Música do capítulo – Titãs – Aluga-se

“Foco Maria Eduarda, foco! Lembre-se do que essa bandida te fez passar nos últimos dias.”

Entrei no carro e Helena ficou me olhando com uma carinha de decepção, fiquei com pena, abri o vidro e falei:

- Podemos conversar amanhã, tive um dia tão cansativo...

Helena deu a volta e entrou no meu carro, jogou as flores no banco de trás e me puxou para um beijo...Fiquei de novo sem reação.

- Desculpe Má, sei que pisei na bola contigo, mas sei lá, fico sem saber como agir, gosto demais de você...Você não imagina o quanto.  Disse logo após o beijo.

Dei partida no carro e perguntei:

- Por que você faz isso?

- Isso o que? Devolveu a pergunta.

- Helena você me deixa confusa, irritada...Tivemos uma noite tão gostosa e aí você sumiu, não ligou, não respondeu as minhas mensagens. Me deixou no vácuo.

- Também não exagere né?

- Exagero? Sério mesmo Helena? Vamos lá, há tempos que conversamos e há tempos que tento marcar algo com você e nunca dá certo, por acaso te encontrei e quando achei que finalmente iríamos começar algo, você de novo sumiu.

- Já te falei que as coisas comigo são mais complicadas, não sei lidar com esse sentimento... Por isso eu fujo sempre que as coisas começam a ficar mais sérias.

Respirei fundo, não queria brigar. A verdade é que nesse momento só queria ir para casa dormir. Fizemos o restante do caminho em silêncio, deixei Helena em sua casa, antes de sair, ela me puxou para outro beijo, mas recusei.

- Desculpa de novo Má! Sou uma grossa, eu sei. Agora pensa com carinho na proposta que te fiz, vamos viajar?

- Prometo pensar, mas agora preciso ir.

Helena desceu e saí rapidamente, do retrovisor vi que ela ficou parada no portão olhando, minha vontade era sair o mais rápido possível dali, na minha cabeça ouvia o eco: Cilada, cilada, cilada...Mas não tenho juízo, dei ré e voltei.

- Oi Má, esqueceu alguma coisa?

Não respondi, desci do carro e fui até Helena.

- Esqueci sim.

Helena me olhava sem entender nada, havia ansiedade em seu olhar.

Dessa vez fui eu que a puxei para um beijo.

- Vamos entrar? Podemos tomar alguma coisa.

Fiz um carinho em seu rosto e respondi:

- Não posso, realmente o dia foi muito cansativo, mas podemos marcar alguma coisa amanhã, o que acha?.

- Vamos jantar? Depois podemos combinar nossa viagem, que tal?

Fiquei olhando para Helena tão empolgada, o sorriso iluminando seu rosto.

- Pode ser sim, amanhã tenho só duas aulas, posso te encontrar em algum restaurante.

- Tudo bem, me liga amanhã?

- Ligo sim, agora preciso ir.

Dei mais um beijo e esperei Helena entrar, logo depois fui para casa, estava animada com aquele começo.

No dia seguinte, liguei para Helena logo cedo e marcamos o jantar, combinamos de nos encontrar no restaurante mesmo.

- Duda... Duda...

Estava distraída e não ouvi Lara me chamando.

- Reunião, vamos?

Tinha me esquecido dessa bendita reunião, levantei e saí, no corredor Lara perguntou se eu estava bem.

- Estou sim, vou jantar hoje com Helena.

- Humm...Estamos evoluindo.

- Deixa de ser chata!

- Não falei nada demais, agora silêncio.

Entramos na sala e logo Lemos começou a falar sobre o assassinato do político, disse que iríamos trabalhar em conjunto com a polícia federal e a miliar, pois o caso envolvia tráfico de drogas, chantagem, falsificação e mais um monte de coisas.

- O Luiz Ramos foi uma queima de arquivo. Começou meu chefe entregando uma pasta para cada um, com informações do morto.

- Alguma pista? Perguntei.

- Por enquanto tudo está sob sigilo, mas posso adiantar que as investigações estão em andamento em vários estados, como Mato Grosso do Sul, Rondônia, Rio de Janeiro e São Paulo.

- E esse tal Luiz Ramos?

- Ele era o tesoureiro da organização podemos dizer assim, na casa dele encontramos várias planilhas com valores lançados, os computadores estão sendo periciados, mas está tudo codificado e além do mais os nomes que encontramos são na verdade codinomes. Temos muito trabalho pela frente.

