I. C. B.
Isabel
Depois do passeio, as coisas mudaram entre nós duas. Não que Carmen tivesse largado toda sua teimosia e decidido enfim ser minha mulher, mas eu via a pequena mudança, a suavidade em seu olhar e o jeito mais calmo ao lidar com meus carinhos e juras de amor, ela foi se entregando pouco a pouco, acho que percebeu que, pelo menos, durante o tempo que passasse ali comigo, ela não poderia vencer o nosso amor. Era um sentimento forte demais para ser ignorado. E enfim, Carmen se rendeu. Queria eu que fosse para sempre, mas sentia que uma hora isso mudaria.
Me doía imaginar que isso tudo acabaria depois do nascimento do bebê, mas assim como ela, me permiti viver aqueles momentos e aproveitar cada segundo de sua companhia. A cama de solteira improvisada, já não era tão usada, ela sempre me puxava para deitar ao seu lado e passávamos a noite assim, ela em meu colo e eu a abraçando. Na verdade, abraçando os dois, pois a cada dia que passava me apegava mais ao bebê.
O dia nasceu e como sempre me levantei antes de Carmen. Fiz toda minha higiene pessoal e fui até a cozinha.
– Bom dia, Marta! – A mulher me olhou sorrindo.
– Bom dia, Baronesa! – Ela estava passando café e inspirei fundo aquele cheiro maravilhoso.
– Teu café sempre é o mais cheiroso! – Disse fazendo a mulher rir sem graça.
– Já posso arrumar a mesa do café na varanda? – Marta perguntou. Carmen amava a vista da fazenda, então criamos o hábito de tomar café ali todos os dias.
– Hoje não! Eu amo bolo de fubá com erva doce! – Disse suspirando ao me deliciar com um pedaço. – Como adivinhou? – Falei de boca cheia fazendo a mulher rir.
– Dona Lucília me avisou que gosta desse bolo e pediu para preparar para a senhora. – Parei de comer e me deu aquela pontada de arrependimento em ter afastado–a tanto.
Lucília. Ela era a imagem de mãe que conheci. Me doía saber que não aprovava minhas escolhas e não me apoiava. Falaria com ela mais tarde.
– Marta, faça uma cesta com pedaços de bolo, frutas e seu maravilhoso café! – Ela me olhou surpresa.
– Não vai tomar café na varanda?
– Hoje levarei Carmen para visitar mais alguns lugares e depois até a casa da outra fazenda.... – Marta concordou e sorriu.
Saí da cozinha e fui até o quarto acordar a preguiçosa. Beijei seu pescoço e a vi se remexer.
– Bom dia, Madame Dorminhoca! – Disse beijando seu pescoço.
– Isabel, vai dormir! Ainda é de madrugada! – Falou manhosa e virou para o outro lado.
Levantei e ri. Peguei meu relógio de bolso.
– São sete e meia da manhã! – Disse indignada.
Ela levantou a cabeça e me olhou irritada.
– Ou seja, de madrugada! – Resmungou colocando um travesseiro sobre o rosto.
Revirei os olhos.
– Essa hora já estou cavalgando por aí!
– ¡Pero no soy un caballo! – Falou me fazendo rir alto.
Carmen se rendeu e em seguida escutei sua risada.
– Insuportável! – Disse rindo. – Me fez perder o sono! – Me jogou o travesseiro.
– Vamos, quero levá–la para conhecer mais lugares! – Disse animada.
Carmen levantou devagar e foi até a bacia com água lavar o rosto.
– Como pode levantar tão animada assim? – Disse me fazendo rir. – Soy una mujer da noite, Isabel! Sete horas da manhã para mim é madrugada!
"Mujer da noite."
Pois é, Carmen me fez lembrar o que ela sempre seria.
Murchei um pouco o sorriso e ela percebeu, largou a toalha que usava para enxugar o rosto e se aproximou de mim. Me puxou para um abraço sem nada falar. Ela sabe o que senti quando falou sobre ser uma mulher da noite e teve a sensibilidade de apenas me puxar para seu colo e em seguida me beijar, como se em silêncio me dissesse: "Serei sempre sua!"
