Capitulo 49 - Em quem podemos confiar?
Capítulo 49 – Em quem podemos confiar?
Pov Lia
O fim de semana que passou com Liz só serviu para deixar a irritadinha ainda mais desestabilizada. Ter se entregado a ela de bandeja não estava em seus planos, mas foi impossível se conter estando tão perto. Lia admitia para si mesma que era louca por ela. A única certeza que tinha era que, apesar do coração quebrado, ainda a amava loucamente.
Quando acordaram naquela segunda-feira cinzenta, seu coração não estava reconfortado por terem passado a noite juntas, muito pelo contrário. Se sentia esgotada emocionalmente, principalmente quando ela foi sincera e partiu sem prometer nada, lhe deixando com ainda mais incertezas no fundo de seu ser.
Lia tinha certeza dos sentimentos de Liz, ainda mais depois que haviam feito amor. Não era possível que ela tivesse fingido tanto. Claramente elas haviam feito amor naquele dia, nada mais além disso. Assim que Liz partiu do apartamento, desabou sobre o sofá da sala dela e as lágrimas rolaram. Não suportava mais sentir aquela dor no peito. Era como se seu coração fosse dilacerar.
Naquele momento, Lia soube que não tinha mais o que ser feito. Ela lutara por Liz novamente. Expôs seus sentimentos de forma clara, passando por cima do seu orgulho e mágoa, e mais uma vez, a rockeira a afastou. Seja lá o que fosse que ela estivesse escondendo, já deixara bastante claro que não queria a sua presença. Aquilo só a deixava ainda pior. Sabia que era algo relacionado ao acidente de Luísa, tinha que ser algo sobre isso. Além de magoada, também se preocupava com ela. Não queria que nada de mal lhe acontecesse.
Se sentindo frágil, Lia baixou totalmente a guarda. Pedro, percebendo seu estado, aproximou-se e a aninhou em seus braços fraternais. Apenas naquele dia, os dois retomaram a relação “maninha e maninho” de sempre. Também já estava passando da hora. A irritadinha tinha saudades de compartilhar seus sentimentos com o irmão.
Voltaram para casa, onde Lia estava arrumando várias coisas para sua viagem que já aconteceria agora no final de julho. Sempre que remexia nas malas, sentia um abalo no estômago. Não se sentia nenhum pouco empolgada com esse intercâmbio, embora fosse o seu sonho. Estava mais frustrada do que qualquer outra coisa. Sua única fonte de “inspiração” para prosseguir nisso, era Vanessa, que não a deixava desanimar. A ruiva ficou do seu lado e a ajudou até mesmo no dia de tirar seu passaporte. Em outras palavras, Vanessa havia feito quase tudo por ela.
Faltava pouco menos de duas semanas para o grande acontecimento. A cada dia riscado do calendário, se sentia ainda mais nervosa. Antigamente o seu sonho era sair do país e conhecer uma nova cultura, mas o medo e receio estavam muito presentes. Tantos dariam tudo para estarem em seu lugar, sabia disso, mas ainda assim, era difícil.
Tinha medo de sofrer preconceito em Londres. Já ouvira tantos relatos xenofóbicos de brasileiros que moravam fora. No entanto, não poderia se deixar abater. Sabia que no fundo, tudo isso era apenas uma desculpa para disfarçar o que realmente sentia. Saudades de Liz.
Como o esperado, mas não menos doloroso, a rockeira não voltou a lhe procurar. Nem mesmo através de uma ligação ou mensagem. Por várias vezes se pegou olhando para a foto de perfil dela e quase se entregou ao desejo de mandar uma mensagem, porém, não podia fazer aquilo. Não iria mais trair sua autoestima por ela.
Naquele fim de semana, Nádia a convidou para irem até a cidade grande, apenas as duas. Sabiam que Lia iria precisar renovar bem o guarda roupa com roupas de frio mais adequadas, por isso foram às compras. Foi um domingo bem descontraído entre as duas. Nunca mais havia passado tanto tempo assim com a mãe.
Na hora do almoço, elas foram até um bom restaurante do shopping. Enquanto esperavam pela comida, a mãe começou a puxar assunto de forma sutil e atenciosa.
— Como está se sentindo com isso tudo? Ansiosa?
— Sim, e apreensiva também — disse com sinceridade. Só havia se aberto de verdade com Cris aquele tempo todo.
— É normal. Você está prestes e conhecer pessoas e uma cultura nova. Me sinto muito orgulhosa de você. Aliás, eu e o seu pai sentimos orgulho.
Lia apenas ficou calada e remexeu nos talheres à sua frente. Ainda estava muito distante do pai, contudo, com os dias contados para partir, não queria ficar de mal com ele. Esperava que ele se aproximasse como das outras vezes, mas depois de tanto ser ignorado, o pai finalmente a deixou à vontade.
— Qual o problema? — Nádia voltou a perguntar.
— Nada.
— Lia, eu queria muito te pedir uma coisa! — Lia encarou a mãe, que parecia bem séria. — Por favor, não viaje sem falar com o seu pai. Ele está muito mal com essa distância.
Os seus olhos marejaram. Ela também estava mal com isso. Apesar de tudo, ele era o seu pai e sabia que ele só queria o seu bem.
— Eu também não quero viajar brigada com ele — desabafou e engoliu o choro.
— Ele vai ficar muito feliz em saber disso. — A mãe segurou sua mão através da mesa. — É o certo.
— Eu sei. Eu fiquei muito chateada com o que ele fez, mas... isso já nem importa mais. — Refletiu e limpou as lágrimas com as mãos. — Liz não terminou comigo por causa dele.
Lia não falava nada a respeito de Liz em casa. Era um assunto muito doloroso e sentia que ninguém a entendia de verdade. Também não queria ficar se lamentando na frente de ninguém, mas estava extremamente triste e abalada com o fato da rockeira não ter ligado.
— Por que ela terminou então? — Nádia parecia curiosa para saber sobre.
— Eu não sei.
— Semana passada quando você foi até lá, pensei que tinha ido se encontrar com ela.
— Eu fui me encontrar com ela, mas não resolvemos nada. — Concluiu se sentindo triste. — Eu não sei mais de nada.
— Ah, a dor do primeiro amor. Não passa fácil, filha. Você não é a primeira e nem a última a se sentir assim.
— Eu sei, mas é tão difícil... — A irritadinha se sentia à vontade para desabafar com a mãe. — Sinto como se eu nunca mais fosse ser tão feliz de novo. Nem mesmo com essa viagem que sempre foi o meu sonho eu não estou empolgada. Como pode uma coisa dessas?
— É assim mesmo, Lia. Você está passando por uma fase agora. Por isso é importante manter sua mente ocupada com outras coisas. Não pode parar.
Lia estranhava demais o comportamento da mãe. Quando pensava na reação dela, quando soube que gostava de Liz, e comparava com agora, era como se fossem duas pessoas diferentes. No final, a mãe que havia sido a mais compreensiva de todos com os sentimentos da filha.
