¿Niño o Niña?
Carmen
Depois daquele dia que visitamos a fazenda as coisas mudaram significativamente. Decide seguir os conselhos de Marta e ouvir meu coração, pelo menos no tempo em que estivesse ali. Eu sairia destruída dessa situação de qualquer maneira, então optei por, pelo menos, ter lembranças boas disso tudo.
Não pensava muito no futuro, era assustador. Eu ainda não sabia o que fazer com essa criança que crescia em mim, mas sentia em meu coração o carinho por ele florescer. Sonhar com nosso futuro fantasioso ao lado de Isabel tornou–se rotina e por vezes me pegava sorrindo sozinha. Quase conseguia visualizar uma vida ali com ela e essa criança correndo pelos corredores, cavalgando com a Baronesa, aprendendo a ser cortês como ela... era doloroso pensar nisso, mas eu sempre fui teimosa e mesmo sabendo da dor que me causava, eu continuava a sonhar acordada.
Isabel parou de dormir na cama de solteiro improvisada e passou a deitar todas as noites comigo, eu já não conseguia dormir sem seu corpo atrás do meu, me sentia segura em seus braços e ela dormia todas as noites abraçada a mim, com a mão espalmada em meu ventre. Sinto que não é só a mim que essa criança vem conquistando, percebo que aos poucos ela está roubando o meu coração e o da Baronesa de Vassouras também.
Os momentos que antes eram só meu e de Isabel, agora também eram do bebê, depois de ter certeza que tinha a minha permissão para interagir, a Baronesa não parou mais, por vezes contava as aventuras do dia enquanto acariciava minha barriga com ternura. Ela o chamava de bebê e aderi o apelido também. Sua preocupação era perceptível, em alguns dias, ao chegar em casa perguntava da criança antes mesmo de me dar um oi.
Eu parei de ignorar sua presença e passei a pensar nele com carinho, mas ainda não conseguia agir assim, a culpa me consumia. Não conseguia falar com ele ou acariciá–lo como Isabel fazia e agradeci muitas vezes por ela estar ali para isso, eu já causei tanta dor a essa criança mesmo antes de seu nascimento, a última coisa que eu quero é que ela se sinta só.
O nosso beijo embaixo da árvore naquele dia, foi um gatilho. Não paramos mais e acho que nós duas sabíamos que seria assim e era maravilhoso. Eu amava o fim da tarde, quando Isabel chegava com um olhar cansado, me beijava com ternura e sentava ao meu lado na varanda para admirar o pôr do sol. Virou uma rotina. Também virou rotina desejar que aquilo nunca mais acabasse.
Depois de alguns dias a Baronesa quis me mostrar o resto das belezas das duas propriedades. Não conseguimos ver tudo em um único dia, era enorme e eu sentia o cansaço em dobro, a gravidez tirou um bocado de energia de mim.
Isabel me levou até um orquidário na antiga fazenda. Um lugar belíssimo e juntas concluímos que não era só lindo, mas também um símbolo do amor de Jorge e Margot. Eu fiquei feliz pela minha grande amiga, era perceptível o amor do Barão por ela em cada pequena pétala de flor daquele lugar e desejei trazê–la aqui um dia. Por mais que preferisse não pensar no futuro, foi inevitável. Saí do orquidário triste e com a sensação de que desejei tanto ser igual a Margot que agora vivia uma história que acabaria exatamente igual à dela. Isabel pensava provavelmente a mesma coisa, eu sei pelo seu silêncio.
Cavalgamos até um campo aberto próximo ali. Uma árvore enorme fazia uma bela sombra no local, mais um dos lugares extraordinários dessa fazenda.
Isabel me ajudou a sentar no chão logo depois de arrumar a toalha para o café. A barriga pequena já pesava um bocado.
– Espero que goste de bolo de Fubá! Eu adoro e pedi para Marta um grande pedaço! – Eu ri de seu jeito animado, amava esses momentos descontraídos. Amava todos os momentos com ela.
– Acho que estávamos com fome... – Constatei depois de comer mais um pedaço do bolo maravilhoso de Marta.
– Tu comeu todo o meu bolo de fubá! – Falou indignada.
Quase engasguei rindo.
– Não me culpe! Nem eu sabia que gostava tanto...
– Deve ser o bebê! – Vi seus olhos se iluminarem ao olhar para minha barriga e eu levei a mão até ali instintivamente.
– Acho que tem grandes chances.... – Disse rindo.