Fiquei nos seus braços e resolvi afastar os medos e incertezas. Eu faria o que prometi, aproveitaria todos os dias ao seu lado, enquanto fosse possível. A beijei com todo meu amor, Carmen se derreteu em meus braços e me puxou mais para si. Minhas mãos desceram até sua bunda e escutei seu gemido na minha boca.
– Para sua assanhada! – Disse mordendo os lábios – Sabe que não podemos!
Bufei irritada e vi Carmen se afastar para trocar de roupa. Abri a porta.
– Onde vai? – Me perguntou surpresa.
– Naquele dia na cachoeira eu te disse que para mim era demais te ver nua e não poder fazer nada, então sairei do quarto para o bem da minha sanidade mental. – Carmen riu alto.
Pisquei para a mulher e saí. Preciso perguntar a Plínio quando Carmen estará livre para sex*. Qualquer dia desses perderemos a cabeça. Ri do meu pensamento e fui até o estábulo.
– Bom dia, Baronesa!
– Bom dia, José! – Respondi ao homem que cuidava dos cavalos.
– Posso aprontar ela para a senhora se quiser?! – Disse se aproximando.
– Não se preocupe, eu mesmo farei isso! Faz tempo que não dou atenção a essa menina aqui! – Disse beijando o focinho da égua a minha frente que relinchou alto.
– Acho que ela gostou da ideia – José disse rindo.
Meu amor pelos cavalos herdei do meu pai. Era um grande cavaleiro. Me ensinou a cavalgar, cuidar e amar os cavalos. Passei algum tempo escovando o pelo da égua. Coloquei a sela e montei. Quando saí do estábulo vi ao longe Carmen na varanda. Me aproximei e vi seu sorriso aumentar.
– Pronta para mais um dia de passeio?! – Ela concordou e sorriu. – Venha vou ajudá–la a subir. – Desci do cavalo e a peguei pela mão. – Pronta?!
– ¡No! – Puxou meu rosto e me beijou antes. – Agora sim estou pronta! – Ri da sua ousadia e a peguei no colo ajeitando a mulher na sela. Subi em seguida atrás do seu corpo e logo vi Marta correndo em nossa direção.
– Baronesa! – Disse com a cesta na mão. Quase me esqueci do café que pedi para ela separar.
– Marta, tu és um anjo! Já ia me esquecendo! – Peguei a cesta de sua mão.
– O que é isso? – Carmen perguntou curiosa.
– Algumas coisas gostosas que pedi para Marta separar para nós duas! –Me virei para a empregada a frente. – Muito obrigada! Não precisa nos esperar para o almoço, vamos almoçar na outra casa!
– Pode deixar, Baronesa! Tenham cuidado! – Disse sorrindo. Agradecemos e em seguida partimos.
Andamos um bom tempo só admirando os vales a nossa frente e me deliciando com cada suspiro de surpresa de Carmen. Era bom ver que ela estava gostando de tudo. Havia um campo de flores ali perto, um pequeno orquidário que meu pai construiu a muito tempo atrás. Eu gostava de ir até ali, as orquídeas eram lindas. Meu pai nunca deixou de cuidar delas, desde que me lembro ele sempre ia até o local e passava horas no meio das orquídeas. Quando faleceu, não quis deixar esse local se acabar, ele parecia amar tanto. Contratei um jardineiro que passou a cuidar do local todos os dias.
– Chegamos! – Disse parando cavalo. Desci ajudei Carmen a descer em seguida e prendi Pérola na árvore.
– Uau! – Disse admirando as rosas ao redor.
– É lindo, não é?! – Disse orgulhosa.
– Extraordinário! – Falou encantada, foi até o meio do jardim e admirou com delicadeza cada flor. – Que lugar! Belíssimo!
Me aproximei sorrindo. Era bom quando conseguia surpreendê–la. Peguei Carmen pela mão.
– Venha quero te mostrar uma coisa...
De mãos dadas seguimos juntas até a pequena casa de vidro ao lado do grande jardim. Abri a porta e senti aquele cheiro bom das flores. Carmen soltou da minha mão e andou até as várias mesas com orquídeas. Tinha de todos os tipos e cores. Estavam bem cuidadas, o que fez o meu coração se aquecer, meu pai ficaria feliz.
– Eu amei esse lugar, Isabel! – Disse encantada. – Não sabia que gostava de cuidar de plantas.
Me aproximei dela por trás e a abracei de leve pela cintura.
