Introdução Parte I
Laura contraía o rosto enquanto Alana movia a agulha sobre sua clavícula, sentindo a dor, mas contente com a imagem que se formava. Alana estava com uma máscara preta, concentrada, enquanto uma música de rock tocava ao fundo. Sentiu o celular vibrar no bolso e mordeu o lábio inferior, vendo o horário e o nome de Iori na tela. Estava atrasada para a encontrar e sabia que ela estaria nervosa, mas atendeu mesmo assim.
—Querida, onde você está? — Iori questionou impacientemente, bebendo um gole de suco para umedecer a boca. — Estou te esperando há meia hora.
—Estou terminando a tatu agora. Desculpa te fazer esperar, mas o equipamento de Alana deu problema e começamos depois do horário.
—Com tantos estúdios, Laura, e você escolhe justo o de Alana para me fazer esperar? — Ela deixou demonstrar o nervosismo.
—É uma região sensível, e você sabe que Alana tem boas mãos. Mas não se preocupe, querida, eu já estou saindo daqui.
—Você tem quinze minutos para chegar aqui, ou só te vejo em dois dias.
Iori desligou, fazendo Laura suspirar. Olhou para baixo, vendo que Alana tinha terminado a figura de La Muerte, a deusa mexicana. Um manto vermelho cobria sua cabeça, enquanto traços coloridos enfeitavam seu rosto na pele morena de Laura. Olhos enfatizados. Uma rosa estava na lateral da cabeça, o olhar era penetrante. Era somente mais uma das várias tatuagens que ela possuía pelo corpo.
—Sua patroa está nervosa? — Alana perguntou em tom zombeteiro.
—Iori odeia esperar. E vai viajar a noite, então nós sempre tentamos combinar de nos encontrar antes das viagens dela, ao menos para nos despedir.
—Arquiteta, não é? Lembro de você me dizer na última tatuagem que ela viaja muito.
—Sim, ela faz os projetos, e tem que supervisionar as obras. Ela quer fazer o nome ser conhecido, então dificilmente ela recusa alguma dessas viagens.
—E o que você fica fazendo sozinha em casa?
—Dou festas, fico chapada. Esse tipo de coisa. — Falou com ironia.
—Eu não sei por que Iori te aguenta. Ela consegue coisas melhores.
—Como você? — Provocou, pressionando a mão na sua testa e a afastando. — Não adianta, Iori e eu estamos juntas há muito tempo, não há nada que não possamos lidar.
Alana riu, limpando a tinta ao redor da tatuagem e a protegendo um plástico, afastando-se para jogar a camisa de Laura em sua direção para que se vestisse. Laura ainda caminhou pelo estúdio até o espelho em uma das paredes, olhando o desenho mais uma vez, orgulhosa e contente com a nova imagem eternizada em seu corpo, antes de colocar a camisa de flanela.
—Iori te ama, não estrague isso. — Alana chamou sua atenção, digitando na máquina de cobrança. — Agora me entregue o cartão, que te dou um desconto por bom comportamento.
—Não se preocupe, eu sei cuidar de Iori. — Ela tateou o bolso da calça e pegou a carteira, escolhendo um dos cartões e estendendo para ela. — E obrigada. Sei que sempre posso contar com você.
—Ótimo. Então cuide da minha obra de arte, e me ligue se acontecer qualquer coisa.
Laura montou em sua moto tão logo chegou na rua, prendendo os longos cabelos castanhos antes de colocar o capacete, ligando a moto e acelerando ao encontro de Iori. A mulher estava sentada na mesma mesa que costumava reservar, próximo a janela, não notou quando Laura estacionou a moto, entretida num aplicativo de celular, movendo o dedo para passar as fotos dos perfis de mulheres. Laura se aproximou e sentou ao seu lado, beijando sua bochecha antes de olhar a tela do celular.
—Oh, estamos buscando diversão? — Perguntou em tom humorado, mas não deixou esconder seu interesse.
—Talvez. — Ela bloqueou a tela e deu um sutil tapa no braço dela. — Eu devia te deixar comendo sozinha.
