Marcela

 

Depois de sete dias fazendo visitas e corrigindo minha proposta de negócio com os árabes, o grande dia estava próximo. Nossa última reunião estava marcada para a manhã do dia seguinte, mas a ansiedade me tirou o sono. 

No relógio marcava 21h30, em São Paulo seria 14h30, um fuso de 7h de diferença, o mundo é uma maravilha mesmo.

 

Peguei meu telefone e resolvi fazer uma ligação. Liguei para a Paty, mas nada. Nem Mateus, nem Isa, nem André, nem mesmo minha mãe.

 

-      Mas será possível que ninguém vai atender! - Disse desistindo de ligar para alguém.

 

Fiquei vasculhando meu celular, até parar nas mensagens que troquei com a Liz. Era incrível como em apenas um único encontro, ela tinha mexido comigo, como se já a conhecesse a anos.

 

Pensei em ligar, mas desisti logo em seguida.

 

-      E vou dizer o que? “Oi, não paro de pensar em você”? No mínimo ela vai me achar louca, rir e desligar. - Falei sozinha.

 

Lembrei que ela estudava arquitetura e do quando disse que gostava da modernidade dos projetos atualmente.

Peguei uma das fotos que tirei do prédio onde ficava o escritório dos árabes, era extremamente lindo e resolvi que mandaria por mensagem.

 

Localizado no centro da cidade, o edifício contava com duas torres, cada uma com 22 andares. Um era um centro empresarial, e o outro era o luxuoso hotel onde estava hospedada.

 

-      Espero que ela responda. - Disse enquanto digitava a mensagem.

 

“Pensei que gostaria de ver esse lugar, é realmente muito bonito, cheio de detalhes e com uma arquitetura muito rica.” - 21h45 (em Dubai) 

 

Coloquei o celular sobre o peito, ansiosa por saber se ela me responderia.

Acabei caindo no sono esperando e a resposta não veio.

 

Acordei ainda não tinha clareado, estava bem mais ansiosa, agora não sabia se pela reunião, ou pela resposta que não recebi a noite, e que não veio pela manhã também.

 

-      Ela deve ter alguma coisa mais interessante, ou estava trabalhando. - Disse olhando o celular e percebi que ela não tinha nem visualizado a mensagem ainda. - Pelo menos não é sinal de que está me ignorando. - Ri sozinha.

 

O relógio marcava 6h15 e minha reunião estava agendada para às 8h30, resolvi que tomaria café no quarto mesmo, liguei e pedi o serviço de quarto, e aproveitei para tomar um banho.

Comi, terminei de me trocar, agora o relógio mostrava 7h28.

 

-      Parece que a hora não quer passar. - Disse sacudindo o pequeno objeto que estava na cabeceira da cama. - Vamos meu filho, trabalha rápido ai.

 

Ouvi meu celular tocar, fiquei surpresa quando o vi o motivo.

 

“Isso é realmente muito bonito, imagino como não deve ter dado trabalho para ser feito. Por isso eu amo arquitetura!” (0h33 em São Paulo)

 

Resolvi que não responderia naquele momento, precisava me acalmar para a reunião e começar uma conversa com ela agora não me ajudaria muito.

Me adiantei ao horário marcado e cheguei na reunião no escritório dos árabes às 8hs.

 

-      ladayk nuqtat fi salihik. eazim 'an 'arak la tantazi'. - Disse o dono da companhia e eu fiquei sem entender.

-      O que ele disse? - Perguntei ao intérprete.

-      Que você tem um ponto a seu favor Marcela, ele aprecia muito quem se adianta e não espera por ninguém.

 

Fiquei feliz com o elogio, apenas assenti com a cabeça e comecei.

 

-      We can start? - Disse dando início a nossa reunião.

 

Depois de apresentar minha proposta e responder a várias dúvidas do árabes, eles me pediram um tempo e aguardei ao lado de fora da sala de reuniões.

Pensei que meu coração fosse sair do peito, enquanto aguardava pela resposta deles.

 

Quando percebi que a secretaria deles estava me olhando disfarçadamente, resolvi puxar assunto, pra tentar relaxar um pouco.

 

-      Do you speak english? - Perguntei me sentando mais próximo a sua mesa.

-      Eu falo português se preferir. - Sorriu

-      Ahh, que maravilha! É sempre bom ouvir isso. - Sorri de volta me levantando de onde estava.

-      Meu nome é…

-      Marcela Fontana Pellegrini. Eu sei seu nome. - Disse ainda sorrindo.

-      É claro que sabe, você deve ser então a Jamile, correto? Me lembro de ter falado com você pelo telefone.

-      Isso mesmo, essa sou eu. - Prazer.

-      Prazer finalmente. Não imaginei que fosse brasileira quando nos falamos por telefone.

-      Sou meio brasileira para dizer a verdade, minha mãe nasceu em Minas Gerais e meu pai é daqui mesmo.

-      Legal, então temos aqui uma árabe mineira. - Brinquei enquanto voltava a me sentar.

 

Ela sorriu de volta e atendeu ao telefone, e logo em seguida me fez sinal de que estavam me chamando de volta.

 

-      É pra você entrar lá, eles já têm a resposta. Boa sorte. - Disse me dando um aperto de mão e entregando junto um pedacinho de papel.

 

No caminho até a sala consegui ler o que estava escrito.