– Na verdade nunca levei muito jeito com flores... – Carmen me olhou confusa.
– E por que fez tudo isso? – Disse olhando ao redor.
Suspirei um pouco triste e com saudade.
– Esse lugar foi meu pai que construiu... Ele me trazia aqui e me contava que no meio das orquídeas se sentia feliz e amado. Na verdade eu nunca entendi bem essa parte! – Disse rindo fraco e me aproximei do banco que ele sempre sentava para cuidar das plantas. A saudade fez doer meu coração. Carmen se aproximou e me deixou um beijo delicado na boca.
– Tu padre debe estar muy feliz por ver como cuidou do que ele tanto amava... – Disse me fazendo sorrir. Ela secou uma lágrima teimosa que caiu e me puxou pela mão para admirar com ela cada orquídea do lugar.
Carmen parou na frente de uma delas e me olhou surpresa.
–– Sabe quem é apaixonada por orquídeas? – Disse com um meio sorriso.
– Não... – Disse curiosa.
Ela demorou um pouco e riu quando falou.
– Margot! – Arregalei os olhos surpresa. – Sempre tem uma dúzia delas em seu quarto e espalhadas pela casa... – Carmen disse pensativa e eu enfim descobri porque meu pai construiu aquele lugar.
Eu sabia de sua história de amor com Margot e tudo se encaixou.
"Minha querida, aqui eu me sinto feliz e amado"– Sua voz invadiu minha cabeça, como que sussurrada em meus ouvidos.
Ele sempre amou Margot, nunca deixou de amar e pensar nela. Aquele lugar em que estávamos era o pequeno santuário que ele fez para eternizar aquele amor que não deu certo. Será que eu também viveria assim? A vida toda sonhando com uma vida ao lado de Carmen que nunca seria real. Me entristeci um pouco por ele e por mim. Nós dois tivemos o destino cruel de nos apaixonar por mulheres impossíveis.
– Margot, adoraria esse lugar! – Disse sonhadora.
– Sim... meu pai construiu tudo isso para ela... – Disse sorrindo tocando em uma das plantas.
Carmen me olhou com um misto de surpresa e confusão.
– Eu sei sobre a história de amor dos dois...
– Margot?
– Não, Lucília me contou um dia... Disse que me pareço com ele quando estava apaixonado pela mulher da capital! – falei pensativa.
Carmen engoliu em seco e nada falou. Ela sabia o quanto as histórias tomavam um rumo semelhante.
– Fico feliz de saber que, pelo menos, isso o deixava conformado! – Falei cabisbaixa.
Carmen ainda de costas não notou meu olhar tristonho e eu somente escutei seu suspiro triste.
– Queria trazer Margot aqui um dia... – Disse pensativa.
– Na próxima vinda dela a fazenda a trazemos aqui, o que acha? – Ela se virou e me olhou um pouco mais animada.
– Gracias por isso, mi amor! – Puxei seu queixo e a beijei delicadamente.
– Vamos! – Disse segurando sua mão.
Ela concordou feliz. Saímos do orquidário um pouco tristonhas, mas sem tocar no assunto. Encarar a realidade estava fora de cogitação. Coloquei Carmen novamente na égua e subi em seguida.
– Onde vamos agora? – falou um pouco mais animada.
– Tem um campo mais a frente, com uma boa árvore para sombra... Já são quase dez da manhã e não tomamos café ainda.
– Estou faminta! – Disse se escorando no meu ombro.
– Seu pedido é uma ordem, Madame!
Alguns minutos depois, parei perto de uma grande figueira. Desci Carmen do cavalo e tirei a cesta.
– Essa árvore parece ser muito antiga... – Disse encantada.
– É sim... – Peguei uma toalha que Marta tinha colocado na cesta e estendi pelo chão. – Está aqui desde a época de meu bisavó.
– Incrível como tudo nesse lugar tem um pouco de ti e da tua história... – Falou sorridente.
– Minha família vivi nessa região tem algumas gerações... – Disse rindo. – Agora vem, vamos comer! – Puxei Carmen pela mão e a ajudei a sentar.
Nos servi de café e bolo.
– Espero que goste de bolo de Fubá! Eu adoro e pedi para Marta um grande pedaço! – falei animada.
– Parece uma criança de tão animada com esse bolo! – Falou rindo e me jogando um beijo.
