POV BEATRIZ

 

 

         A água fria caia em minhas costas e minha mente fervilhava no que tinha acabado de acontecer. O sabor da boca de Marcela ainda estava na minha e meu corpo inteiro estava tremulo, eu nunca imaginaria que em um mesmo dia Lívia tentaria me beijar de tarde e a noite eu estaria beijando Marcela. O que mais me assustava é que eu gostei do beijo e não conseguia arar de pensar nele.

 

-BIA, CHEGUEI. – Bernardo gritou da sala e eu desliguei o chuveiro. –Tá no banho?

 

-Estou. – Respondi me enrolando no roupão. – Já estou saindo.

 

Sai do banheiro e Bernardo estava jogado na minha cama mexendo no celular.

 

-Nossa estou exausto. – Fui até o armário procurar o que vestir antes de sentar e conversar com Bernardo. – Achei que chegaria a tempo de buscar você, mas me atrasei todo.

 

-Está tudo bem, vim de carona. – Bernardo se ajeitou na cama e me lançou aquele olhar desconfiado.

 

-O que você aprontou nessa festa? – Ele me conhecia melhor do que ninguém. – Essa sua carinha ai não me engana.

 

-Nem sei por onde começar. – Vesti uma blusa qualquer e coloquei uma calcinha de dormir. – Nessa festa aconteceu de tudo.

 

-Pois pode ir me contando do inicio. – Me joguei na cama de bruços e comecei a narrar os acontecidos da festa.

 

        Contei tudo, contei como Lívia ficou bêbada, contei a chegada de Orlando na festa e que Sandro impediu Marcela de fazer confusão. Quando contei que Lívia tentou me beijar ele ficou chocado e disse que ela não me deixaria em paz, também mencionei como os pais de Marcela eram incríveis e que amei conhecê-los.

 

-Já está intima dos pais de Sandro. – Ele debochou de mim e com certeza não fazia ideia do que eu o contaria.

 

-Tem mais uma coisa, sabe quando eu disse que vim de carona? – Bernardo me encarou curioso e respirei antes de falar.

 

-Fala logo! – Ele bateu palminhas e eu contei que Marcela insistiu em me trazer em casa e as caras que ele fazia eram engraçadas, contei nosso dialogo no trajeto até o momento em que ela me deixou na porta do prédio e que eu esqueci meu celular no carro. - E ai? Como você sabe que esqueceu no carro dela?

 

-Por que ela veio trazer. – Estava fazendo rodeios antes de contar de uma vez o que tinha acontecido.

 

-Beatriz para de fazer essa cara de cínica e me conta logo. – Bernardo odiava quando eu fazia isso.

 

-Ela me beijou!

 

-O QUE? – Ele deu um pulo na cama ficando de joelhos e levou a mão na boca espantado. – A chefona te beijou e você fez o que?

 

-Eu retribui. – Minha voz saiu em um fio e Bernardo tinha aquele olhar de incredulidade.

 

-Eu não acredito. – Nem eu mesmo acreditava que eu tinha feito isso. – E ai? O que rolou depois?

 

 -Ela foi embora, dizendo que não devia ter feito isso. – Tinha certo desanimo na minha voz.

 

-Meu Deus Bia, são muitas informações. – Concordei com a cabeça e ele me puxou pra deitar em seu colo. – E como você está se sentindo?

 

- Eu não sei ao certo, parte de mim está confusa, pois jamais imaginei Marcela me agarrando na porta do meu apartamento. – Não sei como falaria que Marcela sair repentinamente tinha me chateado.

 

-Você gostou do beijo? – Sem duvidas era um dos melhores beijos em que eu já beijei, mas apenas balancei a cabeça confirmando que sim. –Então você não gostou dela ter saído sem ter conversado.

 

-Eu queria pelo menos uma explicação. – Bernardo acariciava meus cabelos enquanto processava as informações. – Ela me beijou, eu juro que não esperava.