—Você não seria capaz. — Sorriu, inclinando-se, buscando pelos seus lábios, não recebendo recusa. — Desculpa, não vai acontecer de novo.
—Espero que não. Ao menos a tatuagem ficou boa?
Laura sorriu e afastou a camisa para o lado, mostrando a imagem recém pintada em sua pele. Iori tocou sobre o plástico, sorrindo contente por mais alguns instantes com admiração.
—Sua vó ficaria orgulhosa em ver isso. — Relembrou, subindo a mão em seu rosto firme e acariciando. — Foi por isso que fez, não é mesmo?
—Sim. Era uma forma de homenagear minha família.
—Bem ao lado da que fez para me marcar. — Iori deslizou o dedo pela próxima tatuagem, para a águia que possuía as garras num coração, as asas abertas de maneira protetora. — Eu gostei do gesto. Tenho certeza de que sua família vai gostar também, quando verem.
—Eu gostei do resultado. Que bom que também gostou. — Laura sorriu e beijou Iori mais uma vez. — Você já fez os pedidos?
—Claro. Espero que esteja com fome, porque tem uma barca de sushi te esperando.
—Fazer tatuagem dá fome, pode mandar trazer.
Iori acenou para a garçonete, sinalizando para que trouxesse seu pedido. A mulher sumiu no corredor ao lado para buscar a barca. Laura passou o braço sobres os ombros de Iori, que voltou a desbloquear o celular e olhar as fotos de uma candidata, ouvindo o riso de Laura ao seu lado.
—Vai ter companhia lá?
—Claro que não, idiota. — Sorriu, acomodando-se contra o seu corpo. — Mas o que você acha?
—Eu não sei. Estamos procurando isso outra vez? Diversão?
—Estava pensando em algo mais sério.
—De novo?
Iori pausou antes de responder, porque a barca tinha chego e estava sendo servida no meio da mesa, seus copos sendo preenchidos com sucos.
—É bom te ver por aqui. — A mulher falou, um pequeno sorriso amistoso nos lábios. — Já faz algum tempo que não vem aqui.
—Estive visitando as outras franquias. Mas aqui sempre vai ser especial. Tem um frescor que os demais ainda não tem. — Iori falou em tom suave e amigável.
—Talvez seja porque é o primeiro que seus pais abriram. Há mais valor sentimental envolvido.
—E como estão seus estudos, Ana? Você começou aqui há pouco tempo, não é?
—Sim. Mas meus estudos estão indo muito bem. Tenho que conciliar os cursos com o trabalho.
—Você está fazendo mais cursos além de japonês? — Laura perguntou em tom surpreso.
—Sim, sim. — Ana riu, acanhada. — Estou fazendo alguns cursos para complementar a faculdade. Mas são pagos, então eu preciso conciliar com o trabalho.
—Você é muito jovem, mas já tem um bom senso de responsabilidade.
—Seus pais devem estar orgulhosos. — Iori complementou.
—Sim, eles estão. Eles sempre me apoiam. E eu fico feliz em trazer esse orgulho para casa.
—Eu lembro quando estava no seu lugar e tive que fazer vários cursos para ter um bom currículo. — Laura relembrou. — Eu ficava maluca.
—Você também fez arquitetura como Iori?
—Não. Fiz psicologia, então fiz mais algumas especializações. Agora herdei um consultório do meu pai, num bom lugar.
—Mas ela faz isso como se fosse um passatempo. — Iori pontuou, segurando a mão de Laura ainda sobre seu ombro. — Ela nunca leva a sério.
—Mas você leva até demais.
—Alguém tem que levar. Mas de qualquer forma, se precisar qualquer ajuda, basta me dizer, Ana. Não sou a maior especialista em culinária, mas tenho certeza que devo conhecer alguém que saiba.
—Eu te direi se precisar de algo. — Ana sorriu. — Espero que aproveitem o almoço.
Ana se despediu, curvando-se em respeito a Iori antes de se afastar de volta ao trabalho. Laura suspirou, usando os hashis para pegar o primeiro sushi enquanto ouvia Iori agradecer pela comida ao seu lado em sua língua natal, só então começando a comer. Não demorou para que esta notasse a tensão na companheira, que comia em silêncio e olhando para um ponto fixo na mesa, suspirando diversas vezes. Segurou seu rosto em determinado momento, virando-o para si, demorando para atrair seus olhos.