Comemos quase tudo que veio na cesta.
– Acho que estávamos com fome. – Falou mordendo um último pedaço de bolo.
– Tu comeu todo o meu bolo de fubá! – Falei indignada.
Carmen se engasgou rindo.
– Não me culpe! Nem eu sabia que gostava tanto de bolo de fubá....
– Deve ser o bebê! – Disse nos fazendo rir. Desde que Carmen me deu espaço para falar sobre a criança, eu sempre comentava algo, adorava essa nossa interação.
– Acho que tem grandes chances... – Disse rindo.
Me levantei e sentei atrás de Carmen, me apoiei na árvore e coloquei seu corpo grudado ao meu. Minhas mãos foram automaticamente para sua barriga e colocou suas sobre as minhas. Dei um pulo quando do nada senti um movimento ali.
– Sentiu isso? – Me olhou surpresa e assustada.
– Sim...
Paramos de nos mexer e segundos depois sentimos novamente o movimento delicado em seu ventre. Era com toda certeza o bebê. Carmen sorriu timidamente e alisou a barriga. Acho que a emoção pegou ela sem avisar. Fiz carinho ali e logo depois outro pequeno movimento.
– Acho que o bebê gosta do seu toque. – Carmen disse sorridente.
Foi então que decidi fazer algo que poderia me arrepender depois. Sai de trás de seu corpo e deitei em sua frente. Ela me olhou curiosa. Fui até sua barriga e deixei um longo beijo. Carmen ficou tensa, mas relaxou em seguida e vi que podia continuar quando senti ela sorrir.
– Oi pequeno... ou pequena. – Disse nos fazendo rir. – Eu espero que esteja bem aí dentro, sua mãe é muito teimosa, eu sei, mas ela está fazendo o possível para que fique bem. – Ouvi um soluço e quando olhei Carmen chorava me olhando, mas sorria em meio às lágrimas.
– Continua... – Disse com a voz embargada.
– Espero que não acabe com todo do meu bolo de fubá, que me mostrou ser o teu preferido também! – Carmen riu alto. – Prometo pedir a Marta para fazer muitos bolos para nós...
Eu estava fazendo algo que, no fundo, sei que não deveria e meu medo de me arrepender depois era enorme. Eu estava me apegando ao bebê, quando sabia que não poderia fazer isso. Não sei qual será a decisão de Carmen.
Respirei fundo e joguei meu lado racional para o inferno, quando decidi que faria com o bebê o mesmo que estava fazendo com ela, viveria o momento e depois... Não sei, o depois era meio solitário e não gostava muito de visitar essa possibilidade.
– Estamos aqui contigo! – Disse beijando a barriga redondinha e em seguida subindo para beijá–la.
A mulher me puxou para um beijo intenso e se agarrou a mim por um longo tempo.
– Vamos? – Falei acariciando seu rosto. – Precisa de um lugar mais confortável para descansar! – Ela concordou e se levantou. Juntei as coisas pelo chão e peguei Carmen pela mão. – Só um minuto... – Disse voltando alguns passos até a árvore. Puxei um pequeno canivete que carregava comigo.
– O que vai fazer? – Perguntou curiosa.
– Dizem que a figueira é um símbolo de imortalidade... – Fui até a árvore e comecei a entalhar algumas letras. – Deixarei aqui as nossas iniciais para imortalidade...
– Tu no existes, Isabel! – Carmen repetiu aquela frase que ela tanto gostava de falar sobre mim.
– Existo! E agora estamos marcados para sempre aqui. – Ela sorriu lindamente.
– E quem é esse B? – Perguntou passando a mão pela letra ao lado da nossa.
– Bebê! – Disse a fazendo rir. – Como ainda não sabemos se é menino ou menina coloquei B para representar os dois!
I.C.B. Ficaríamos ali para eternidade. Do jeito que meu coração queria que fosse na vida real.
Ela passou a mão pelas inicias e me beijou novamente. Seguimos logo depois para a casa da fazenda de Vassouras onde eu nasci e cresci. Queria que Carmen conhecesse todas as partes da minha vida.
Um empregado logo que me viu nos ajudou com as coisas e a descida. Levou minha égua até o estábulo e assim eu pude entrar na casa com Carmen.
– É tão linda quanto a outra... – Disse admirada.
