CAPÍTULO 16 - Diga sim pra mim

         - Já posso entrar?

         - Não amorzinho, espere só mais um pouquinho...

         Stella perguntava rindo do outro lado, enquanto eu tentava em vão deixar a última letra da frase colada na parede com durex, foi difícil, mas, assim que consegui, abri a porta deixando que ela entrasse.

         - Gostou amor?. - Perguntei ansiosa.

         Ela olhou tudo que fiz com a ajuda de Antônia e Adelle, e correu para me beijar, foi um dia corrido e para que tudo desse certo, Plínio tinha ajudado a mantê-la distante e ocupada na fábrica de chocolates, e enquanto isso, arrumávamos o quarto para o meu pedido de casamento, a decoração era simples, mas, de muito bom gosto, no teto balões com gás hélio em formato de coração rosa de um delicado tom pastel traziam em suas pontas luz de fadas de LED na cor branca que seguravam reproduções das inúmeras fotos que tiramos ao longo de pouco mais de um ano que estávamos morando juntas com os nossos filhos caninos, Conan e Fandangos.  

        Em cima da mesa deixei um lindo buquê de rosas vermelhas, um quadrinho luminoso com os nossos nomes, vários chocolates em formato de corações enfeitados com as letras M & S, que de forma espirituosa, Adelle lembrou de colocar dentro da bomboniere azul que eu havia trazido com a ambrosia, ao lado e não menos importante, estavam as alianças, escolhi duas lindas em ouro branco e amarelo, a dela era rebuscada, cheia de detalhes e com brilhantes, enquanto a minha preferi um modelo minimalista, a clássica mesmo, também não havia esquecido de encomendar um bolo lindo, bastante versátil, redondo e com um ar naturalmente romântico, com babados e trabalhos de bico com merengue e buttercream em formato de flores, ele ficava ao lado de vários porta-retratos com fotos nossas, e na parede colei a frase com letras vermelhas com dourado nas pontas "Diga sim pra mim", ela sentou na cama com os olhos cheios de lágrimas e após beija-la com todo amor, fui buscar o violão para cantar a música de Isabella Taviani.

        Quando ela parou de chorar, me abraçou e trocamos as alianças.

- Mari, esse "sim" estava preso na minha garganta esperando por você a anos.

        Ela me olhou emocionada e riu quando percebeu que eu estava vestida com aquele vestidinho vermelho oriental dela que tanto gostava.

- Ah, você lembra de cada detalhes, olha os chocolatinhos dentro da bomboniere azul...

- Essa parte foi ideia da Adelle, amorzinho.

- Está tudo lindo, mas, você sabe...eu diria sim de qualquer jeito, nem que fosse apenas umas pergunta, eu te amo Mari.

- Eu também te amo muito minha estrelinha.

        Stella não havia reparado nas pétalas de rosa em cima da cama quando me puxou para baixo do seu corpo, eu suspirei quando senti seus beijos em meu pescoço e delicadas mordidinhas em toda a sua extensão, ela dizia frases desencontradas e entrecortadas, para logo depois voltar a me beijar cheia de desejo, eu passaria por tudo novamente se fosse para terminar assim, ok, esquece o tráfico de animais e a galinhagem, mas, não há nada melhor do que amar e ser amada, quanto mais amo, mais esse amor enraíza no meu coração, a amo como nunca antes e esse amor faz parte de mim. Depois que nos amamos, encostei sua cabeça em meu ombro e cheirei aquela cascata cacheada enquanto envolvia o dedo em um dos cachinhos, brincando para ouvir a sua risadinha gostosa e cativante. Eu te amo Stella...

       Eu não sei se registrei aqui em que circunstâncias a conheci, mas, eu lembro de cada detalhe, ela era viúva e estava atrás de um passarinho azul. Não, não foi amor à primeira vista, nada disso, mas, de cara já gostei do seu jeito forte e determinado, não podia também deixar de reparar em sua beleza singular e exótica, eu estava encantada com tudo, e isso ia além do meu desejo de leva-la para cama, eu a desejava, claro, mas, também queria entender suas ideias, sua alegria, seu amor pela vida e o seu sentimento pelos animais.