—O que houve?
—Você sabe que odeio quando fala do meu trabalho dessa forma, ainda mais em frente a sua família. — Falou seriamente, afastando suas mãos. — Não é como se eu tivesse passado anos estudando sem levar a sério o que faço.
—Temos que concordar que você está muito relaxada em relação ao consultório do seu pai. Você devia ter pedido que colocasse em seu nome já que ele resolveu te dar isso.
—Eu não gosto de ficar no consultório.
—Mas está acomodada com o dinheiro que ganha do seu pai.
—Eu não ganho qualquer dinheiro do meu pai.
—Ele paga o aluguel do consultório, Laura. Indiretamente você ganha o dinheiro que não gasta nisso.
—Te deixaria feliz se eu pagasse o aluguel? Não é como se eu usasse com frequência. Eu trabalho no hospital e você sabe que é minha preferência. — Laura desviou o olhar, mirando o ambiente a frente com algum nervosismo.
—Então venda o lugar, Laura, ou alugue para quem goste de consultório. Mas tenha o lugar em seu nome.
—Por que isso te incomoda tanto? — Ela estreitou os olhos para a companheira. — Eu trabalho e pago nossas contas da mesma forma que você. O dinheiro sobra. Que diferença isso faz?
—Pode não fazer diferença agora. Mas e no futuro, Laura? E se quisermos ter filhos daqui alguns anos? Mais uma renda pode ajudar muito quando eu diminuir a carga de trabalho.
—Então sua preocupação é um dinheiro que não precisamos agora.
—Só estou pensando em nosso futuro, Laura. Mas você nunca parece pensar nisso. Você é descuidada demais.
—E você preocupada demais. Sequer podemos aproveitar um almoço antes de você passar dois dias fora da cidade porque você continua pensando em coisas que não sabemos se vamos precisar, se vai acontecer. — Suspirou, soltando os hashis sobre a mesa, perdendo a vontade de comer. — Você nunca aproveita o que temos agora. Por isso nunca encontraremos alguém compatível para fazer parte do que temos.
—Não confunda as coisas. Já faz três anos que tentamos isso. Mas isso não dará certo porque você é acomodada demais com o que temos para pensar em melhorar as coisas com nosso futuro. — Iori controlou seu tom, mas deixou claro seu desagrado.
—Quer saber? Estou cansada, Iori. Você continua me cobrando coisas inúteis como se faltasse algo em nossa vida juntas. — Pausou, baixando o tom quando notou que falava alto demais, o suficiente para as pessoas ao redor olharem em sua direção. — Alana estava certa.
—Alana? Por que está invocando essa garota agora?
—Porque ela está certa em dizer que você consegue alguém melhor que eu. Alguém estável e que pense como você. Então use seus métodos para achar alguém que pense como você, Iori, porque assim não está dando certo.
Laura se levantou e seguiu para fora do restaurante sem pensar uma segunda vez, surpreendendo Iori, que a seguiu logo em seguida. Laura prendia os cabelos para colocar o capacete, mas foi impedida de colocar, Ioria segurava a dianteira do capacete, atraindo sua atenção.
—Não diga essas coisas idiotas, Laura. Você sabe no fundo que não é o que quero. — Ela inclinou a cabeça, falando com maior preocupação. — Eu quero continuar com você, porque você pensa diferente de mim.
—Às vezes não parece quando você me cobra tanto essas coisas. É como se estivesse descontente comigo. Com meu modo de vida. Eu sempre fui assim e isso nunca te impediu de morar comigo.
—É diferente agora. — Iori se aproximou, soltando o capacete e segurando o rosto da outra em mãos. — Estamos juntas há anos, meu amor. Eu só quero deixar nosso futuro estável financeiramente. Só peço que olhe com mais atenção para a sua carreira e seu patrimônio. Seria bom se pensasse mais no futuro, se realmente o quer passar comigo.