Terminamos nosso café e ela logo juntou as coisas na cesta e sentou atrás de mim com as mãos em meu ventre e como de costume descansei as minhas sobre as dela. Estávamos em silêncio quando senti minha barriga mexer. Ficamos imóveis esperando que acontecesse novamente e logo sentimos outra vez. Eu não sei o que aconteceu comigo naquele momento, era como se tivesse sentido essa criança mexer na barriga, mas dentro do meu peito também. Dentro do meu coração.
Fui tomada por uma emoção que não imaginei que surgiria e um sorriso teimoso brotou nos meus lábios, quando me dei conta estava sorrindo para a barriga enquanto alisava o local. Era a primeira vez que o sentia e a primeira vez que ele sentia o meu carinho também.
Isabel voltou a acariciar ali e logo sentimos ele mexer outra vez.
– Acho que o bebê gosta do teu toque. – Disse sorridente.
A Baronesa ficou alguns segundos em silêncio e então saiu de trás de mim, olhei–a sem entender e ela logo deitou na minha frente, bem próxima. Isabel me surpreendeu quando chegou mais perto e beijou minha barriga com cuidado e carinho. Fiquei imediatamente tensa, mas logo deixei os pensamentos racionais de lado e curti aquele momento. Senti ela um tanto apreensiva com a minha reação e eu sorri.
Assim que sua voz rouca começou a falar, senti meus olhos se encherem de lágrimas. Isabel disse ao Bebê tudo que eu queria dizer e não tinha coragem.
"Eu sei que fiz uma coisa horrível, mas desejo que esteja bem aqui dentro. Ela tem razão quando fala da minha teimosia, mas eu estou tentando... estou tentando fazer tudo certo por ti. Para que fique bem e saudável."
– Continua... – Pedi com a voz embargada.
– Espero que não acabe com todo o meu bolo de fubá, que me mostrou agora ser teu preferido também! – Mesmo chorando, eu ri. – Prometo pedir a Marta para fazer muitos bolos para nós.
Ela parou de falar novamente e vi seu rosto se entristecer um pouco, mas logo sorriu lindamente para minha barriga. Isabel estava em conflito. Eu a conheço bem o suficiente para saber que ela está apegada ao bebê, mas com medo da minha decisão. Sinto como se conhecesse essa mulher a centenas de anos.
– Estamos aqui contigo! – Ela beijou minha barriga novamente e subiu para beijar minha boca.
Puxei–a mais para mim e beijei–a com todo o amor e emoção que estava sentindo naquele momento. Quando interrompemos o beijo eu me encolhi em seus braços e permaneci ali em silêncio por um longo tempo.
Quando me convidou para irmos, concordei sem contestar, mesmo bem melhor, ainda sentia enjoos, tonturas e cansaço. Isabel juntou as coisas e me ajeitei para irmos.
– Só um minuto... – Disse voltando alguns passos até a árvore.
Isabel entalhou nossas iniciais na figueira para eternizar nosso amor. Era imortal, sentia que seria por toda a eternidade e além dela.
I.C.B.
Passei os dedos delicadamente sobre as letras e tive a certeza de que independente do rumo que nossas vidas tomassem depois de hoje, eternamente lembraríamos desse momento. Essa árvore e todas as sementes que sairiam dela para virarem outras teriam um pouco do nosso amor. Imortal.
"Não o ignore, Carmen. Ele está aqui por uma razão!". A voz de Marta imediatamente invadiu minhas lembranças e entendi finalmente o que aquilo queria dizer, essa criança fazia parte disso. Obviamente ela não era de Isabel, mas era parte da nossa imortalidade. Exatamente como as sementes que surgem aqui e são carregadas pelos pássaros em segurança por longas distâncias onde futuramente outra árvore como essa nascerá.
Acho que me senti como um pássaro e tive a certeza de que Isabel era a terra fértil que transformaria algo tão pequeno e frágil em força e grandeza.
Enquanto beijava os lábios dela, pela primeira vez pensei em um futuro que poderia ser possível. Um futuro bom para, pelo menos, duas daquelas letrinhas talhadas na figueira.
Seguimos para casa na fazenda de Vassouras. Era um lugar lindo e pude ver seus suspiros nostálgico enquanto admirava cada canto onde passávamos. Os olhos dela diziam o quanto sentia falta daqui.
Isabel me puxou para um dos quartos logo que chegamos. Vi ela olhar com carinho para a porta antes de abri–la. Haviam muitas coisas antigas ali, alguns cômodos cobertos com lençóis... vi um baú com algo que pareciam brinquedos e entendi imediatamente que aquele tinha sido o quarto dela quando criança.
