Lucília
Isabel
Felizmente tudo deu certo. Plínio, logo chegou à fazenda e minutos depois nos deu a notícia que o bebê estava bem, só assim conseguimos finalmente respirar aliviadas. Tivemos que escutar um senhor sermão do médico, mas foi necessário, nos precipitamos e novamente respirei aliviada quando ele disse que Carmen estava estável.
Plínio nos deixou cientes de que relações mais íntimas, não poderiam de fato acontecer pelo menos por um mês. E estresses... Bem estresses de maneira nenhuma. Teria que tomar providências quanto a isso. Carmen e o bebê são minhas prioridades, farei o que for preciso para deixá-los confortáveis.
– Baronesa, cuide bem dos dois! – Disse a apertando a minha mão.
– Obrigada novamente, Plínio! – Agradeci. – Vou te levar até a porta.
Acompanhou o médico até a saída da casa e novamente o agradeci. Seria eternamente grata a Plínio, por ter salvo a vida da minha Carmen.
– Até, Baronesa! – Disse entrando na carruagem.
Fiquei ali parada alguns minutos pensativa e me recuperando do grande susto que levamos. Essa criança nem nasceu e já está nos dando trabalho. Sorri ao pensar no bebê. Assim que me virei me deparei com Lucília parada no meio da sala.
– O que a cortesã fez dessa vez para te prender a ela? Inventou alguma dor nova? Cólica? – Falou irritada. Eu já não reconhecia mais Lucília, essa raiva que ela sente por Carmen e pela criança está passando dos limites.
– Mesmo não sendo do teu interesse, vou contar o que aconteceu. – disse ríspida. – Carmen teve um sangramento... – Ela riu debochada. – Mas felizmente ela e a criança estão bem! – Passei por Lucília sem encará-la.
– Sabe que deveria levar a mulher de volta ao lugar dela! – Falou me fazendo parar ainda de costas para ela.
– O lugar de Carmen é aqui ao meu lado! Espero que se acostume com isso, Lucília, ou teremos sérios problemas! – Ela não respondeu e eu voltei ao quarto irritada com a governanta. Eu precisava dar um jeito nisso, Carmen não podia se estressar e Lucília não a deixaria em paz. Teria uma conversa franca com ela mais tarde.
Entrei no quarto e ela logo reparou que não estava bem.
– ¿Qué pasó, Cariño? – Ela nunca tinha me chamado assim, foi impossível não sorrir.
– Nunca me chamou assim.... – Falei a deixando sem graça. – Como és linda, Carmen!
– Pare! Está me deixando sem jeito! – Sorri. – Agora me diga, por que veio brava da sala?
Suspirei pesado.
– Lucília.... Mas não quero falar sobre isso.
Carmen entendeu meu pedido e não comentou nada, apenas ficamos ali juntas. Levantei sua camisola e fiz um carinho em sua barriga. Essa criança já era minha filha e nada nem ninguém mudaria isso. Nunca. Deitei a cabeça novamente em sua barriga e cantei uma canção de ninar que meu pai cantava para mim, quando era pequena.
"Boa noite, boa noite,
Coberto com rosas,
Presas com cravinhos,
Deslize por baixo da coberta!
Amanhã de manhã, se Deus quiser
Boa noite, boa noite
Sua cama está arrumada,
Desejo bons sonhos então!
Amanhã de manhã um novo dia
Já lhe espera com alegria"
Cantava baixinho e quando olhei para cima, Carmen dormia serena. A deixei descansar, esses dias foram turbulentos para ela. Fiquei ali ao seu lado, com a cabeça ainda grudada na sua barriga. Minutos depois escutei batidas na porta, que acabaram também despertando-a.
– Entre! - falei sem me mexer.
– O almoço está servido! - Era Lucília. Tinha que ser ela, parecia que não cansava de perturbar. Isso não continuaria mais, hoje mesmo tomaria providências.
– Peça à Marta que prepare a mesa da varanda para nós duas. Só isso? - Disse seca.