—Claro que eu quero. — Laura suspirou, pendendo o capacete no guia da moto, recostando-se nela. — Mas também quero que você aproveite as coisas que temos agora sem se preocupar tanto com o futuro.
—Vê por que eu escolhi estar com você? — Iori finalizou o espaço entre elas, envolvendo seu pescoço. — Você consegue manter minha cabeça aqui.
—Eu entendo que você queira que eu planeje minha vida melhor. E eu faço isso, só que não faço isso tão rápido quanto você consegue.
—Eu sei. E está tudo bem. Já fico feliz que você considere as coisas que te digo.
—Claro que considero. Ainda estou pensando sobre o consultório do meu pai, você não precisa me pressionar sobre isso agora.
—Tudo bem, eu não irei. — Iori se inclinou e beijou os lábios dela, diminuindo a tensão entre elas. — Em pensar que todos na faculdade não acreditavam que fôssemos ficar juntas por tanto tempo.
—Mas demos bastante certo. — Laura sorriu, envolvendo sua cintura. — Podemos até ter um filho para mostrar o quão errado eles estavam.
—Vê? Você consegue mostrar que pensa no futuro. Só me diga que vai considerar pedir ao seu pai para te passar o consultório definitivamente. Não é como se não fosse acontecer eventualmente.
—Irei pensar, eu prometo.
Iori se contentou com isso e voltou a beijá-la, acariciando seus cabelos por um instante antes de se afastar. Laura olhou o relógio no celular e suspirou.
—Eu tenho um paciente em vinte minutos. Tenho que ir.
—Tudo bem, eu te aviso quando desembarcar.
—Queria ter tempo para te levar no aeroporto hoje.
—Não se preocupe. Serão apenas dois dias. Logo eu volto.
—Está bem. Se ver algo interessante no aplicativo me deixe saber.
—Então você quer tentar de novo?
—Quero. Você tem razão, estou acomodada com o que temos, porque é algo bom. Não vejo problema em tentar achar mais alguém que complemente o que temos.
—Oh, isso é bom. — Iori sorriu abertamente. — Talvez seja bom também, porque não gosto de te deixar sozinha sempre que viajo. Te deixar com alguém que gostemos será bom. Para nós duas.
—Não seja boba, eu sempre vou continuar sentindo sua falta aqui.
—Mas ao menos teria companhia.
Laura balançou a cabeça, inclinando-se e a beijando, aproveitando a companhia por mais alguns instantes até ir embora. Iori ainda voltou ao restaurante de sua família e mandou que embrulhassem o restante da barca para enviar ao seu endereço, imaginando que Laura teria fome quando chegasse em casa. Foi direto ao aeroporto, sem perder tempo em começar a procurar pelas primeiras candidatas a um encontro com um casal.
Conheceram a primeira candidata alguns dias depois da viagem de Iori, num restaurante da escolha da mulher. O casal chegou primeiro, fazendo somente o pedido de um vinho para abrir o apetite enquanto esperavam.
—É um lugar elegante. — Iori comentou, olhando ao redor. — Não sabia que tinha algo assim perto do seu trabalho.
—Nem eu. — Ela suspirou, movendo-se desconfortável, notando a elegância das outras pessoas indicando a diferença de classes. — Eu não sei se é o melhor lugar para conhecer uma pessoa.
—Nisso eu tenho que concordar. — Iori moveu o líquido dentro da taça. — É tudo muito expansivo. E não me parece que sejam muito liberais em relação a nossa presença aqui.
—Devíamos ter comentado que era melhor que fosse em nossa casa. Ou em outro tipo de local público.
—Ei, relaxa. — Iori segurou sua mão sobre a mesa e acariciou. — Talvez ela só seja mais discreta e queira um ambiente neutro.
—Discreta é sinônimo para ainda no armário?
—Acho que é o que vamos descobrir.
Iori indicou a entrada do restaurante, onde uma mulher alta, magra e roupa social falava com a recepcionista de maneira amigável, que indicou a mesa onde estavam. O ambiente era bem iluminado, as mesas mais separadas, toda a mobília remetia a algo antigo e elegante, com espelhos nas laterais que alongavam o recinto. Laura foi a primeira a se levantar quando a mulher chegou perto da mesa, ligeiramente mais alta, reconhecendo-a das fotos que tinha mostrado no aplicativo. Ao contrário do que esperava, a mulher se aproximou e a abraçou de maneira carinhosa, como se a conhecesse há mais tempo.