— Por que a senhora mudou tanto? — perguntou no impulso de seus pensamentos.
— Como assim? — A mãe franziu o cenho sem entender.
— A senhora pirou tanto quando eu contei sobre a Liz. Disse que era pecado, que eu não era a sua filha...
Nádia fechou os olhos à sua frente a balançou a cabeça. Aquilo fez Lia calar-se. A mãe parecia envergonhada de si mesma.
— Eu me arrependo até hoje por ter dito todas aquelas coisas, Lia. Sinto muito mesmo! A irritadinha sentiu verdade nas palavras dela e mesmo depois de tanto tempo, se sentiu feliz em ouvir aquilo.
— Eu nunca tinha lidado com uma situação daquelas. A única coisa que eu sabia é que era errado. Não conseguia aceitar que minha filha gostasse de outra mulher. Sentia vergonha só em pensar na reação das pessoas, mas aí, o seu tio, seus primos... eles agiram de forma tão natural. As coisas que o Olavo disse... eu senti vergonha. Mas quando eu percebi que você ia se afastar da gente... precisei rever meus conceitos. O preconceito não valia o peso de perder minha filha.
Lia não conseguiu dizer mais nada. As lágrimas tomaram de conta. Estava já sensível por aqueles dias e ouvir tudo aquilo da mãe, só lhe deixou ainda mais emocionada. Ter o apoio dela já era a melhor coisa que poderia ter ganhado.
— A senhora não sabe como é importante ouvir isso. Obrigada!
— Você é minha filha. Te amo muito!
— Também te amo, mãe! — respondeu com um sorriso de orelha a orelha.
Elas fizeram a refeição em um silêncio agradável. Depois tomaram um sorvete e voltaram às compras. Retornaram para a cidade já era quase noite, com a mala do carro bastante cheia de sacolas. O pai e o irmão estavam comendo lasanha e assistindo futebol juntos. Os dois se levantaram para ajudá-las com as compras.
Lia subiu para seu quarto e tomou um banho. Havia andado o shopping inteiro e seus pés estavam matando de doloridos. Depois de descansar por uma meia hora, deitada em sua cama, lembrou-se da conversa com a mãe mais cedo. Precisava falar com o seu pai e não queria mais adiar isso. Decidida, desceu as escadas, procurou por ele, que estava sentado no sofá do deque ao lado da mãe.
Assim que os dois a viram, logo viu entendimento na face da mãe e sem dizer nada, ela levantou-se, deixando ela e o pai a sós. Estava se sentindo muito sem jeito em começar a conversa, mas reuniu coragem e foi sentar-se ao lado dele. Horácio apenas a observava em silêncio e com atenção, mas acabou dizendo por fim:
— Com certeza compraram tudo que precisava, não é?
— Sim, até demais. — O silêncio se instaurou novamente. Lia olhou para as próprias mãos. — O senhor está bravo comigo?
— Não, minha princesa. — Ele respondeu com aquele mesmo tom ameno de sempre. Aquilo a fez levantar a cabeça e encará-lo. Nos olhos do pai viu apenas carinho. — Mas eu sei que você está comigo.
Lia abriu a boca levemente e apenas balançou a cabeça negativamente. Sentia um bolo se formar em sua garganta.
— Não estou mais. Eu não quero mais ficar brigada com o senhor! — sussurrou sem jeito.
O pai sorriu feliz e abraçou-a como tantas vezes antes. Foi reconfortante sentir o abraço dele novamente depois de tanto tempo. A irritadinha abraçou-o de volta e os dois passaram muito tempo daquela forma.
— Desculpe por ter tratado a Liz daquele jeito, filha! Eu sei o que você sente por ela, é só que é difícil para mim...
— Shiu! — Lia não queria mesmo voltar para aquele assunto. Ele já pedira desculpas e nada mais poderia ser feito. Não adiantava mais falar sobre o ocorrido. — Isso já passou, pai. E obrigada pelas desculpas.
— Eu não quero sua infelicidade. Mas também não quero que perca essa oportunidade...
— Eu entendo agora. — Lia falou pensativa. — Eu sei que não devo perder a oportunidade. Eu sei.
— Eu prometo que não vou mais me comportar daquele jeito. Eu deveria ter conversado com você primeiro.
Lia concordou, mas não falou nada. Muita coisa lhe incomodava, mas não sabia se valia a pena tocar no assunto, porém, o pai estava ali e parecia aberto a críticas, então acabou dizendo:
— Vocês me tratam feito uma criança que não sabe de nada, às vezes. Isso enche o saco. Eu já tenho 22 anos, não tem mais cabimento isso...
— Eu sei, eu sei... eu agi de cabeça quente. Queria apenas o seu bem. Eu sempre vou intervir se for o melhor para você, Lia...
— Não, pai. Mas não assim. Vocês têm que conversar para mim de igual para igual...
— Sabe que às vezes é muito difícil de conseguir isso. — Ele a olhou com reprovação. — Você logo explode. É difícil conseguir conversar com você.
Lia sentiu suas bochechas queimarem. Ela sabia que o pai havia dito a verdade. Sua personalidade forte e jeito explosivo eram um problema. Todos sabiam. Não era à toa que lhe chamavam de irritadinha.
— É, eu sei! — admitiu em tom sério. — Peço desculpas por isso também.
O pai passou um braço por seus ombros e lhe deu um beijo carinhoso no topo da cabeça.
— Estamos bem, então? — Ele perguntou.
— Sim, estamos, pai.
Depois de mais algum tempo em silêncio, ele voltou a se pronunciar:
— Desculpe ter sido grosso com a Liz. Eu tenho que admitir que ela parece gostar mesmo de você, de verdade. Eu acho que nunca vou conseguir aceitar bem isso, mas não posso te impedir de ser feliz. Só quero que saiba que eu não vou mais interferir.
Os olhos de Lia embaçaram. Tudo o que mais queria era ouvir aquilo do pai, mas agora já era tarde mesmo. Liz não a queria mais. Pensar isso fez seu peito doer mais um pouco, mas mesmo assim, agradeceu.
— Obrigada, pai!
***
Uma semana se passou rapidamente. Não havia um só dia em que o seu peito não doesse com o silêncio de Lisandra. Já era sexta-feira e seu voo estava marcado para o meio-dia de terça-feira. Seus pais a convidaram para irem à casa da vó. Lia estava aproveitando aqueles dias para se despedir da família por aqueles seis meses. Era noite quando chegaram lá e para a sua surpresa, todos estavam ali. A avó, tio Olavo e seus primos. Eles haviam feito um jantar especialmente para comemorar a sua conquista.
Lia ficou muito feliz e tocada com o gesto deles. Sua família era muito boa e pacata, não tinha do que reclamar. Eles haviam colocado mesas e cadeiras no quintal e assavam carne. Foi uma noite de muita alegria e diversão. Lia acabou bebendo vinho além da conta e acabou dormindo no quarto de hóspedes. Estava precisando um pouco daquilo para se distrair. Por sorte, ninguém a olhou torto por isso.