– Isabel...
– Pode sair, Lucília. Conversarei contigo mais tarde. - Escutei seu suspiro e depois saiu batendo os pés com raiva. Revirei os olhos.
Fiquei mais algum tempo ali com eles, aproveitando a companhia das minhas pessoas preferidas.
– Vamos almoçar? - Falei me espreguiçando.
– Vamos. Teu filho está faminto. - Escutar ela dizendo isso, me fez sorrir largo e me emocionar.
Marta arrumou uma linda mesa. O dia estava bonito e a temperatura agradável. Era perfeito para uma refeição na varanda. Afastei gentilmente a cadeira para a mulher sentar.
– Gracias, galante Baronesa! - Disse me fazendo rir.
Almoçamos em paz, sem perturbações. Carmen estava mais leve era visível e isso me deixou mais tranquila também. Depois do almoço, ficamos mais um tempo sentadas na varanda. Eu não trabalhei naquele dia. Decidi que ficar com eles. Haviam alguns papéis pendentes escritório, mas deixei para mais tarde.
– Está com sono? - Perguntei quando ela se recostou no meu ombro.
– Um pouco... - Bocejou em seguida. - Tenho mais sono agora do que antes... - Riu.
– É a gravidez, meu amor! - Carmen se encaixou mais em meus braços e fechou os olhos.
– Se quiser te levo para o quarto e dormimos um pouco, o que acha?
Ela se encolheu e concordou.
– Não se importa?
– Claro que não! Vou levar os dois para a cama... - A puxei pela mão até o quarto. Arrumei a cama enquanto ela colocava algo mais leve para deitar.
Carmen deitou nos meus braços e alguns minutos depois já estava com a respiração pesada. Me permiti fechar os olhos e também dormi. Acordei com o sol se pondo, estava quase escurecendo. Lembrei dos papéis da fazenda que tinha que revisar e bufei. Coloquei a mulher com cuidado para o outro lado da cama e deixei um beijo em sua testa. Ela nem se moveu, dormia profundamente.
Levantei para me vestir e sai em seguida do quarto. A casa parecia vazia. Só sentia o cheiro bom de comida vindo da cozinha. Fui até o escritório e me sentei atrás da grande mesa. A parte da contabilidade da fazenda era a mais delicada, exigia muita atenção. Precisava de alguém para me ajudar. Depois que juntei as duas fazendas, meu trabalho duplicou. Pensava que daria conta e até consegui no começo, mas agora precisava dividir meu tempo entre Carmen, o bebê e a fazenda. Aos poucos, fui me adaptando a essa rotina, mas a papelada sempre acumulava. Bufei, mas não tinha para onde fugir. Passei um bom tempo trancada no escritório, fazendo cálculos. Me levantei um pouco da cadeira tempos depois, ajeitando minha postura e olhei desanimada para o tanto de coisa que ainda faltava.
Escutei batidas na porta.
– Entre! - Disse voltando a cadeira e abaixando a cabeça para ler alguns documentos.
– Isabel... O jantar está servido. - Era Lucília novamente.
– Vou em seguida. - Respondi ainda sem olhar para a mulher a minha frente.
Ela fechou a porta mas não saiu. Fez um barulho com a garganta chamando minha atenção.
– Pois não? - Perguntei olhando para ela.
– Até quando irá me ignorar, Isabel?! - Disse um pouco irritada.
A encarei e ri.
– Tu não tens jeito, Lucília! - Falei afastando o papel que estava lendo. - Sabe que estou agindo assim por um motivo!
Ela fechou a cara.
– Deixará aquela mulher te colocar contra mim? - Disse irritada.
Respirei fundo. Aquilo precisava acabar e seria agora.
– Não se refira mais a Carmen dessa forma...
– Mas ela é uma qualquer... - Não deixei a mulher continuar.
– Já pedi para não falar assim de Carmen! - Disse alto.
Lucília se assustou com minha reação.
