Quando tenho a convicção de que ela vem em minha direção, não posso esperar a sua chegada, caso a permitisse, eu entregaria rápido as minhas emoções ao grupo e não estou preparada para escutar certos comentários no momento. Peço licença aos colegas e me encaminho a ela. Acho que estou levemente ruborizada e espero não transparecer tanto o quão estou nervosa com a sua presença. Espero também não gaguejar nem travar a fala como de costume rotineiro ao me deparar com situações inusitadas e delicadas como essa.

    Nós nos encontramos no caminho, tudo nela me atraía, era como um imã. Não consegui parar de sorrir, um sorriso diferente dos demais, mais verdadeiro e intenso. As nossas mãos se encontraram num cumprimento leve e suave. Nenhuma das duas ousou fazer nada mais que isso neste primeiro instante.

- Então você é a mais recente funcionária que tanto falam. – Ela diz e fico surpresa com o seu comentário. Isso significa que já perguntou sobre mim.

- Espero que sejam coisas boas. – Digo, ela sorri e me pergunta se eu gostaria de acompanhá-la até o balcão onde serviam as bebidas. Gesticulei que sim e a segui.

    Não pude deixar de reparar no seu caminhar, mas logo tratei de redirecionar a minha visão para outros ambientes, não queria ser indelicada ou desrespeitosa. Resolvi apenas tomar uma água, perder a noção do que estava acontecendo não fazia parte dos meus planos, ainda mais em um ambiente majoritariamente coorporativo. Creio que se eu ingerisse mais qualquer bebida alcóolica, eu perderia o controle da situação e não responderia mais por mim. Assim, mantivemos uma conversa sutil, ela realmente se lembrava do esbarrão e ficou implicando comigo. Provavelmente tudo o que ela falasse eu não conseguiria deixar de sorrir.

    Ficamos nessa conversa por um tempo, descobri que ela não trabalha na empresa, o que me trouxe alívio, mas como seus pais atuam ali, de vez em quando ela aparece para uma visita ou para resolver as pendências da sua volta à cidade. Após se aventurar no mundo e terminar os seus estudos, ela decidiu que voltaria para sua cidade natal. Assim como eu, em busca de sossego. Soube também que ainda estava morando com os pais, mas até decidir o que faria em seguida.

- Estamos conversando, você sabe quem sou, mas até o momento não disse o seu nome. – Reparo que ainda desconheço o que tanto queria saber e ouso perguntar.

- Ágatha. – Se antes eu estava encantada, com o escutar singelo do seu nome, fiquei mais ainda.

    Não tenho tempo nem de me deliciar com ele, parecia que ela iria em seguida informar o sobrenome, entretanto, somos interrompidas com a chegada da minha supervisora e do seu esposo que vieram me cumprimentar. O mesmo casal que antes conversava com Ágatha. Rosa é extremamente agradável, mais uma vez tive a sorte de ter ao meu redor uma pessoa que me acolhesse tanto e me valorizasse. Ela tem sido o motivo de eu estar tão entregue ao trabalho e empenhada em fazê-lo com louvor.

- Vejo que já conheceu a nossa filha. – Rosa diz e no mesmo instante, os meus pensamentos se travam. Por mais que a minha conversa com Ágatha estivesse sendo em forma de um flerte discreto, eu não poderia continuar com isso. Como eu poderia manter a mesma postura? Primeiro que eu não me permitia estar disponível e segundo que manter qualquer vínculo com a filha da chefe poderia me trazer eventuais problemas. E problema é a última coisa que gostaria de atrair, o que tanto quero evitar. Agora mesmo que eu estaria totalmente inacessível.

    Tento aparentar simpatia e o mesmo sorriso, mas percebo que a senhorita dos meus atuais pensamentos sentiu a minha mudança. Se tudo isso está apenas na minha cabeça, eu não sei. Ela pode ser hétero e o meu gaydar estar totalmente falho, não seria a primeira vez. Mas o sexto sentido me indicava que algo de diferente estava acontecendo e a partir de agora eu me comprometeria em não alimentar as faíscas do fogo que poderiam existir.

    O tempo passou e nem percebi que a festa se aproximava do fim. Após últimas celebrações, resolvi que já estava na hora de ir. Após aquele banho de água fria, não me restava o que fazer além da partida. O cansaço da semana já estava batendo e a frustração com os últimos acontecimentos não contribuíam para que eu mantivesse a empolgação inicial. Com essas reflexões fui embora e acho que foi a primeira vez desde que me mudei que me senti desiludida, mas eu tinha a plena consciência que poderia desfocar os pensamentos e em alguns dias eu já teria totalmente superado. Assim eu esperava.

Fim do capítulo