No domingo, Cris a fez se deslocar até a cidade, alegando que as duas precisavam da própria despedida e comemoração. Cedo do dia ela e Pedro chegaram até lá. Vivi juntou-se a eles também, assim como Vanessa. Os seis passaram o dia na praia, aproveitando o mar. A amiga levou muito camarão para ela, pois sabia como Lia amava frutos do mar.
Eles tomaram bastante banho, brincaram de vôlei, almoçaram, e no final do dia, foram dormir no apartamento de Alberto, onde ficaram ouvindo música e conversando por muito tempo. Lia estava triste. O dia havia sido perfeito ao lado dos amigos, mas a falta de uma pessoa em especial estava destroçando o seu coração. Queria muito vê-la uma última vez antes de ir.
Passando por cima de seu orgulho pela segunda vez, abriu a conversa com ela e digitou:
Lia: “Meu voo já vai ser na terça. É assim mesmo que vai ser? Por que não me mandou uma mísera mensagem de satisfação, Liz? Por quê? Será que era muito custo? Você não se importa nenhum pouco em saber como eu estou? Nunca pensei que você fosse me desapontar tanto assim, mas aqui estamos nós... estou viajando com o coração partido por sua causa, como sempre. Toda essa nossa história só serviu para isso mesmo. Me machucar! Espero que você tenha uma boa vida. Adeus!”
Suas mãos chegavam a tremer de tanta raiva e desapontamento. Por aquela noite, Liz nem mesmo recebeu a mensagem. Era como se ela estivesse sem internet, mas não podia mais se importar com isso. Se ela quisesse algum contato, que se esforçasse de agora em diante. Ninguém nunca lhe machucara tanto assim. Aquilo não seria esquecido por ela nunca em sua vida, isso era certo.
Segunda-feira amanheceu ensolarada e com um lindo céu azul. Ela e Pedro passaram bastante tempo na piscina pela manhã. Lia queria aproveitar seus últimos dias da melhor maneira possível. Já não queria mais pensar em Liz, ela que fosse para o quinto dos infernos! Ela ainda não havia visto a sua mensagem, o que lhe deixava puta e preocupada ao mesmo tempo. Sem mais esperanças, decidiu bloquear o número dela e não mais se chatear.
Na terça, Lia passou a manhã inteiro dormindo e descansando para a viagem. O pai e a mãe tiraram folga para que pudessem passar o dia todo juntos, aproveitando os últimos momentos em família e para levá-la ao aeroporto.
Encheram os dois carros com as bagagens de Lia e partiram. Quando chegaram, havia um representante do intercâmbio à espera dos alunos selecionados. Vanessa já estava lá acompanhada por seus pais. A ruiva se aproximou rapidamente assim que a via e lhe abraçou com alegria.
— Finalmente isso está acontecendo, Lia. Estou tão feliz! — Ela disse empolgada.
Lia apenas sorriu. Estava triste e nervosa além de qualquer coisa, então aproveitou para apresentar a amiga aos seus pais devidamente. Enquanto esperavam serem chamadas, Cris chegou junto de Alberto. Ver os amigos, foi a gota final de que precisava. Seus olhos se encheram de lágrimas assim que Cris se aproximou.
As duas trocaram um abraço terno, mas nada disseram. Alberto também a abraçou e mais uma vez, lhe felicitou pela conquista.
— A que horas o seu voo sai? — Cris perguntou, parecendo ansiosa.
— Meio dia em ponto! — Lia olhou as horas no visor de seu celular. Já passava das onze. Logo logo seriam chamados.
Lia teve raiva ao constatar que Liz não viria nem ao menos lhe ver. Por que ela sempre a fazia passar por um turbilhão de sentimentos? Ela teve mais de duas semanas para se informar sobre sua viagem e nem se importou com isso. Por que ela sempre a machucava? Estava cansada de ter que passar grandes abalos emocionais e desapontamentos. Queria não criar expectativas, mas era impossível.
O representante do intercâmbio se juntou a eles novamente. Todos os estudantes estavam ali e foram chamados um a um para despacharem as bagagens. Lia fez questão de ser a última na fila, apesar de tudo, queria muito vê-la uma última vez, era tanto que seu estômago doía, tinha esperanças de que ela viesse se despedir.
Lia olhava para os lados a todo momento, procurando algum sinal dela, mas nada. Infelizmente, logo chegou sua vez de despachar as malas e foi finalmente para a fila definitiva de embarque. Todos a seguiram.
Os pais lhe deram um abraço em conjunto. Lia chorava copiosamente junto deles. Seu coração partiria quebrado em mil pedacinhos. Tinha vontade de desistir de tudo, mas era tarde.
— Se cuida, filha! — A mãe disse emocionada e passou as mãos em seus cabelos.
— Vamos sentir saudades, minha princesa. — O pai declarou com os olhos avermelhados.
— Obrigada! — Agradeceu no automático. Não tinha mais ânimo para as despedidas.
Depois foi a vez do irmão a abraçar muito apertado.
— Vou sentir saudades, mana!
— Eu também, mano!
Já se sentia dormente de tanto chorar. Nem tinha mais vergonha por estar tão derretida na frente de todos. Logo Cris se aproximou e quase a espremeu entre seus braços.
— Miga, você merece demais essa oportunidade. Aproveite muito em Londres, ok?
— Ok. Obrigada!
Nem tinha muita força ou ânimo para falar nada. Alberto a abraçou com carinho e lhe desejou boa sorte. Saindo daquela sala, eles não poderiam mais lhe acompanhar.
Quando o homem da fila lhe deu a última chamada, não teve mais como esperar. Atravessou os portões indo rumo a um novo destino e deixando seu coração despedaçado para trás junto com cada um deles. Nem sabia como estava conseguindo andar, mas àquela altura, não havia outra coisa a se fazer a não ser seguir em frente...
***
Pov Liz
Depois de uns longos segundos de espanto, Luísa disparou:
— Mas o que você está falando, Liz? — Ela parecia escandalizada com sua declaração.
— A senhora precisa confiar em mim. Desde o começo que eu achei toda aquela situação muito suspeita. Não se encaixava direito. A senhora não ficou desconfiada de nada?
Luísa apenas ficou calada, refletindo sobre suas palavras. A confusão estava estampada em sua cara, por isso Lia aproveitou para falar mais.
— O Artur que contratou o tal detetive. Ele que estava à frente de tudo. Pensa tia, bastou ele se aproximar para todas essas coisas acontecerem com a senhora...
A tia levou as mãos até a cabeça, balançando-a negativamente. Liz entendia, era muita coisa para processar.
— É claro que achei tudo muito estranho, mas e quanto às provas contra Flávio?
— É isso que nós estamos tentando entender...
— Nós? — A tia franziu o cenho. — Nós quem?
