Meus pedaços por Bastiat
O tempo devora a beleza da paixão
Isabel
Acordei assustada e dei um pulo na cama ao ouvir um barulho de algum objeto quebrando.
- ¡Puta que parió!
Eu tentei abrir os meus olhos, mas a claridade foi como um ácido jogado neles.
Minha cabeça lateja, o meu cérebro vai explodir dentro dela. Pareço ter um guarda-chuva enfiado na minha garganta. Sem falar no gosto amargo. Isso tudo só tem um nome: ressaca.
A próxima reação do meu corpo me fez levantar e correr até a privada do meu banheiro. Vômito.
Sentei-me no chão e me entreguei a clássica posição da pessoa que bebe para esquecer, mas exagera. Com a pressão baixa, demorei para me recuperar. Ainda bem que a Giovanna não está comigo este final de semana, o vexame seria muito pior.
Aos poucos eu me reergui, tirei as minhas roupas e tomei banho. Foi bom para despertar-me. A minha dor de cabeça até diminuiu.
Saí do box e me olhei no espelho.
- Que coisa ridícula, Isabel. Nem parece que tem mais de 40 anos, é mãe e empresária de sucesso - disse para o meu próprio reflexo.
Saí do banheiro e dei de cara com a garrafa de Absinto espatifada no chão do meu quarto. Então esse foi o barulho que me acordou. Provavelmente eu dormi com a bebida na cama e ao me virar na cama, derrubei.
Caminhei até o closet e coloquei uma calça larga, uma baby look branca sem estampa e calcei um tênis. Antes de tudo preciso buscar a vassoura, panos e produto de limpeza para arrumar o estrago da bebida esparramada pelo chão. Depois preciso beber um café forte e comer alguma coisa, ir até o estacionamento da emissora buscar o meu carro, passar na filial do Arte e mais tarde ir à sede principal. Se eu não me jogar no trabalho, posso facilmente enlouquecer.
Comecei por buscar os utensílios para a limpeza. Retornei ao meu quarto e peguei um por um dos vidros para embrulhar em um jornal.
Quando terminei com os cacos, parei e passei a observar o meu quarto.
- Cazzo... no recuerdo nada.
Forcei a minha cabeça para me lembrar de alguma coisa, mas nada veio. Amnésia seletiva total. A última coisa que me lembro é de ter bebido um copo e depois ter passado a beber da própria garrafa.
Joguei um pano seco e passei a limpar o líquido.
Enquanto terminava, convenci-me de que logo cai no sono e por isso não me recordo de nada. Se tivesse feito algo importante com certeza saberia, não bebi tanto assim.
Desencanei do suposto problema e dei-me por satisfeita com a minha limpeza.
Lavei as mãos no banheiro, retornei ao quarto, arrumei a minha cama, peguei o meu celular, minha bolsa e desci até a cozinha.
Fiz um café amargo que comi com um pedaço de pão. Ainda bem que não tem gravação hoje, preciso de um tempo para absorver tudo o que aconteceu ontem.
O melhor de tudo mesmo é que só verei a Helena na segunda-feira. Ou seja, 3 dias para tentar assimilar melhor o que fizemos e ainda posso contar com esse tempo para pensar na conversa que precisamos ter.
Como programado, tomei um café bem forte e comi um mamão apenas para não sair com a barriga vazia. Indague-me sobre a atitude da Helena de praticamente fugir de uma conversa. Não posso julgá-la, sei que posso ter dado a impressão de ter cometido a mesma atitude. Porém, acredito que sejam momentos complemente diferentes. Helena sabe o que fez, não preciso ouvir suas mentiras. O que aconteceu ontem foi algo novo e precisamos encontrar um jeito de entender seja lá o que estamos sentindo.
Decidido: vou buscar o meu carro e ir ao encontro dela. Seja na sua casa ou na empresa, onde ela estiver e preferir. Eu não posso conviver mais dias com essa interrogação na cabeça.
Saí apressada de casa e para a minha sorte havia um táxi acabando de deixar um passageiro de frente ao prédio onde moro.
Corrida aceita, durante o trajeto concentrei-me em encontrar palavras e o que dizer à Helena em algumas horas.
Cheguei na porta do estacionamento da emissora. Agradeci o motorista, sai do carro, andei em direção da entrada de pedestres, cumprimentei o porteiro e ajeitei os meus óculos escuros no rosto.