– Sim... – Falei sonhadora. Cada canto daquela casa tinha um pedaço da minha vida. – Foi aqui que cresci... Venha! – A puxei pela mão.
Entrei em um quarto que há anos não era mais usado. Nele tinham algumas coisas antigas. Abri a porta devagar e entramos juntas. Fui até um móvel antigo coberto por um lençol e puxei. Meu antigo berço ainda estava intacto. Fui até o objeto e o acariciei.
– Era o teu berço? – Concordei e Carmen se aproximou com os olhos brilhando. – Que lindo, Isabel! – Falou passando a mão por toda a extensão.
– Gostaria que ficasse com ele... – Ela me encarou assustada. – O bebê vai precisar de um lugar para dormir. Eu não sei o que pensa em fazer...
– Isabel... – Carmen tentou falar mas não deixei.
– Não falarei disso... Nem quero te pressionar! – Ela me agradeceu com o olhar. – Só que independente do que faça, ele precisará de um berço e gostaria muito que aceitasse esse como presente para o bebê! – Disse tímida. Ela me puxou para um abraço terno.
– Regalo aceito! – Disse antes de me beijar.
Meu coração se aqueceu. Queria que o bebê tivesse uma parte de mim também.
– Vou te mostrar o restante... – Disse animada e tentando mudar o foco da conversa.
Carmen me seguiu por cada canto daquela casa fazendo perguntas e rindo das histórias que contava sobre minha infância.
– Eras una niña muy levada, Isabel! – Disse rindo. Estávamos agora sentadas na sala enquanto mostrava a ela alguns dos cantos da sala que danifiquei brincando ou andando de pônei dentro de casa.
– Não acredito que teve um pônei! – Disse surpresa e encantada. – Eu sempre os achei fofos!
– Eu ganhei um do meu pai quando tinha cinco anos e fiquei tão encantada que queria andar com ele para todo o lado, inclusive dentro de casa. – Ela riu alto. – Uma noite Lucília, pegou o pônei dentro do meu quarto coberto por um lençol. – Rimos juntas.
– Não acredito?! – Disse rindo.
– Pode acreditar, meu pai me colocou de castigo dois dias por isso! – Sorri ao lembrar. – Era uma boa época.... – Lembrei saudosa.
– Imagino que sim! Foi uma criança alegre, Isabel! Fico feliz por isso! – Carmen sorriu para mim e tocou sua barriga. Eu sabia o que ela tinha pensado, o desejo para que seu filho tivesse a mesma felicidade que um dia eu tive estava estampada em seus olhos castanhos. E eu desejava o mesmo com todo o meu coração.
– Tua casa é linda! As duas são! A fazenda, os vales, as flores... Tudo nesse lugar é especial, Isabel!
Agora eu sabia que por um momento ela tinha desejado aquilo para ela. Se Carmen soubesse que só dependia de uma palavra sua e tudo aquilo seria seu. Os vales, as flores, as casas, a Baronesa. Tudo naquele lugar já a pertencia, só dependia dela aceitar os presentes da vida. Passamos uma tarde agradável na casa e chegando quase ao fim da tarde partimos para a outra fazenda. O dia havia sido adorável, mas muito cansativo. Carmen veio dormindo em meu ombro pelo caminho e despertou já próximo a casa. Estranhei a movimentação e a carruagem na frente.
– Está esperando visitas? – Me perguntou curiosa.
– Não que eu saiba... – Descemos do cavalo e subimos juntas a escada até a varanda. Escutamos risadas vindo da sala e um delas reconheceria em qualquer lugar do mundo. Era Louis. O que me deixava com medo era quem veio o acompanhando.
Entrei para acabar logo com aquele mistério e vi de cara meu grande amigo sentado na sala, conversando com Lucília e ao seu lado... Meu sangue gelou, pois minhas suspeitas estavam certas. Héloïse.
Carmen parou ao meu lado.
– Isabel! – Louis se levantou e me abraçou forte.
– Amigo! Não o esperava tão cedo no Brasil... – Disse ainda assustada.
– Os negócios me trouxeram ao Império mais cedo. E quem é a mulher bonita ao seu lado? – Ele sabia quem era, mas era sacana demais ia me fazer apresentar.