A Baronesa caminhou até um móvel e tirou o lençol de cima. Era um berço lindo e em perfeito estado. Passei a mão por toda a sua extensão, eu estava encantada.
– Gostaria que ficasse com ele... – Olhei–a assustada. – O bebê vai precisar de um lugar para dormir... Eu não sei o que pensa em fazer...
– Isabel... – Tentei dizer a ela o quanto ainda estava confusa, mas ela me interrompeu e eu agradeci internamente.
– Não falarei disso... Nem quero pressionar vocês! – Olhei–a grata. – Só que independente do que faça ele precisará de um berço e gostaria muito que aceitasse esse como presente para o bebê! – Disse tímida.
Isabel tinha dinheiro suficiente para comprar cem berços como aquele e nenhum deles eu aceitaria, mas esse eu aceitei com todo meu coração, eu via em seus olhos o quanto o que estava fazendo era importante. Abracei–a com carinho.
– Presente aceito... – Disse antes de beijar sua boca.
***
– Pode acreditar, meu pai me colocou de castigo dois dias por isso! – Isabel contava de sua infância e sorria largo ao lembrar. – Era uma boa época...
– Imagino que sim! Foi uma criança alegre, Isabel! Fico feliz por isso!
Sorri para ela e levei uma mão ao ventre. É o que mais quero para essa criança, uma infância feliz, com amor, cuidados, uma boa vida... Lembrei de meus devaneios de mais cedo e suspirei com a possibilidade.
– Tua casa é linda! As duas são! A fazenda, os vales, as flores... Tudo nesse lugar é especial, Isabel!
E era. Cada canto dessa imensidão de terra ficaria guardado na minha memória e tenho a impressão de que aquela figueira que visitamos mais cedo se tornou um símbolo de amor, assim como o orquidário. Suspirei triste, mas logo tratei de não pensar sobre isso.
Nosso dia foi lindo. Cheio de emoções. Voltamos para a outra casa já era tardinha, dormi em seus braços grande parte do trajeto, estava cansada. Queria tomar um banho e deitar na cama.
– Estamos chegando, meu amor. – Isabel sussurrou e eu despertei sorrindo.
Ao nos aproximarmos da casa, vimos a movimentação na entrada e uma carruagem na frente. Ela me disse que não esperava visitas e parecia tão surpresa quanto eu.
Senti seu corpo enrijecer quando ouviu da varanda as vozes na sala. Não gostei nada da reação, mas resolvi não questionar. Isabel me olhou de canto de olho por poucos instantes, parecia quase com medo e então entrou na sala de uma vez.
Passei os olhos pelo cômodo, havia ali um homem, Lucília e uma mulher. Os dois desconhecidos aparentavam ter a mesma idade da Baronesa. Suspirei irritada e tive certeza de que a reação dela era por causa dessa menina, mas logo meu sorriso debochado, que há tempos não usava estava lá presente.
– Isabel! – O homem levantou para abraçá–la e percebi que não era daqui pelo sotaque.
– Amigo! – Disse retribuindo. – Não o esperava tão cedo ao Brasil.... – Senti algo em sua voz, ela estava tensa. Disfarçava bem, mas eu a conhecia mais do que ela podia imaginar.
– Os negócios me trouxeram ao Brasil mais cedo... E quem é a mulher bonita ao seu lado?
– Claro! Essa é Carmen! – Ele veio à minha frente e puxou delicadamente minha mão para um beijo.
– En chatant, mademoiselle! (Encantado, Madame) – Sorri e aceitei a gentileza.
– Francês? Sempre gostei dos franceses! – Ele ajeitou o terno orgulhoso pelo elogio. Percebi pela forma que se mexia que ele era diferente, assim como Isabel... e eu. Louis era seu nome.
A mulher se levantou e a Baronesa empalideceu. Isso foi o suficiente para eu sentir um ódio tremendo, mas não parou aí.
– Isabel, ma chérie! – Caminhou toda saltitante até ela e deixou um beijo bem próximo à sua boca. Próximo demais.
Cerrei a mandíbula contendo a minha raiva e só não arranquei–a de perto da Baronesa porque o bebê mexeu novamente, me fazendo lembrar que eu não estava sozinha. Esperei que Isabel reagisse de alguma forma, qualquer coisa que fizesse essa mulher entender que ela era minha. Só minha. Mas a desgraçada sorriu e me olhou novamente de canto.
"¡Baronesa, usted estás muy jodida!"
O francês, percebendo a tensão convidou Isabel para o escritório com a desculpa de conversas de negócio. Ela concordou suspirando de alívio, se pensa que isso ficará assim, está muito enganada.