Minha cara não deve estar das melhores e a noite mal dormida está estampada nas minhas olheiras, por isso preferi algo que me escondesse.
- Isabel Casañas.
‘Eu não posso ter uma manhã de paz enquanto enfrento uma ressaca na minha vida?', perguntei-me.
- Natália - virei-me em sua direção.
- O que você está fazendo aqui?
- Desde quando te devo satisfação? - Perguntei com deboche.
- Ora, eu não quero saber de você, o que faz ou o que deixa de fazer. Só acho estranho a sua presença já que hoje não dia de gravação.
- Vim apenas buscar o meu carro que deixei aqui ontem, não temos gravação. Estranho é a sua presença aqui.
- Muito bem, Isabel. Apesar de tudo, ao menos a educação você preservou - ironizou. - E não tem nada de estranha a minha presença, vim fazer a ponte entre um aluno da Escola de Roteiristas e a emissora. Parece que teremos uma série de suspense no ar futuramente.
Revirei os olhos com a sua falsidade de continuar uma conversa amena e virei-me de costas para sair.
- Ei, espera - parei, mas não voltei a minha atenção para ela. - Eu estava mesmo querendo falar com você desde que fiquei sabendo que voltaria ao Atuando.
- No temos nada para hablar, Natália. Eu estou ocupada demais para ouvir suas opiniões sem fundamentos.
Ignorando a minha falta de vontade para conversar, a sócia e amiga da minha ex continuou:
- Fiquei sabendo do beijo e de toda merd* que você disse à Heleninha. Você não acha que está na hora de se afastar de vez como fez no início? Por que você não some da vida dela e entrega a Gi? Todo mundo sabe que a Helena é uma mãe mil vezes melhor do que você.
Girei o meu corpo imediatamente e caminhei na sua direção.
- Eu te disse que estou ocupada demais para ouvir suas opiniões sem fundamentos. Quem deveria desaparecer da vida da Helena é você.
- Ah, essa é a Isabel que eu sempre soube que existia. Vamos lá, revele-se. Você nunca gostou de mim, não é?
- Nunca tive nada contra usted, Natália. Sempre te recebi com prazer na minha casa pois a Helena tinha uma verdadeira admiração por você. Em consideração a amizade entre vocês duas, eu ignorei as brigas que você criou para o meu casamento. No era surpresa quando no final de uma discussão eu ouvia "a Nat me disse". Você criava fantasias ridículas, nunca esqueci quando eu tive que demitir uma estagiária por sua culpa.
- Agora a culpa é minha porque você terminou o casamento? Não se faça de vítima, a única culpada dessa história é você. Eu não sei como você se aguenta acusando os outros para não admitir o verdadeiro motivo dessa sua separação.
- Você sempre foi tão infantil, garota. Mas agora confesso que fiquei curiosa para ouvir mais uma opinião relevante - ironizei.
- É sério que você acha que engana todo mundo com essa história de beijinho entre a Helena e o Gustavo ser a gota d'água? Eu sei que você se separou porque não precisava mais dela. Fez-se a vida inteira de atriz sofrida, sem grana, arte acima de tudo, mas depois que conheceu a fama e passou a ganhar rios de dinheiro, Helena Carvalho virou um objeto descartável que estava atrapalhando a vida nova.
Eu comecei a aplaudi-la, esqueci-me até que estava em um local que poderia facilmente ser vista e ouvida.
- Dessa vez você se superou, Natália. Olha que nem Freud analisaria tão bem uma pessoa - mais uma vez abusei da ironia.
- A única pessoa que sinto pena nessa história toda é da Gi...
- Chega! - A interrompi - Você não vai tocar no nome da minha filha novamente. Quer dizer suas bobagens sobre o que pensa de mim? Fique à vontade. Mas deixa a Giovanna fora disso.
- Frustrada! Alpinista social!
Que Natália Viera nunca foi muito com a minha cara não é uma surpresa, mas me ofender desse jeito está sendo novidade.
- Está insinuando que eu fiquei 15 anos com a Helena por interesse? Sempre tivemos contas separadas, querida.