—É um prazer finalmente conhecer vocês. — Ela falou enquanto se afastava, oferecendo o mesmo abraço em Iori. — Vocês são encantadoras pessoalmente.
—Oh, obrigada. — Iori sorriu, segurando suas mãos quando se afastaram. — Você é um charme, Tina.
—E elegante. — Laura acrescentou, envolvendo os ombros de Iori.
—Agradeço os elogios. Mas sentem-se, sintam-se à vontade. — Ela gesticulou a mesa, esperando que voltasse a sentar para fazer o mesmo. — Gostaram do lugar?
—É diferente dos lugares que costumamos ir. — Laura falou em tom sutil. — Mas não é desagradável.
—Talvez muito neutro. — Iori acrescentou. — Mas o ambiente é calmo, só não sei se é o melhor lugar para nos conhecermos.
—Vocês são sinceras. — Tina riu sutilmente, sem se deixar afetar. — Não se preocupem com o ambiente, eu teria mandado fechar o restaurante para ficarmos sozinhas se imaginasse que isso podia incomodar vocês. — Ela se recostou na cadeira mais relaxada, cruzando os dedos sobre a barriga. — É meu restaurante. Herdei de minha mãe, mas já faz dez anos que tenho estado administrando aqui.
—Oh, parabéns. — Iori voltou a rodar o liquido na taça. — O lugar é lindo, não nos entenda mal. O vinho está ótimo. Não temos qualquer problema em estar em público.
—Mas pode ser que o público não esteja tão confortável com nossa presença. Então a gente costuma evitar problemas. — Laura acrescentou, buscando pela mão de Iori. — Ainda mais por ser seu ambiente de trabalho.
—Oh, eu entendo. Bem... Sinto muito por não ter causado a melhor impressão em nosso primeiro encontro. — Tina falou mais desanimada, demonstrando alguma frustração. — Acho que não se sentirão confortáveis em jantar aqui, certo?
—Eu não sei. Talvez pudéssemos marcar outro lugar para nos encontrarmos com calma. Falando por mim, pelo menos, acho que não seria uma boa ideia continuarmos aqui.
—Mas podemos continuar a noite em outro lugar. — Iori sugeriu em tom sugestivo.
—Claro, por que não? — Tina não hesitou em aceitar, rindo logo em seguida.
—Hoje não consigo, querida. — Laura olhou para a companheira, acariciando sua mão. — Semana x.
—Aqueles dias? — Tina questionou, inclinando a cabeça por um momento.
—Sim. Sinto muito.
—Não tem problema. Outro dia nós tentamos marcar novamente.
—Claro. Mas foi muito bom te ver pessoalmente. — Iori falou enquanto se levantava, finalizando o jantar antes mesmo de começarem.
—Posso dizer o mesmo.
Elas se despediram de maneira mais breve, então o casal foi para o carro, saindo da região sem falar nada nos primeiros minutos. Iori ligou para uma pizzaria que conheciam e fez um pedido, passando no local no caminho de casa
—Ao menos ainda lembramos nossos códigos. — Laura comentou após algum tempo, parando num farol.
—Semana x. — Iori riu baixinho. — Eu tinha plena certeza que não vi uma gota de sangue hoje de manhã.
—Ela não esperou um segundo para concordar com o sex*, mas sequer sugeriu jantarmos em outro lugar. — Ela balançou a cabeça, suspirando e voltando a acelerar. — Você fez bem em testar.
—Eu percebi que você não estava gostando. Eu só queria ter certeza que não haveria uma segunda vez.
—Eu entendo que ela queria mostrar um local que tinha o controle, mas não no primeiro encontro. Achei que faltou algum planejamento. — Ela olhou para Iori por um momento. — E marcarmos com dois dias de antecedência, já que ela queria escolher o lugar.