– Com licença vou me recolher! Foi um prazer, Louis! – O homem foi o único que me dei o trabalho de acenar e saí sem olhar para trás. Ir para o quarto era o mais seguro. Me conheço o suficiente para saber que faria essa mulher desconhecia engolir os móveis da sala se ela abrisse a boca outra vez.
Fui para o quarto espumando de ódio, mas meu caminhar era lento e sereno. Quando fechei a porta deixei toda a minha raiva sair enquanto tirava minhas roupas para me banhar e jogava–as com ódio pelo quarto.
"O que diabos foi aquele beijo?"
Eu era uma mulher muito observadora , era nítido que aquilo não era inédito.
– Eu vou matá–la assim que botar os pés neste quarto, Baronesa. – Bufei de raiva.
– Senhora? – A empregada que preparava meu banho me olhou confusa, achou que eu estava falando com ela.
– Nada, Rita... – Disfarcei sorrindo.
Quando a menina saiu do quarto eu entrei na água e finalmente relaxei, depois da cena que presenciei, até esqueci o quanto estava cansada. Senti o bebê mexer e sorri me acalmando um pouco. Desde a manhã, quando sentimos pela primeira vez ele não parou mais. Era uma sensação gostosa. Acariciei a barriga e tomei coragem para falar com ele.
– ¡Hola, bebé! – Sussurrei ainda receosa. – Tu salvaste a todos agora a pouco. – Sorri. Eu sentia que tinha tanto para dizer a essa criança, mas não agora. – A Baronesa roubou tu corazón también, não é? Tú eres un ladrãozinho como ela.
Nunca me imaginei aqui, muito menos apaixonada por essa criança. É inacreditável como ele me conquistava mais e mais com o passar dos dias.
"Quando foi que eu mudei tanto?"
Minha pergunta foi respondida quando lembrei de Isabel. Amá–la me mudou e esse bebê também, a sua vontade de viver, sua resistência e força. Mesmo com todas as tentativas de interromper a gravidez ele continuou aqui. Mesmo quando resolvi ignorar a sua existência alguém me fez lembrar que ele estava aqui e agora eu podia senti–lo e pelo que parece, nossa convivência com Isabel está fazendo essa criança salvá–la mesmo que inconscientemente. Ri alto com o pensamento.
– Prometo que a deixarei inteira... – Lembrei da mulher desconhecida e senti meu sangue ferver novamente. – Pelo menos por enquanto.
Continuei no banho até a água ficar fria e quando saí já sabia o que fazer com Isabel. Como previ, em uma das minhas malas estavam minhas roupas favoritas. Há tempos não me vestia assim e também não assumia a pose de mulher sedutora. Era uma das versões que mais amava em mim e a Baronesa de Vassouras pagaria caro por não fazer nada.
– Acho, Isabel, que preciso te fazer recordar quién soy. – Disse sozinha e com um sorriso malicioso enquanto me olhava no espelho.
A camisola transparente acentuava minhas curvas. Recuperei um pouco do peso que perdi, meus seios estavam maiores e apesar da barriga, gostei do que vi e sabia que causaria nela exatamente o que eu queria. Chamei a menina que preparou meu banho e pedi para que arrumasse a cama de solteiro, era ali que ela dormiria essa noite. Deitei–me na cama e logo adormeci.
Acordei assim que ouvi os passos cautelosos de Isabel ao entrar no quarto, mas continuei imóvel. Esperei que se banhasse e pelo que parece a pequena cama arrumada passou despercebida por ela. Deitou devagar, sentia em cada movimento seu o medo da minha reação, ela sabia que eu estava com muita raiva. Assim que me olhou a mulher soltou um suspiro de prazer e eu sorri vitoriosa, mas não deixei que ela visse.
Depois de passar alguns segundos admirando ela afastou meus cabelos para o lado e beijou meu pescoço com vontade, mentiria se dissesse que não me abalei com aquele beijo. É lógico que eu sentia falta dela, mas hoje não teria nada além de uma noite inteira morrendo de tesão.
Senti sua mão acariciar meu corpo e me entreguei as suas carícias e senti a respiração ofegante de Isabel em meu pescoço. Respirei fundo, foi difícil afastá–la. Quase me rendi, mas quando ela me puxou para mais perto lembrei da cena e empurrei a mulher com força para longe de mim derrubando–a da cama.
– Su cama esta pronta! –Apontei.
– Se não me quer ao teu lado, por que se vestiu assim para mim? – Disse ajeitando o travesseiro.
– Errado! Eu me vesti assim para mim e não para usted!
