voz de Renato, bem melosa.

            Achou a casa de Beatriz careta, blasé. Quase nada de decoração, pouca criatividade na entrada, na sala. A exceção era o quadro pendurado, que era muito bonito, certamente custou uma nota, e se destoava de todo o resto. Faltava cor, faltava vida! Era tudo muito arrumadinho, sem dúvida de bom gosto, no sentido de que eram móveis requintados, mas só. Como um lindo jardim de flores artificiais. Samanta não queria reparar, mas era difícil. O apartamento poderia ser facilmente transformado naquelas casas de Instagram, se a moradora fosse mais ousada.

            Sem querer, pensou em diversas soluções para aproveitar cada espaço, as janelas grandes, o pé direito alto. E era duplex! Não havia uma plantinha, meu Deus! Uma jiboia descendo por aquela escada transformaria aquele caracol, que certamente se retorcia de desgosto. E uma samambaia perto daquela varanda transformaria todo o resto.

 

- O banheiro fica ali – Beatriz diz, entregando uma toalha felpuda e uma bolsinha para ela – A temperatura do chuveiro regula em cima, deixei um roupão pendurado, caso queira.

- Agradeço – Samanta responde, sorrindo também para a irmã.

 

Reparou que na bolsinha havia xampu, condicionador e sabonete líquido, tudo em embalagenzinhas. Achou muita gentileza, e se sentiu um pouco mal por estar pensando em medidas para resolver problemas que Beatriz nem sabia que tinha.

O banheiro na verdade fazia parte de um quarto que não parecia ser usado, que tinha apenas uma cama e uma cômoda. Antes de entrar no banho Samanta abriu a janela devagarinho, para não fazer barulho, e contemplou a vista dali. Era linda!

No andar de cima, um pouco alheia à paisagem, Beatriz abre a janela do quarto sem prestar muita atenção ao mundo lá fora. Tinha mil coisas na cabeça, mas sua urgência maior era se livrar daquele sal, então estabeleceu que depois do banho organizaria os assuntos todos, por ordem de importância e prioridade. Incluindo seu casamento com Fernanda.

Colocou o anel de noivado, que estava guardado na mesinha ao lado da cama, e foi para o banheiro descalça. Fernanda vinha logo atrás, com o cabelo preso num coque.

 

- Não foi tão ruim, foi? – a noiva pergunta, vendo Beatriz se despir para entrar debaixo do chuveiro. Mesmo tendo fugido do sol a manhã inteira, dava para ver a marca da calcinha – A praia estava uma delícia!

- Estava mesmo, amor – ela responde, tirando a camiseta devagar. Suas costas pareciam queimar em brasa – Mas sinceramente não pretendo voltar tão cedo. É sempre um horror – ela acrescenta ao final, falando um pouco mais alto, depois de abrir a torneira.

- Eu sei. Eu entendo – Fernanda concorda, tirando sua roupa. Notou que havia areia dentro do sutiã e assim que ficou nua colocou no dedo o anel que tinha tirado mais cedo – Vivemos num mundo difícil – ela complementa, estendendo a mão e vendo a joia brilhar.

- Muito difícil, nossa – Apesar do que falavam, Beatriz sorri ao vê-la entrar no box – Não me sinto segura, é horrível.

- Mas isso não é só na praia, amor – Fernanda diz, dividindo espaço com ela e se molhando na água gelada.

- Não é, mas lá é pior. Eu acho.

- Uma pena. Eu adorei ter ido à praia com você. Fiquei com vontade de te lamber naquele mar.

- Tarada!

 

Beatriz a beija, e se abraçam por alguns segundos debaixo da água. Apoiou os braços sobre os ombros de Fernanda, que a abraçava pela cintura. Tinham quase o mesmo tamanho, mas Beatriz ficou um pouco na ponta dos pés, e se encaixaram bem na frente. Aquilo provocou nela um suspiro mais intenso, que se intensificou com uma mordidinha que Fernanda deu em sua boca.

 

- Amor... – ela gem*.

- O compromisso, eu sei – Fernanda responde, mas não a solta – O restaurante, o almoço, a sobremesa – ela fala, beijando Beatriz, que ainda a abraçava.   