—Não foi uma boa primeira experiência, eu concordo. — Iori pousou a mão em sua perna, fazendo caricias. — Mas imaginei que não conseguiríamos algo logo de início.
—Sim, eu também. Quem sabe da próxima? Podemos convidar para ir lá em casa. Assim temos mais controle do ambiente.
—Acho difícil alguém concordar assim de primeira. E eu não sei se é uma boa ideia convidar desconhecidas para ir em casa.
—Então sugerimos o próximo lugar?
—Sim, podemos fazer isso.
A próxima candidata aceitou encontrar com o casal, durante o dia no final de semana, num parque. Ambas estranharam a escolha, mas nenhuma desgostou de fazer um piquenique como primeiro encontro. Encontraram-se na entrada no parque e caminharam juntas para o interior do local, ambas gostando do bom humor e da aparência jovial da mulher, que usava roupas confortáveis para uma primavera quente.
—Você sempre vem aqui? — Laura questionou, carregando uma cesta com uma mão e a outra segurando a mão de Iori enquanto andavam.
—Sim! Eu corro aqui toda manhã antes de ir para o trabalho. — Ela apontou para um conjunto de prédios a norte do parque. — Eu moro logo ali.
—Oh, é realmente perto. Eu adoraria que tivesse um parque perto de casa. — Ela olhou para Iori. — Seria tão prático para passar o tempo depois do trabalho.
—É tranquilizador. — A mulher sorriu a olhá-la. — De manhã é bastante calmo aqui. Com menos pessoas.
—E no que você trabalha, Lisa? — Iori a olhou com curiosidade.
—Designer de interiores. E vocês?
—Arquiteta.
—Psicóloga. — Laura respondeu logo em seguida.
—Profissões bem distintas. Mas eu gosto. Já trabalhei com alguns arquitetos. São bem detalhistas. Mas eu também sou, o trabalho rende bem.
—Rende sim. É sempre bom conhecer um designer quando tenho que fazer uma apresentação mais aprofundada de um projeto. — Iori falou com animação. — Mas com o passar do tempo você acaba vendo a importância de conhecer uma psicóloga. Laura sempre me ajudou a enxergar o ponto de vista de outra pessoa. E isso acabou me ajudando a imaginar melhor o que cada cliente quer que seja criado.
—Bem, agora conheço uma. — Ela olhou para Laura com um brilho admirado nos olhos, que sorriu de volta. — Venham. Conheço um espaço mais quieto para ficarmos.
Ela guiou o casal pelo parque, ainda fazendo perguntas sobre sua vida e rotina, mantendo a conversa leve e bem humorada. Sentaram após estender uma toalha na grama, debaixo de uma árvore, o local com menor movimentação de pessoas devido a proximidade do estacionamento. Laura começou a colocar os alimentos embrulhados no centro da toalha entre elas, a mulher a ajudou, retirando as coisas que ela mesma tinha trazido em sua cesta.
Passaram a tarde usando o tempo para conversar, mas nenhuma negou a crescente vontade que crescia de levarem o encontro adiante. Em meio a olhares e toques, seguiram Lisa para seu apartamento, e ela não se demorou em demonstrar preferência por Iori, abraçando-se em seu pescoço tão logo chegaram no quarto. Mas não recusou as investidas de Laura, que a manteve ocupada enquanto sua parceira a satisfazia. Não demorou para todas terminarem aos risos e sem fôlego no colchão, contentes. Mas também não demorou para o casal perceber que tinham colocado tudo a perder, uma vez que os planos de tentarem manter um relacionamento sério com Lisa tinha se findado tão logo entraram naquele apartamento.
As próximas tentativas resultaram no mesmo fracasso, perceberam que ou avançavam demais, ou exigiam muito das mulheres que conheciam. Decidiram esperar para pensar no que estavam fazendo de errado, levantando critérios sobre o que deveriam fazer de agora em diante.
—Será que estamos tão ruins assim na abordagem? — Iori questionou, movendo um dedo sobre a última tatuagem de Laura, distraída. — Eu sei que faz alguns anos desde Helena, talvez isso tenha feito com que ficássemos mais cautelosas?