       Nossos dias seguiam em uma profunda conexão, nós conversávamos sobre tudo e sempre saia de sua casa estranhamente feliz, me sentia tão melhor ao seu lado, mas, junto a isso, vinha um enorme medo do que estava sentindo, e acima de tudo, tinha receio da felicidade, será que eu merecia mesmo ser feliz?, no fundo eu tinha consciência que não, então, resolvi que seriamos apenas amantes e fugi desse amor loucamente, quando fizemos amor pela primeira vez, assim que a toquei, tive a certeza de que se bobeasse ela entraria com tudo em meu peito bagunçando toda a minha vida, claro, depois vieram muitos outros dias, e era delicioso, mas, com isso vinham as inúmeras conversas sobre tudo, e fui me envolvendo sem nem perceber, até ouvir dela mesmo sobre o que eu estava sentindo, e ao perceber que ela estava certa, eu fugi, tentei sufocar esse amor com outros corpos, mas, não teve como, ela conseguiu acertar em cheio meu ponto mais sensível, o coração e fez desse lugar a sua morada, sabe quando vi que não poderia mais fugir?, quando bateu uma tristeza no fundo da minha alma com sua distância, e quando percebi que tudo ficou mais bonito quando ela apareceu em uma delegacia inóspita e alegrou meu coração com seu sorriso, foi como se um novo sol abrisse nos meus dias cinzas que estavam sem ela.

        O fato é que sinto que ela faz parte de mim, e tudo na minha vida me parece tão mais bonito com ela, por isso mesmo é incontrolável esse querer, meu amor mais parece um cavalo selvagem, sem rédea e sem rumo certo. Será que tem como me apaixonar ainda mais?, sei que todos os dias descubro nela um novo capítulo, e cada capítulo me parece mais encantador do que o outro, e a cada dia o que sinto está mais lindo e especial, com açúcar e com afeto vamos construindo nossa história, nem falamos nada demais as vezes, mas, tudo vem com inteligência, sutileza e bom gosto, todos os momentos e tudo o que falamos me faz tão mais feliz. E assim, os dias passam e ela se torna mais e mais especial.

- Mariana?, amor?, te dou um chocolate por seu pensamento...

- Stellinha, estava lembrando um pouco da nossa história...eu...eu te amo há tanto tempo, eu fugi...fugi porque tinha medo do amor que sentia, eu não me achava merecedora de ser feliz e...

- Shhhh...isso já passou meu bem, vem aqui com a sua Stella.

        Ela me puxou, me sentou em seu colo e acariciou minhas costas, dizendo que o passado estava exatamente onde deveria estar, bem longe de nós e da nossa felicidade, me aconcheguei e chorei pelo tempo perdido e pelos erros cometidos, ela entendeu o meu momento, me aconchegou e me deixou chorar, me embalando com seus braços acolhedores e cantando suavemente em meus ouvidos doces canções de ninar, e quer saber?, eu adormeci, só acordei bem mais tarde com seus beijos suaves em minhas costas e uma mesa arrumada dentro do quarto com o lanche da tarde.

        Nos casamos na fazenda mesmo, cerca de um mês depois desse dia, preciso comentar que a "Fazenda Olho D'água" mudou de nome, passando a se chamar "Fazenda Aconchego", juntas fizemos algumas mudanças, e o que já era lindo tornou-se ainda melhor, a arquitetura do lugar ganhou um ar familiar e aconchegante, do jeitinho que queríamos.