- Sua irmã está lá embaixo.

- Eu sei – Fernanda responde, finalmente a soltando.

- Eu não sou uma boa companhia de praia, mas não quero que deixe de ir só por minha causa. Sempre que a Samanta ou alguém da turma te chamar, vai. Você gosta tanto, e é gostoso mesmo. Eu que não curto muito.

- Sem você não vai ter graça, Bia – ela resmunga, tirando o sabonete dos braços, admirando o bronzeado adquirido conforme a espuma descia pelas pernas. Olhou para Beatriz e deu uma piscadinha, porque reparou que ela acompanhava àquilo também.

- Mas hoje foi só a primeira vez que fomos juntas, Fernanda. Até então, você sempre ia sem mim, mesmo.

- Pois é. Falou bem: “até então” – Fernanda repete, mostrando para ela o anel em seu dedo – Eu amei meu anel de noivado! Não falei isso hoje, ainda.

- Que bom que gostou, amor – Beatriz sorri, fechando os olhos para tirar o xampu do cabelo. Tinha a impressão de que até o couro cabeludo estava queimado – E melhor que ter gostado, foi você ter aceitado ao pedido.

- Não sou maluca para não querer me casar com você! – ela afirma, se encaixando às costas de Beatriz, que não protestou. Sentiu as mãos dela descerem das costelas até a lateral das coxas, e sem titubear alisou seus pelos, enrolados na espuma que percorria todo o seu corpo.

- Espero que não se arrependa – Beatriz diz bem baixinho, mas Fernanda ouviu.  

- Me arrepender do que, Bia? – ela pergunta, vendo Beatriz virar o rosto e a olhar de canto. Reparou que o tom rosado nas bochechas realçava ainda mais a cor de seus olhos.

- Sei lá. Fiquei vendo hoje aquela gente tão bonita e sarada para lá e para cá... Muitos te olhavam.

- É porque meu biquíni é bonito – Fernanda brinca, virando Beatriz para ela. Levantou seu queixo para que se olhassem – Eu amo você, meu amor. Só você me interessava naquela praia inteira. Só tenho olhos para você!

- Eu sou tão sem graça!

- É uma delícia, ei! – ela fala, a beijando, a puxando pela bunda – Te acho uma gostosa e você tem tudo o que eu gosto. Não se esqueça que me apaixonei por você assim que te vi, e na ocasião você estava bem vestida.

- Nem lembra do que eu falei naquela palestra – Beatriz debocha, com um sorrisinho.

- Me encantei pelos suspiros no meio das suas frases, na sensação de ser brindada de repente com a sua risada, e me contentar por ser só meio sorriso. Me perdi nas suas microexpressões, no tom de suspense dos seus olhos, nos seus gestos tão polidos e contidos, que me deram uma vontade tão sincera de te fazer sorrir, de te fazer virar os olhos, de te despentear, te tirar do prumo – Fernanda puxou de leve o cabelo de Beatriz, que gem*u – Fui atrás de tudo o que havia a seu respeito, quis saber que mulher era aquela, que tinha aquele poder de me deixar extasiada num auditório lotado e em silêncio.

- Stalker – Beatriz passa a mão entre as pernas de Fernanda, que estava molhada. Colocou dois dedos dentro dela de repente, porque sabia que ela gostava da surpresa daquilo.

- Você não imagina quantas noites eu pensei em você e te desejei – Fernanda diz, num suspiro, contraindo na mão de Beatriz, dando um beijo na mulher que contrariava as leis da física e ocupava, com ela, o mesmo espaço naquele universo dentro do box – Não sai, Bia.

- Não vou – ela responde, e parecia sincera. Aumentou o ritmo do movimento que fazia, como garantia do que dizia. Levou a outra mão para baixo, enquanto Fernanda a enlaçava com os braços, num abraço apertado, e movimentou o clit*ris com o polegar e o dedão, num ritmo que sempre a fazia goz*r.

- Eu te amo – Fernanda diz, sentindo o orgasmo latejar todo o seu corpo, em movimentos expansivos.

- Eu te amo também – Beatriz responde, dando beijo nela. Antes que dissesse mais alguma coisa, Fernanda a acaricia, mantendo seus olhos nos dela.