– Por que não pode simplesmente respeitar minha vontade?! Tudo bem que não concorde com minhas decisões, mas me RESPEITE! - Disse batendo na mesa. - Respeite a mulher que está naquele quarto e acima de tudo respeite o meu filho! Ele não é um bastardo e não me importa o que ache, Lucília, ELE É meu filho e se Carmen permitir, será o futuro Barão ou Baronesa de Vassouras! - Ela se encostou na cadeira em frente da mesa e ensaiou um desmaio, eu sabia que era cena.
– Teu pai nunca permitiria isso! - Disse ríspida.
– Meu pai era apaixonado por Margot, Lucília! Por Deus! - Isso pareceu afetar a mulher mais do qualquer coisa.
– Teu pai um dia gostou de mim... - Falou abaixando a cabeça com pesar. - Éramos muito amigos, eu cresci na fazenda assim como ele. Mas ele era o futuro Barão e eu era só a filha do capataz... - Ela dizia chorosa. - Ele gostava de mim, me disse isso inúmeras vezes. - Sorriu em meio às lágrimas. - Mas cresceu e foi embora estudar em Coimbra. Quando voltou... - Sua voz estava embargada. - Quando voltou passava a maior parte do tempo na capital.
Ela me olhava e via a tristeza tanto nas suas palavras quanto no seu olhar. Fiquei em silêncio e deixei que continuasse:
– Ele se apaixonou por ela... - Disse com desprezo. - Aquela... - A olhei com repreensão. - Se apaixonou por Margot! Uma mulher da vida! Ele mesmo me confessou, ainda éramos amigos e ele tinha medo do que o pai faria quando descobrisse que amava uma Pu... - De novo ela parou e respirou antes de falar. - Ele não sabia o que fazer, queria fugir com ela! Um absurdo! - Disse com raiva. - Jorge era um homem inteligente, o futuro Barão, jamais o deixaria estragar a vida por uma mulher da noite!
– Lucília... O que fizeste?! - Perguntei já sabendo a resposta.
– Eu já estava virando governanta, seus avós confiavam em mim... Foi quando que contei ao teu avô que Jorge estava apaixonado por Margot.
Engoli em seco. Sei que Lucília não foi a única responsável pelo romance deles não ter dado certo mas, com certeza, aquilo pesou para acabar de vez com os sonhos do meu pai.
– Por que fez isso? - Disse indignada.
– PORQUE EU AMAVA O TEU PAI, ISABEL! - Disse alto. - E aquela mulher não o merecia! Eu merecia! Eu sempre o amei e ela o tirou de mim! - Disse chorando.
Apesar de tudo fiquei com pena. Eu tinha afeto por Lucília e vê-la naquele estado mexeu comigo. Me aproximei e coloquei a mão em seu ombro.
– Margot não teve culpa, Lucília! Ninguém escolhe isso, simplesmente acontece... - Ela enxugou algumas lágrimas.
– Teu avô tratou de tirar Jorge da capital e a apressar o casamento com a tua mãe. Não sei o que ele fez, mas Jorge voltou arrasado da capital, nunca mais foi o mesmo e me arrependi durante muitos anos por ter contado seu segredo. Nunca contei a ninguém sobre isso, só a ti agora... Só estou lhe dizendo isso, Isabel, porque não quero ver história se repetir. Eu te amo! - Disse me fazendo um carinho no rosto. - Não aguentaria te ver afundada na mesma tristeza que se apoderou do teu pai. Tu era a única alegria na vida dele e eu prometi me redimir cuidando de ti! Então me diga, como acha que estou me sentindo agora, vendo a história se repetir bem debaixo do meu nariz!? - Perguntou irritada.
– Eu sinto muito pelo que viveu, Lucília! Pelo teu amor não correspondido, mas errou ao contar ao meu avô e está errando agora ao tentar me afastar de Carmen. Acha que o melhor para mim seria viver sem ela? Como aconteceu com meu pai?
Ela bufou.