        Nosso casamento também não foi muito diferente, tudo o que mais sonhávamos era valorizar a beleza e as características próprias do lugar, optamos por criar uma ambientação aconchegante com cara de casa, assim, os convidados que chegavam se sentiam acolhidos, podendo sentir que faziam parte da nossa vida e na nossa felicidade. Para a cerimônia, foi criado um caminho com vasos de margarida e velas que levaria Stella até o altar, onde um amigo kardecista estaria esperando para a cerimônia religiosa, pois já havíamos casado no cartório.

        Os arranjos florais ganharam tons de vermelho, laranja e rosa, e sobressaíram em meio ao verde que havia no lugar, móveis de madeira completavam a decoração, harmonizando com o mobiliário da fazenda, as mesas dos convidados eram decoradas com guirlandas ao centro, e ao lado estava uma mesa farta com canapês de alcachofra e camarão, miniquiche de funghi secchi, canapés de carpaccio, kani com kiwi, patê de truta defumada, salmão com pão preto e torradas, além de patê com geleia de framboesa. Na entrada foi servido brie e camembert de massa folhada, sopa de tomate com ervas finas, salada verde com queijos variados em cubos e torradinhas ao molho de azeite e nozes. Para jantar havia filé mignon com shimeji sauté, purê de batatas e alho ao molho oriental de shoyo, salmão marinado em ervas, com arroz e batata sauté de zuchini, coradas ao molho de alcaparras, espaguete de camarão, servido ao molho de branco, com tomilho e lascas de parmesão, finalizando com uma torta de açafrão.

        Em duas outras mesas estavam os docinhos variados com as iniciais de nossos nomes e o bolo, considerado o ápice da decoração, todo feito de baunilha, com camadas de mousse de chocolate dark, o bolo tinha quatro camadas cobertas de fondant de baunilha, e cada nível foi decorado com uma variedade de rosas, orquídeas e lírios de açúcar.

        Estávamos felizes, celebrando o nosso amor, e em algum instante peguei sua mão e a carreguei até o quarto, suspendi meu vestido rapidamente e ela riu já imaginado alguma malícia, foi quando mostrei tatuado em minha virilha uma pequena constelação de estrelas, com uma que reluzia bastante no meio de tantas outras, eu olhei em seus olhos e disse "Stella, você é o amor da minha vida", ela me abraçou e não teve como fugir do seu beijo, fizemos amor do jeito que dava, de uma forma deliciosa e afobada, antes de voltar para sala, arrumamos a maquiagem e os vestidos e seguimos com a comemoração até o amanhecer, sem esquecer a participação de Fandangos e Conan, que estavam muito elegantes em seus terninhos e animadamente balançavam conosco e com os convidados, ao som do DJ que rolou pela noite adentro.

        Na noite seguinte seguimos em lua de mel, nossa viagem iniciou em Lucerna da Suíça, que lugar lindo, suas construções antigas e a arquitetura medieval nos deixou apaixonadas pelo lugar, assim como por sua natureza impressionante, a cidade é toda rodeada pelos alpes suíços, cortada por um grande lago de água potável e foi lá que tantas vezes nos declaramos e nos abraçamos sentindo a delícia que é amar.

        Ir a Suíça e não experimentar o seu famoso fundue de queijo não é a mesma coisa, escolhemos um feito com queijo Gruyère e pães de acompanhamento.

        Estava ali a sua frente, observando aqueles olhos lindos me fitando de forma tão apaixonada que não resisti de dizer.

- Stella, casa comigo?.

- Meu amor, já somos casadas...

- Que sorte a minha, quero renovar todos os dias esse casamento.

        Eu vi que seus olhinhos brilhavam quando me perguntou.

- Mari, você quer casar comigo?

- Todos os dias...

        E foi assim que desabamos a chorar, só paramos quando passou um vendedor de flores, eu ia comprar apenas uma, mas, comprei acabei foi comprando todas, segui até o dono do restaurante e pedi com meu francês de quinta categoria para usar um pouco do microfone do cantor e seu violão, não entendi muito a resposta, mas, vi que concordou, assim, peguei o violão e cantei "Love of my Life", foi o ápice, Stella chorou e todos aplaudiram, sai satisfeita dali, sabendo que a fazia feliz.