Liz suspirou e começou a contar tudo o que havia acontecido. Desde que havia ido na casa do tio confrontá-lo, até a noite passada, quando ele mostrou que havia um esquema de lavagem de dinheiro na empresa com a tal empresa laranja. Luísa ouvia a tudo atentamente, parecendo bastante chocada e assustada.
— Liz, você precisa ter cuidado. O Flávio pode estar inventando tudo isso para te convencer...
— A senhora acha que eu já não pensei nisso? Mas tudo o que ele falou faz sentido. As coisas que ele me mostrou. Ele tinha extratos e comprovantes. A gente precisa saber de quem é essa empresa e conseguir alguma prova de que foi ele.
— Isso é muito sério. Para uma coisa dessas estar acontecendo, então temos mais pessoas dentro da empresa mal acomunadas com isso. E pessoas de confiança do financeiro.
Luísa tinha uma expressão pálida e aflita. Liz se aproximou dela e segurou-a pelo braço.
— Sim, é pior do que a gente pensa. Só temos que encontrar uma prova concreta de que foi o Artur mesmo que fez tudo isso. A coisa toda está muito bem armada. Flávio está colhendo essas informações pouco a pouco para que ele não descubra e faça algo pior.
— Mas por que ele tem tanta certeza de que é o Artur?
— Só pode ser ele. Flávio disse que para conseguir fazer tudo isso só podia ser ele. Depois de nós três o Artur é o outro maior investidor...
Luísa balançou a cabeça em concordância.
— Sim, faz sentido. Ele é um dos únicos investidores que está envolvido na empresa dessa forma.
— Flávio não queria que eu falasse nada para a senhora agora. Ele tem certeza que não iria acreditar, mas eu arrisquei mesmo assim. Eu não posso deixar a senhora dormir do lado de um homem desses.
Luísa de repente olhou-a ainda mais preocupada.
— O que foi?
— Ele me pediu em casamento ontem — sussurrou em resposta.
O coração de Liz bateu desesperado com a informação. Aquela era a última coisa que poderia esperar acontecer.
— A senhora aceitou? — perguntou em voz esganiçada.
— Ainda não.
Liz suspirou de alívio e agradeceu aos céus por isso.
— Que bom!
— Será que é por isso que ele vem agindo tão estranho ultimamente? — Luísa falou mais consigo mesma do que com Liz. — Ele parece um pouco nervoso essas últimas semanas. Fez umas viagens estranhas em cima da hora. Disse que era negócios que tinha em outra cidade.
As entranhas de Liz apertaram de angústia. Artur não poderia ficar nervoso e nem desconfiado de nada, caso contrário, ele poderia fazer algo de ruim novamente.
— Tia, eu fiquei muito puta de raiva e triste quando eu pensei que pudesse ser Artur. Logo ele que está ao nosso lado em todos os momentos. Ele é um escroto, psicopata...
— Esse assunto está me dando um nó na cabeça. Eu admito que deixei muitas coisas nas mãos dele. Não tinha cabeça para nada depois do acidente. Não posso acreditar que ele está por trás disso!
Os olhos da tia encheram-se de lágrimas. A rockeira aproximou-se dela e a abraçou com carinho. Luísa havia passado tantos anos sozinha e agora, quando achou que finalmente tinha encontrando um bom homem, descobre que é um psicopata que tentou assassiná-la. Era surreal demais e extremamente aterrorizante.
— Eu sei que é difícil de acreditar nisso. Mas eu acredito no Flávio. Eu sei que tem muita prova contra ele, mas eu acho que foi armação mesmo.
— Eu preciso me encontrar com o Flávio o mais rápido possível e tirar essa história a limpo.
— Precisamos ter cuidado. Ninguém pode saber que estamos indo até lá. Eu fui ontem à noite, no carro do Fabrício. Ele me levou. Nem o meu celular eu levei, sei lá. Todo cuidado é pouco.
— Meu Deus! — Luísa exclamou temerosa. — Como eu vou voltar para casa e olhar para cara dele depois disso?
— Eu também não sei como vou conseguir. Eu estou puta de ódio com esse escroto.
Ela levou a mão a testa e derrubou mais algumas lágrimas. As duas sentaram na grama por vários segundos e ficaram quietas, até que Luísa conseguisse se recompor.
— Nós precisamos ter muito cuidado, Liz. Não sei mais em quem confiar.
— Eu também estou me sentindo perdida. Faz muitas semanas. Eu estava sem saber o que fazer já. Precisava contar tudo para senhora.
— Minha menina... é claro que você tinha que me contar tudo. Não sei como ficou com isso tanto tempo sozinha.
— Eu não poderia deixar a senhora tão vulnerável perto dele. Eu tenho certeza que Artur está por trás desse acidente também. Aquele filho da puta!
A ira tomou conta de seu ser novamente. Tinha ganas de esganar Artur com as próprias mãos por todo o mal que ele causara a tia. Poderia tê-la perdido. Jamais conseguiria superar aquilo. Artur havia sido muito esperto.
Com Luísa morta e a culpa caindo sobre Flávio, a aliança entre as famílias seria desfeita rapidamente. Vitória e Tomás não seriam problema já que eles nunca se envolveriam na empresa e Liz sabia que também não iria querer saber de nada envolvendo assuntos corporativos. De fato, os três sairiam da jogada de uma só vez, deixando o caminho de Artur livre. Havia sido um plano muito maléfico. Agora era entender como ele havia conseguido tantas provas contra o tio.
Quando voltaram a casa, encontraram Artur na sala. Ele tinha a expressão séria e mexia no celular. Ele olhou para elas por cima da armação dos óculos e parecia analisá-las.
— Está tudo bem? — perguntou todo atencioso. Liz sentiu seu estômago revirar ao olhar a cara cínica dele. Luísa apenas suspirou suavemente ao seu lado e viu quando ela esboçou um meio sorriso.
— Está sim, querido! — Ela foi até ele e abraçou-o por trás do sofá.
A rockeira sentiu uma angústia com a cena e foi inevitável virar o rosto e focar o olhar em outro canto.
— Será que podemos remarcar nossa tarde para outro dia? — Luísa falou suavemente para ele.
— Por quê? — Ele pareceu desconfiado e virou-se para ela no sofá. — Algum problema?
Liz revirou os olhos. Era muito descaramento. Sua vontade era de quebrar a cara dele com uns bons socos e levá-lo para bem longe da tia.
— Liz está passando por um mau momento. Quero passar um tempo com ela.
— Ah... tudo bem. — Ele deu um beijinho nos lábios de Luísa e sorriu. — Nesse caso então é melhor eu ir, não é?
Sem mais delongas ele levantou do sofá, mas antes deu um abraço em Luísa e cumprimentou Liz antes de sair pela porta.
— Vamos até o meu quarto! — Liz segurou a tia pela mão e as duas subiram as escadas.
Lá chegando, a rockeira trancou a porta e sacou o celular do bolso, discando o número que Fabrício lhe dera. O telefone tocou poucas vezes até que Fabrício a atendesse.
— Oi, Liz. Algum problema?
— Eu já contei tudo a ela. Tia Luísa quer ir até aí falar com vocês.
