Capítulo VIII – Olhando para trás
Carol – Três anos e meio atrás
Eu conheço Maria Fernanda Cañas há, pelo menos, vinte anos. Que foi quando minha irmã mais nova estudou com o primo dela e, coincidentemente, nossas famílias viraram amigas. Durante a infância, Mafê sempre estava nas festinhas de escola, colônia de férias e tudo o que envolvia eventos do Bernardo e eu, como irmã da amiguinha dele, também estava lá.
Quando ela fez a festa de quinze anos, acho que eu já era um pouco apaixonada por ela, pois lembro de ter sentido raiva do “príncipe” com quem ela dançava. Lembro também que ela o beijou de olhos abertos, parecendo extremamente entediada com aquela situação. Por ter pais separados, na verdade famílias separadas, pois seu pai era completamente ausente, ela teve duas festas de quinze anos e eu nunca tinha ido para o mundo dela por completo. Parecia que eu só conhecia sua vida pela metade.
Ela conheceu Isabella em um evento da minha faculdade, coisa que me culpo até hoje. Mafê era uma das únicas mulheres de cabelo preto em odontologia e eu a havia chamado para uma chopada de final de período. No meio da festa, discutimos pois, semanas antes nos beijamos em seu carro e, continuávamos nos beijando às vezes. Naquele dia, nos beijamos antes de chegar ao evento mas, no meio de um monte de gente bêbada e cantando Florence agachada e pulando no refrão, alguém me beijou e Maria Fernanda viu. Quando o beijo no desconhecido acabou, eu a olhei e ela tinha ódio e mágoa no olhar. Acho que ali, nós nos fodemos pela primeira vez. Eu tentei ir atrás dela, mas acontece que Mafê com raiva é um furacão que, se você tentar segurar, ela vai jogar tanta coisa em você que com certeza vai te magoar. Com raiva, ela enfia o dedo na sua ferida e gira. Quando cheguei perto o suficiente para lhe tocar, ela agarrou uma menina e a beijou, revidando o que eu tinha feito. Só que, ao contrário do que eu deveria ter feito, mandei uma mensagem à ela avisando que podia ir sem mim, que eu entendia. Passei o resto da festa com algumas pessoas da minha turma e a via à distância conversando com a loura posuda.
Sumimos. Acho que demos um tempo de amizade, de beijos… e ela deu um tempo de tudo. Apareceu namorando Isabella um mês depois. Descobri pelas redes sociais e por Felipe, seu melhor amigo e, talvez o único amigo que ficava dos dois lados de sua família. Lembro que ele me ligou, para contar que não estava gostando daquilo, mas que Isabella parecia gostar de Mafê. Não fui convidada para a colação de grau, nem para a festa de formatura, ela não quis comemorar com a família de parte de pai e, um belo dia, Felipe me ligou meio em choque falando que Maria Fernanda iria pedir Isabella em casamento e ele achava que havia algo errado nisso. Ele dizia que Isabella estava cercando Mafê, isolando ela de todos. “Ela não ouve ninguém, Carol. Pensei que talvez ouviria você, mas tem alguma coisa errada nessa história. As amigas dela também não estão entendendo nada”. Lipe me explicou que Mafê tinha comprado algumas salas de consultório em um leilão por um preço muito abaixo do mercado e que aquilo estava dando certo. Prometi tentar. Liguei. Liguei muito. Mandei mensagem falando que precisava dela, que tinha um problema. Sabia que assim ela apareceria. Recebi a mensagem seca “me manda o endereço”.
Ela chegou em minha casa duas horas depois, eu moro no Alto da Boa Vista na casa que herdei dos meus avós. Falei para ela sentar na varanda que precisava conversar e desabei. Pedi desculpas, expliquei o que houve no dia e ela ouvia calada. Tinha uma aliança que devia pesar uns cinco quilos no dedo. Pedi perdão. Falei que estava depressiva, que não conseguia mais ficar assim. O que eu queria dizer mesmo era que ela não podia casar porquê eu era apaixonada por ela. Mafê me abraçou e falou em meu ouvido que me perdoara há tempos, mas não sabia como conversar comigo. Me contou dos consultórios, que usava um e alugava cinco, eu contei que havia me formado e estava na construtora da família, levando ela para um ramo de luxo.