– Essa mulher irá embora a qualquer momento, Isabel! Não vê isso?
– Eu não sou idiota, Lucília! E Carmen não é minha prisioneira! Se quiser ir embora dessa casa, será uma escolha dela e nada poderei fazer, mas se ela decidir ficar espero que respeite minha decisão!
Ela se afastou de mim.
– Ela irá te magoar, Isabel! Eu sei disso... Aquela mulher não serve para ti, muito menos a criança que ela carrega.
Naquela hora vi que Lucília não tinha jeito, ela nunca entenderia. Suspirei triste.
– Eu amo Carmen e amo o MEU filho! - Disse a encarando. - E se não consegue entender isso... - Respirei fundo. - Terá que se afastar! - Ela me olhou triste. - Peço para que fique na antiga casa. Carmen não pode se estressar e não a deixará em paz, eu sei disso... Então por favor, Lucília, arrume tuas coisas amanhã mesmo pode retornar para outra fazenda.
– Mas, Isabel... - Ela tentou argumentar.
– A decisão está tomada, Lucília! - Virei as costas e deixei a mulher no escritório. Meu coração doeu ao escutar seu soluço de choro, mas não voltaria atrás.
Lucília nem apareceu na sala de jantar naquela noite. Não a vi mais depois da conversa e fui dormir sentindo o peso de afastá-la, infelizmente não havia outra opção.
– Como tu estás, meu amor? - Perguntei a Carmen abraçando-a por trás e acariciando aquela barriga linda.
– Com un poquito de dor apenas. - Beijei seu ombro e a puxei mais para mim.
– Quer que Plínio venha aqui amanhã?
– Não, mi amor. Está tudo bem com nós dois.
– Mesmo? - Perguntei preocupada.
– Mesmo! - Carmen me deu um beijo, se aconchegou mais em meus braços e logo adormeceu tranquila.
Acordei bem cedo no dia seguinte, não quis ver a saída de Lucília. Me tranquei em meu escritório e escutei seus passos pelo corredor. Meu coração ficava apertado, ela estava sendo uma pessoa terrível para Carmen, mas também era a única mãe que conheci.
– Essa é a última, Dona Lucília? - Escutei a voz de um dos empregados.
– Sim... leve tudo para a carruagem, já estou saindo.
Escutei seus passos pelo corredor, andando de um lado para o outro. Ela sabia que eu estava no escritório, estava criando coragem para entrar. Parou de repente e escutei sua respiração forte. Mas ao contrário do que pensei, ela não bateu na porta. Voltou a andar e depois não mais a escutei. Abri a porta devagar e olhei pela fresta. Não tinha ninguém pelo corredor. Sai do escritório, fui até a sala e escutei os cavalos relinchando, o cocheiro já ia sair com a carruagem. Paralisei e me dei conta que nunca passei um só dia da minha vida sem a presença de Lucília e seus cuidados comigo. Movida somente pelo sentimento, eu corri até a porta da casa e vi ela já dentro da carruagem, com a cara tristonha.
"Ah, Lucília, por que és tão rancorosa?"
Nada disso precisava acontecer, se ela simplesmente entendesse minha decisão. Seu olhar cruzou com o meu e de novo saí em disparada até a carruagem. Lucília saiu e me deu seu colo assim que me aproximei dela.
– Se cuide, minha menina! - Disse me abraçando forte e dando um beijo em minha testa.
– Não queria que as coisas tivessem tomado esse rumo... - Falei. Ela riu fraco.
– Eu só desejo o melhor para ti, Isabel! É a filha que não tive... Qualquer coisa sabe onde me encontrar. - Disse com a voz embargada. Lucília me deu outro beijo e entrou na carruagem rápido, como se estivesse tomando coragem para ir embora.
– Vamos! - Disse ao cocheiro e se foi sem olhar para trás.
Eu fiquei ali parada vendo a carruagem se afastar e com olhos cheios de lágrimas. Senti braços me envolvendo e nem precisei virar para saber quem era.