Luísa apenas a olhava de forma especulativa e atenta.
— Ela acreditou? — O primo parecia surpreso e apreensivo.
— Ela precisa ter mais certeza, mas não dispensou a possibilidade. Ela está tão assustada quanto eu. Como podemos fazer?
— Temos que ter muito cuidado, Liz. Ninguém pode saber que ela está vindo aqui. Vez ou outra vem um policial aqui para checar as coisas e o Artur não pode desconfiar de nada.
— Eu sei. Por isso mesmo estou perguntando como faremos.
— Noite passada foi bastante seguro. Eu sei que ninguém nos seguiu.
Liz teve uma boa ideia com aquilo.
— E se eu levasse ela para o meu apartamento? Você poderia ir buscar a gente lá.
— Sim, pode ser. Assim como da outra vez. Quando então?
— Pode ser essa noite?
— Só um momento... — A ligação ficou muda por quase um minuto e logo o primo voltou a falar: — Eu pego vocês às oito, então. Naquele mesmo lugar.
— Tudo bem! Até mais tarde.
— E então? — Luísa perguntou ansiosa e com as sobrancelhas arqueadas.
— Vamos fazer o seguinte. Vamos até o meu apartamento, como eu fiz da outra vez. Eu tenho medo que Artur dê um jeito de nos vigiar aqui de alguma forma. Fabrício vai estar lá na rua de trás nos esperando.
— Será que isso é confiável, Liz? — A voz da tia estava temerosa.
— Tia, eles são a minha família. Eu confio no Flávio. Acho que deveríamos juntar forças e descobrir tudo de uma só vez. Você precisa despistar o seu segurança e se livrar dele assim que possível. Tenho a impressão que eles estão nos vigiando para aquele crápula.
— Ainda mais essa! — Levou a mão até a testa e balançou a cabeça. — Ok. Vamos fazer isso.
Liz suspirou de alívio. Não achava que a tia iria acreditar nela tão facilmente. Tinha certeza que ela ficaria do lado de Artur e o defenderia, mas Luísa era uma mulher esperta e logo observou os sinais estranhos que ele mostrava.
Pela noite, Luísa e Liz saíram do condomínio, ambas, deixando os seus celulares em casa. Assim que chegaram até o prédio do apartamento de Liz, foram para a saída dos fundos. Fabrício chegou em pouco tempo e sem demora, as duas entraram no carro.
— Olá, Fabrício! — A tia cumprimentou-o, parecendo incerta.
— Olá, Luísa! — Ele apenas respondeu um pouco sem jeito, depois olhou para Liz. — Podemos ir?
As duas assentiram e sem mais delongas, ele deu a partida no carro.
Chegaram no condomínio muito rápido, mas viram que havia uma viatura da polícia parada ali, em frente à casa. Fabrício suspirou pesado.
— Não acredito que já estão aqui de novo!
— Eles vêm com frequência? — A tia se pronunciou à medida que iam se aproximando.
— Mais ou menos. Geralmente vinham uma vez a cada semana, mas já estão aqui tão cedo. Vamos entrar com o carro na garagem.
Fabrício apertou o controle e o portão abriu. Eles entraram sem maiores problemas e quando desceram do carro, ele disse:
— Fiquem aqui até eles irem embora. Nunca se sabe.
— Ok! — Liz respondeu.
Luísa parecia super apreensiva ao seu lado.
— Não estou gostando nada disso, Liz!
— Tia, a gente não sabe em quem confiar. E se tem alguém da polícia mal acomunado com Artur? Nem em hipótese ele pode saber que estamos aqui. Logo desconfiaria que sabemos de algo.
A rockeira sabia que tudo aquilo era uma doideira, mas infelizmente precisavam de todo o cuidado. Não mais do que uns quinze minutos, Fernando surgiu na porta da garagem.
— Eles já foram.
Liz seguiu na frente e a tia segurou em sua mão. Eles atravessaram a luxuosa casa do tio em direção ao escritório, onde ele já as esperava.
— Luísa! — Flávio falou um pouco emocionado. Ele estava sentado em um poltrona, mas se esforçou em se colocar de pé ao vê-las. — Obrigada por ter nos dado um voto de confiança.
— Eu ainda não estou certa de nada, Flávio. Eu vim porque a Liz me pediu.
O tio pareceu um pouco triste ao ouvir aquilo e deu de ombros, mas continuou:
— Não precisa ter medo de nada. Eu não lhe fiz nenhum mal, eu juro! Nós dois estamos sendo manipulados nessa situação toda.
— Eu preciso de provas, Flávio!
— Eu sei, e é isso que eu estou tentando encontrar. Não vou deixar aquele maníaco nos fazer mal, eu prometo!
Luísa estava com a respiração pesada e tinha uma expressão temerosa. Liz interviu vendo a animosidade.
— Onde estão aqueles papéis que o senhor me mostrou ontem?
— Estão aqui. — Flávio pegou a pasta que estava na cadeira ao seu lado e pôs sobre a mesinha de centro.
A tia não se moveu, então Liz pegou-a e entregou a ela, que tomou o conteúdo em suas mãos cuidadosamente. Luísa avaliou a pasta por alguns segundos e, suspirando fundo, abriu-a, olhando o conteúdo dos papéis. Ela fez uma cara de confusão à medida que analisava os extratos e comprovantes. Em um determinado momento, acabou sentando no sofá, parecendo confusa e assustada.
— Mas tem coisas autorizadas até mesmo por mim, aí. Eu não lembro de ter autorizado nada disso. Irmãos Ventura... olha só para esses valores! O que significa isso? — perguntou escandalizada, fitando Flávio.
— É isso que estou tentando entender e descobrir. Luísa... — Vagarosamente o tio foi se aproximando. — Nós temos um grande problema de segurança na empresa. Artur não pode ter conseguido isso sem a ajuda de alguém do nosso financeiro.
— Mas é claro que não. E isso me preocupa ainda mais.
— Olha, o meu investigador partiu hoje. Ele está procurando tudo a respeito dessa empresa. Algo que nos leve até Artur e prove que ele está por trás disso.
A tia levou a mão até a testa e não parecia nada bem. Liz foi até ela e abraçou-a.
— Calma, tia. A gente vai conseguir sair dessa.
— Eu prometo que não vou deixar ele fazer nada contra vocês duas, mas vocês precisam tentar manter distância do Artur.
— Como eu vou fazer isso sem ele desconfiar?
— Casais separam o tempo todo! Diga que está incerta sobre o que sente. — Flávio tomou a palavra mais uma vez. — O que ele não pode é ver que estamos investigando essas transferências.
— Mas como você tem certeza de que é o Artur quem está por trás disso tudo? É isso que eu quero entender.
— Eu desconfiei de muitos outros, mas o Artur é a pessoa com o passado mais duvidoso que eu encontrei. Você não acha a história dele muito estranha? Tudo aponta para ele.
A tia parecia estar em estado de choque e aos poucos ela foi concordando com a cabeça.
