Gente, tem alguém aí ainda? Desculpem o hiato enorme, estava sem tempo para escrever e não queria entregar o resto da história de qualquer jeito, mas agora está tudo certo.
Boas notícias para quem acompanha: amanhã já tem capítulo novo, ok?
Abraços e um feliz ano novo!
Capitulo 31: 2019
A coisa mais urgente que Débora fez ao retornar ao Brasil foi organizar os papéis do divórcio. A viagem de fim de ano havia sido uma pausa necessária para que decidisse enfrentar de vez a complicada situação que Rodolfo havia instalado em sua vida e na de sua filha. Durante a virada de ano, num brinde entre as amigas na Champs-Élysées, durante um abraço e outro, percebeu que não estava mais tão triste pela ausência do ex. Não ali, em Paris, dividindo o ano que chegava com Natália, sua grande amiga, viúva há cinco anos e conhecendo a Cidade Luz pela primeira vez.
Além de Natália, acompanhavam-na nos festejos Heloise e Pauline, um casal de francesas que Débora conhecera em férias passadas. Heloise, a mais próxima, nutria bastante carinho por Débora e Catarina, mas nunca simpatizou com Rodolfo, por isso recebeu a amiga em sua casa não como alguém triste que estava prestes a se divorciar de um casamento maravilhoso e sim como alguém prestes a começar uma triunfante etapa em busca de amor próprio e autossatisfação. Aproveitou ao máximo sua estadia com as amigas, sentindo-se renovada e apta a enfrentar as consequências que surgiriam dali em diante.
Agora em solo brasileiro, Débora aguardava o contato com o advogado que ela e Rodolfo contrataram em comum acordo. Conferiu novamente a data na agenda do celular, naquele dia se completava um mês da partida de Catarina e havia apenas uma semana de distância para o aniversário de dezoito anos da garota. Curtia as últimas fotos postadas pela filha, nas quais ela aparecia abraçada a uma garota de cabelos cor-de-rosa que Débora ainda não conhecia, mas que julgou ser a amiga que a acompanhava. "As duas parecem muito felizes", pensou e sorriu, curtindo as fotos seguintes. Foi tirada da distração pela voz áspera de Rodolfo, que imediatamente a deixou chocada pela aparência desleixada e pela demasiada magreza e olheiras indisfarçáveis:
- Feliz 2019.
- Ro...Rodolfo...bom dia...
- Como foi a viagem? Viu a Heloise?
- Sim... ficamos na casa dela e de Pauline durante as festas. Como está Bruce?
- Bem, mas acho que sente falta da casa, do quintal. O apartamento é muito pequeno para ele.
- Você pode levá-lo de volta ao sobrado se quiser. Deve ser péssimo para ele se adaptar... - Débora fez uma curta pausa e desviou o olhar novamente para a tela do celular.
- Darei mais um tempo e verei o que faço. São as fotos de Catarina que está vendo aí?
- Sim, você as viu? Ela está aproveitando bem as férias, nos falamos ontem.
- Sabe que não tenho redes sociais.
- Não sei, você poderia ter criado alguma, em consonância com sua nova vida ao lado da garota.
- Olhe pra mim, Débora. Não vê como estou? Acha mesmo que aparento levar uma "nova vida" com Érika?
- Percebi que está abatido...
- Então tenha controle em seu sarcasmo.
- Não estou sendo sarcástica.
- Aposto que está adorando ver o quão fracassado estou!
- Acalme-se! Não sei muita coisa de sua vida, como posso adivinhar o que está acontecendo?
- Se você me perguntasse, eu...
- Senhores? Perdão por interromper, mas podem entrar agora. - O advogado abriu a porta do escritório, cortando a réplica de Rodolfo.
- Bom dia, doutor Maurício.
- Bom dia, Débora. Sentem-se, por favor. Vou ser direto e ágil. Os papéis para o divórcio extrajudicial que solicitaram estão prontos, estou aguardando apenas a filha de vocês completar a maioridade para agendarmos a data no cartório e finalizar o processo. Procede o desejo de ambos por essa modalidade de divórcio, não é mesmo?
- Sim. - Débora foi econômica nas palavras.
- Ótimo, senhor Rodolfo?
- Sim. Catarina completará dezoito anos na próxima quinta.
- Excelente. Essa é a maneira mais amigável e fácil de realizar o procedimento. Aqui está o inventário da partilha para vocês conferirem novamente, a comunhão parcial de bens também agilizou bastante o levantamento.
- Já conferi duas vezes, doutor. Estou de acordo.
- Estamos. - Foi a vez de Rodolfo poupar vocabulário.
- O assunto mais complexo neste caso continua sendo a sociedade compartilhada por vocês. Chegaram a um denominador comum?
- Manteremos a sociedade, meu cargo atual de gerência comercial e o dela de presidenta das cadeias de restaurantes Barone.