       Da Suíça fomos direto para o Vale do Loire, na França, amamos principalmente três cidades, Tours, Amboise e Blois. O lugar é famoso pelos vinhos, campos verdes e claro, por seus inúmeros castelos, ficamos hospedadas inicialmente em Blois, em um hotel cuja a construção lembrava um castelo medieval, e como estávamos felizes demais por termos excedido um pouquinho no vinho, resolvemos encenar uma versão gay, denominada por nós de Romeia e Julieta em plena varanda, pensei que fossem reclamar, mas, que nada, percebemos que a plateia estava curtindo e muito, no final fomos aplaudidas, e ouvimos em diferentes idiomas que gritavam "beija, beija" e beijamos, no outro dia acordamos nuas, com uma ressaca gigante e mortas de vergonha, passamos o dia inteiro nos curtindo e fazendo as refeições no quarto, mas, bastou sair para ouvir de várias pessoas que a performance foi inesquecível.

        Da França fomos a Algarve em Portugal, lugar maravilhoso, com várias praias paradisíacas e rochosas, além das muitas falésias e das águas transparentes, a culinária era espetacular e nos divertimos bastante entre a Praia do Ancão, Praia da Luz e Praia da Rocha, e foi lá, tomando uma deliciosa Sopa de Conquilhas com pães de alho como acompanhamento, que cantei muitos fados e adorei ver o corpo cheio de curvas de Stella com aquele biquini tomara que caia vermelho pegando sol, para mais tarde me deliciar com aquela marquinha sedutora deixada em seu corpo.

        De Algarve seguimos para Praga, amamos aquela cidade, o lugar consegue ser ao mesmo tempo moderno e clássico, a arquitetura medieval convive lado a lado e harmonicamente com prédios modernos. Segundo o escritor Franz Kafka, "Praga não deixa a gente ir embora, esta velha tem garras", e o escritor estava certo, íamos passar apenas dois dias e ficamos seis, porque cada cantinho que andamos tinha algo para admirar e curtir, depois de muita farra gastronômica, no último dia comemos um Smážený sýr, um prato bem leve, com queijo empanado acompanhado por cenouras, batatas e salada e seguimos para o último lugar da viagem.

        Nosso último lugar foi em Santorini na Grécia, a ilha vulcânica tem um mar inesquecível, de um azul bem forte, e na arquitetura observamos as inúmeras casinhas brancas construídas no penhasco. Além da beleza impressionante, a ilha tem uma gastronomia espetacular, a famosa culinária grega nos surpreendeu, e não teve nada melhor e de mais lindo do que ver o pôr do sol nas ilhas gregas juntinhas, ficávamos ali de mãos dadas e com a gostosa sensação de que estávamos a cada dia construindo um lindo caminho.

- Meu amor, estou amando tudo isso aqui, mas, confesso que já estou com saudade do nosso ninho e dos nossos filhos caninos. Mari, o que quer fazer no último dia da nossa lua de mel?.

- Amor...

- Diga, o que quer fazer?.

- Quero fazer amor contigo e depois admirar um pouco dessa paisagem, você me faz muito feliz Stella.

- Ohhh meu bem, não mais do que você me faz, te amo tanto Mari.

        Nos amamos no quarto, depois ficamos admirando a linda paisagem da janela e ficamos abraçadas nuas, sai um pouco e tirei uma foto maravilhosa, só dá para ver a silhueta de Stella em preto e branco de costas, mas, considero essa foto minha grande obra prima, quando voltamos, mandei ampliar e coloquei no nosso quarto tempos depois. E para encerrar nossa viagem fizemos um passeio de barco no vulcão da ilha, enquanto comíamos uma gostosa ambrosia. 

Fim do capítulo