Isabel estava brava, era assim toda a vez que ficava excitada e não podia fazer nada. Eu sei porque ainda não fizemos amor desde que cheguei aqui, mas por diversas vezes trocamos carícias até quase enlouquecermos.
– Não sei por que essa irritação toda? Eu não fiz nada!
"EXATAMENTE, NÃO FEZ NADA!"
– ¿Qué es esa mujer? – Disse me apontando o livro.
– Carmen, calma!
– ¿Qué es esa mujer, Isabel?!
– Uma amiga!
– Respuesta Equivocada de novo! – Disse jogando o livro que voou certeiro na minha cabeça.
– Doida! – Peguei outra coisa para jogar contra ela, mas Isabel se adiantou. – Ela é prima do Louis! Veio com ele ao Brasil da última vez que estive na capital e ficaram hospedados na minha casa de Botafogo! Foi como a conheci!
Parei para pensar quando foi a última vez que ela esteve na capital e lembrei que não estávamos juntas, na realidade nunca estivemos de fato juntas e pensar nisso me fez ficar triste e mais brava ainda, larguei o objeto de volta onde estava e suspirei.
– Que seja, Baronesa! – Falei com raiva e deitei de costas para ela.
– Carmen... – Ela falou baixo tentando me tocar, mas eu não queria isso agora.
– No se aproxime, Isabel! – Ela suspirou derrotada e deitou na cama de solteiro.
Dormi com muita raiva e pela primeira vez acordei antes dela. Perdi o sono na madrugada, sentia falta de seu corpo na cama e quando o sol nasceu eu levantei.
– Bom dia! – Cumprimentei Marta ao chegar na cozinha.
– Bom dia. Acordou cedo, Madame. – A senhora me olhou surpresa e eu suspirei apenas concordando. Ela riu fraco e acho que percebeu minha irritação e associou a desgraçada francesa.
O cheiro do café de Marta era maravilhoso e logo ela me alcançou uma xícara. Sentei–me ali na mesa enquanto ela preparava as coisas para o café da manhã da Baronesa e suas visitinhas.
Olhei um bolo de fubá quentinho em cima do balcão e minha boca salivou, imediatamente coloquei as mãos em minha barriga tentando advertir o bebê a esperar, mas não surtiu efeito. Marta riu disfarçadamente da minha cara quando umedeci os lábios pensando em como um pedaço me faria feliz agora. Olhei–a rindo derrotada. A senhora cortou um pedaço grande e eu comi com uma satisfação inacreditável.
– Eu queria esperar para o café, mas parece que alguém aqui é muito impaciente. – Disse sorrindo para ela. – Obrigada.
Ela concordou sorridente.
– Obrigada pelo que me disse naquele dia também, Marta. – Ela me olhou com ternura e senti que podia conversar. – Me fez enxergar que mesmo sem saber o que farei daqui a alguns meses, posso viver esse momento. Segui seu conselho e parei de ignorá–lo. Não queria que isso tivesse acontecido, mas tens razão, ele está aqui por um motivo e não é justo fingir que ele não existe.
Ela me ouvia atentamente e eu deixava um carinho na minha barriga enquanto falava do bebê.
– Se me permite, Madame... – Acenei para que ela falasse. – Parece a senhora fez mais do que apenas parar de ignorar.
Apontou para minhas mãos e eu concordei com um sorriso fraco.
– Acho que queremos mais... – Ela riu e me serviu mais um pedaço de bolo.
Continuamos a conversar amenidades por mais algum tempo e logo depois segui até a varanda. Aos poucos, mesmo sem querer, eu ia me sentindo em casa ali e percebi que uma vida aqui na fazenda não era o pesadelo que sempre achei que fosse. Ainda bebericava meu café quando Isabel surgiu com um olhar preocupado na varanda, sabia que ela estava me procurando e revirei os olhos quando a vi.
– Bom dia para ti também, Carmen! – Eu estava bem menos brava que ontem, mas ainda irritada e de mau humor.
Isabel sentou na varanda comigo e serviu uma xícara de café. Logo o clima tenso foi embora e já havia quase esquecido a raiva que ela me fez passar na noite anterior.
– Bonjour! – Me recordei prontamente do motivo do meu mau humor assim que ouvi sua voz.
A Baronesa estava sentada de frente para mim e a mulherzinha teve a audácia de sentar ao seu lado, ela endureceu na hora e desviou o olhar do meu.
– Isabel, se estiver com o dia livre adoraria conhecer a fazenda como me prometeu da última vez!
Essa história estava cada vez mais interessante. Quer dizer que as coisas que me mostrou ela mostrava a toda a mulher que levava para cama? Me senti ofendida e fiquei ainda mais brava.