 

-Eu te entendo, mas sabemos que ela agiu no impulso.

 

-Sim eu sei, Marcela é casada. – Esse detalhe estava martelando minha mente. – Eu não posso cair nesse rolo Bernardo, não posso perder meu emprego por besteira.

 

-E se não for besteira, e se ela estiver interessada? – Ele me questionava e eu tentava acompanhar o raciocino. –Amiga você é linda, é incrível e com certeza é apaixonante.

 

-Bernardo foi só um beijo e você já está falando de paixão? – Bernardo deu uma sonora gargalhada.

 

-Eu tenho a mente fértil, sorry! – Nos ajeitamos na cama e eu suspirei. – O que você pretende fazer?

 

-Nada! – Ele me olhou incrédulo. – Eu vou fingir que nada disso aconteceu e seguir com o plano de trabalhar e ter grana suficiente pra abrir o meu próprio negocio.

 

-Te desejo sorte amiga, e saiba que estou sempre aqui. – Abracei meu amigo e ele se aconchegou em mim. – Mas só uma coisa, será que a toda poderosa vai deixar isso como estar? E se ela vir atrás de você?

 

-Eu preciso ter foco, eu tenho que lembrar que ela é casada e eu não vou entrar nesse barco. – Eu só não sei se conseguiria me manter firme, Marcela me deixava fora dos trilhos.

 

-Você é forte!

 

 

         Bernardo ficou ali comigo até que eu adormecesse, ele sempre me dava colo quando eu precisava e sem ele eu nem sei o que seria da minha vida. Eu tive um sono um tanto conturbado, sonhei com Marcela e o sonho não era nítido, mas sei que Jaqueline estava no meio do sono e descobria que eu tinha beijado sua esposa, acordei no susto, olhei no relógio e já estava quase na hora do meu despertador tocar, achei melhor me levantar logo e ir para o chuveiro. Hoje eu estava mais ansiosa que o normal, estava rezando pra não ter que me encontrar com Marcela pela Cyber, e eu nem sei com que cara eu iria olhar para Jaqueline depois de ter retribuído o beijo. Tentei não ficar pensando nessas coisas e terminei de me arrumar. Bernardo preparava nosso café e logo eu me juntei a ele.

 

-Bom dia minha musa. – Ele veio até mim e me beijou. – Dormiu bem?

 

-Bom dia gatão! Até que dormi, mas tive um sonho louco. – Contei ele as partes do sonho que eu me lembrava e ele só achava graça.

 

-Relaxa Bia, vai dar tudo certo. – Suspirei e tomamos nosso café mudando de assunto.

 

         Terminamos o café e eu me despedi dele, meu dia seria longo e eu teria que ter coragem pra encara-lo. Depois de alguns minutos o uber estacionava em frente ao meu trabalho, o frio na minha barriga parecia que não passaria nunca, mas eu enchi meus pulmões de ar e desci do carro caminhando pra dentro do enorme prédio. Passei por Luciana e a recepcionista me deu bom dia sorridente, decidi subir de escada, não queria dar de cara com Marcela no elevador. Eu praticamente estava dividindo uma sala com Lívia e até então ela ainda não havia chegado, comecei a organizar minhas coisas quando Felipe apareceu na sala dizendo que teríamos uma reunião geral em poucos minutos, o agradeci e fiquei me preparando psicologicamente para o que viria.

 

 

POV MARCELA

 

 

        Em menos de dez minutos estava estacionando meu carro na garagem do meu irmão, se ele soubesse o quanto vim em velocidade alta ele me daria um sermão daqueles. Desci do carro e subi pelo elevador até o andar do apartamento dele, a porta estava encostada e ele me esperava com uma expressão preocupada.

 

-Como você está maninha?- - Ele me apartou em um abraço e eu deixei algumas lágrimas rolarem.

 

- Eu estou péssima, eu não acredito que deixei ela me enganar assim! – O que mais me doía é que eu não escutei a minha família quando me disseram que ela não prestava. – Como eu fui idiota.

