Capitulo 41
A Última Rosa -- Capítulo 41
Augusta debateu-se o quanto pôde, mas Michelle era muito mais forte que ela.
-- Me larga, sua maluca -- ela berrou a pleno pulmões -- Vou chamar a polícia.
-- Chama, querida -- Michelle deu uma risada debochada -- Quem sabe não ficaremos juntas na mesma cela.
Augusta a encarou, como se estivesse assimilando a afirmação da ruiva.
-- O que está querendo dizer com isso?
-- Que você vai me ouvir bem caladinha -- Michelle afastou-se dela com um empurrão -- Nossa conversa será rápida.
A médica fez um gesto com a mão.
-- Escuta, Michelle, não tenho nem tempo nem energia para jogar conversa fora. Tenho um paciente me aguardando -- ela se virou e deu um passo em direção à porta.
Michelle segurou-a pelo braço, obrigando-a a voltar-se.
-- Não se faça de boba, doutora. Eu sei que foram vocês duas que tentaram me matar naquele dia.
O rosto da médica endureceu, os olhos faiscaram.
-- Sua louca, não tenho nada haver com isso.
-- Não? Interessante né, porque será que o meu carro está com marcas de tinta vermelha? -- ela perguntou irônica, e depois acrescentou: -- Não vai ser difícil a polícia descobrir em qual oficina você deixou o seu carro -- Michelle se afastou e foi sentar-se na grande cadeira de couro atrás da mesa -- Eu não perdi a memória, doutora, apenas fingi para que você não me matasse lá no hospital.
Ao ver que ela permanecia em silêncio, Michelle comentou:
-- Sabia que é crime o que vocês fizeram? Mentir que a Marcela não andava só para que a Jessica não a deixasse. Você não tem vergonha? -- Michelle se levantou da cadeira e foi até ela -- Você vai se arrepender por mentir em seu depoimento.
-- Você não tem provas, marcas de tinta na lataria do seu carro não prova nada.
Para esse momento, Michelle já havia formulado o Plano B.
-- Lembra do caminhão que vinha no sentido contrário e eu quase bati de frente com ele? Pois é, doutora capeta, ele voltou para me ajudar. Só não testemunhou contra vocês porque eu pedi -- ela falou e observou atentamente a reação da médica. Era uma mentira que podia dar certo.
Augusta ficou imóvel, encostando-se à parede, acuada como um cervo espreitado por um leopardo. Por um tempo ela nada disse, apenas fuzilou Michelle com os olhos. Até que resolveu falar:
-- Não mudarei uma vírgula do meu depoimento -- Augusta disse, lentamente, tropeçando nas palavras. Ela viu Michelle caminhar de volta para a mesa e pegar o celular na bolsa.
-- Que pena, poderíamos ter evitado muitos problemas -- sua mão tremia quando ela começou a digitar o número da polícia. Não pensou que fosse ter que chegar a esse ponto.
Augusta não conseguia se mexer nem pensar. Pense! Pense rápido, diga algo, qualquer coisa. Mas estava paralisada pelo medo das consequências que aquela denúncia traria à sua carreira. Deus! Não! Não podia.
-- O que devo fazer?
Aliviada, Michelle inspirou fundo e soltou o ar preso dos pulmões.
-- Falar a verdade, é só isso que eu quero que faça. Todos nós sabemos que não foi a Jessica quem assassinou a Marcela. Porque está fazendo isso?
Augusta balançou a cabeça devagar.
-- Nem sempre as coisas saem como planejamos -- declarou de modo enigmático -- Temos um acordo -- disse ela, abrindo a porta.
Michelle se levantou da cadeira, atravessou a sala e a encarou.
-- Não me obrigue a voltar aqui, doutora. Cumpra o acordo e não teremos problemas -- ela ajeitou a bolsa no ombro e saiu decidida.
Satisfeita, sorriu para Valquíria que a esperava ansiosamente na recepção.
-- Então, o que ela disse?
Michelle olhou ao redor e apontou para a porta.
-- Conto tudo lá fora.
Jessica olhava as pessoas, as gavetas funerárias, os murmúrios, ela sentia um estranho alheamento. Parecia que aquelas coisas não estavam acontecendo, que ela não estava ali realmente e que o corpo dentro do caixão envernizado, com alças de metal dourado, não era o de Marcela. Tudo parecia um pesadelo.