- Não, Isabel. Você sempre tentou ser independente financeiramente e por isso você se frustrava. Mas deve ser realmente ruim não poder comprar uma casa com a sua mulher para ter um quintal grande. Isso sem contar da vez que a Helena sustentou a casa sozinha por quase um ano. Nem a compra do mês você conseguia fazer direito, que vergonha! E o tratamento para engravidar?! Nem vamos citar aqui. Você mal tinha dinheiro para um enxoval decente.
Senti o baque. Escondi toda a minha decepção atrás dos óculos escuros.
- Como... co... Ela... ela te contou... te disse isso?
- O quê? Eu sou a melhor amiga dela, com quem você acha que ela desabafava? Eu sei tudo e mais um pouco sobre vocês.
Eu nunca me senti tão humilhada em toda minha vida. A pessoa que eu mais confiava é pior do que eu imaginei.
Engoli seco e tentei concentrar-me na discussão novamente. A melhor defesa é o ataque.
- Ainda bem que eu bati o pé e não deixei que a Helena te escolhesse como madrinha da Giovanna. Você é baixa, traicioneira, ridícula.
- Quem está usando a Gi agora, Isabel?
- Quem é que a frustrada agora, Natália? Você nunca perdoou pela Elisa ter sido escolhida como a madrinha da minha pequena.
A amiga da Helena aproximou-se de mim e praticamente cuspiu na minha cara:
- Você foi pouco corna, minha amiga deveria ter te chifrado muito mais. Ter visto a Helena e o Gustavo se beijando não foi nem metade do que você merecia ter visto de verdade.
Antes que eu deixasse a raiva tomar conta do meu corpo e fizesse alguma besteira, dei dois passos para trás e apressada saí de perto dela.
Com a visão embaçada pelo meu choro, demorei até conseguir chegar no meu carro. À procura da chave na minha bolsa também não foi fácil.
Quando finalmente encontrei, abri a porta rapidamente e sentei-me no banco abaixando a minha cabeça até encostar no volante. Entreguei-me ao pranto.
"Helena entregou-me uma pequena caixa e sorriu.
- Essa não é a mesma caixinha que você me deu ontem com o sapato que nosso bebê vai sair da maternidade? - disse colocando a almofada do sofá da nossa sala no lugar e arrumei minha postura.
- É, mas o que tem dentro é outra coisa - Lena respondeu.
- Você sabe que ele ou ela só terá dois pés, não é?! - Brinquei.
- Cala a boca, Isa - sua mão deu um tapa leve na minha perna e em seguida fez carinho.
Retirei a tampa da caixa e o meu sorriso morreu só por imaginar do que se tratava.
- Una llave? - Indaguei.
- A chave da nossa nova casa.
Busquei os olhos da minha mulher.
- Achei que você tivesse concordado em esperar mais um tempo para comprarmos juntas. Você sabe que eu não tenho de onde tirar um centavo para essa casa.
- Eu sei, meu amor. Mas eu pensei melhor e vi que não tem nada a ver. Eu quero que nossa criança cresça em uma casa com bastante espaço para brincar e não neste apartamento. Eu sempre quis comprar um cantinho para nós, já você sempre preferiu dividir o aluguel. O fato de eu comprar a casa, não significa que ela não será sua.
- O que no tiene nada a ver é você agir pelas minhas costas. Você não consegue esperar por 5 años? Eu vou recuperar o Arte, caramba.
- Nem você tem certeza disso, Isa.
- Eu tenho certeza, Helena! Não menospreze o meu sonho.
- Menosprezar? Vida, eu quero mais é que você acabe logo com essa dívida e que o Arte dê certo. Deixe-me te ajudar a pagar esse empréstimo absurdo que você fez.
- Eu já disse que no! - Irritei-me.
A mais velha pegou na minha mão e passou a fazer carinho.
- Amor, calma. Você está grávida de apenas dois meses e a médica disse para termos cuidado, lembra? Ficar agitada pode fazer mal ao bebê.
Coloquei uma boa quantidade de ar em meus pulmões e soltei devagar. Eu preciso manter a calma, mesmo que me sinta machucada com a falta de apoio emocional da minha mulher para os meus sonhos.
- Isa - sua voz suave me capturou. - Eu também tenho os meus sonhos e imaginei por anos nós duas em uma casa com uma criança correndo pra lá e pra cá. Não estrague tudo por orgulho, aceite essa casa como o nosso lar.