 

-Hey, não é culpa sua. – Sandro me levou ao sofá e se ajoelhou em minha frente. – Você estava apaixonada, não podia adivinhar.

 

-Eu devia ter sacado, eu nunca deixei que as pessoas me enganassem. – Sequei minhas lágrimas e dei lugar para a irritação. – Ela nunca me amou de verdade, desde o inicio foi sempre eu quem corri atrás de tudo.

 

-O que você pretende fazer? – Ele me perguntou receoso.

 

-Eu não quero dar metade da Cyber pra ela, eu conquistei aquilo sozinha. – A cyber sempre foi um projeto meu e quando conheci Jaqueline eu tirei a ideia do papel. – Maldita hora em que eu a pedi em casamento.

 

-Talvez Melissa esteja certa, vamos tentar um acordo. – Sandro tentava ser otimista, mas eu já nem sei o que pensar.

 

-Podemos pensar nisso amanhã? Hoje meu dia foi pesado. – Suspirei cansada e me joguei no encosto do sofá.

 

-Claro! Quer que eu faça algo pra gente comer? – Meu irmão sempre cuidou de mim, tínhamos apenas dois anos de diferença e nem parecia que ele era o mais novo. – Ou eu posso pedir também.

 

-Não precisa, eu estou bem! – Sandro me olhou com pena e se sentou ao meu lado.

 

-Eu estou sempre aqui por você, não se esqueça disso. – Nos abraçamos e eu me senti confortada. – Vou preparar o quarto de hospedes pra você, nem acredito que vamos morar juntos de novo, como nos bons tempos da faculdade, quando nós dois éramos solteiros.

 

-Não temos mais idade pra isso. –Sorri e ele fez cara de desanimo.

 

-Saudade daquela época, mesmo com Andressa no seu pé. – Andressa era uma namorada que eu tinha na época da faculdade e ela não me dava sossego.

 

-Nossa, nem me lembre.

 

        Ficamos ali conversando e nem vimos às horas passando, já era madrugada quando resolvi ir pro quarto, agradeci meu irmão pela hospitalidade e fui pro chuveiro tomar um banho antes de tentar dormi. Estava em baixo do chuveiro e a agua escorria pelo meu corpo, minha mente vagava em um único lugar, levei a mão em meus lábios e era como se eu sentisse os lábios de Bia nos meus, eu omiti esse ocorrido de Sandro, não por medo do julgamento, mas porque eu sei que ele está interessado nela e eu não sei como ele iria reagir. Senti meu coração palpitar quando me lembrei de Bia estremecendo em meus braços e retribuindo o meu beijo, eu sabia o quão errado aquilo era, mas eu não consegui controlar meus impulsos. Desliguei o chuveiro e tentei me concentrar, amanhã meu dia seria longo, mesmo querendo repetir o beijo, eu preciso resolver a bagunça da minha vida.

 

       Eu não tinha conseguido dormir, passei a noite inteira pensando e logo já estava entrando no prédio da Cyber, cheguei antes da maioria dos funcionários e Melissa me mandou uma mensagem dizendo que já estava a caminho. Alice chegou e me entregou a agenda da semana, teríamos uma reunião geral as nove e eu não estava a fim de olhar pra Jaqueline, mas não posso deixar que isso afetasse meu trabalho. Melissa sentada de frente a mim e ouvia com atenção o que eu contava sobre ter jogado tudo na cara de Jaqueline.

 

-Amiga, que loucura. – Concordei com a cabeça. – Ela nem se deu o trabalho de negar.

 

-Pois é, mas não tinha como ela negar nada. – Melissa parecia analisar a situação. – Mas tem uma coisa que ainda não te contei e foi o real motivo pelo qual te chamei aqui.

 

-Me conta logo. – Melissa era curiosa até onde não podia mais.