- Certo, então a relação de ambos continua no âmbito profissional tão somente, procede?
- Correto, doutor. Pelo menos até que eu encontre outro sócio confiável, vamos...
- Como assim até que você encontre outro sócio? Não foi isso que combinamos!
- Rodolfo, é óbvio que não poderemos manter essa sociedade para sempre, a rede é da minha família e eu posso te devolver o pouco capital que você aplicou quando for necessário, não é, doutor?
- Certamente, podemos fazer uma dissolução societária parcial assim que solicitarem. E se o senhor Rodolfo concordar, podemos vender a cota dele a um preço considerável, vários investidores irão manifestar o interesse, sem dúvidas. Dessa forma, o senhor não sairá perdendo, isso dará margem para que monte o próprio negócio, inclusive.
- Débora, você quer mesmo se ver livre de mim a todo custo assim?
- Não é desse jeito, Rodolfo. Pense bem, foi você quem saiu de casa e ocasionou tudo isso.
- Senhores, pensem na sociedade com calma, quanto ao divórcio, podemos agendar a formalidade no cartório para o dia 02 de fevereiro? Consta aqui que é uma semana após a maioridade da senhorita Catarina Barone.
- Por mim, poderia ser hoje mesmo, doutor Maurício. Estamos conversados. Obrigada!
- Espere, Débora! Até logo, doutor, obrigado.
- Disponham. Nos vemos em breve.
Rodolfo alcançou Débora na porta de saída do escritório de advocacia. Abraçou a ex-esposa num ato inegavelmente desesperado, arrancando risinhos nada discretos da secretária que observava a cena de sua mesinha.
- O que é isso agora, Rodolfo?
- Me deixe ir na festa de aniversário de Cate, por favor.
- Mas é claro que pode ir, você ainda é o pai dela, por Deus! Deixe-me ir, tenho aula de pilates...
- Não vá ainda, vamos tomar um café, está cedo...
- Estou realmente atrasada para a aula, nos vemos no aniversário de Cate.
- Perdão por ser ríspido lá dentro, sinto falta de vocês, estou sofrendo, acredite Débora, estou sofrendo muito!
- Eu também estou sofrendo, Cate também sofreu bastante. Essa história toda só magoou todo mundo. Não vamos repetir, né? Você me disse com todas as letras que estava apaixonado por outra, que ia ficar com ela. O que faz aqui abraçado a sua ex-mulher?
- Eu não sei. Só estou muito mal! Quero voltar pra casa e...
- Não, você só está falando isso por causa da sociedade.
- Como pode ter certeza disso?! Nós convivemos vinte anos! Acha que eu joguei fora só pelo que aconteceu? Ainda pesam pra mim!
- Vinte anos... e só agora, tanto tempo depois, vejo que casei com o homem errado. Nos vemos, Rodolfo. Até logo.
*****
Érika colocou a travessa recheada de macarronada no centro da mesa de jantar e realinhou pela última vez os guardanapos e talheres ao lado dos pratos, cantarolando alegremente a música viral do momento. O bom trabalho na cozinha não era o único motivo de sua felicidade, pois comemorava, exultante, um mês da cirurgia bem sucedida de Jorge. A recuperação também caminhava a passos otimistas, contrariando os prognósticos da maioria de casos daquela temida doença. Para a equipe médica, o caso de Jorge era mais uma hepatectomia parcial que entrava na probabilidade de acertos e remissão. A família Gonçalves enfim respirava com certo alívio, depois das provações do ano anterior.
Érika, no entanto, ainda sentia um incômodo interno que deixava suas noites de sono turbulentas. Logo após a partida de Catarina, na dramática despedida que tiveram à beira-mar, não houve tempo para que a gerente mensurasse o tamanho do sentimento que crescia dentro de si, o amor genuíno que tentou esconder do próprio coração e apagar de sua conturbada cabeça, visto que logo teve que se preocupar unicamente com a cirurgia do pai.
Sem dúvidas, mesmo com toda a atribulação e correria, pensava em Catarina todos os dias quando acordava e todas noites quando tentava, inutilmente, dormir bem. Não sabia, porém, se aquele sentimento se tornara unilateral. Para Érika, serviam como alertas as fotos que via nas redes sociais, as mesmas que Débora curtiu no escritório. Chamavam mais ainda atenção da gerente as legendas que, certamente, eram criadas e escritas pela própria Catarina.
Lembrou também, com dor, da mensagem que mandou nos primeiros dias do ano, sem a resposta de Cate, todavia. Era uma fotografia tirada da nova decoração de seu quarto, em meio a votos de "feliz ano novo, espero que esteja bem". O silêncio, mais uma vez, falava mais que qualquer palavra.