– Lo siento mucho, mi amor... - Carmen disse baixinho.
Enxuguei as lágrimas e me virei para abraçá-la. Seu rosto entristeceu quando viu meu estado.
– ¡Oh mi amor, lo siento mucho! - Repetiu me abraçando forte e enxugando algumas lágrimas que teimaram a cair.
– Está tudo bem, Carmen! Foi necessário, Lucília estava passando dos limites... Vocês precisam de sossego! - disse colocando a mão em sua barriga.
Ela sorriu para mim mas via que também sofria. Ela se culpava pela minha decisão e eu nem precisava escutar isso dos seus lábios, seus olhos me diziam. Arrumei a postura e a beijei.
– Vamos tomar café! - Disse a puxando pela mão. - Meu pequeno deve estar faminto! - Disse me referindo ao bebê.
– Como tem tanta certeza de que é um pequeño e não uma pequeña? - Ela riu e pareceu se animar de novo. Nos sentamos na mesa e nos servi o café.
– Não sei... Já disse que só me importa que seja saudável, mas ainda acho que será um menino! - Disse sorrindo.
– Me gustaria se fosse un niño... - Falou pensativa. - Queria que fosse cortês e gentil como usted! - disse me fazendo suspirar.
– Sou gentil porque te amo. - Disse levando a xícara à boca.
– No... Eres amable con todos, Baronesa! Isso é uma coisa que vem de dentro de ti! - Suspirei de novo.
– Pode parar de me fazer ficar envergonhada, por favor? - Carmen riu alto.
E assim a manhã passou rápido. Hoje não tive como fugir das tarefas da fazenda e sai logo depois do café para verificar as plantações e os animais. Passei toda parte do dia envolvida nisso e deixei Carmen aos cuidados de Marta, o que me deixou mais tranquila. Voltei por volta das duas da tarde e ela estava na varanda conversando com um homem que de longe não reconheci. Apressei o cavalo e quando estava quase na entrada vi que se tratava do meu amigo Louis. Eles voltaram rápido, espero não ter problemas com Héloise e Carmen.
– Até que enfim a Baronesa resolveu aparecer! - Louis se aproximou e me abraçou assim que desci do cavalo.
– Que bom que voltou! Como foram as coisas na capital? - Me aproximei de Carmen que estava sentada com a mão na sua barriga. Coloquei a minha sobre a dela.
– Oi, minha querida! - Disse a beijando.
– Por que demorou tanto? - Falou preocupada.
– Desculpa a demora, fiquei presa em alguns problemas com as plantações de cana.
– Está tudo bem, Isabel? - Perguntou ainda preocupada.
– Sim, meu amor! Não se preocupe com isso, já resolvi.
– Como sempre muito gentil... Minha amiga jamais deixaria uma dama se preocupar com problemas de homem! - Louis disse nos fazendo rir.
Revirei os olhos enquanto ele e Carmen riam.
– Não faça essa cara, Isabel! És mais homem do que eu! - Disse me dando um tapa de leve no braço.
Carmen riu mais alto.
– Tu não sabes nem a metade das coisas que tua amada aqui fazia na juventude! - Louis se sentou ao lado de Carmen.
–- Louis... - Disse preocupada.
– ¡Ahora quiero saber de todo! - Carmen disse me olhando.
Me restou somente sentar no parapeito da varanda. Héloïse logo se aproximou da gente com um leque em uma das mãos.
– Posso me juntar a vocês? - Disse tímida.
Carmen revirou os olhos e não respondeu.
– Claro, prima! - Louis puxou uma cadeira para a moça sentar e ela me olhou sorridente. Retribui e não a encarei mais. - Estava começando a contar as façanhas da nossa Baronesa namoradeira na juventude! - Héloïse riu.
– Estou curiosa! - Disse me olhando.
– Melhor começar, Louis! - Carmen disse, a cortando.
Meu amigo me olhou divertido e começou seu relato.