Maria Fernanda não falou nada do noivado. Sequer citou a noiva. Comentou que tinha se mudado para o Leblon, mas que odiava o bairro. Conversamos uma tarde inteira como se nada tivesse acontecido, como se nossas vidas não tivesse sido completamente separadas por um ano. Até que seu celular tocou e ela pediu licença e eu pude ouvir.
“Oi amor, não, estou a caminho”
“Não, estou na barra resolvendo umas coisas do consultório”
“Não tenho mais atendimentos hoje”
“Você não chega esse final de semana então?”
“Sim de casa te ligo”
Meu pensamento era “que porr*!?” mas fui cortada com ela sentando na cadeira ao meu lado e segurando minha mão.
- Vou salvar seu número no celular, assim que der eu venho te ver. Mas preciso ir
- Por que você mentiu, mafê?
- Complicado demais para explicar - Ela bufou. Me deu um beijo na mandíbula e se levantou para ir. No portão, me olhou e sorriu, que saudade eu estava desse sorriso perto de mim - Preciso fazer o projeto da clínica, você faria para mim? Mas preciso que outra pessoa assine. Isabella quebra a casa se vir seu nome em alguma coisa.
- Nossa Senhora. Me livre de conhecer essa mulher. E sim, me passa o endereço que eu mando alguém da equipe ir para olhar, desenho o projeto. Posso mandar para seu avô dar uma olhada? Ele adora ver o que eu faço e eu adoro aprender com ele - Seu olho brilhou ouvindo eu falar de seu avô. Ele era arquiteto autodidata e adorava ver o que era tendência, além de ter um bom gosto absurdo.
- Quer dizer que a senhora Luvizzoto está andando com seu Amador. Claro que pode. Vai ser uma honra. - Ela segurou minhas duas mãos e deu um beijo nelas com os olhos fechados. Meu coração parecia saltar e ter pequenas arritmias. Seu celular tocou de novo e ela atendeu irritada.
“Isabella, o que está acontecendo?
Impossível, eu estou na Barra, Avenida das Américas perto do Alto
Que porr*, eu já vou. Para quê quer que eu chegue logo? Você não cansa de ficar me Porto Alegre não? Está falando comigo, não está? Como eu estaria te traindo, você está em que planeta? Não, meu amor, não… Domingo eu te espero em casa, está tudo bem. Eu te aviso quando chegar em casa”
Sua feição mudara completamente. Ela estava de costas para mim mas dava para ver seus ombros tensos. Eu só me questionava porque Mafê, que sempre foi tão livre e independente, parecia tão presa. Ela virou para mim e suspirou, relaxando os ombros e me abraçando. - Vou indo, Carolinda. Estava com saudades - Seu perfume entrou em minhas narinas e me abraçou por dentro, esquentou meu coração.
- Volta quando quiser, estou aqui. - Queria dizer que sempre estive, mas ela ainda parecia tensa. Dei um beijo em sua bochecha e a vi sair, não sem antes comentar. - Veloster? Você parece uma anã dentro disso - Ela riu jogando a cabeça para trás e dando os ombros.
- Isabella que escolheu - Fez careta de reprovação e saiu. E, naquele momento, eu vi que um dia ela poderia ser minha de uma vez.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Cristina245
Em: 07/02/2021
Ansiosa para os próximos capítulos.
Espero que não nós abandone, pois a maioria começa eu não termina...
Adorei ??’?
Resposta do autor:
Oi, Cris! Pode me cobrar até pelo Instagram @veherzautora
bicaf
Em: 07/02/2021
Oi.
Que situação. Coitada da Mafê, ficou bem presa nessa relação abusiva e ainda por cima levou chifre. Realmente, há gente que não sabe a sorte que tem, tem tudo para levar uma vida maravilhosa do lado dessa mulher perfeita e depois estraga tudo. Pega essa mulher maravilhosa pra você Carol!
Beijo.
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