- Nem tudo é questão de orgulho, cariño. Já estava decidido que esperaríamos. Por que tudo tem que ser do seu jeito?
- Por que tudo tem que ser do SEU jeito, Isabel?
- Você tem certeza disso? Quando foi que eu não fiz as suas vontades? - Perguntei olhando em seus olhos e sorrindo de lado.
A menor pareceu pensar longe e quebrou o nosso contato visual para deitar a cabeça no meu peito.
- Se vai te fazer se sentir melhor, quando o bebê nascer passamos a casa para o nome dele ou dela. Assim fica como um presente.
- Passamos? - Estranhei.
- Sim, eu comprei no nosso nome. Apesar de eu já ter a chave porque usei um pouquinho o meu nome, só falta a sua assinatura para finalizar a entrada nos papéis - finalizou dando um beijo na minha pele.
- No credo en eso. No vou assinar nada.
Helena saiu da sua posição e olhou para mim.
- Ah, mas você vai sim! Já gastei um bom dinheiro para rodar a papelada e não vou fazer tudo de novo. É só uma formalidade, amor. Já te disse que vamos passar para o nome do nosso filho.
- É por isso que digo: tudo tem que ser do seu jeito - meus dedos deslizaram pela sua face. - Tudo bem, eu assino.
A paulistana sorriu e beijou os meus lábios.
- Posso marcar uma visita para amanhã? Eu amei a casa, mas você precisa aprovar também. Se você gostar, assinamos na nossa futura cozinha ampla.
Minha Helena sabe como me agradar e citou o meu cômodo preferido porque sabe que meu sonho é ter uma cozinha maior.
- Pode marcar, cariño. Eu tenho certeza de que vou gostar.
Feliz, Heleninha pulou em cima de mim com cautela e abraçou-me. Distribuí beijos pelo seu cabelo e rosto. Eu nunca conseguiria dizer não ou impedi-la de realizar os seus sonhos. Primeiro o seu sorriso, depois o meu.
- Isa? - chamou a minha atenção de maneira manhosa.
- Diga, cariño - disse com receio.
- Você já pensou em nomes? Nós até hoje não falamos sobre isso.
- Sí... Na verdade, apenas em um.
- Em qual?
- Giovanni ou Giovanna.
Helena pareceu pensar um pouco e pronunciou os nomes. Sorrindo, sua atenção se voltou para mim novamente.
- Para te provar que nem sempre as coisas são como eu quero, vou deixar você escolher o nome. Será Giovanni ou Giovanna.
Minha única opção era rir da sua esperteza.
- Eres terrible, cariño. Você só aceitou porque gostou do nome também.
- Claro que não, amor. Eu dei sorte de ser um nome lindo, só isso.
Abracei a sua cintura fina e a trouxe para o meu colo.
- Está ansiosa para ver a nossa casa? - Perguntou-me.
- Curiosa para conhecer a casa da Giovanna ou do Giovanni..."
A casa continua no nosso nome. Os anos foram passando e acabei deixando o assunto para depois conforme a Helena me enrolava.
Enrolar talvez tenha se tornado a especialidade da minha ex. Não bastou todas as traições, agora eu descubro que a apresentadora contava para todo mundo que eu precisei da sua ajuda para fazer a compra do mês.
O meu orgulho não está ferido, ele jorra sangue. Se por um momento eu desejei voltar para a Helena, agora eu tenho certeza de que jamais farei isso. Não tem sex* gostoso que vá cicatrizar mais essa ferida.
Meu celular começou a tocar e eu levantei a cabeça. Peguei o aparelho dentro da minha bolsa e vi que era ela.
- Alô - atendi.
"- Isabel? Isa, está tudo bem? Eu fui até o seu apartamento, mas o porteiro me disse que você não estava. Passei nos dois Arte, nem sinal de você. Onde você está?"
- Na merd*, Helena. Eu estou na merd* que você me jogou. Parabéns, dessa vez você se superou.
"- Hã? O que aconteceu? Bebeu de novo? Já emendou com a bebedeira de ontem?"
- Como você sabe que eu bebi?
"- Você não se lembra? Nos falamos ontem pelo celular, mas você dormiu no meio da ligação."
- Shit...
"- Isabel, eu sei que ontem foi tudo confuso, acho que estamos tentando assimilar até agora o que aconteceu. Sei também que fugi, mas estou disposta a conversar hoje. Onde você está?"