Enquanto o corpo de Marcela era levado à sepultura, Jessica jurava fazer o impossível para encontrar o assassino, mesmo que isso adiasse por algum tempo, os seus planos profissionais. Faria pagar caro por tirar a vida de uma mulher honesta, cheia de sonhos, desejos e esperanças para o futuro. Estava pronta para enfrentar quaisquer desafios. Mais do que provar a sua inocência, queria vingança
-- Jess -- Michelle que continuava com o braço enganchado ao dela murmurou, como que para lembrá-la de sua presença -- Tudo bem, amor?
Jessica olhou ao redor e percebeu que as pessoas a observavam com um olhar acusador como se ela fosse a assassina.
-- O povo de Hills já fez o seu próprio julgamento -- disse ela, com um olhar amargo.
-- O povo julga demais sem saber.
-- Gostaria que eles espalhassem a verdade com a mesma velocidade que espalham os boatos. Depois que sua imagem é manchada perante a sociedade, dificilmente se consegue recuperá-la.
Um leve sorriso curvou os lábios sensuais de Michelle.
-- Não se preocupe com os olhares e comentários do povo, em breve tudo se esclarecerá e eu mesma vou me encarregar de sair gritando pelos quatros cantos de Hills.
Jessica deu um profundo suspiro e balançou a cabeça de um lado para o outro.
-- Só você mesmo, Maya -- Jessica olhou outra vez ao redor, dessa vez à procura da médica -- Você viu a Augusta?
-- Não -- Michelle franziu o cenho -- Que estranho, amor!
-- Muito estranho -- Jessica concordou, preocupada.
-- Sinto muito! -- disse um homem, vindo até ela, enquanto a gaveta era lacrada.
-- Obrigada.
Da mesma forma discreta que chegou o homem se afastou. Olhou para trás duas vezes antes de cruzar o portão de saída do cemitério.
-- Que homem esquisito, Jess. Você o conhece?
-- Não, mas seu rosto me é familiar.
Havia terminado a cerimônia fúnebre. Nada mais havia a fazer.
Michelle abraçou-a.
-- Vamos embora, amor. Eu dirijo para você -- disse a ruiva, carinhosamente, segurando a mão da noiva.
-- Estou bem, Maya, não se preocupe -- respondeu ela, cabisbaixa, olhando os funcionários do cemitério terminarem o trabalho.
-- Não vamos discutir, eu dirijo, vamos lá -- insistiu Michelle, carregando-a na direção do portão de saída.
Michelle ainda olhou pela última vez para as coroas e os inúmeros vasos com flores levados pelos amigos, clientes e funcionários da empresa.
-- Marcela gostava muito de flores. Nosso jardim era um dos mais lindos da região.
-- Agora vamos -- disse Michelle.
Ao sair, Jessica sentiu que deixava lá dentro boa parte de sua vida. Sentiu-se grata a ela, mas apenas isso: grata. Nunca a amara na verdade. Faltou amor de casal ao casamento, excitação, aventuras, perigos, cumplicidade. Nada disso, porém, aconteceu. Por mais que tentasse, Jessica não conseguia pensar em Marcela nada mais que uma amiga.
-- Vamos tomar um sorvete? Acho que precisamos disso -- falou Michelle, assim que entraram no carro.
-- Está bem, você escolhe -- respondeu, sem vontade.
Michelle olhou para Jessica, ela tinha uma expressão triste no olhar. Pôs o carro em movimento e rumou para o centro de Hills, deixando para trás a tranquilidade do cemitério. Inês, Pepe, Vitória e Valquíria também deixaram o local.
Jessica pensou, por instantes, depois falou:
-- Deve ser horrível ser deixado sozinho, num local como esse desconhecido e silencioso.
Michelle olhou para ela e sorriu.
-- O que ficou aqui foi o envoltório do Espírito, Jess. Não se preocupe, o Espírito da Marcela não está sozinho.
Entardecia em Hills. O cheiro de maresia era forte no ar, enquanto o céu se tingia de tons amarelados e avermelhados. O carro parou em frente a sorveteria Generosa, um lugar muito frequentado pelos turistas, não muito longe da baía. Dali, podia-se avistar a praia lotada e muita gente caminhando pelo calçadão.
Jessica e Michelle foram sentar-se num canto isolado, mas de onde se tinha uma vista da rua e das pessoas que aproveitavam um verão excepcionalmente quente.
Michelle pegou o celular ao ouvir o barulho de notificação do WhatsApp.
-- O Pepe enviou uma mensagem avisando que também estão vindo tomar sorvete.
-- Que bom, estou curiosa para saber o que eles conseguiram arrancar do gerente da locadora.
-- Qual o sabor que vai pedir? -- quis saber Michelle, mudando de assunto. Estavam passando por um momento terrível, mas queria que Jessica esquecesse temporariamente dos problemas.