– Todas sabem que passei alguns anos aqui no Brasil, na fazenda de Isabel. - As moças concordaram. - Acho que tínhamos em torno de quinze anos... - Disse já rindo. - E Isabel fugia de Lucília para ficar aos beijos com as filhas dos fazendeiros. Pegava o cavalo e lá ia Isabel atrás de lábios rosados. - Disse nos fazendo rir. - Eu por vezes era obrigado a ir, pois meu tio, o Barão, não a deixava sair sozinha! E lá ficava eu de vigia para a Madame, enquanto ela se divertia!
– Isabel! - Héloïse disse levando a mão ao peito.
– Sempre atrevida! - Carmen disse piscando para mim.
– Chega, Louis! - Falei descendo do parapeito.
– Nem pensar! Ainda não contei daquela vez que ela agarrou a filha do Barão de Alferes, na sacristia da igreja, minhas senhoras! - As duas arregalaram os olhos surpresas e riram alto em seguida. - O padre quase as pegou, escaparam por poucos! Se não fosse eu, que era coroinha na época... - Louis disse revirando os olhos e foi minha vez de rir.
– Usted era coroinha?! - Carmen perguntou rindo.
– Nem me lembre disso! - Louis falou bufando. - Lucília me colocou para participar de eventos da igreja, acreditando que assim eu fosse me curar do meu jeito muito afeminado. - Revirou os olhos de novo. - E como todos podem perceber ela não teve êxito! - Rimos alto.
– Agora chega de histórias, estou exausta! - Falei me esticando. Carmen levantou e segurou minha mão.
– Vamos... Farei uma massagem na Baronesa namoradeira! - Disse rindo e me puxando pela mão.
– Fiquem à vontade, a casa de vocês! - Escutei Carmen resmungar algo, mas como já estava mais a frente, dentro da casa, não entendi bem.
Antes de entrar Héloïse me puxou pela mão.
– Não se preocupe, não vou demorar no que vou falar! - Disse olhando para mim e depois para Carmen. Quando me virei a mulher tinha fogo nos olhos. - Quero pedir desculpas pelo modo que tratei Carmen... Eu não sabia que a amava tanto. - Disse abaixando a cabeça. - Para mim era somente uma cortesã.
– Ela é muito mais que isso! - Disse à Héloïse. - Ela é tudo! - Falei suspirando.
Héloïse apenas concordou com a cabeça e sorriu. Se aproximou de mim e deixou um beijo em meu rosto.
– Que pena eu não ter surgido em sua vida primeiro... - Ela sussurrou em meu ouvido e se afastou sorrindo.
O que Héloïse não sabia é que não importa o tempo, a partir do momento que Carmen surgisse em minha vida, eu seria só dela. Somente dela. Entrei e entrelacei minhas mãos da espanhola, que me olhava ainda desconfiada. Entramos no quarto e a primeira coisa foi me lançar um olhar irritado.
– O que aquela mujer queria com usted? - Disse se sentando na cama.
– Nada demais... - Respondi tirando a blusa. - Só me pedir desculpas por ter te tratado mal. - Ela me olhou ainda desconfiada. - Disse que não sabia que eu te amava.
– Hum... - Cruzou os braços emburrada. Só me aproximei e a beijei.
– Sabe que não tem motivos para ciúmes, meu coração pertence somente a ti! - Ela relutou, mas enfim me beijou.
Os franceses foram embora dois dias depois. O navio deles partiria pela tarde rumo a França. Héloïse não implicou mais com Carmen naqueles dias e o clima até que se tornou mais leve entre elas.
O tempo foi passando rápido e mais de um mês correu sem que eu nem percebesse. A cada dia Carmen mudava. Tudo. Os cabelos, a sua cintura, a barriga cada dia maior, seu rosto iluminado. Ela era a mulher mais linda do mundo. E como era diferente da mulher que conheci a meses atrás.
Estávamos nos virando bem sem Lucília, apesar de sentir sua falta. Marta tinha ocupado parte de suas tarefas e dirigia a casa tão bem quanto.