- Já te disse: na merd*.
"- O que foi agora, Isa? Por favor, me diga. Eu estou realmente cansada de não saber lidar mais com você."
O choro que havia cessado minutos atrás, voltou.
- Sabe com quem eu falei há pouco? - Minha voz embargou.
"- Não, querida. Eu nem sei onde você está, como vou adivinhar?"
- Com a sua amiga Natália Vieira.
Ouvi um resmungo e posso jurar que a vejo olhando para o céu ou o teto de algum lugar.
"- Aposto que vocês discutiram, não foi? Não vale a mal do que a Nat te disse, ela só estava tentando me defender. Seja lá o que vocês conversaram."
- Eu não levei nada a sério, exceto o que ela me revelou.
"- O que ela te revelou, Isabel?"
Senti a sua voz aflita e balancei a minha cabeça negativamente.
- Usted contou a ella que eu fiquei quase um ano sem conseguir colocar dinheiro em casa. Pior, você deu a entender que me sustentava. Isso nunca aconteceu de fato, Helena. Ou melhor, aconteceu sim, eu que entendi errado. Yo pensé que tínhamos um acuerdo. Mas eu me enganei, assim como fui me enganando durante 15 anos.
"- Isabel, você deve ter entendido errado..."
- Será mesmo? Torço para que sí porque nem cuando te vi beijar o Gustavo foi tan doloroso. Se você não contou, como a Natália sabe? Responda-me, Helena, como é possível? Você contou ou não isso para ela?
Não sei por quanto tempo ficamos em silêncio, mas sei que foi o suficiente para entender.
"- Meu amor, eu contei, mas não foi como você entendeu."
- Chamar-me de ‘meu amor' não vai mudar nada, Helena.
"- Ok, eu posso ter errado, não deveria ter contado coisas que só desrespeitavam a nós. Mas eu quero conversar com você, te explicar como foi que chegamos no assunto. Por favor, Isabel."
- Você também se vangloriou de ter pagado a inseminação da nossa filha, Helena. Cazzo, você contou da casa, e até do enxoval! Eu não comprei tanta coisa, mas porque você queria luxo.
"- Eu vou matar a Natália - sussurrou. - Isabel, esquece todas as bobagens que a Natália tenha mencionado. O que ela queria era justamente te ferir e pelo jeito conseguiu. Eu vou ter uma conversa séria e ela vai te pedir desculpa."
- No necesita. Eu te pediria para afastar a Giovanna dela, mas sei que você nunca fará isso. Eu só te aconselharia escucharla menos para o seu próprio bem.
"- Isabel, vamos conversar..."
- No, Helena. Tudo o que eu menos quero no momento é te ver - tomei um fôlego longo e continuei. - Por favor, faça a conta de tudo que você achar que eu te devo e mande para mim. Eu não preciso de sua esmola. No soy uma alpinista social.
Encerrei a ligação e joguei o meu celular no chão do carro.
- No llores por ella, Isabel - dei risada e chorei ao mesmo tempo.
Retirei os meus óculos escuros, sequei as minhas lágrimas e coloquei o de grau.
Estiquei-me para alcançar o meu celular, abri o aplicativo de música e procurei por uma específica. A mesma que ouvia nas noites em que caia a minha ficha de toda situação que me meti e na volta para casa no dia em que nos separamos.
Dei a partida no motor, sai do estacionamento da emissora de televisão, liguei o rádio e dei play.
A guitarra pesada soou em uma bela melodia.
A voz poderosa e inconfundível de Janis Joplin rasgou o meu coração:
Oh, come on, come on, come on, come on!
Didn't I make you feel like you were the only man, yeah! (Eu não te fiz sentir como se você fosse o único homem? Sim)
Didn't I give you nearly everything that a woman possibly can? (Eu não te dei quase tudo que uma mulher possivelmente pode dar?)
Respondi cantando junto:
- Honey, you know I did! (Querida, você sabe que sim!).
And each time I tell myself that I, well I think I've had enough (E a cada vez digo a mim mesma que eu, bem, acho que tive o bastante)
Mais uma vez cantei como se estivesse falando para a Heleninha:
- But I'm gonna show you, baby, that a woman can be tough (Mas eu vou te mostrar, baby, que uma mulher pode ser durona)
O refrão começou e eu me segurei por estar dirigindo.