Depois de uma pequena discussão com a tal francesa. Me levantei da cadeira devagar escorando–me na mesa, eu usava um vestido discreto, mas o decote apertava meus seios bem mais do que da última vez que o usei. Isabel engoliu seco. Todos os meus movimentos eram pensados e analisados para atingi–la e ao mesmo tempo parecer o mais natural possível, Héloïse jamais saberia o quanto sua presença me causou ciúmes.
– Onde vai? – Isabel perguntou quando virei as costas.
Encarei–a por alguns segundos antes de responder.
– Fazer as malas, agradeço a estadia, Baronesa, mas preciso voltar para casa. – Falei sorrindo.
Eu não arredaria o pé daquela fazenda lugar enquanto essa mulher estivesse ali. Nem morta! Mas daria um susto na Baronesa. Sei que consegui, porque Isabel empalideceu. Virei as costas e saí caminhando lentamente.
– On va enfin passer du temps seuls, Isabel. (Finalmente teremos um tempo sozinhas, Isabel.) – A francesa disse assim que me retirei, sua doçura me fez sentir mais ódio ainda e o meu sorriso vitorioso sumiu imediatamente.
Travei no meio do corredor, sabia que ali onde eu estava só Isabel conseguiria me enxergar e tive que respirar fundo para não voltar lá e assassinar a tal visita.
Entrei no quarto batendo a porta toda a força. Se aquela Baronesa desgraçada não aparecer aqui em cinco minutos eu realmente faço as malas e volto para o bordel hoje mesmo. Catei nas gavetas do criado–mudo e achei o que procurava. Os cigarros caros de Isabel, desde que cheguei aqui ela não me deixa fumar por conta da gravidez, um só não me fará mal e ainda darei motivos para chamar sua atenção. Acendi e traguei, era um saboroso cigarro importado. Soltei a fumaça devagar e me senti tonta, fazia um bom tempo que não fumava.
Sentei na cama brava, mas nem sei se tenho o direito de estar. Olhei minhas roupas espalhadas pelo quarto, minhas joias em cima do criado–mudo, alguns dos meus chapéus favoritos junto com suas cartolas, meus sapatos arrumados próximo aos dela e me dei conta de que minha vida com Isabel já era mais real do que eu era capaz de admitir e gostei disso. Passei a mão nos travesseiros que ela dormia e sorri. Enquanto eu estivesse aqui ela era minha. Se quiser casar com Héloïse ou qualquer outra mulher depois que eu voltar a capital, que seja, mas eu tomei a decisão de ficar aqui até o nascimento dessa criança e só eu teria Isabel enquanto estivesse aqui.
Pensar em voltar ao bordel e deixá–la me incomodou, não sei se quero mais voltar a casa e, com certeza, não quero que ela se case com ninguém! Ninguém além de mim.
Acendi outro cigarro na brava do primeiro. Era delicioso. Levantei e caminhei até uma parte do roupeiro que Isabel destinou para algumas das minhas roupas. Eu adorava as artes e hoje ela descobriria que se eu não tivesse me tornado cortesã, vocação para o teatro não me faltaria.
Tirei os vestidos do cabide e joguei na cama. Estava dobrando–os e colocando na mala quando Isabel entrou no quarto correndo.
– O que está fazendo, Carmen? – Perguntou correndo até mim, arrancando o cigarro de meus dedos e jogando pela janela. Olhei–a brava e ela devolveu do mesmo jeito.
– ¡No te debo satisfacción! – Gritei.
– PARA COM ISSO! – Bagunçou a mala e jogou as roupas na cama de novo.
– O que pensa que está fazendo, Baronesa? – Perguntei empurrando seu braço.
– EU que pergunto!
– Não é óbvio? Me voy a la capital. – Peguei as roupas e novamente joguei na mala.
– NÃO VAI MESMO! – Gritou, foi até a porta do quarto e trancou escondendo a chave no bolso da camisa..
– Vai me prender aqui? – Perguntei baixo, dando as costas para ela e caminhando até a janela.
– Não... mas não quero que saia assim. – Sua voz saiu triste. – Carmen...
– ¡Cállate Isabel! Me deixe só, preciso terminar de arrumar minhas coisas.
– Não! Amor, não... – "Não me chame assim agora, Isabel Albuquerque de Castro!" – Para com isso. Eu sei que ela te deixou brava, mas... Carmen...
Senti meus olhos cheios de lágrimas, eu estava cada dia mais sensível.