— Eu achei muito estranho a forma como ele se aproximou de você, mas também não era da minha conta.
Algumas lágrimas caíram pelo rosto da tia. O coração de Liz apertou com isso e permaneceu firme ao lado dela.
— Nós vamos fazer ele pagar por tudo o que ele está fazendo, tia.
— No que depender de mim, vamos mesmo! — Flávio concordou. — Luísa, você precisa ser ainda mais forte nesse momento. Nós juntos somos mais fortes.
Ele ofereceu a mão para ela e, meio receosa, a tia aceitou, olhando-o.
— Essas coisas são muito sérias, Flávio. Temos que levar isso à polícia.
— Vamos levar no momento certo. Agora eu só iria me prejudicar mais ainda. Todas as pistas estão contra mim e contar com a polícia para investigar isso mais a fundo é difícil, você sabe! Infelizmente é a realidade do nosso país.
— Não podemos ficar bancando o FBI. Isso é perigoso!
— Eu sei, eu sei! Me dê mais um pouco de tempo e logo teremos algo de concreto.
O clima estava muito tenso, mas era inevitável. Os três conversaram mais um tempo, e ficou decidido que Luísa terminaria com Artur da melhor maneira possível e que assim que o investigador desse algum notícia, elas ficariam sabendo de tudo.
Luísa já chegou em casa à procura de Vitória e Tomás e fez questão de ficar o tempo todo com eles naquela noite. Ela decidiu que não iria dizer nada para os filhos ainda. Diria somente quando estivesse alguma coisa certa. Liz também ficou com eles. Não teve cabeça para mais nada naquela noite.
No outro dia, a tia chamou Artur para finalmente terminar tudo com ele. Não foi preciso dizer que ele saiu da casa extremamente chateado e contrariado. Luísa usou o pretexto de que havia ficado com dúvidas a respeito da proposta de casamento dele e precisava de um tempo. Mais tarde naquele mesmo dia, Liz e a tia conversavam lá fora no jardim.
— Com Artur longe eu vou dispensar os nossos seguranças e contratar outros. Eu mesma vou fazer isso.
— Era isso mesmo o que eu estava pensando, dispensar esses, mas também não ficar sem nenhum. Ele pode tentar algo contra nós.
— Ainda não consigo acreditar em tudo o que está acontecendo.
— Foi por isso que eu terminei com a Lia. — Liz finalmente admitiu, tirando um pouco do peso de seu coração. — Não quero envolvê-la nessa loucura toda.
Luísa a olhou surpresa e logo em seguida, uma expressão de entendimento tomou sua face delicada.
— Agora entendi. Antes não fazia sentido para mim esse término. Você estava tão envolvida com ela.
— Não está sendo fácil. Nunca nada doeu tanto assim...
— Minha menina! — A tia apertou sua mão com carinho. — Ela não está sabendo nada disso?
— Não. Eu não quero ela sabendo de nada e correndo perigo por minha culpa.
— Foi uma atitude nobre. Se isso tudo for verdade, já sabemos que Artur não tem escrúpulos. Você fez o certo.
— Eu sei! — respondeu tristemente.
Saber que havia feito tudo aquilo para o bem dela, não diminuía em nada a dor. Lembrou-se naquele momento, que havia ficado de lhe dar uma resposta e seu estômago revirou com isso. O que poderia dizer depois de tudo aquilo? Só ficara ainda mais óbvio que não poderia mais ficar perto dela. Iria deixá-la seguir para o intercâmbio sem a sua interferência. Era melhor assim.
Os dias foram se passando, maçantes e tensos. Ela e Luísa voltaram com tudo para a empresa. A tia tentava driblar tudo com o melhor jogo de cintura possível, mas era difícil. Elas não se encontraram muito com Artur na empresa por aqueles dias, mas não sabiam se aquilo era bom ou ruim, ao menos não precisaram ficar aturando a cara dele.
Naquela semana, Liz, além das preocupações mais recentes, ainda gastava mais de sua energia emocional pensando em Lia. Sabia que devia uma mensagem de satisfação a ela, nem que fosse uma facada de vez acabando com qualquer esperança das duas juntas. Escreveu várias mensagens, mas tinha receio. Também pensou em ligar, mas o que diria? Sabia que ela só ficaria ainda mais puta e não conseguiria lidar com isso naquele momento. Sabia que agora sim, estava sendo uma tremenda escrota.
No final de semana, Luísa convidou ela e os filhos para fazerem uma pequena viagem. Foram para aquela mesma mansão na praia do ano novo. Naquela altura, a tia já havia contratado novos seguranças. Passaram o sábado e o domingo totalmente isolados de todos, o que até foi uma coisa boa para Liz, que queria tentar desligar um pouco sua mente de tudo o que estava acontecendo.
Liz deixou seu telefone em casa e Luísa também. A tia recebeu um novo aparelho e um novo chipe de Flávio, apenas por via das dúvidas. Os primos estavam cada vez mais desconfiados das atitudes da mãe e Luísa se abriu com eles em partes. Contou que suspeitava da inocência de Flávio, mas que também não sabia quem estava mesmo por trás de tudo.
Uma vez mais, Vitória e Tomás imploraram para que a mãe se livrasse da empresa e vivesse o resto de sua vida de maneira mais sossegada. Liz não os julgava, aquela possibilidade também passava sempre por sua cabeça. Será que valia a pena viver daquele jeito por um legado? Tinha quase certeza que não.
A segunda-feira chegou com tudo, lhes trazendo uma notícia bombástica. A polícia apareceu cedo na mansão com um pedido para que Luísa comparecesse na delegacia com urgência. Liz foi junto dela sem nem pensar duas vezes. Lá chegando, a delegada Girão as recebeu em seu escritório. Sem mais delongas, ela começou a explicar tudo.
— Nós fizemos uma investigação profunda no caso do seu acidente e de todo esse mistério. Com todas as provas que Hugo nos deu, fomos a fundo em tudo o que poderíamos, mas isso só complicou ainda mais a vida do Flávio.
Naquele momento Liz sentiu um abalo no estômago. Já se preparava para a péssima notícia que viria por aí. Viu que a tia ficou com uma postura tensa na cadeira ao seu lado, enquanto a delegada continuava.
— Nós estávamos com o telefone dele sendo analisado, e não resta dúvidas de que aquelas mensagens foram mesmo enviadas no aparelho e do número dele. Não há indícios também de que o aparelho tenha sido clonado nem nada do tipo. Nós procuramos, também, saber tudo sobre aquele homem das filmagens. Revistamos tudo de registro da vida dele. O homem tinha um sistema de vigilância no estabelecimento e passamos mais de um mês revisando as filmagens para ver se encontrávamos algo de estranho.
Ela e Luísa apenas concordavam com a cabeça enquanto escutavam toda a narrativa atentamente. A delegada se levantou de sua cadeira e foi até um aparelho de TV no canto da sala, ligando-o. Era um vídeo de vigilância, a imagem estava bem nítida até e colorida. No vídeo, uma mulher ruiva, alta e bem vestida entrava em um pequeno escritório e os dois sentavam e conversavam por alguns minutos.