Érika sentou na cadeira que ficava exatamente em frente à travessa com macarrão, mas agora já não cantava mais música alguma. Pôs uma das mãos no queixo e abriu a agenda do celular com a outra, como de costume. Ali estava, destacado em fonte vermelha, evidente e a apenas uma semana de acontecer: "aniversário da Cate".
Num instante, tão rápido como surpreendente, gotículas se formaram em cima do "J" de "janeiro", manchando a tela de seu celular. Lágrimas involuntárias, derramadas nas vezes em que se pegava daquele jeito, sentindo que a história entre elas mal havia começado e teve que acabar.
- Érika? Por que não nos avisou que o almoço já estava pronto? Estou faminto! - Jorge surgiu do quarto como num passe de mágica, guiado pelo cheiro atraente do macarrão. - Érika? Está chorando, minha filha? O que houve?
- O quê? Não, pai. - Enxugou as lágrimas rapidamente com a palma da mão. - É a tela do celular, está ressecando meus olhos, sabe como é, muito tempo exposta a essa luz. Chama a mamãe, eu acabei de colocar a mesa!
- Ah, entendi, vou chamar, pode deixar! Nossa, como está cheiroso!
Érika viu o pai deixar a sala de jantar, guardando o celular no bolso traseiro da calça em seguida. O horário de almoço estava acabando e ela se sentia incrivelmente agradecida por ter que voltar ao trabalho em breve. Lá esperava, pelo menos por alguns minutos, entre o atendimento dos clientes, recuadas de cantadas inapropriadas e vai e vem de carros, esquecer o canto dos olhos escuros de Catarina, que quase se fechavam quando ela sorria.
Mas nem a pilha de obrigações profissionais acalmou seu coração. Numa dessas conexões inexplicáveis de desejos e almas, a súbita saudade de ver seu amor transpassou seus medos e incertezas. Ao fim do expediente, guiada pela coragem que lhe era específica e pela vontade de ver Catarina, nem que fosse de longe, além de estar amparada pelo clima de calmaria em casa e pela saúde de seu pai, tomou o caminho contrário ao habitual de todos os dias. Viu a cidade mudar no decorrer do percurso até chegar ao bairro do sobrado 759, que continuava ostentando o inigualável aspecto de condomínio fechado.
Parou em frente à fonte do grandioso jardim de entrada, surpresa pelas próprias pernas bambas, "mais adolescente que a própria Catarina, quem diria", pensou consigo. Estava fixada como uma estaca no chão, sem saber o que fazer e tão absorta em sua atitude inconsequente que não percebeu o som do veículo que se aproximava, tampouco o singelo barulho da porta batendo, extremamente cuidadoso, como somente alguém muito educado poderia fazer. Finalmente se virou quando a pessoa que acabara de bater a porta do veículo lhe chamou:
- Com licença? Você deseja alguma coisa?
- Pois não, desculpe estar parada aqui... eu... aqui mora uma amiga minha... Ca... Catarina...
- Oh! Você é amiga de Cate? Nunca a vi nas festas! Eu sou Débora, mãe dela.
- É que nos conhecemos há pouco tempo... bem, foi um prazer... estou de saída!
- Espere! A Cate não voltou de viagem ainda, mas eu posso dizer que você veio vê-la. Como se chama?
- Agradeço, mas não era nada de importante, senhora. Poxa, eu realmente preciso ir, perderei o horário do ônibus! Tchau! - Érika saiu a passos tão rápidos que mais parecia estar correndo ao invés de caminhando.
Débora balançou negativamente a cabeça, retocou o batom enquanto andava em direção à porta do sobrado e discou o número de Rodolfo no celular em seguida:
- Débora? O que houve para você me ligar depois de hoje?
- Vou ser curta e grossa porque sua cara de pau parece não ter limites! A próxima vez que você mandar a sua namorada atrás da minha filha, esqueça o divórcio amigável, a sociedade e o escambau! Vou perder totalmente a compostura que venho segurando, sabe-se lá como!
- Como é que é? A Érika foi até nossa casa?!
- Correção, a sua putinha veio até a MINHA casa, com a cara mais lavada do mundo! Mas não se preocupe, eu não a tratei mal, muito pelo contrário. Ela é só uma garotinha audaciosa e sem noção! Eu sei quem está por trás dessa jogada suja!
- Não tenho nada a ver com isso!
- O recado está dado, Rodolfo! O recado está dado!
No ponto de ônibus, Érika suava em bicas. Felizmente não precisou esperar muito, pegou o transporte que fazia o trajeto mais devagar e que atravessava a cidade quase toda, sem se importar com o horário em que chegaria, tamanha a urgência de se afastar daquele local. O constrangimento, entretanto, a seguiu durante toda a volta para casa.
Fim do capítulo
Espero que ainda estejam por aí, kkkk
Nos vemos amanhã!
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