- Interessante que ele está sendo tratado como herói pela mídia, o cara que combateu a corrupção. – Observou Lara.

- Isso é uma estratégia dos advogados dele, querem colocar a opinião pública contra a polícia, mas vamos deixar assim, com isso podemos investigar com mais tranquilidade.

- Quando o corpo vai ser liberado? Foi minha vez de perguntar.

- Agora a tarde, mas não vai seguir para assembleia legislativa, conversei com o secretário de segurança e os advogados e para evitar tumulto, a família vai velar no crematório da Vila Alpina.

- Mas vai ser cremado?. Não seria prudente então segurar mais tempo esse corpo? Questionou um dos investigadores.

- Seguramos o máximo que podíamos, mas a causa da morte foi simples, ele foi estrangulado com o próprio cinto, não tem sinal de arrombamento, o que significa que ele conhecia o assassino.

- E as imagens da câmera de segurança?

- Todas sendo analisadas, mas por enquanto não encontramos nada. Duda alguma novidade no material que você colheu?

- Nada, nenhuma digital, nada de pelos... Mas não terminamos ainda.

- Certo, se precisar de ajuda me fale. Agora, voltem a seus postos.

Passei o dia vendo e revendo as provas, não encontrei nada, o que era bastante frustrante, a tarde fui conversar com Lara, esse caso estava estranho demais.

-Oi Dudinha, algum problema?

- Você não tá achando esse caso estranho demais?

Lara tirou os óculos e coçou a cabeça.

- Sinto que falta alguma coisa, mas já olhei tudo e não acho nenhum fio solto. Tem alguma coisa em mente?

- Pra começar acho que deveriam segurar o corpo mais tempo, amanhã vai ser cremado e aí se tiver alguma coisa vamos perder.

- Mas o legista foi enfático sobre a causa da morte.

- O Lorenzo está participando dessa investigação?

- Não, ele está de férias. Fala Duda qual sua teoria?

- Não tenho nada, só estou achando tudo muito estranho. Achou alguma coisa nas câmeras de segurança?

- Nada....Ou o assassino entrou por algum ponto cego...

- Ou estava dentro de casa.

- Será que o Lemos não consegue um mandato para segurar o corpo mais tempo?

- Baseado em que? Não temos nada.

- Lara acho que esse caso não é tão simples assim, tem muita coisa envolvida e gente graúda nessa história.

Lara olhou para o relógio e levantou:

- Concordo com você, mas no momento não há nada que possamos fazer.

Saímos juntas da sala dela e trocamos de assunto:

- E a Janine?

- Está bem, vamos passar o feriado por aqui mesmo e você?

- Helena me chamou para viajar com ela.

Lara parou e me olhou assustada:

- A falecida apareceu?

- Deixa de ser besta! – Rebati brincando – Mas apareceu sim, toda linda e fofa.

- Tem certeza de que é Helena mesmo? Fofura não é um adjetivo que combina com ela.

- Você é tão engraçadinha.

- Eu sei. Mas falando sério, fico feliz que ela tenha aparecido e que dessa vez é pra valer.

- Vamos jantar e combinar o local que vamos.

- Boa sorte e não deixe ela se impor, lembre-se que você saiu de um relacionamento abusivo, não vai entrar em outro.

Lara saiu sem me deixar responder, fui para minha sala pegar minha bolsa e encontrar Helena.

- Oi Duda! Saudou Helena ao me ver chegar .

- Oi Helena. Dei um beijo de leve em seus lábios e nos sentamos.

Pedidos feitos, fomos combinar o dia e local da viagem.

- Pensei em ir para a casa de praia dos meus pais, o que você acha? Essa época é mais tranquila.

- Pode ser, vou renovar meu bronzeado. Disse brincando.

- Se eu deixar, não pretendo passar o dia torrando no sol, prefiro ficar curtindo a casa com você.

Helena estava tão empolgada, que acabei me contagiando, fizemos planos, combinamos de sair na quarta logo após o expediente.

Deixei Helena em casa e fui pensando no crime, não conseguia conectar os pontos como em outros casos, alguma coisa não estava fechando, ainda pensei em ligar para Lemos, mas não tinha nada concreto, só tinha a impressão de que havia algo muito errado, Lara não conseguiu me ajudar. Sorri e pensei: “Já sei, vou ligar para o legista”. Acelerei, mal entrei em casa e liguei para o doutor Gaspar, à princípio ele ficou hesitante e acabou contando que a causa da morte foi inconclusiva, apesar de sinais de estrangulamento, os sinais não eram claros, perguntei o motivo de liberar o corpo, ele disse que foi pressão da alta cúpula da polícia. Só então, agradeci e desliguei, ainda mais intrigada.