– Claro! Essa é Carmen! – Ele ficou a sua frente e puxou delicadamente sua mão para um beijo. – En chatant, mademoiselle! (Encantado, Madame) – Carmen sorriu e aceitou a gentileza.
– Francês? Sempre gostei dos franceses! – Disse fazendo Louis se inflar como um pavão.
Héloïse se levantou me deixando branca como a neve.
– Isabel, ma chérie! – Héloïse se aproximou me deixando um beijo perto da boca. Perto demais. Pelo canto do olho vi Carmen encarar a mulher com ódio.
– Acabo de cambiar mi opinión sobre os franceses... – Disse baixo e irritada. Louis vendo minha tensão e o clima pigarreou chamando atenção para ele.
– O que me conta de novo, minha amiga? O que acha de irmos até seu escritório conversar um pouco de negócios, as damas certamente acharão entediante! – Louis sempre me salvando.
– Com licença vou me recolher! Foi um prazer, Louis! – Disse diretamente ao meu amigo e passou por Héloïse como se ela não existisse. Me olhar ela nem se deu ao trabalho e sei que teria problemas mais tarde.
Louis me olhou segurando o riso e Héloïse olhou Carmen da cabeça aos pés.
– É um prazer revê–la, Héloïse! – Disse fazendo uma pequena reverência. A mulher sorriu. – Mas te deixarei na companhia da Lucilia, temos negócios a tratar! – Disse seguindo Louis.
Assim que fechei a porta do escritório, Louis se soltou e me intimou a contar tudo.
– Estou esperando, Baronesa... – Disse sentando a minha frente.
– Tu pareces aquelas tias velhas fofoqueiras! – Louis riu alto.
– Prazer, Gertrudes! Agora comece a contar! – Quando enfim parei de rir contei a ele tudo que passou até a chegada de Carmen a minha casa.
– É isso! – Disse levantando as mãos. – Agora estou aqui vivendo todo o dia como se fosse o último e apaixonada pelo filho de Carmen!
– Ma Chérie, tu estás muito enrascada! – Disse me fazendo revirar os olhos.
– Isso eu já sei! – Falei levantando.
– E coitada de Héloïse, veio até a fazenda na esperança de ter algo mais sério com a Baronesa! – Falou levando a mão a cabeça.
– Eu e Carmen não estamos oficialmente juntas, mas eu a amo Louis!
– Que confusão, minha amiga! Só espero não ter que recolher os pedaços das damas pelo chão, quando as duas se engalfinharem por causa da Baronesa! – disse rindo.
– Como pode rir da minha desgraça?! – Ele me abraçou pelos ombros.
– Como vocês brésiliens dizem... Vamos sourire para não chorar! – O ditado no sotaque de Louis me fez enfim relaxar e rir junto com ele.
Entramos logo em seguida em uma conversa sobre negócios e a fábrica que Louis enfim tinha encontrado na região norte do Rio de Janeiro. De acordo com meu amigo eles ficariam ali por apenas alguns dias, só o tempo de assinar os papéis de posse. E eu agradeci mentalmente por essa estada seria curta. Terminamos nossa conversa já pela madrugada e seguimos cada um para seus aposentos. A sala já estava vazia e parei na frente do meu quarto, respirando fundo.
Quando abri a porta a vi já deitada. Tirei minha roupa e fui me banhar antes de dormir. Vesti a roupa que sempre usava para dormir e agradeci aos céus por Carmen já dormir e assim não me arrancar a cabeça no mesmo dia. Deitei devagar ao seu lado e quando levantei o cobertor fiquei de boca aberta. Carmen usava uma camisola transparente, uma que nunca vi usar aqui na fazenda. Era a primeira vez que via tão exposta assim depois de tanto tempo. Meu corpo inteiro reagiu aquela imagem e minha boca foi direto ao seu pescoço a beijando com desejo.
Carmen se roçou em mim até me deixar louca e quando a puxei mais para perto a mulher me jogou da cama com um empurrão forte.
– Sai daqui! – Disse irritada. Dava para ver a raiva em seu olhar.
– Tu és louca?! – Perguntei irritada e levantando do chão.
– Su cama esta pronta! – Apontou para a cama de solteiro que não usava mais. Nela estava um lençol e os travesseiros arrumados. Estava tão preocupada com a reação de Carmen que nem reparei na cama feita.