—Sim, provavelmente. — Laura suspirou com a recordação. — Será que estamos realmente prontas para investir em outra pessoa? Digo... — Ela inclinou a cabeça para Iori, deitada ao seu lado. — Estamos há muitos anos juntas. Sobrevivemos a muita coisa. Quando conhecemos Helena estávamos no começo ainda. Agora é diferente.
—Acho que estamos indo com muita sede ao copo. — Iori a olhou, pressionando a testa em seu maxilar. — É melhor desacelerarmos.
—O que estou dizendo-
—Eu sei. Talvez não tenha espaço para mais uma agora. Por isso estou falando para tentarmos ir devagar antes de parar.
—Talvez não parar, mas dar uma pausa. Por algum tempo. Reunir o que estamos fazendo de errado e voltar com mais calma depois.
—Você tem razão. Foram três meses de tentativas. Mas ao menos eu tenho você. — Ela sorriu, virando-se, sentindo o corpo de Laura pressionar em suas costas ao a abraçar.
—Você diz isso porque sabe que sempre vai me ter. — Laura falou em seu ouvido, afastando seus cabelos para depositar um beijo em seu pescoço. — E eu estou contente em ter você aqui. Talvez nossa terceira pessoa venha de outra forma.
—Oh? Por carta?
—Pensei em algo mais biológico mesmo. — Ela segurou a mão de Iori e a levou ao próprio ventre, pressionado em suas costas. — Nosso filho.
—Oh. — Iori acariciou sua barriga antes de envolver seus dedos e os trazer para junto de si. — Você quer gerar? Achei que fôssemos adotar.
—Eu não me importo. Só quero que saiba que estou pronta para dar esse passo quando você estiver.
—Eu sei, querida. E admiro que esteja disposta a gerar. A ficar em casa para cuidar de nosso filho. Mesmo que saiba que não precisar abrir mão de sua carreira para isso.
—Eu sei. Mas é só no começo. Eu não planejo virar uma dona de casa integral. — Ela riu baixinho. — Sei que daremos um jeito.
—Sim, daremos. Por enquanto, vamos buscar ter um preparo maior para receber uma criança.
Laura voltou a beijar seu pescoço, apertando-a mais em seus braços antes de desejar boa noite.
Fim do capítulo
Já deu para ter uma ideia da personalidade de ambas? :)
Confesso que foi um desafio para mim decidir postar essa história, uma vez que é um assunto tabu e eu fiz justamente para tentar formular em minha cabeça como um relacionamento assim funcionaria.
Posso estar errada, mas julguei que seria difícil achar um laço em comum em vivências de pessoas que tem relacionamentos assim, que não fosse a vontade de estarem juntos.
Então sintam-se a vontade para comentar sobre erros, acertos, estou a disposição.
Ainda tenho que terminar a história, os capítulos são longos e eu irei separar em dois muitas vezes. Demais avisos postarei nos próximos capítulos quando necessário.
Quem será a terceira pessoa que vai integrar essa relação? No próximo vocês já descobrem.
Obs: Para quem é novo aqui na história, gostaria de avisar que meu livro "Born" já está quentinho nas prateleiras da Amazon ;)
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Comentar este capítulo:
May Poetisa
Em: 24/03/2022
Alex, parabéns pela tua escrita impecável e criatividade ímpar. Gosto muito de te ler. Eu não tenho paciência para acompanhar novelas e por isso nem assisto, não me animo, até tento, mas, acabo vendo uma ou outra coisa isolada que tenha relevância social, levantando bandeira de causas importantes, por exemplo. Agora tenho que confessar, que com "Nossa vida juntas" me tornei noveleira e nunca torci tanto por um final feliz. Das histórias de poliamor que já li, é a minha favorita e jamais esquecerei da Laura, quase fiquei de mal de ti quando ela foi excluída kkk obrigada por compartilhar conosco tantos escritos lindos. Beijocas, May.
Resposta do autor:
May querida, que prazer imenso te receber por aqui :)
Que bom saber que sou lida por você!
Novelas são realmente difíceis de acompanhar por n motivos rs mas é uma graça ter visto "Nossa vida juntas" se tornar uma novelinha tão gostosa de acompanhar.