- Eu tenho o poder de te fazer virar os olhos.

- Você tem! – ela afirma, mas num tom de voz um pouco fraco.

- Não ouvi.

- Você tem o poder, amor! Só você! – Beatriz responde, mais alto desta vez. Sorriu quando gozou – Eu sou sua!

- Minha garota – Fernanda sorri, e depois de se molhar mais uma vez, sai do box.

- Ficaria o dia inteiro nua com você – Beatriz comenta, fechando a torneira.

- A gente fica quando voltar. Estou faminta, agora de comida!

 

            Beatriz sorri e sai do banheiro com a toalha enrolada no cabelo. Fernanda estava no quarto, só de calcinha, e conectava o celular à caixinha de som. Colocou uma música em alemão que Beatriz não conhecia, num ritmo animado, e deu uma dançadinha, de um jeito sexy. Ouviu, ao longe, Samanta cantarolando o refrão. Achou inusitado.

            Colocou uma roupa leve e desceu quando Fernanda terminava de pentear o cabelo. Encontrou Samanta entretida, olhando para o quadro na sala.

 

- Você pode achar que é birutice da minha parte, mas eu sinto uma energia tão boa vinda dessa pintura!

- A artista é uma pessoa de uma alma muito sensível – Fernanda diz, antes que Beatriz falasse alguma coisa – Não acredito que você está com essa roupa.

- Eu te falei ontem a blusa que ia usar – Samanta responde, vendo que estavam vestidas iguais – Você troca, eu não trouxe outra opção.

 

            Saíram alguns minutos depois, e na descida do elevador Beatriz acompanhou um diálogo entre as irmãs que não entendeu muita coisa, mas estava com a cabeça longe, pensando em tudo aquilo que vinha maturando nos últimos dias. Acompanhou as duas até o restaurante um pouco distraída, alheia à conversa, que seguiu até que se acomodassem em uma mesa perto da janela.

 

- Eu tiro meu chapéu para vocês! – Samanta comenta, sentada na frente do casal. Dali dava para ver o mar que, agitado, lançava com força suas ondas em direção à areia – Sério mesmo! Não sei de onde tiram tanta paciência para lidar com o preconceito e a discriminação! Eu vi como aquele grupo ao nosso lado na praia nos encarava e fazia comentários... E isso sem falar nas outras pessoas que passavam por nós e nos olhavam de maneira esquisita. Ninguém não estava nem fazendo nada!

- A gente adquire essa paciência com o passar dos anos. É preciso –Beatriz revela, apertando muito brevemente a mão de Fernanda, que olhava o menu – Além disso, eu gosto de pensar que os nossos atos refletem o que nós somos. Não revido ignorância com ignorância. Gosto de ser racional, sempre, mesmo e inclusive quando estou lidando com patetas. Não reagir pode ser nossa melhor arma.

- Eu não saberia lidar com isso desta maneira e agir assim... Acho que não sou evoluída o suficiente.

- Saberia sim, Sá – Fernanda garante, sem desgrudar os olhos do cardápio – Até porque um dia você se cansaria de brigar e reclamar. E, cansada, perceberia que é bem mais fácil não retrucar e relevar certas coisas. Não vale o desgaste.

- Mas, gente! Vocês são lindas, duas mulheres maravilhosas, vão se casar... É lamentável imaginar que possivelmente vão ter que enfrentar esse tipo de discriminação até o fim de suas vidas!

- Somos o que somos! – Beatriz comenta, levantando o copo de suco que o garçom acabava de entregar – O mundo não é nenhum parquinho.

- Para mim sempre pareceu... – Samanta resmunga, pegando o copo que o rapaz lhe entregava.

- Ser lésbica é um ato revolucionário – Fernanda fala, assim que o garçom anota os pedidos e se afasta. É difícil, numa sociedade machista, sexista, patriarcal e falocrática.

- E mesmo assim vocês estão juntas. Parabéns, bravo! – Samanta sorri e faz um gesto, como se brindasse – Um brinde ao homossexualismo!