 

“Me ligue se quiser ouvir mais sobre ser árabe mineira. Estou livre assim que sua reunião terminar”

 

Sorri e coloquei o bilhete dentro do bolso, acho que estava com um encontro marcado. Tenho certeza de que a Paty iria sair dali direto com a moça, eu ligaria para ela assim que tivesse outra oportunidade.

 

Quando entrei na sala novamente, todos estavam de pé e começaram a aplaudir.

Fiquei sem entender o que significava, mas pelo visto era coisa boa, já que estavam rindo e com semblante feliz.

 

-      Tahani binta, yumkinuk faeal dhalik. Marhabaan bikum fi baladay al'aemal altijariat. - Disse vindo em minha direção.

-      Ele disse que você está de parabéns pela conquista, e deseja que seja bem vinda aos negócios árabes.

 

Fiquei em êxtase! Só sabia rir e agradecer. Enfim meu sonho estava se concretizando, e todo meu trabalho estava caminhando pra onde eu sempre quis.

Troquei mais algumas palavras com eles e combinamos uma visita deles ao Brasil para conhecerem meus projetos de perto.

 

Quando saí da sala, vi que a Jamile estava terminando de arrumar sua mesa e já estava pegando a bolsa, ela me sorriu de lado com certa malicia, e eu devolvi da mesma maneira.

 

Não costumava fazer isso, misturar trabalho com prazer, e nem poderia correr o risco de colocar tudo a perder por uma aventura, mas o dia estava pedindo e eu merecia. Uma bebida e uma noite de prazer não iriam fazer mal algum, ainda mais com uma mulher como Jamile.

Ela tinha a pele em um tom que não dava pra definir o que era por conta das vestimentas típicas deles, o pouco que pude ver foram seus olhos negros, um sorriso marcante.

 

-      Agora é só comemorar esses 2 dias que me faltam e depois focar de novo. - Pensei enquanto caminhava no corredor

 

Quando cheguei no meu quarto, arrumei umas roupas que havia deixado jogadas pelo chão na ansiedade de não saber o que vestir, me sentei na cama e enfim peguei meu celular. Liguei para minha mãe antes de qualquer outra pessoa.

 

-      Mamãe. - Disse segurando o riso.

-      Oi minha filha, eu e seu pai já íamos te ligar. Vem aqui homem de Deus. - Gritou pelo meu pai.

-      Pensei que estariam dormindo mamãe, é madrugada ai.

-      E desde quando 5hs é madrugada menina? Sabe que seu pai e eu acordamos cedo sempre. - Disse com voz de brava. - Mas e então, como está aí?

-      Está tudo bem mamãe, volto em dois dias para São Paulo, vou aproveitar para uma mini férias aqui, mereço muito.

-      Não me diga que deu certo minha filha? Me conta, quero saber!

-      Passa o telefone pra mim mulher, pelo amor de Deus. - Ouvi meu pai tentando pegar o telefone.

-      Coloca no viva voz mamãe, tenho ótimas notícias para vocês.

-      Pronto filha, agora estou te ouvindo também. - Disse meu pai. - E então, conta como foi.

-      Papai, mamãe, agora oficialmente a Construtora MFP faz parte do grupo Faheem.

 

Precisei tirar o telefone do ouvido com os gritos da minha mãe, acho que até o vizinho deve ter escutado.

E depois ela começou a chorar.

 

-      Calma mamãe, não precisa chorar assim, tenta se acalmar - Disse ficando preocupada.

-      Você a conhece minha filha, sabe o escândalo que sempre faz. - Ouvi quando minha mãe xingou meu pai no fundo. - Ta vendo aí, sempre um escândalo. - Ele riu.

-      Eu sei papai, mas ela fica nervosa e passa mal, não deveria ter contato assim também.

-      Deveria sim meu anjo, essa é a sua vitória, estamos muito orgulhosos de você. Saiba que eu até voltaria a trabalhar depois dessa notícia.

-      Seria maravilhoso contar com sua ajuda papai, o senhor sempre foi uma das minhas inspirações, sabe disso.

-      Agora aproveita e vai comemorar minha menina, mas olha, com juízo viu. Não quero ter que ir te buscar pra tirar você de alguma enrascada. Você sabe como são os costumes por aí né… - Me alertou com certa preocupação na voz.

 

Desliguei prometendo que não aprontaria nada naqueles dois dias, nada que me fizesse precisar de ajuda, claro.

Mandei mensagem para os meus amigos, contanto sobre a novidade, e todos eles me responderam a mesma coisa:

 

“Parabéns Marcela, sabíamos que você conseguiu. Agora vê se para de trabalhar e aproveita!

 

Até parecia que a Paty tinha ensaiado isso com eles, que coisa. Por fim, respondi a Liz.

 

“Desculpa a demora em responder, esse fuso horário ainda me deixa confusa e também porque estava em uma reunião muito importante.” (12h48 em Dubai) 

 

“Não tem problema, peço desculpas pela demora também, estava trabalhando quando me mandou a foto. Espero que tenha dado certo sua reunião.” (5h51 em São Paulo)

 

 

"Não pensei que fosse estar acordada a uma hora dessas, é praticamente madrugada ai.” (13hs em Dubai)

 

“Tenho costume de acordar muito cedo e necessidade de dormir tarde, assim é a vida, rs. (6h06 em São Paulo)  

 

Troquei mais algumas mensagens com a Liz e resolvi que descansar um pouco antes de sair com a Jamile, já tínhamos combinado de nos encontrar na porta do hotel às 20hs.

Foi só o tempo de almoçar e cai no sono, agora quem pedia descanso era minha mente.

 

 

Fim do capítulo