I want you to come on, come on, come on, come on and take it (Eu quero que você venha, venha, venha, venha e leve-o)
Take it! (Leve-o)
Take another little piece of my heart now, baby! (Leve outro pedacinho do meu coração agora, querida!)
Oh, oh, break it! (Oh, oh, quebre-o!)
Break another little bit of my heart now, darling, yeah, yeah, yeah (Quebre outro pedacinho do meu coração agora, querido, sim, sim)
Oh, oh, have a! (Oh, oh, possua um!)
Have another little piece of my heart now, baby (Possua outro pedacinho do meu coração agora, baby)
You know you got it if it makes you feel good (Você sabe que pode, se isso te faz sentir-se bem)
Oh, yes indeed (Oh, sim, realmente)
Helena deixou o meu coração em pedaços e se não bastasse tudo, hoje quebrou ainda mais. Talvez ela esteja satisfeita porque como diz o refrão, quebrou, levou um pedaço. Voltou, quebrou de novo e de novo.
You're out on the streets looking good (Você está fora, nas ruas, parecendo bem)
And baby deep down in your heart I guess you know that it ain't right (E baby, bem dentro do seu coração, eu acho que você sabe que isso não é correto)
Never, never, never, never, never, never hear me when I cry at night (Nunca, nunca, nunca, nunca, nunca me ouve quando eu choro à noite)
- Babe, I cry all the time! (Babe, eu choro o tempo todo!)
And each time I tell myself that I, well I can't stand the pain (E a cada vez digo a mim mesma que eu, bem, não consigo suportar a dor)
But when you hold me in your arms, I'll sing it once again (Mas quando você me segurar em seus braços, vou cantar mais uma vez)
Só que nunca mais ela me terá em seus braços, pensei.
Parei no farol e cantei em plenos pulmões:
- I'll say come on, come on, come on, come on and take it!
Take it!
Take another little piece of my heart now, baby
Oh, oh, break it!
Break another little bit of my heart now, darling, yeah
Oh, oh, have a!
Have another little piece of my heart now, baby
You know you got it, child, if it makes you feel good
Quando parei, notei que um entregador de folhetos me olhava assustado.
Olhei para o outro lado e escondi o meu rosto. O farol abriu e eu saí cantando pneu.
- ¡Qué vergüenza!
O refrão foi se repetindo até o fim. Assim como a música que tocou mais 5 vezes durante o trajeto.
[...]
Deitada no sofá do meu apartamento, reli todo o papel que estava em minhas mãos.
A última modificação foi feita há 10 dias e aprovada. Quando chegou, 4 dias atrás, eu guardei em uma gaveta e resolvi só pensar nele na semana que vem que é o prazo para a minha assinatura. Mas tudo mudou.
A campainha tocou e sentei-me assustada no sofá. Só pode ser alguém que conheço para o porteiro não ter interfonado.
Coloquei o papel com os outros em cima da mesa de centro. Levantei-me receosa, andei até a porta e olhei pelo olho mágico.
Respirei aliviada e abri a porta.
- Oi, Nina.
- Oi, dona Isabel - sorriu.
- Entra - pedi e ela o fez. - Cadê a Giovanna? - Olhei para o corredor.
- Está em um passeio da escola ainda, só a buscarei em uma hora.
Fiz a moça me acompanhar até o sofá e me sentei após ela se acomodar.
- Aconteceu alguma coisa, Nina? O que faz aqui?
- Desculpa, mas a Helena me pediu para passar aqui antes de buscar a Giovanna na escola. Ela está preocupada e eu também fiquei.
Balancei a cabeça em negação.
- Você é babá da Gi e não minha, Nina. Você não precisava dar a volta na cidade só porque a Helena está se sentindo culpada.
- Eu não sei o que aconteceu e também não quero me meter na história de vocês. Mas ela me ligou chorando e implorando para eu ver como a senhora está. Eu sei que sou só a babá da sua filha, mas eu me preocupo com a senhora também. Sempre gostei dos nossos papos.
- Perdóname, Nina. Eu não quis te rebaixar a uma mera babá da Gi. Eu gosto muito de você. Além de ser uma excelente profissional, é uma menina maravilhosa.
Sorri triste, mas ganhei um sorriso de compreensão.
- Como a senhora está?