- Eu amo essa mulher! – Fernanda se declara, controlando a vontade de beijar Beatriz – Não escolhi minha sexualidade, porque isso não é uma escolha (por isso não se diz “opção sexual”, e sim “orientação sexual”). Em segundo lugar, não se usa mais a palavra “homossexualismo” porque durante anos a homossexualidade foi considerada doença, e na medicina palavras terminadas em “ismo” se referem a doença. A palavra foi abolida por fazer essa conotação.

- Entendi –  Samanta balança a cabeça – Quer dizer, então, que a opção de vocês foi se assumir? Se assumirem?

- Sim – as duas respondem, quase simultaneamente.

- E vocês estão prontas? Quero dizer... Já se preparam para a enxurrada de críticas que o casamento de vocês pode gerar?

- Bom, nós não vamos hastear nenhuma bandeira na porta de casa –Beatriz responde, divertida – Não vamos nos casar em uma igreja, usando vestido de noiva. Nem divulgar as fotos da nossa lua de mel em colunas sociais.

- Eu sei, gata. Mas não me refiro a tudo isso! Não precisa ir tão longe. Meus pais são extremamente católicos, e com a Talita a tiracolo essa tarefa de fazê-los entender sobre o casamento de vocês vai ser ainda mais complicada. Eles têm aquela ideia de que casamento é sagrado, que Deus fez o homem e a mulher, e aquele papo que a Nanda conhece muito bem.

- Eles repetem o papo da igreja, mas são abertos a mudarem de ideia. E é aí que você entra! – Fernanda sorri – Eu te amo e preciso de você para me auxiliar nesta tarefa de convencimento! Você é boa nisso.

- Eu também te amo, irmã! – Samanta afirma, segurando sua mão por cima da mesa – Mas você sabe como a mamãe e o papai são... Você está usando até aliança. Que é linda, por sinal, eu amei. Mas você sabe como eles podem também ser cabeça-dura.

- Sim, eu sei – Fernanda responde, olhando para a própria mão – Mas sei também o quanto amo a Bia, e o quanto ela me faz feliz, e o quanto eu quero passar o resto da minha vida com ela. E por ela, enfrento o mundo, Sá. E até o papai e a mamãe. E a Talita.

 

Samanta sorri e encara o casal à sua frente. Era, realmente, inegável o fato de que se amavam, dava para ver na cumplicidade entre elas, nas trocas de olhares, em toda a linguagem corporal. Conhecia bem a irmã para saber que aquele sorriso sempre presente quando Beatriz estava por perto era sincero e despretensioso. Mas também conhecia seus pais e, principalmente sua irmã, assim como Fernanda.

Com um pouco de desgosto, pensou que caso fosse um homem, era certo que seus pais aprovariam de imediato aquela união. Beatriz, além de educada e inteligente, era muito gentil e cortês. E demonstrava amar Fernanda de verdade.

 

- Tá – Samanta diz – Quando vai ser o casamento?

- Na verdade nós só vamos reunir algumas pessoas em algum restaurante depois que sairmos do cartório – Fernanda responde, voltando a sorrir. Se preocupava desde o início com a reação de seus pais, não queria dar a eles nenhum desgosto, mas seu amor por Beatriz era maior – Não vai ser um “casamento”.

- Isso é o que ela diz, queridinha – Renato afirma, sentando-se de repente à mesa – Amada, é claro que vai ser um casamento! E vamos ter as noivas, os champanhes, o bolo, o buquê. E, claro, os padrinhos, os presentes, a recepção.

- Só porque você quer... – Beatriz resmunga, sorrindo.

- Não – ele complementa, fazendo uma careta para ela – É só porque vocês querem. Deixe de ser boba Bia! Todos queremos pelo menos um almoço de casamento bem pomposo.

- Não estou tão certa disso – ela responde, vendo o garçom trazer os pratos. Renato deu uma piscadinha, satisfeito, quando viu que a amiga tinha pedido comida para ele – Os pais da Fernanda vão estar lá e ninguém aqui tem a pretensão de chocá-los.

- Claro, é um casamento, não uma parada gay! – Renato ressalta, causando no garçom uma risadinha – Vai ser discreto. Um casamento discreto!

- Eu concordo – Samanta se anima – Pelo menos um almoço, Nanda! – Samanta emenda, vendo a irmã fazer uma careta.

- Eu cuido dos convidados e você do menu – Renato diz, encostando seu copo no suco de Samanta – Somos os padrinhos desse casamento, isso está bem claro para mim.

- Concordo, para mim também – ela responde, sorrindo.  

- Eu adorei você! Por que ainda não tínhamos nos conhecido?

- Talvez porque minha irmã, que seria a nossa ponte, não é muito de sair. Ela vive com a cara enfiada nos livros.

- Sei, mas eu também – ele ri – Então a pergunta que fica é: onde você se perdeu?

- Em lugar nenhum! – Samanta responde, de supetão. Apesar do tom sério, ainda sorria – E acredite, já precisei responder isso diversas vezes. Só eu sei como é ter uma irmã gêmea que cursou medicina.

- Sá – Fernanda chama, e Samanta sorri mais abertamente, demonstrando que estava tudo bem – Eu sinto sono, Renato. Tenho preguiça de acordar cedo, de fazer as coisas. Já bem nova percebi que essa vida não era para mim, mas sempre combinou com a minha irmã.

- Seus pais devem ter te cobrado bastante – Beatriz comenta, um pouco compadecida com a moça.

- Muito!

- Mas não se enganem com essa carinha – Fernanda diz – A Samanta ganhou um bom dinheiro por ser dorminhoca.

- Nanda – Samanta chama, um pouco acanhada.

- Ué, mas é verdade!   

- Como assim? Me conta – Renato pede, falando baixinho, como se estivesse prestes a saber de algum grande segredo.

- Um dia minha irmã sugeriu, num evento cheio de nerds, criar um site que permitisse a negociação entre compradores e produtores, de qualquer tipo, sem intermediários.

- Sei. Tipo o site Comércio Livre?

- Exatamente como o site Comércio Livre! – Fernanda sorri, batendo palmas.

- Eu sugeri o nome “Mercado Livre”, mas disseram que não era muito comercial – Samanta complementa, sorrindo também – Isso foi nos primórdios da internet, bem no comecinho. Foi só uma boa ideia em um momento propício.

- Foi mais que isso – Fernanda corrige.

- Bela forma de fazer seus pais te deixarem em paz: ficando rica – Renato ria – Adorei!

 

Os dois emendam um animado papo sobre internet. Fernanda observa Beatriz que, distraída, olhava para o mar perto dali. Sabia que estava empolgada com o casamento, tanto quanto ela, mas reconhecia também que ela não sossegaria por completo enquanto não resolvesse a pendência que tinha com Bianca.

 

- Quando você vai procurá-la? – Fernanda pergunta baixinho, vendo ao longe algumas gaivotas voarem em pares.

- Ainda não sei – Beatriz responde, sem encará-la, com a voz quase inaudível – Antes disso eu tenho que saber trabalhar as questões que ela jogou em cima de mim. E eu não sei ainda como lidar com isso.

- Eu imagino que não, meu amor. Sinto muito.

- Sinto muito também. Queria poder me dedicar ao que me importa, você, nosso casamento.

- Eu sei.

- É como se de repente a minha vida inteira se transformasse em uma mentira. A minha história se transformou em uma incerteza, uma armação. Do dia para a noite.

- Poxa, Bia – Fernanda segura sua mão, por debaixo da mesa – Você pensou em, sei lá, fazer um exame de DNA?

- Pensei, e já descartei. Tudo isso começou porque eu reconheci no quintal da casa dela uma árvore que ela nem se lembrava que tinha existido. Posso até fazer o exame, mas por desencargo de consciência, como protocolo, apenas. Tudo me parece absurdamente claro, e para você?

- Sim, também. Desculpa, mas acho até que a Bianca se parece com você – Fernanda diz, e vê Beatriz virar os olhos, em total desgosto – Fisicamente! É claro que fisicamente falando. Mas você tem razão. Tudo é muito claro. Mas também muito complexo.

- É sim, bastante. Só que mesmo complicado eu tenho que enfrentar isso. Tenho que enfrentar a Bianca.

- “Enfrentá-la”?

- Claro! Ela simplesmente representa tudo o que sempre me esforcei para manter distante de mim. Não só o fato de ela ser hétero, e ser machista, assim como o marido, e homofóbica...