Só tinha uma pessoa que poderia me ajudar, mas, só em falar seu nome meu coração já disparava. Resoluta, procurei seu nome na agenda do celular e disquei, estava tremendo.

- Duda? Tudo bem?.

A voz rouca de Sophia se espalhou e precisei sentar, pois minhas pernas amoleceram.

- O.. Oi... Tu.. Tudo bem e você?

- Surpresa, e confesso que estou curiosa com seu telefonema.

Respirei fundo, precisava me acalmar.

- Preciso da sua ajuda com um caso, não sei se você acompanhou pela televisão.

- O caso do deputado? Sim vi algumas coisas. Em que posso ajudar?

Falei das minhas impressões, das minhas dúvidas, da conversa com o legista e com Lara. Sophia ouviu tudo sem interromper.

- É um caso que chama muito atenção e já posso apontar um erro grande, o corpo jamais poderia ser liberado sem ter certeza do que causou a morte. Entendo a pressão no médico legista, mas, ele tem autoridade para segurar o corpo e ter certeza do que causou a morte. O que o Lemos acha?

- Na verdade, ele já tem do legista a causa da morte, então, não pode fazer nada. Será que ele não conseguia algum mandato para ter esse corpo de volta e fazer uma nova autópsia?

- Baseado em que Duda? São só suposições, muito boas por sinal, mas nenhum juiz vai conceder. Vocês podem tentar que o corpo não seja cremado, baseado no relatório do legista.

Isso acendeu uma luz no meu cérebro, eu tinha uma cópia do relatório.

- E outra coisa, já investigaram quem estava na casa no dia do assassinato? Li que a esposa e filhas estavam no exterior, veja o assessor, empregados e pessoas próximas.

Sophia era fera demais, já sabia o que fazer, ou melhor, ia tentar.

- Muito obrigada Sophia, você me ajudou muito.

- É sempre bom ajudar. E você como está?

Conversamos um pouco e desliguei. Como era bom ouvir a voz de Sophia, sempre tão firme...

Liguei para meu chefe e falei das minhas impressões e dúvidas, no começo Lemos estava descrente, mas conforme eu falava, percebi que seu interesse aumentou.

- Vou conseguir esse mandato agora, obrigada menina prodígio.

Dei risada e fui tomar um banho mais tranquila, antes de dormir Helena ligou e ficamos um bom tempo conversando e fazendo planos para a viagem.

No dia seguinte, quando cheguei para trabalhar, meu carro foi cercado por fotógrafos, repórteres e cinegrafistas, não entendi nada e entrei rapidamente.

- Que bagunça é essa?  Perguntei à Lara que me aguardava com o café.

- Seu palpite estava certo, o corpo do defunto está aqui novamente para uma nova autópsia e seu nome aparece como uma das responsáveis por isso.

Fiz uma careta, odiava esse tipo de exposição. Resolvi passar o dia sem sair, almocei por lá mesmo e nem fui dar aulas, até que tudo se acalmasse.

Na quarta-feira pela manhã nova reviravolta, o irmão do deputado, Eduardo Ramos foi preso acusado de ser o autor do assassinato, a causa da morte foi envenenamento por digitalina, encontrado no medicamento que Luiz tomava para problemas cardíacos. A dose foi administrada na comida e no vinho, o cinto foi usado para criar uma distração. A polícia estava investigando o motivo, pois segundo a família ambos eram inseparáveis. E segundo as investigações, Eduardo era o braço direito do irmão e sua morte o beneficiaria. Após a prisão de Eduardo, houve uma grande operação e muita gente foi presa, incluindo alguns deputados, senadores e até um governador.

Respirei aliviada, agora teria sossego...Engano...Quando cheguei fui obrigada a participar da coletiva de imprensa e responder algumas perguntas. Logo que saí, Lara veio brincar e me chamando de celebridade, já Lemos perguntou se eu queria fazer parte da equipe de investigação. Neguei é claro.

Liguei para Sophia e agradeci pela ajuda, fiquei com vontade de estender a conversa, mas não havia nada a ser dito;

Fim do capítulo