 

-Eu fui deixar Bia em casa ontem, e ela acabou esquecendo o celular em meu carro. – Melissa se ajeitou na cadeira e ouvia com atenção. – Acabou que ficamos um tempo conversando e quando fomos nos despedir eu a beijei.

 

-O QUE? MARCELA ESTOU CHOCADA! – Melissa levou a mão na boca e me olhava espantada.

 

-Fala baixo, não precisa gritar pra Cyber inteira ouvir. – A reprendi e ela pediu desculpas.

 

-Mas e ai? O que rolou depois?

 

-Eu sai desnorteada de lá, eu não devia ter feito isso. – Respondi massageando minhas têmporas.

 

-Ela deve estar te odiando agora, coitada da garota. – Era a ultima coisa que eu queria. – Mas ela retribuiu o beijo?

 

-Sim. – Sorri ao lembrar e Melissa me encarava com as sobrancelhas arqueadas. – Eu tô ferrada amiga.

 

-Está mesmo, pois com um beijo você já está toda abobada. – Ela debochava de mim, porem com um pouco de razão. – Mas o meu concelho é o de sempre, seja sincera com você mesma, e com ela também.

 

-Mesmo que eu queira repetir esse beijo eu não acho que irá acontecer. – Suspirei desanimada. – Eu ainda preciso me resolver com Jaqueline e mesmo que eu queira, eu não sei se ela quer.

 

-Vou te dar um concelho, chama ela aqui e tira a dúvida. – Melissa tinha um sorriso faceiro nos lábios. – Primeiro peça desculpas, vai que cola.

 

-Melissa, não começa a colocar coisas na minha cabeça. – Não era má ideia, mas aquilo não era certo.

 

-Marcela, se joga. – Estávamos de pé e ela me segurou pelos ombros. – Sua vida está de cabeça pra baixo, e se Beatriz for sua válvula de escape não se omita.

 

       Balancei a cabeça em negação, Melissa sempre me dava os melhores concelhos, mas esse era algo muito fora da minha realidade, eu sempre fui uma pessoa muito racional, mas no momento quando Bia estava no meio minha razão ia pro espaço.

 

-Odeio quando você tem razão. – Melissa sorriu largamente.

 

-Eu sempre tenho Razão. – Ela era convencida. – Vai lá e se joga.

 

         Nos despedimos e marcamos de almoçar para conversamos melhor. Fiquei andando de um lado para o outro pensando em o que eu faria, meu estomago revirava, e no fio de impulso eu interfonei pra Alice e pedi que ela chamasse Beatriz até minha sala. Aguardei sentada em minha cadeira, minhas mãos suavam e eu repassava na mente o que eu faria. Ouvi batidas na porta e pedi que ela entrasse. O tempo pareceu congelar quando nossos olhos se encontraram. Beatriz estava incrivelmente linda, e foi involuntário o sorriso que eu dei quando ela entrou por completo em minha sala.

 

-Bom dia senhorita Mendes. – Ela estava sem graça e eu entendia o motivo.

 

-Bom dia Marcela, algum problema. – o Problema era que eu não conseguia me controlar com a proximidade dela.

 

-Te chamei aqui para pedir desculpas, eu agi por impulso ontem. – Sorri cabisbaixa e ela se mantinha seria. – Eu não devia ter feito aquilo.

 

- Está tudo bem, não se preocupe. – Beatriz agia de forma fria, e isso estava me deixando triste.

 

-Não está tudo bem, eu não quero que fique um clima estranho entre nós.

 

-Marcela, eu fiquei sem entender o motivo, mas não se preocupe eu não farei nenhum clima. – Beatriz desviou o olhar. – Você é casada, e eu não quero estar no meio disso.

 

-Entendo. – Isso foi como um balde de agua fria em mim, ali eu vi que o sentimento era só meu. – Era só isso, te vejo na reunião.

 

      Beatriz saiu sem dizer mais nenhuma palavra, me joguei na cadeira embirrada e irritada, Melissa me paga por ter colocado essas ideias em minha cabeça.

 

 

 

Fim do capítulo