- Bem. Na medida do possível eu estou bem.
- Quer conversar sobre o que aconteceu?
Olhei para os papéis em cima da mesa e respondi:
- Eu estava terminando de ler esses papéis.
- Que são? - Indagou esticando o pescoço para tentar ler.
Levantei-me do sofá e me ajoelhei perante os papéis. Depois de juntá-los, peguei uma caneta rubificando duas páginas.
- São os papéis do divórcio.
Com a mão tremendo, coloquei a ponta da caneta na linha e ouvi a voz da Nina que freou a minha ação.
- Espera! Pensa bem. Você tem certeza disso? Acho que a raiva não é uma boa conselheira.
- Eu nunca pensei que faria isso, sabe? Eu acreditava na besteira de ser para sempre, até que a morte nos separe. Sempre pedi para morrer primeiro, pois achava que não suportaria perdê-la. Mas eu não a perdi. Não se pode perder o que nunca se teve de verdade. Apenas amei uma mentira. Uma mentira.
Coloquei a minha assinatura e sentei-me no chão chorando. Fui acolhida pela Nina em um abraço forte. Desabei.
Fim do capítulo
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GabiVasco
Em: 19/11/2020
Nitidamente a Natália fez isso de propósito para ver se afasta de vez a Isabel, eu acho triste isso mesmo irritada com o egoísmo declarado da Helena de ter desrespeitado o combinado da casa.
Agora eu acho que a Natália faz parte de algum plano que esse Gustavo estava envolvido no meio.
Resposta do autor:
Será mesmo? Gustavo e Nat? Pensa se tem um objetivo...
Abs.
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Rain
Em: 17/11/2020
Olá!
Olha, veja bem... Até agora, muitos fatores contribuíram para a separação da Isabel e da Helena, entre elas, as próprias Isabel e Helena. Como eu a via dito, as Helena mentiu demais, não respeitou o sonhos da Isa, nem ao menos uma conversa sobre tudo que envolvia elas, por exemplo: a compra da casa, elas tiveram. A Helena se falar coisa a Natália é normal, sempre queremos nos abrir com nosso amigos. Mas, ela deveriar perceber que se abriu justo com o amigo que não gostava muito da relação dela.
A Isabel também é errada na história. Elas já são maduras e deveriram conversar, por mais que possa ser doloroso ouvir a pessoa que você dizer que te traiu. Porém, Isa está certa em muitas coisas.
Acho que Natália não possa ser a pessoa que armou para elas se separarem, mas com a " proteção" dela com a Helena causou danos no casamento das duas. A gente não gostar da pessoa é pelo gosto. Mas, se Natália queria a felicidade de Helena ela teria conhecido a Isabel melhor e não interferido no casamento das duas. Essa parte da " corna" ela acabou afirmando que Helena realmente traiu a Isa. Foi uma merda!
Essa Elisa, se esconde demais. Por ela ainda não aparecer e fica enrolando a Helena, me dar uma suspeita sobre ela. Vou esperar ela aparecer para dar meu palpite. A Isa defendendo ela deixou outra puga atrás da orelha.
Desculpa o comentário grande. Eu meio que falo demais, e acabei me empolgando também. Essa história é o máximo, por mais que seja dolorosa em alguns momentos.
Espero que não demore para elas ficarem juntas... Mas, pelo visto a coisa vai demorar.
Bye, Autora!
Resposta do autor:
Hey!
Não se preocupe, eu adooooro textão, amo saber o que estão pensando e ler as teorias é melhor ainda.
Concordo com muitas coisas que disse, visão bem clara. Posso te confirmar: Natália não armou para elas, você acertou.
Depende do que é demorar, mas tem várias coisas para serem resolvidas.
Abs!
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Baiana
Em: 17/11/2020
Rapaz, tô achando que a cobra venenosa que contribuiu para acabar com o paraíso de Isabel e Helena foi a Natália,mas a culpa não foi 100% dela,pois se houvesse diálogo entre elas,todo problema que fosse surgindo,elas sentariam e tentariam resolver,e a Helena foi muito sonsa não percebendo a falsa amiga,espero que depois desses absurdos que ela falou para a Isabel,ela coloque essa Natália no lugar dela.
ii
Resposta do autor:
Bem observado a parte do diálogo e cada uma com sua culpa.
Abs!
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