Quem sabe um dia não sou contratada para escrever uma novela real? Hehe
Laura é um amor inesquecível S2
Agradeço pelo seu comentário nota 1000! Comentário centenário! Festaaaaa!
Beijos! :*
LILITH_HERA
Em: 13/02/2022
Boa tarde !
Aceito não somente a taça, mas o vinho e quem sabe uma companhia agradável...
Bom... Como disse, minha identificação com a Lana é muito forte. Não sei o que a vida me reserva, mas as portas estão abertas as oportunidades, quem sabe surge uma Laura e uma Iori em minha vida.
Um ótimo tudo a você !!!
Resposta do autor:
hahaha taça de vinho providenciada, e companhia agradável? haha quem sabe? ;)
É assim mesmo, quem sabe o que a vida guarda para cada um? Espero que ce encontra um trisal para chamar de seu!
Agradeço! Te desejo em dobro ;)
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Lea
Em: 05/08/2021
Todos os meus comentários são totalmente emotivos!Eu sei que a história é em cima do Trisal,e todo os problemas e desafios em torno disso! Perdoa EU, estou amando a história! Mas Laura é meu TESOURO!
Resposta do autor:
Sim, sim, bastante emotivos, eu só senti que era o momento de te dar uns toques para tu não ficar perdida também kkkkk fico feliz que esteja gostando :D
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Lea
Em: 02/08/2021
Li Lori e ficou Lori hahaha
Estou achando a Iori muito empolgada com a Lana,acho que pode estremecer a relação delas!! Esmero que isso não aconteça, porém o ser humano pode mudar!!
Resposta do autor:
ahahah eu entendo. Eu devia ter colocado com Y, mas já era tarde demais quando tive essa ideia kkkkk
O ser humano pode mudar mesmo, e essas três mudam bastante durante a história ;)
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Dolly Loca
Em: 24/07/2021
Amei a possibilidade de uma parte 2 uhuuuulll
essa história vai deixar muitas saudades.
Bjos
Resposta do autor:
quem sabe no futuro ;)
Já estou com saudades também :(
Beijos :D
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Dolly Loca
Em: 19/03/2021
Curtindo muito o desenvolvimento da história. O tema é complexo, mas acho que está sendo muito bem abordado sob a ótica de todas as envolvidas. Parabéns!
bjos
Resposta do autor:
Obrigada! =D Fico feliz que esteja gostando, foi um trabalho muito curioso de fazer e fico contente que esteja sendo apreciado ;)
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Donaria
Em: 07/03/2021
Ola autora!! você escreve muito bem, gostei da construção das personagens...concordo que o enredo é ousado...rsrsrs, não consigo me imaginar numa situação dessa, a não ser que não seja por uma noite so...e mesmo assim acredito que sairia faltando alguns pedaços, minha esposa com certeza arrancaria...rsrsrs. Tenho um casal de amigas que estão em um poliamor, a principio achei que seria um grande problema, mas estão se acertando e já estão juntas a quase um ano. Realmente o assunto é um tabu, mas está ai...na nossa frente, e querendo entender ou não acontece...e não tentar entender ou aceitar nos torna pequenos e preconceituosos...como se diz "toda forma de amar vale a pena se a alma não é pequena"...bora ver como você vai enrolar esse poliamor...aposto na Alana...rsrsrsrs não sei se Lori aposta também...kkkk
Resposta do autor:
Olá Donaria!
Obrigada pelos elogios, eles são sempre bem-vindos e me deixa feliz saber que gostou da escrita e das personagens :D
Eu também tinha um grande medo quando pensava sobre o poliamor, ficava com um pé atrás quando ouvia falar. Mas conforme fui escrevendo começou a sair com tanta naturalidade, fiquei me perguntando se entraria numa relação assim. Eu falo para meu amigo que prefiro tentar primeiro antes de dizer que não, é bom se manter disponível para novas experiências, mas também é bom aproveitar o que temos ahahaha melhor não procurar confusão com a esposa haha
Será que é a Alana? ahahaha iori com certeza ficaria surpresa se fosse ahaha
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