CAPÍTULO 50 ESPERANÇAS
— Claro, ela fez das crianças, um projeto científico, e por isso ficou famosa e reconhecida mundialmente, por isso os meninos não se parecem com ninguém. Devem se parecer com os pais biológicos. Entende porque eles não gostam que digam que eles são filhos dela? — Olhava para frente enquanto falava, em busca de uma forma de sair do engarrafamento.
— Agora eu entendi. Como foi para eles quando souberam.
— Ficaram loucos, mas minha ex-sogra e meu ex-sogro penaram muito, e a Jenny nasceu quando eles não tinham mais esperanças, então quando os meninos nasceram, foi amor à primeira vista. Eles conversaram com os meninos e conseguiram convencer eles de que eram uma família.
— Mais um motivo para eu não querer ela trabalhando na minha gravidez, vai que ela muda algunha coisa.
— Não sei, mas com o conhecimento que ela tem, eles permitem que ela tome certas decisões, tudo em nome da pesquisa e da ciência.
— Está vendo. Quero ela bem longe dos meus filhos que já vivem e dos que ainda vão viver, e não quero saber dela andando por aí dando palpite na sua vida. Aliás, além de nós duas, não admito que mais ninguém dê palpite na vida de nossos filhos.
Luíza tirou o cinto de segurança, aproveitou que estavam presas no engarrafamento e segurou o rosto da morena entre suas mãos, focando dentro dos seus olhos enquanto dizia delicadamente:
— Eu nunca fiz questão de ser fiel a ninguém, nem tampouco exigi isso de outras pessoas que passaram na minha vida. Nem mesmo com a Jenny que fui casada por seis anos eu fui fiel. E nunca tive remorsos. Como ela viajava muito e quase nunca estava em casa, eu sempre tinha namoradas por fora e ela sabia. Mas com você é diferente, jamais vou olhar, desejar ou querer outra mulher, porque você é tudo que eu pedi a Deus a minha vida toda — continuou, olhando aqueles olhos castanho-amarelados de Fabiana, que brilhavam como duas esmeraldas.
O sorriso aflorou em sua boca e cresceu para seu semblante, terminando em seus olhos, onde fez moradia. Ela tinha certeza de que nunca antes havia se sentido tão amada e completa como nesse exato momento. Assim, as palavras que saíram da sua boca eram a expressão da mais pura verdade.
— Eu sou exclusiva sua. E serei até o meu último suspiro. Minha loira linda. Por isso quero ter um filho seu. Gestar um bebê seu é ter você presa a minha alma para eternidade. — Foi inevitável que seus olhos umedecessem com as lágrimas.
Luíza a puxou para seus braços e se perderam em um beijo calmo, cheio de afeto e amor. De repente, ouviram barulhos altos e descobriram estarem sendo interrompidas com as buzinas dos carros avisando que elas deveriam colocar o carro em movimento, já que o sinal estava verde e elas estavam interrompendo o fluxo. Fez um carinho no rosto da morena como quem pede desculpa por parar o beijo abruptamente, colocou novamente o cinto de segurança e ligou o carro – sempre olhando dentro dos olhos da mulher amada. Passou a primeira marcha, olhando para os retrovisores, cautelosa, com receio de um motorista imprudente tentar ultrapassada sem um aviso, causando uma colisão. Olhou para a estrada quando sentiu uma mão se posicionar em cima da sua, entrelaçando seus dedos. Fez uma oração aos céus pedindo para ter mais tempo aqui no plano terrestre.
[...]
Fabiana olhava os quadros espalhados na parede branca da clínica até onde a vista alcançava. Imagens de praias lindas, morros e cachoeiras descendo montanha abaixo, de pôr do sol e de vários tipos de pássaros dos quais ela nunca ouvira falar. Um rapaz passava o pano com desinfetante no piso mais lá na frente, onde uma placa triangular avisava para ter cuidado. Uma senhora baixinha já com uma certa idade colocava em uma mesinha de lado uma garrafa grande com café e outra com chá, um pote de vidro cheio de bolachas e salgadinhos e uma travessa com maçãs. Fabiana a tudo examinava, achando correto, afinal todo paciente ali sentado, o que não era pouco, pagava muito caro o plano de saúde e merecia esse conforto. Estava absorta e não viu seu nome ser chamado, só quando Luíza cutucou seu braço que notou estar sendo chamada.
— D. Fabiana e D. Luíza, podem entrar, a Dra. Margareth vai atendê-las — a mocinha da recepção chamou e falou bem baixinho.
Fabiana olhou para Luíza, que olhou de volta para ela sem entender o que estava acontecendo.
— Meu bem, deve estar havendo um engano, olha novamente a ficha. Meu médico é o Dr. Isac — pediu, esticando o pescoço para tentar ver seu nome na fileira de pastas com os exames das pacientes.
— Está certo, olhe a senhora mesma. — Girou o monitor do computador para o lado de Fabiana e Luíza, ambas olharam e constataram que ali estava agendado:
09:45 Doutora: Margareth Pinheiro
Paciente: Fabiana Linhares E Luíza Albuquerque
Procedimento: inseminação.
— Está aqui, amor. A moça está certa — Luíza falava enquanto mostrava o nome dela no computador.
— Senhora, o Dr. Isac viajou hoje pela madrugada para resolver um problema familiar e repassou sua agenda para a Dra. Margareth, que, além de ser sua pupila, é também sua filha e excelente ginecologista.
Fabiana tinha vaga lembrança da garotinha de mais ou menos uns onze anos que corria pelo consultório quando ela estava grávida do Marcelo e fingia ser médica. Muitas vezes o pai a expulsava do consultório para examinar Fabiana.
— Ele retorna quando?
— Como é um problema de doença em família, ele cancelou sua agenda e passou seus pacientes aos médicos aqui mesmo do hospital. Então, siga a linha azul, o consultório é o 208. — Entregou a Luíza os papéis, e as duas seguiram a linha azul no chão onde também podia ser notado uma linha vermelha e outra verde, todas iam para especialidades diferentes. Depois de duas voltas, chegaram à sala em um corredor branco com portas de um lado a outro, todas numeradas – de um lado par, do outro ímpar. Luíza deu três batidinhas na porta, entrando em seguida.
— Bom dia, senhoras. D. Fabiana e D. Luíza, quem é quem, por favor? — Uma médica branquinha como a neve, com uma vasta cabeleira vermelha e com olhos verdes, olhava para as duas e sorria. Com a mão estendida, mostrava o par de cadeiras em frente à sua mesa para que as duas sentassem, o que fizeram sem demora.
— Eu sou Fabiana e esta é minha esposa, Luíza.
— Bem, segundo os exames aqui, o procedimento vai ser feito com a senhora, dona Fabiana, certo? — perguntou, falando de cabeça baixa, examinando os papéis. Em seguida continuou: — Bem, seguindo as orientações do seu médico, vou explicar umas coisinhas, tudo bem?
— Pode explicar, mas acredito que ele já tenha feito isso nas visitas anteriores — Fabiana Falou.
— Bem, como vocês devem saber, existem dois tipos de fertilização: a intracervical (IC), que nada mais é do que inserir o esperma no cérvix, e a intrauterina (IU) em que o esperma é inserido no útero.
— Mas, doutora, qual a mais eficaz, ou melhor, a que tem mais chances de eu engravidar na primeira tentativa, já que não sou mais nenhuma adolescente e o tempo está correndo pra mim?
— Eu aconselho a intrauterina. Já que nessa os espermatozoides passam por um tratamento.
— Mas essa não é aquela em que o esperma é colocado dentro do útero e segue o caminho como se um homem tivesse ejaculado dentro? — Luíza que perguntou, deixando Fabiana curiosa e aguardando a resposta.
— Sim, nessa a fertilização tem 20% de chance de engravidar, e no outro método é menos de 5% — ela falava e mostrava um gráfico no projetor em cima da mesa, que transmitia a imagem atrás da sua cadeira, que foi afastada para que ela pudesse explicar melhor.
— Mas nós escolhemos a in vitro. A Fabiana já fez todo o tratamento, meus óvulos já foram coletados, e hoje é só para injetar os embriões — Luíza explicava à médica enquanto tentava segurar Fabiana, que já tentava levantar e sair da sala.
— Só um minuto, dona Fabiana. Eu recebi o aviso, hoje pela madrugada, de que meu pai precisava voar para Santa Catarina. Minha vó, mãe dele, está indo para outro plano e ele foi se despedir. Não tive tempo de examinar o prontuário dos pacientes da manhã. Só um minuto — pediu enquanto abria e fechava gavetas, espalhando papéis em cima da mesa que já estava lotada. Por fim, abriu uma pasta e o computador.
— Pronto, achei. Mil perdões, dona Fabiana. As senhoras estão corretíssimas. Um instante, por favor. Dona Zuleide, venha até aqui, por favor. — Após desligar o interfone, se voltou para as duas. — Então, vamos para a sala ao lado colocar os seus bebês na casinha deles. Deixa eu ver... Dois embriões? Só dois? Por que não três? As chances são maiores.
— Dois são o ideal. Sou muito parideira e tenho receio de que, se colocar mais de dois, todos sobrevivam. — A médica a observava enquanto ela respondia.
Nesse meio tempo, uma moça de mais ou menos vinte anos bateu na porta e pôs a cabeça para dentro.
— Em que posso ajudar, doutora? — Aguardou do lado de fora mesmo.
— Por favor, organize essa papelada e separe na ordem em que as futuras mamães estão agendadas para a inseminação. Estou mais perdida do que cego em tiroteio, como diz o ditado. — Virando para Fabiana: — Então, minha linda, vamos, que suas crianças estão aguardando.
Fabiana e Luíza seguiram a doutora, de mãos dadas e coração acelerados.
Fim do capítulo
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