– Quer saber, Isabel. Eu nem tinha que estar aqui. Só estou por uma infeliz casualidade e porque Margot não foi capaz de entender que eu não queria mais contato contigo. Na primeira oportunidade de me contrariar veio correndo pedir tua ajuda. – Eu só falei, nem pensei no que estava dizendo. Suspirei. – Mira, Solo quiero salir daqui e deixá–las a sós. – Repeti a frase de Héloïse e senti meu coração doer, ainda bem que eu estava de costas porque não consegui controlar e algumas lágrimas escaparam de meus olhos. Isabel se aproximou de mim devagar e me abraçou, tentei sair, mas ela me segurou mais forte e acariciou minha barriga.
– Eu só quero ficar a sós contigo. – Sussurrou doce no meu ouvido e deixou um beijo em meu ombro. Era incrível como ela conseguia me desmontar. – Vocês dois aqui é a casualidade mais feliz que já aconteceu na minha vida. Não chame mais o bebê assim.
Abaixei a cabeça me sentindo mal por isso.
– Eu não vou prendê–la aqui, Carmen. Não quero que pense assim. Mas quero continuar cuidando de vocês e me prometeu que ficaria até o nascimento. O bordel não é um lugar bom para ele, precisa de tranquilidade.
Sua voz baixinho perto do meu ouvido me trazia paz, mas eu ainda estava com raiva e continuaria com isso, me afastei dela novamente e fui até a janela enorme que dava para o jardim, o tempo estava fechando.
– Tem toda a razão, Baronesa. Mas meu filho vai ter que se acostumar com isso. – Vi pelo vidro ela sorrir lindamente quando eu disse filho. Minha postura brava vacilou, era a primeira vez que o chamava assim e foi muito intencional, sorri triste olhando para a barriga. – Sua mãe é uma Cortesã. – Encolhi os ombros e ouvi um suspiro pesado de Isabel.
– Por favor, para com isso. – Pediu triste.
– Não, Isabel! No paro! – Olhei para ela ignorando as lágrimas que molhavam meu rosto. – Sabe por quê? Porque para mim foi especial. Esses dias que me mostrou tús terras, os lugares que me llevaste... FOI ÚNICO PARA MIM, MAS PELO VISTO USTED FAZ ISSO COM TODAS LAS MUJERES QUE SE DEITA!
Isabel se aproximou de mim e eu empurrei–a e estapeei seus braços, ela não revidou, só se defendeu assustada com minha reação.
– Carmen, pare! – Pediu, mas eu continuei enquanto chorava compulsivamente.
– ¡LLEVARLA TAMBIÉN AQUEL ÁRBOL! MOSTRE–A AS COISAS QUE ME MOSTROU ENQUANTO ME DIZIA TODAS LAS COSAS HERMOSAS. MENTIROSA! – Gritei a última palavra mais alto e Isabel me calou com um beijo. Continuei a estapear a mulher, mas ela segurou meus braços e me empurrou delicadamente até sentir a parede gelada em minhas costas. Por fim, me rendi aos seus beijos.
"¡MIERDA!"
– Nunca mais me chame de mentirosa, Carmen. – Disse me olhando séria, mas não brava. – E nunca mais duvide do meu amor por ti.
Isabel encarou meus olhos fixamente por alguns segundos e me beijou de novo, aos poucos ela soltou meus braços e desceu as mãos para minha cintura, não resisti e agarrei seu pescoço puxando–a mais para mim, nosso beijo era quente, mas calmo ao mesmo tempo.
Ela desceu uma mão para minha perna e puxou até que ficasse em sua cintura. O vestido que eu usava não tinha armação e ela aproveitou para acariciar desde o meu tornozelo até minhas coxas, subindo o vestido com o toque. Sempre tivemos pressa nas noites em meu quarto, Isabel e eu éramos impacientes, mas não hoje. Aos poucos a chuva começou a cair forte e os pingos grossos faziam um barulho gostoso no vidro da janela. Eu não aguentava mais resistir a ela.
– Llevame a la cama... – Pedi enquanto sentia seus beijos molhados em meu pescoço e o carinho provocativo na minha coxa, eu agarrava seus cabelos.
– Carmen... – Sussurrou olhando–me com cautela.
– Anda logo!
Ela riu largo e me pegou no colo. Deitou–me na cama, joguei meus vestidos e a mala no chão e ela logo encaixou seu corpo sobre o meu com cuidado, sem forçar seu peso contra minha barriga.
– Tem certeza que está bem para isso? – Perguntou deixando um carinho em meu rosto.
– Absoluta. Sé que no vai nos machucar. – Falei sorrindo.