-- Acho que vou tomar um sorvete de leite condensado.
-- Bela pedida, Jess. Vou pegar o mesmo.
Michelle foi buscar os sorvetes, enquanto Jessica olhava as pessoas no calçadão. Não conseguia pensar em nada. A morte de Marcela anestesiou-a. Era assim que se sentia.
Michelle retornou com duas taças e colocou-as sobre a mesa.
-- Alô, alô, mundo chamando Jess -- ela brincou -- Tente desligar-se um pouco dos problemas, amor. Você está tão amuadinha.
-- Talvez seja o cansaço, as emoções, a morte dela foi repentina e traumatizante. Eu não amava Marcela como esposa. Pode compreender isso? A gente convivia. A gente se tolerava, vivíamos como boas amigas, apenas isso.
-- Mas ela queria mais, Jess. Marcela te amava e a queria como esposa, amante, companheira. Não sei definir ao certo também. Mas com certeza não queria uma amiga. Esse casamento sem calor, sem paixão, sem ardor, assustava ela. Marcela tinha muito medo de que você a deixasse.
-- Mas como você queria que fosse? Afinal de contas, eu nunca deixei de amar você. Ela sabia e aceitou as regras de um jogo que jogávamos por hábito. Apenas isso! Só isso! -- afirmou, pateticamente, olhando Michelle com lágrimas nos olhos -- Meu erro foi ter aceito essa situação. Devia tê-la deixado antes, dado a ela a oportunidade de encontrar alguém que a fizesse feliz.
-- A culpa foi dela, Jess. Preferiu ficar em uma cadeira de rodas só para prendê-la junta à ela.
-- O que? -- quando Jessica olhou para Michelle, ela corou -- Como assim, preferiu?
Nervosamente, Michelle levou uma colher de sorvete à boca. Jessica esperou ela degustar, pegar o guardanapo e passar lentamente sobre os lábios.
Michelle suspirou fundo, não era o momento nem o lugar para tal revelação.
-- A Augusta...
-- Ai, ai, ai, danadinhas! Começaram sem nós! -- Pepe deu a volta na mesa e puxou uma cadeira para se acomodar mais próximo de Jéssica. A perfumista ergueu o olhar para encará-lo.
-- Que hora, hein! -- reclamou.
-- Porque? -- perguntou Valquíria, sentando-se ao lado de Michelle.
-- Por nada -- respondeu Michelle, aliviada -- Onde está a tia Inês?
-- Namorando -- disse Pepe -- Velha assanhada!
-- Pepe! -- Vitória deu um tapa no ombro dele -- O delegado Nilson a chamou para conversar. Eles estão lá fora.
-- Não gostei da cara do delegado.
-- Porque Valquíria? -- perguntou Jessica.
-- Ele está muito carrancudo e você sabe que isso é raro.
Michelle se revirou na cadeira.
-- Pare de imaginar coisas, Valquíria! Já temos problemas demais.
-- A Valquíria tem razão, Mi -- afirmou Pepe -- Acho melhor a chefe já ir criando o DVDM.
-- O que é isso?
-- "Departamento de Vai Dar Merda".
-- Seu idiota! O que você conseguiu com o gerente da locadora?
-- Pinguinho de gente, meu amor! Eu e o Nícolas temos informações preciosas sobre o homem misterioso.
-- Fala logo.
-- Ah, não. Primeiro vou pegar sorvete -- Pepe se levantou e saiu.
-- Cara sem noção -- Jessica levou uma colher de sorvete à boca enquanto esperava o retorno de Pepe.
-- Eu também vou me servir, vamos Vitória? -- Valquíria se levantou.
-- Vamos.
Assim que elas se afastaram, Jessica se virou para Michelle.
-- Em casa continuamos a nossa conversa.
-- Sem problemas -- Michelle respondeu, fingindo casualidade.
O rosto delicado de Inês tinha uma expressão sombria quando ela parou ao lado da mesa.
-- Nilson precisa falar com você, minha filha. Ele está lá fora.
Jessica não perguntou nada. Não precisou. O olhar da tia dizia que algo muito ruim acontecia.
-- Quer que eu te acompanhe? -- perguntou Michelle.
-- Não, está tudo bem. Me esperem aqui.
Cuidem-se e cuidem ainda mais daqueles que você ama .
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
HelOliveira
Em: 08/06/2021
A cada capitulo fico mais curiosa...agora.ainda sua surgiu mais Homem estranho....
Eita que vamos descobrir o que o delegado tem pra.falar..
Bjos e se cuida tb
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