Capitulo 5 – Um pesadelo

Não sei quanto tempo fiquei paralisada, a sensação era de não conseguir respirar, de não sentir as minhas pernas. Escutava vozes, mas parecia estar muito distantes. Sabe quando você tem a sensação de tudo ao seu redor parou?

Voltei a minha atenção para o mar, queria ter a certeza que era coisa da minha imaginação, e olhei outra vez na direção daquela voz, e vi que era real, que ela estava diante dos meus olhos.

_Luciana Ferraz, a que devo a honra?

_Nicole  Oliveira, a ironia continua sendo sua marca registrada?

_ Depende, é principalmente quando sou pega de surpresa por um ser do além.

_Está me vigiando ou a sua bola de cristal continua funcionando muito bem?

_Eu estava na caverna, vi quando você passou, dei um tempo e vim falar com você.

Caverna é um bar que nós costumávamos ir quando estávamos casadas. Pois é, minha ex agora resolveu me seguir, o motivo ainda não sei, mas pode ter certeza de que vou descobrir.                           

Esse bar era nosso point, conheci muitos dos meus amigos lá, e depois que nos separamos acabei vindo morar aqui e ela continuou na nossa casa, que hoje é dela. Fiz questão de sair e deixar absolutamente tudo, queria apenas minhas coisas pessoais e a minha dignidade. A caverna é de um amigo, o Paulinho, e ele nunca me perdoou por não ter ido mais lá, e um dos motivos é que ela sempre frequentava, e pra mim não ia rolar ficar colocando o dedo na ferida, todas as vezes que a encontrasse por lá.

Sou muito tranquila em relação a determinadas situações, mas me conheço o suficiente pra saber que um dia a casa iria cair. Que depois que ela tomasse umas cervejas, ela iria encher o meu saco, provocar, até que eu perdesse o controle, e isso me deixaria muito mal depois, pois sempre, prezei muito pela minha imagem, nunca gostei de barracos, nunca bati em mulher, nunca encostei um dedo em nenhuma pessoa com a qual já me relacionei, não suporto relacionamento abusivo, e sabia que se não evitasse determinados lugares, iria acabar indo de encontro a tudo que eu acredito.

Eu tive a noção exata do meu alto controle quando, em uma madrugada, acordei e senti a falta dela na cama. Ela foi para a  festa de um amigo e por estar muito cansada, eu fiquei com as crianças, ela tinha duas filhas, minhas paixões.

Sabe aquele dia que parece que o teu anjo da guarda está grudado em você?

Eu levantei e o silêncio era absurdo, fui ao quarto das crianças, e a minha boa e velha intuição gritou, eu abri a porta e a vi aos beijos com outra dentro do carro.

Eu sempre tive o sono muito pesado, principalmente quando estava bem, sem problemas. E creio que foi exatamente isso que ela pensou, e jamais imaginou que eu acordaria e muito menos abriria a porta.

Eu voltei para o quarto e ela entrou, eu já estava arrumando as minhas coisas, chamei um táxi, avisei que mandaria alguém pegar a moto e que depois marcaria pra falar com as crianças e sai, simples assim.

E cá estamos nós, dois anos depois, eu surpresa, assustada e chateada por não conseguir ter nenhuma reação, e ela me olhando, me encarando, como se esse encontro fosse a coisa mais natural do mundo.

_ Sua mulher sabe que você está aqui ? Ou você deixou ela dormindo e veio atrás de mim?_ Essa frase, nesse momento foi uma merd*.

_Ela está no bar, eu avisei que iria falar com você.

_Falar comigo, interessante, não lembro de ter marcado com você!_ A minha cara de deboche era visível.

_Queria pedir desculpa por tudo.

_Primeiro que, desculpas, não apagam absolutamente nada.

_Segundo, essa história já está morta e enterrada.

_Terceiro, a única coisa que temos em comum, são as crianças, jamais vou me afastar delas, deixar de ligar, de sair com elas, a menos que você proíba, e isso é um direito seu _ pausa para res pirar.

_Jamais faria isso, elas amam você...

_E o erro não foi meu, se não fui mais buscar elas pra ficarem comigo, foi porque estava doente, me cuidando e seria pesado demais para elas.

_Soube que voltou a trabalhar!

_Seus informantes são competentes, parabéns!!!

_Pelo jeito não tem conversa.

_Luciana, tudo foi resolvido naquela noite, você está tocando sua vida, eu tocando a minha vida e ponto, tudo como tem que ser.

_Eu preciso ir, amanhã acordo cedo, boa noite. Sai sem olhar para trás e com a certeza que coloquei o ponto final nessa história.

Entrei em casa e fui direto para o chuveiro, um banho morno, me deixaria relaxada e ajudaria a dormir melhor, apesar do calor, eu sempre fazia isso quando precisava relaxar. E hoje o meu dia foi puxado, foi surpreendente e fechou com chave de ouro.

Tenho a sensação da ter carregado por dois anos, uma tonelada nas costas, e hoje tirei de uma só vez. Estava me sentindo leve, talvez, se eu tivesse tido essa conversa antes, não teria passado por tudo que eu passei, não teria enfrentado uma depressão.

A melhor parte desse relacionamento com certeza, são as crianças. Quando conheci a Luciana, a Bia tinha apenas cinco aninhos e a Sara dez. No começo a adaptação foi bem difícil, principalmente com a Sara, que por ser uma mocinha, já entendia tudo. A Bia, é a minha princesa, um doce de menina, e reclama muito quando eu demoro pra ir pegar elas. Hoje temos uma convivência tranquila, desde o começo, combinamos de não tocar em nenhum assunto relacionado a mãe delas, e assim,  elas sempre que podem vem passar o final de semana comigo.

Alguns amigos acham, que eu tenho esse elo com as crianças,   por causa da mãe delas. Fui casada por cinco anos com a Luciana, e tenho um amor tão grande por Bia e Sara, que jamais usaria as duas para me aproximar da mãe delas.

Parece que foi ontem que eu sentei com as duas pra tentar explicar o que estava acontecendo, e ainda ter a preocupação de não apontar o dedo para a mãe delas. A Sara já estava com quinze anos, e sabia exatamente de toda a história, foi opção da mãe contar toda a verdade, embora eu acredite que ela percebeu, já no outro dia. A Bia demorou um pouco para aceitar, se revoltou com a mãe, pediu várias vezes que eu voltasse, meu coração ficava em pedaços, mais uma volta era impossível de acontecer.

Hoje estamos todos bem, eu pelo menos, tentando tocar o barco.

Por decisão minha, opção minha, não me relacionei com ninguém nesses dois anos. Resolvi me cuidar, dar um tempo para que o coração cicatrizasse por completo, sem chances de abrir as feridas, e confesso, que apesar de ser muito difícil , dormir e acordar todas as noites sozinha, foi a melhor decisão que eu tomei. Não seria justo, colocar outra pessoa na minha vida, sem antes colocar um ponto final nessa história, e hoje vejo que foi a melhor decisão que tomei, depois de ter decidido acabar com o meu casamento, claro.

Fim do capítulo