Liz estava chocada assim como Luísa ao lado dela. A mulher em questão era Vanda, a mulher, ou melhor, ex-mulher de Flávio. A rockeira não podia acreditar. Eram provas demais contra ele. Não conseguia acreditar no que estava acontecendo.
— Suponho que reconheçam essa mulher, não é?
Luísa balançou a cabeça de forma afirmativa.
— É a mulher do Flávio.
— Ex-mulher, você quer dizer. E foragida também agora. — A delegada corrigiu-a em tom sério. — É claro que nós a interrogamos quando descobrimos tudo sobre o marido, mas ela realmente parecia inocente e não saber de nada, porém, não estamos conseguindo achá-la, a mulher praticamente sumiu do mapa e se isso aconteceu, é porque tem culpa no cartório. Não resta dúvidas de que o Flávio tramou mesmo tudo isso e ainda teve ela como comparsa.
— E agora? — Liz antecipou-se em perguntar.
— Ele está sendo detido neste exato momento. Eu queria apenas comunicá-la, dona Luísa. Justiça está sendo feita. A senhora pode ficar tranquila.
O coração de Liz estava pesado. Queria continuar acreditando no tio, mas eram muitas provas contra. Será que havia mesmo sido uma ingênua em acreditar nele? Mesmo assim, de alguma forma, tudo aquilo ainda parecia muito esquisito.
Não havia mais o que ser feito. As duas deixaram a delegacia sem nada dizer. No carro, Luísa estava pálida e parecia triste.
— Eu quero acreditar que não foi ele, Liz!
— Eu sei. Também não estou conseguindo lidar com essas informações. Me sinto ingênua por ter acreditado nele — confessou. A angústia havia tomado conta de seu íntimo, assim como o medo.
— Tem alguém jogando com a nossa cabeça, Lia. Não é possível. Todo dia é uma coisa diferente. E agora? Quem está falando a verdade?
Antes que a rockeira dissesse alguma coisa, o telefone tocou. Era Fabrício.
— Alô!
— Você já está sabendo? — O tom de voz dele era ansioso e preocupado.
— Acabamos de sair da delegacia — respondeu incerta e olhou para a tia. Decidiu colocar a ligação em viva voz. — A delegada nos contou tudo.
— Liz, nós não sabemos o que está acontecendo. Nunca imaginamos que a Vanda estava por trás disso. Foi um choque para nós também. Por favor, não acredite no que eles disseram.
— É muito difícil não acreditar, Fabrício. O que a polícia iria ganhar mentindo para nós, assim? — Luísa disse em tom de voz bravo.
— A polícia está sendo tão enganada quanto nós, Luísa. Eles disseram como encontraram essas gravações, por acaso?
Liz balançou a cabeça com as desculpas que ele tentava apresentar. Talvez os filhos realmente acreditassem na inocência do pai. A rockeira faria a mesma coisa se fosse Luísa no lugar de Flávio.
— Não, mas o que isso tem a ver? — A tia disparou sem paciência.
— Receberam uma denúncia anônima de onde as fitas estavam escondidas. Muito oportuno, não acham?
Ela e a tia se olharam. Aquela história toda só se complicava ainda mais, já sentia um nó na mente com tantas reviravoltas e tramoias.
— Como você sabe disso? — Foi Liz que perguntou dessa vez.
— O nosso advogado contou tudo. Ele também foi informado sobre a notícia.
— Eu não sei o que pensar mais, Fabrício...
— Eu só peço que não façam nada por enquanto. Levaram o papai para a cadeia e isso só complica mais ainda as coisas. Estamos tentando ganhar tempo. Por favor!
— Não faremos nada. Não temos nem ao menos o que fazer. — Luísa respondeu.
— Olha, eu volto a ligar assim que eu puder. Só queria mesmo dizer isso por agora.
— Tudo bem.
A tia parecia mais decepcionada do que qualquer coisa. Liz tomou a mão dela na sua.
— O que vamos fazer agora?
— Eu não sei, Liz. Tudo isso está estranho. Se ele for mesmo inocente, então, de fato, essa denúncia foi muito suspeita. E se a própria Vanda está por trás disso tudo e quer colocar a culpa no Flávio? Isso explicaria as mensagens no telefone dele. Ela pode ter feito isso sem ele ver.
— Sim, eu também pensei nisso. Será que estamos sendo duas bobas acreditando nele?
— Talvez. Eu acho melhor ficarmos quietas por enquanto, afastada dos dois.
— Mas se o Artur é culpado, é um perigo ele à solta, tia!
— É justamente por isso que vamos continuar com os seguranças. Vou pensar em algo, minha menina.
Luísa segurou sua mão com firmeza. O resto do caminho de volta para casa foi feito em silêncio. As duas trabalharam de casa o resto do dia. Já era quase noite quando voltou ao seu quarto pela primeira vez, depois todo o final de semana. Decidiu tomar um longo banho e quente e depois atirou-se em sua cama.
Pegou o telefone há muito esquecido e ligou a internet do mesmo. Várias notificações foram chegando, mas seu coração disparou mesmo quando viu uma mensagem de Lia. Nervosa e ansiosa abriu a mensagem que lhe deixou de coração partido.
“Mas como assim ela já vai viajar amanhã?” pensou em desespero. Se sentiu a pior pessoa da face da terra. Nem mesmo para isso tinha tido a devida atenção. Não era à toa que ela estava tão puta. Ligou para Lia na mesma hora, mas a ligação não completava.
“Puta que pariu!” pensou enraivecida e desesperada mais uma vez. Lia havia bloqueado o seu número mais uma vez. Sem perder tempo, ligou para Vivi.
— Ei, amiga. Que saudades! — A amiga já foi dizendo ao atender a sua ligação. — Está tudo bem?
— Não estou nada bem amiga — respondeu, levantando-se da cama e andando de um lado para o outro. — Eu soube agora que a Lia já vai embora amanhã. Você está sabendo de alguma coisa?
— O Pedro comentou comigo mesmo.
— A que horas sai o voo dela amanhã? — perguntou ansiosa.
— Se não me engano, sai ao meio dia. Eu pensei que você sabia.
— Não, eu fui uma idiota. Quer dizer, eu sabia que estava perto, mas acabei esquecendo. Vem acontecendo tanta coisa.
— Mas está tudo bem por aí com vocês? — Vivi parecia preocupada de verdade.
— Sim. Ao menos isso.
— Ok. E o que você vai fazer?
— Eu queria muito ir me despedir dela. Não quero que ela vá embora magoada comigo.
Ela logo se despediu da amiga. Seus olhos arderam e teve vontade de chorar em desespero. Precisava arranjar uma logo um jeito de ir o mais rápido possível até ela. Precisava vê-la uma última vez antes que fosse. Procurou a tia pela casa de forma exasperada e encontrou-a no quarto de Tomás. Ela estava conversando com os filhos, mas não podia esperar.