Carmen precisava de roupas, seus vestidos já estavam apertados demais e ela xingava toda vez que tentava colocar uma de suas vestes habituais.
– Mandarei a costureira fazer uma dúzia deles, mas se acalme! - Falei a segurando pela cintura. Estava emburrada por não conseguir entrar em uma roupa. - Isso acontece, tu estás grávida, seu corpo muda, é natural! - Disse beijando seu rosto. Ela bufou.
Escutamos de longe o barulho de uma carruagem se aproximando e como nosso quarto ficava virado para a estrada principal, fui até a janela verificar. A carruagem estava quase na entrada da casa agora e juntas saímos para ver quem era a nova visita.
Carmen sorriu largo assim que viu a senhora descer.
– Margot! - Disse abraçando a mulher que retribui o abraço apertado. - Quanto tempo!?
– Minha querida! Como está linda! - Disse se afastando de Carmen para admirá-la.
– Gorda, usted quer dizer! - Disse revirando os olhos.
– Ela cismou com isso agora! Que bom vê-la, Margot! - A mulher me abraçou apertado.
– As duas estão iluminadas! - Falou feliz.
Apesar da felicidade por ver Carmen, eu reparei que Margot estava com as feições cansadas e algumas olheiras disfarçadas pela maquiagem.
– Vamos entrar! - Dei espaço para as duas entrarem na frente.
Nos sentamos na sala e Carmen começou a conversa.
– Por que demorou tanto a voltar?
– Muito trabalho, querida! A casa anda bem cheia! - Margot mentiu. Eu sei que mentiu.
– Imagino... E como estão as meninas?
– Todas bem e com saudades! Até Sofia, que continua a implicar mesmo estando longe!
– Essa eu dispenso a saudade! - Disse revirando os olhos.
A conversa rendeu uma boa parte da manhã e Carmen me pediu para levarmos Margot até o orquidário. Estava animada para mostrar a ela tudo que meu pai tinha feito em seu nome. Peguei uma carroça e as levei até o jardim que não era tão distante dali. Eu não ousei atrapalhar o momento e fui atrás apenas observando as duas. Carmen abriu a porta da casa de vidro e assim que entrou Margot levou a mão a boca em surpresa. As orquídeas estavam ainda mais bonitas que da última vez. Ela andou na frente e nos deixou para trás. Parei ao lado de Carmen e observamos Margot que andava por todo o lugar tocando e cheirando as flores.
– Jorge... - Disse enxugando uma lágrima e olhando em volta. - Meu querido... - Falou se aproximando da bancada. Margot vacilou e corri até onde estava.
– Está tudo bem? - Falei a apoiando nos meus braços.
– Margot! - Carmen veio assustada. - Se soubesse que ficaria assim não a tinha trazido aqui... - Ela sorriu para nós duas.
– Foi a melhor coisa que fizeram por mim, minhas queridas!
– Meu pai construiu isso aqui antes de eu nascer, Margot... Ele sempre me trazia aqui e dizia que no meio das orquídeas se sentia feliz e amado. - Sorri para ela. - Só fui entender o porque quando Carmen me contou que tu gostavas de orquídeas.
– Como sabe sobre...
– Lucília me contou faz algum tempo. - Ela endureceu um pouco as feições quando disse o nome de Lucília, mas logo suavizou de novo.
– Teu pai sempre me dizia que um dia construiria um orquidário para mim, como os que ele viu na Europa... - Disse chorosa.
Estava visivelmente emocionada e Carmen achou melhor levá-la de volta a casa. Ela deu uma última olhada na casa de vidro e chorou sozinha. Respeitamos seu momento e deixamos que Margot se despedisse do meu pai naquele instante.
O dever me chamou assim que cheguei até a casa e deixei Margot e Carmen a sós. Algo a mais tinha naquela visita e eu podia sentir que ela escondia alguma coisa.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Sem comentários
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook: