Quando eu parei a moto em frente a vila, e ela desceu, parecia que todos os movimentos dela estavam em câmera lenta, sabe aquelas cenas de filme, quando a gostosona tira o capacete e os cabelos começam a cair em cascata pelos ombros, pois é...meu Deus que mulher era aquela, que sem nenhum esforço conseguia prender a atenção de tantas pessoas, sim, porque a essas alturas, tinha pelo menos meia dúzia de macho, de boca aberta do outro lado da rua.

Todos eram conhecidos, me respeitavam, e quando viram a cara que eu fiz , disfarçaram de forma tosca, quando foram pegos no flagra.

_Vamos entrar?_ falei segurando o capacete que estava com ela.

_Como assim, vamos entrar? Vou morrer de vergonha de chegar assim sem avisar na casa dos seus amigos, ou seja, lá quem for.

_ Aline eu moro aqui, essa é a minha vida além da construtora.

_Por que me trouxe aqui?_ Ela falou olhando pra mim séria.

_Podemos conversar lá dentro?_ Pedi

Abri o portão para entrarmos e deixei que ela entrasse primeiro. Não foram necessários mais que dez passos pra ouvir uma voz pra lá de conhecida.

_Boa tarde Nick, achei que tinha sido abduzida?

_Boa tarde Karina, essa é Aline.

As duas se cumprimentaram rápido e eu pedi licença, e avisei que depois iria ver ela e a Flavinha. Mas...quem conhece a Karina sabe que ela jamais deixaria uma oportunidade daquelas passar em branco, e quando eu indiquei a escada para a Aline subir na minha frente, senti um tapa na bunda, e quando virei, ela sussurrou.

_Vai passar bem, quem é essa delicia.

Juro por Deus, que em outra situação teria batido na Karina, subi rápido atrás da Aline, antes que a bocuda falasse mais besteira.

Essa era a primeira vez que eu trazia alguém até o meu cafofo, tudo era muito simples, apenas um quarto, uma sala, uma cozinha e o banheiro. Apesar de pequeno, era muito aconchegante, confortável e organizado, como diria a Karina: A sua vida pode ser uma zona, mas a casa é impecável.

Outra mania incorrigível que eu tinha era entrar em casa e tirar o que estivesse calçando, depois ligava o som e ia direto para o chuveiro, e dessa vez não foi diferente. Tirei a bota e guardei, mas achei melhor esperar pra escolher uma música pra ouvir depois que voltasse do banho.

_Preciso tomar um banho, se incomoda de esperar um pouco?

_De forma alguma, fique a vontade _ falou observando um painel enorme que tinha na parede da sala onde haviam  diversas fotos.

Peguei o roupão e entrei no banho me questionando se eu havia feito a coisa certa, se teria assustado ela com esse convite, se ela estava desconfortável, se queria ir embora...

Para a minha surpresa, após sair do banheiro, quinze minutos depois, a cena que eu vi, provocou em mim tantas coisas, que nem eu mesma consegui decifrar.

Aline estava sentada no tapete da sala,  as pernas cruzadas, uma taça de vinho na mão, os olhos estavam fechados e ela parecia tranquila de uma forma que eu ainda não tinha visto, era o tipo de cena que deixava o coração leve. Uma mulher linda, rica, bem sucedida, sentada no chão da minha sala, e esse momento era até covardia ser interrompido.

Sem que ela percebesse, fui para o quarto e coloquei uma camiseta e um short, e quando voltei pra sala ela me encarou de uma forma que se eu tivesse nua, não faria a menor diferença.

_Por que me trouxe pra sua casa? _ Aline perguntou sem rodeios.

_Lembra do nosso primeiro encontro?

_Sim, lembro.

_Trouxe você aqui porque queria que você me conhecesse como eu realmente sou, não queria que você me julgasse da mesma forma que eu te julguei, ou tentei julgar.

_Nicole, agora você conhece um pouco mais da minha vida...

_Espera, me deixa terminar, por favor.

_Eu não sei o que está acontecendo comigo Aline, desde a primeira vez que eu te vi, eu soube que era você, da mesma forma que eu sei que jamais daria certo, mesmo que você fosse lésbica, vivemos em mundos completamente diferentes, sem contar que você é a minha chefe.

_Realmente nunca daria certo_ Aline falou de forma tão firme que me surpreendeu.

_Foi o que eu falei_ Respondi da mesma forma.

_Pode chamar um Uber, ainda preciso pegar o meu carro.

_Eu te levo, é o mínimo depois de fazer você perder tanto tempo.

_Não resisti ao seu vinho, depois compro outro.

Esse é o resultado de uma sagitariana e uma canceriana juntas, uma explosão quase incontrolável, uma duelo de sentimentos, onde ninguém quer dar o braço a torcer, onde a sensação  é que colocamos uma barreira instransponível entre nós.

Voltei para o quarto, coloquei uma calça e calcei um tênis, era melhor fazer o que ela queria, o clima tinha ficado pesado, parecíamos duas crianças birrentas. Mas, além disso, da minha parte havia uma sensação de estar deixando tudo que eu acreditava escorrer entre os meus dedos, uma sensação de impotência, de fraqueza e eu sabia que se passássemos por aquela porta não haveria uma segunda chance.

Mas eu não poderia forçar uma situação, jamais tentaria algo contra a vontade dela, que a essa altura já estava de pé.

Quando passei por ela para pegar a chave da moto, nossos braços encostaram levemente e quando eu tentei me afastar, senti a mão dela segurando a minha, e quando vi aqueles olhos cor de mel, com um brilho que eu jamais conseguiria descrever se perderem nos meus, tive a mais absoluta das certezas de que esperaria por ela por toda a minha vida, mesmo que eu tivesse que conquista-la todos os dias.

_Se você não me beijar, eu juro que saio por essa porta e você vai perder a chance de me ensinar a te querer mais do que eu já quero.

_Aline, tem noção do quanto eu quero sentir o gosto da tua boca?_ Por favor, não me pede pra parar.

A energia era quase palpável, a vontade que tínhamos uma da outra era tão grande que nossos olhos brilhavam, nossa pele estava arrepiada e por uma fração de segundos eu tive a sensação que tudo ao nosso redor havia desaparecido e só tinha restado eu e ela.

Sempre quis descobrir o significado real da expressão, encontro de almas, e naquele momento eu descobri. Aline era a minha alma, uma parte de mim que estava perdida, sem rumo, me encontrei naquele par de olhos cor de mel, naquela boca a centímetros de distância. A respiração era calma, embora o coração estivesse enlouquecido, repleto de um sentimento tão bom, tão especial, que chegava a doer.

Sabe quando a vida, o destino, os deuses, os anjos, te enviam um sinal? Estávamos com a testa encostada uma na outra, quando começa a tocar uma música que com certeza era a resposta para todos os meus receios, minhas dúvidas, meus medos, era o sinal que eu precisava pra voltar a viver, respirar...

Celine Dion - A new day has come

A new day has come

A new day has come

I was waiting for so long

For a miracle to come

Everyone told me to be strong

Hold on and don't shed a tear

Through the darkness and good times

I knew I'd make it through

And the world thought I had it all

But I was waiting for you

Um novo dia chegou

Um novo dia chegou

Eu esperei por tanto tempo

Pela chegada de um milagre

Todos me diziam para ser forte

Aguentar e não derramar uma lágrima

Por momentos bons e sombrios

Eu sabia que passaria

E o mundo pensou que eu tinha tudo

Mas eu estava esperando por você

Fim do capítulo