— A senhora pode pedir o jatinho para mim? É urgente!
Luísa pulou da cama do filho ao vê-la tão abalada e foi ao seu encontro.
— O que foi que aconteceu?
— É a Lia, ela já vai viajar amanhã. Preciso ir para lá já.
— Own, minha menina! O jatinho está alugado e só volta amanhã pela manhã.
— O quê?! — exclamou enraivecida e bufou. Logo quando mais precisava, não estava disponível. — Vou ter que comprar uma passagem então.
— Tem certeza de que essa é a melhor coisa a ser feita? — A tia chamou-a, antes que voltasse para seu quarto.
— Como assim?
— Será que não é melhor assim? Sem despedidas?
Liz sabia que talvez ela estivesse certa, mas não poderia suportar a ideia de deixa-la ir sem que se vissem uma última vez. Tinha certeza que ela esperaria sua presença.
— Não posso fazer isso com ela. Seria uma falta de consideração. Preciso correr e comprar uma passagem. Depois a gente se fala.
Já passava das nove da noite começou a olhar as passagens. O destino não estava ao seu favor. Só havia mais um horário ainda disponível para aquele mesmo dia, mas não iria conseguir chegar a tempo. Foi então para os horários do dia seguinte, mas seu coração decepcionou-se mais uma vez. O horário mais cedo disponível era às sete da manhã com uma duração de seis horas. Não conseguiria chegar a tempo.
Procurou em desespero em todas as companhias aéreas um voo direto mais cedo, porém, em nenhum horário conseguiria chegar a tempo do meio dia. Seu coração bateu forte e uma lágrima escorreu por seu rosto. Estava ferrada e sabia disso. Novamente, correu até a tia. Ela estava em seu quarto dessa vez. Entrou lá às pressas e sem cerimônias.
— Não consegui encontrar nenhum horário que me leve a tempo. Puta que pariu!
— Calma, Liz. Vamos pensar em algo. — A tia falou lhe estendendo a mão e chamando-a para sentar-se ao seu lado. — A que horas o voo dela sai amanhã?
— Ao meio dia! — respondeu desesperada e passou as mãos na face com nervosismo.
— Meio dia... — Luísa murmurou pensativa. — Só um momento!
Ela pegou o seu celular e fez uma ligação. Depois de muito tempo aguardando, alguém atendeu.
— Marcelo, boa noite! Desculpe ligar a essa hora. — A tia disse de forma educada e sorriu depois. — Me diz uma coisa, a que horas exatamente vocês vão chegar aqui amanhã?
Após uma longa espera silenciosa, finalmente o homem pareceu responder. Liz conseguia ouvir o próprio coração a bater desesperado dentro do peito. Olhou para a tia com expectativa.
— Ah sim, tudo bem então. Eu te aviso se for precisar de algo. Muito obrigada!
— E então? — A rockeira antecipou-se sem nem deixar a tia desligar direito.
— Ele disse que o homem que alugou quer sair cedo e que talvez chegue aqui umas seis ou sete da manhã, mas ele disse que precisa de tempo para abastecer, caso precise partir logo em seguida.
— E em quanto tempo faz isso?
— Bem, se estiver tudo pronto e ele não pegar filas, em meia hora ou menos.
— Se sairmos exatamente às nove talvez dê tempo, mas não mais do que isso. — Liz pensou em voz alta. Já havia feito tanto aquela viagem que sabia o tempo gasto de uma cidade à outra. Em tempos hábeis, levaria no máximo duas horas e meia para chegar até lá. Chegaria em cima da hora.
— Entendo! — A tia coçou a testa. — Eu vou ligar para a equipe deixar tudo pronto no aeroporto. Para assim que ele chegar, esteja pronto para partir o mais rápido possível.
— Tia, eu nem sei como agradecer. Obrigada!
— Tudo bem.
A tia fez mais algumas ligações e exigiu que tudo estivesse pronto pela manhã.
A noite foi muito mal dormida. Deu alguns cochilos durante a madrugada, mas sempre acordava em desespero com medo de perder a hora. Assim que deu seis em ponto da manhã, levantou da cama, tomou um banho e aprontou-se. Pegou sua mochila e desceu. Estava sem fome, mas mesmo assim, pediu para Silvia lhe preparar um lanchinho. Marcos, o seu guarda-costas, também já estava a postos.
Assim que deu sete horas, Lia foi até o quarto da tia e encontrou-a já acordada. Ela estava fazendo alguns exercícios de fisioterapia. Ela a olhou, assim que entrou no quarto e sorriu.
— Bom dia!
— Bom dia!
— Eu já ia te procurar. Marcelo disse que tinha previsão para chegar ao aeroporto às oito em ponto, pois o tempo está um pouco ruim, mas tudo já está pronto. Assim que ele chegar, vão só abastecer e vocês saem.
— Que bom. Eu estava com medo de dar tudo errado.
— Vamos pensar positivo. Eu vou me aprontar e te levar até o aeroporto.
— Tudo bem.
— Marcos irá com você! — Luísa falou em tom firme de ordem e Liz nem pensou em protestar.
— Claro! Eu já falei com ele.
— Ótimo! Eu te vejo lá em baixo.
— Ok.
Logo eles já estavam saindo de casa. Quando chegaram ao aeroporto, já era quase oito da manhã e, ainda bem, o jatinho não demorou a chegar. Ele passou direto para ser abastecido. Em meia hora, já estavam prontos para sair. Despediu-se da tia com um abraço apertado. Não saberia o que faria sem ela em sua vida.
— Boa sorte! — A tia desejou antes de se separarem.
— Obrigada.
Liz olhava em seu relógio o tempo todo. Já era quase nove da manhã quando saíram. Marcelo, o piloto, disse que conseguiriam chegar exatamente ao meio dia e Liz rezava consigo mesma para que aquilo fosse o suficiente.
Devido ao cansaço, Liz conseguiu dar um bom cochilo, caso contrário, teria roído todas as suas unhas durante a viagem. Faltava uns dez minutos para meio-dia quando o jatinho pousou no aeroporto. Por sorte já estava ali, agora precisava encontrar em qual portão de embarque ela estava. Saiu à procura de algum carrinho que a levasse para o prédio e com Marcos, ao seu lado, logo acharam um.
Assim que o seu telefone ficou com área de serviço novamente, ligou para Cris e rezou para que ela a atendesse. Quando a ligação já estava quase acabando, ela finalmente a atendeu.
— Liz? — Ela já foi falando de forma surpresa.
— Me diz que ela ainda não embarcou, por favor!
***
Fim do capítulo
Oie... não demorei anos dessa vez. kkkkkkkkk
Gente, e aí? Liz vai conseguir se despedir da Lia ou não? eita eita
Obrigada a todas que estão acompanhando e, somente para refrescar a memória de vocês, não esqueçam que a história já está bem perto do fim. Ok?
Beijinhos e até o próximo! S2 S2 S2
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