- É o conjunto, né? – Fernanda interrompe, apertando de leve sua mão. Seu coração se comprimia sempre que notava aquela tristeza no olhar de Beatriz.

- Sim – ela responde, num suspiro – E é provável que ela seja minha irmã! – Beatriz vira os olhos novamente – E, se for, é certo que meu pai tenha mentido para mim por toda a sua vida. Ou seja, depois de morto eu descubro uma pessoa indigesta que me conhece mais do que eu mesma! Uma estranha que representa tudo o que sempre me causou repulsa. Minha irmã – havia desolação em sua voz.

- Já pensou em procurar um analista, para te ajudar a passar por tudo isso? Alguém para conversar sobre o assunto? O Arthur, quem sabe?

- Não quero envolvê-lo nesses problemas. É embaraçoso demais. E quero menos ainda que as pessoas saibam que o meu pai era ainda mais mal caráter do que aparentava ser.

- Sim, mas conversar com outra pessoa pode te trazer alguma luz – Fernanda insiste, dando um beijo em seu rosto.

- Eu já sei quem vai saber me ouvir e me aconselhar – Beatriz garante, voltando a olhar para o mar.

 

 

 

Fim do capítulo

Notas finais:

 

Quem quiser ouvir o som que a Fernanda escolheu, e a irmã cantou, é esse aqui:

Namika - NA-MI-KA (Official Video) - YouTube


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Comentários para 36 - Trinta e seis:
cris05
cris05

Em: 18/07/2021

Que capítulo maravilhoso!

Eu li 3 vezes! rs

É lindo ver o amor e a cumplicidade do meu BiaFe! 

Já vou preparar meu lencinho (e meu chazinho) pra essa conversa de Bia Beatriz com Cícera, minha bruxinha favorita.

Isso aí Samanta e Renato! Queremos festa!

Autora, já nem sei mais o que dizer sobre a sua escrita. Você manda muito bem!  Sou sua fã!

Beijos!


Resposta do autor:

 

*-*

Que querida que vc é!

Adorei esse capítulo tb, entrou pro meu top 10 do livro rs

BiaFe são mto fofinhas msm! <3 <3 <3

Queria TANTO dar um spoiler rsrsrsrsrs

Beijos!

Responder

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NovaAqui
NovaAqui

Em: 17/07/2021

Acho que Cícera conheceu a mãe das meninas: foi vizinha ou amiga. ! Acompanhou o envolvimento de Catarina com o pai da Beatriz!

Quando Catarina engravidou, ela deve ter pedido para Cícera cuidar de Beatriz. Cícera foi trabalhar com o pai de Beatriz e sabendo da história toda, está lá para proteger Beatriz.

Lógico que ela sempre foi uma pessoa iluminada e está usando seus dons para levar Beatriz ao encontro de sua vida verdadeira.

Achismo de uma leitora

Abraços fraternos procês aí


Resposta do autor:

 

Ótimo palpite! Achei pertinente!

Espero que goste da minha versão rs 

Fico feliz por tê-la como leitora dessa história! Grata!

Beijos e até breve!

 

 

Responder

[Faça o login para poder comentar]

Marta Andrade dos Santos
Marta Andrade dos Santos

Em: 17/07/2021

Complicado


Resposta do autor:

 

Né

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NovaAqui
NovaAqui

Em: 17/07/2021

Isso, Renato e Samanta! Façam um festa sim! Ei, hein! Tem que ter bolo, guaraná e muitos doces kkkkkk

Com quem? Com quem? Com quem Beatriz vai conversar? Claro! Só pode ser ela! A única! A espetacular! A grande bruxinha Cícera! Uhuuuu;;!! Ela vai ter todas as respostas

Essa capítulo foi muito bom

Bom final de semana!

Vacina no braço!

Comida no prato!

#ForaBolsonaro

Abraços fraternos procês aí!


Resposta do autor:

 

Rsrs 

Esse capítulo foi bom msm! Que bom que gostou!

Cícera, a bruxa, vai ter msm todas as respostas. E mais!

Bom fds pra vc tb! Se cuide!

Beijos!

 

 

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