– Jamais machucaria vocês. – Roçou seu nariz no meu antes de me beijar novamente.
Isabel desceu os beijos para meu pescoço e colo, quando alcançou a altura dos meus seios, me fez levantar e tirou meu vestido, traçando com as mãos todo o caminho que ele fez até ser jogado ao chão junto aos outros. Ela encarou meu corpo nu sobre a cama com desejo e amor, sorri para ela e ajudei a tirar suas roupas. A chuva caía forte lá fora. Deitou ao meu lado novamente e me puxou para cima, minha boca não desgrudava da sua. Sentou na cama e me fez sentar em suas pernas. Os beijos quentes desceram até meu peito e ela abocanhou um deles com vontade enquanto acariciava minhas costas. Meu corpo inteiro se arrepiou.
– Mais deliciosa que nunca. – Sussurrou entre os beijos molhados que deixava ali.
Eu sentia meu corpo mole de desejo, quente... Ela me deitou na cama novamente e ficou ao meu lado, virando–me de frente para ela, delicadamente abriu minhas pernas e me olhou acompanhando minhas reações, ela estava com medo que eu sentisse dor por conta dos machucados.
Mordi os lábios com expectativa e ela entrou em mim me fazendo ronronar em seus braços. Esperou para ter certeza que estava tudo bem e eu encorajei–a a continuar. Ela me amou lentamente. Seus dedos se movimentavam em mim com cuidado enquanto beijava cada parte do meu corpo que sua boca alcançava. Eu só conseguia arranhar seus braços e gem*r seu nome. Aos poucos meu rebol*r encorajava a ir mais rápido. Passamos longos minutos nos amando assim.
– Vira de costas. – Pediu e eu olhei–a intrigada, ela respondeu com um olhar impaciente e eu obedeci.
Abriu minhas pernas de novo e continuou. Beijava minhas costas nuas e sussurrava juras de amor em meu ouvido, estávamos completamente entregues ao momento. Nada no mundo importava, só nós.
– Isabel... – Gemi alto e senti seu sorriso, ela sabia que eu estava doida.
– Relaxa... vem para mim. – Ouvir sua voz rouca dizer aquilo fez meu corpo todo tremer
– Yo te amo. – Falei enquanto acariciava seu rosto e meu corpo relaxava contra a cama.
Eu não escondia mais o meu amor por ela, mas nesse momento foi diferente. Nunca foi tão verdadeiro. Senti ela sorrir enquanto continuava a beijar minhas costas nuas. Meu corpo estava mole e dormente. Isabel saiu de mim lentamente e imediatamente senti uma pequena dor chata, mas não disse nada para ela. Virei com cuidado e escondi meu rosto em seu peito, fiquei ali chorando baixinho pensando o quanto meu coração pertencia a essa mulher.
– Eu também te amo. – Falou me fazendo olhar em seus olhos, sua mão deixava um carinho terno em meu ventre. – Amo os dois.
Sorri, mas meus olhos se encheram de lágrimas e ela me puxou para seu peito novamente.
– EU te odeio!
– Ué?! – Me olhou risonha, ela sabia que eu ainda estava doente de ciúmes. – Há cinco segundos atrás me amava.
– Cala essa boca. – Empurrei seu rosto delicadamente e ela deitou a cabeça no travesseiro rindo.
– Como é linda!
– Eu sei!
Isabel gargalhou.
– Garoto, tua mãe é a mulher mais complicada e convencida que já conheci. – Falou acariciando minha barriga.
– E se não for um niño? – Perguntei cautelosa lembrando novamente daquele sonho.
– Será uma menina linda, birrenta e teimosa como tu! – Eu ri e ela levantou um pouco e deixou um beijo ali. – Acha que é uma garota? – Perguntou sorridente.
– Não sei... Talvez... – Procurava não pensar muito nisso.
– Será que são dois bebês? – Arregalou os olhos e eu ri alto. – Meu Deus.
– O que imagina? Niño ou niña? – Perguntei, era a primeira vez que falávamos disso.
– Eu não me importo. Só quero que tenha saúde. – Sorri e virei de costas para deitar melhor em seu abraço. Ela estremeceu novamente com meu corpo nu contra o seu e logo já estávamos nos amando novamente.
Por mais que as provocações da francesa continuem e sei que terei trabalho pela frente, tenho certeza de que enquanto eu estiver aqui, nada no mundo vai tirar essa mulher de mim e nem nós dela.
Fim do capítulo
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Marta Andrade dos Santos
Em: 21/09/2020
Eita parquinho pegou fogo.
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