– Se não me quer ao teu lado, por que se vestiu assim para mim? – Disse ajeitando o travesseiro.
– Errado! Eu me vesti assim para mim e não para usted! – Falou com raiva
– E onde estava essa camisola que nunca a vi usando?! – Falei mais irritada pelo estado de excitação que ela tinha me deixado.
– Una mujer sempre carrega consigo una hermosa lenceria! As meninas do bordel sabem disso tão bem quanto yo e por isso ela está aqui! – Falou me afrontando.
– Não sei por que essa irritação toda? Eu não fiz nada! – Ela me olhou com mais raiva que antes.
– O que fue aquele beso, Isabel?! – Disse pegando um pequeno porta joias ao seu lado. Me afastei com medo.
– Não teve beijo nenhum, Carmen!
– ¡Respuesta Equivocada! – Disse me jogando o objeto. Me afastei por pouco e o porta joia caiu do outro lado do quarto.
– ¡Pare com isso, Carmen! – Pelo contrário ela pegou um pequeno livro que tinha no criado–mudo.
– ¿Qué es esa mujer? – Disse me apontando o livro.
– Carmen, calma!
– ¿Qué es esa mujer, Isabel?!
– Uma amiga!
– Respuesta Equivocada de novo! – Disse jogando o livro que voou certeiro na minha cabeça.
– Doida! – Falei passando a mão pela minha testa. Carmen ameaçou em pegar outro objeto quando eu me adiantei a falar.
– Ela é prima do Louis! Veio com ele ao Brasil da última vez que estive na capital e ficaram hospedados na minha casa de Botafogo! Foi como a conheci!
Carmen pareceu se lembrar do período, nós estávamos separadas na época. Ela abaixou o objeto em suas mãos e suspirou irritada.
– Que seja, Baronesa! – Disse meu título com desdém e se deitou de costas para mim.
– Carmen... – Falei tentando me tocá–la.
– No se aproxime, Isabel! – Disse irritada e achei melhor obedecer antes que ela jogasse a cama em mim.
Carmen dormiu virada de costas para mim e eu da minha pequena cama tinha a visão maravilhosa de todo o seu corpo descoberto pelo lençol. Suas curvas, sua bunda, toda aquela maravilha sob aquela infeliz camisola transparente e tenho certeza que ela fez isso de propósito.
Dormi com muito custo quase com o dia nascendo e pela primeira vez levantei depois de Carmen. O quarto estava vazio e sua cama arrumada. Me levantei correndo e fiz minha higiene matinal. Eram oito da manhã. Corri até a varanda e lá estava ela sentada de frente para os vales como fazia toda manhã. Tinha uma xícara de café nas mãos e quando me viu revirou os olhos.
– Bom dia para ti também, Carmen! – Sentei a sua frente e me servi de uma xícara de café. Ela me olhava ainda irritada, mas sem a raiva de ontem a noite.
– Como passou a noite? – Perguntou rindo enquanto tomava seu café. Filha da mãe.
– Com tes... – Ela riu. – Com insônia. – Falei irritada.
– Eu dormi maravilhosamente bem! – Disse sorrindo.
Revirei os olhos e acabei rindo com ela. O clima estava voltando ao normal entre nós duas quando Héloïse apareceu.
– Bonjour! (Bom dia!) – Héloïse sentou ao meu lado na mesa. – Isabel, se estiver com o dia livre adoraria conhecer a fazenda como me prometeu da última vez! –
– Infelizmente Isabel é una mujer muito ocupada não pode ficar por aí com una qualquer... – Riu debochada.
– Não sabia que Isabel agora tinha uma secretaria? – Héloïse debochou também.
– Soy muito mais que una secretária, ma chérie! – Carmen devolveu o deboche e Héloïse se remexeu irritada ao meu lado.
Héloïse sorria para mim e Carmen me matava silenciosamente, apenas com o olhar. E eu? Eu só queria correr daquele fogo cruzado.
Fim do capítulo
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naoseimeulogin
Em: 15/12/2020
Amei, é aquele tipo de capítulo q se lê sem conseguir parar de sorrir
Maria Carolina
Em: 20/09/2020
História apaixonante, madame... espero em breve e ansiosa, próximos capítulos...
Resposta do autor:
Obrigada por ler!!! 🤗â¤ï¸
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