Capitulo 59. A semana mais longa - Parte 6
Os primeiros raios de sol adentraram no quarto, passando pela extensa janela de vidro, trazendo uma claridade indesejada para quem vivia sua primeira ressaca. Emily resmungou palavras desconexas, recusando-se a acreditar que havia esquecido de fechar a cortina na noite anterior. Abrir os olhos nunca havia sido tão difícil, e não precisou de muito esforço para que sua cabeça começasse a latejar.
– Eu nunca mais vou beber... – Puxou o cobertor para cima do rosto, tentando esconder-se dos raios de sol.
A ruiva virou-se de um lado para o outro em uma tentativa frustrada de pegar no sono novamente. Embora ela estivesse cansada, seus pensamentos impediram-na de dormir, levando-a ao encontro de uma pessoa já conhecida: Alice.
Emily não conseguia parar de pensar no porque dela não ter estado aqui desde o momento em que havia acordado, e ponderou as mais diversas possibilidades para justificar aquela ausência, chegando até mesmo a duvidar do amor que tanto enxergava naqueles olhos castanhos tão claros que beiravam ao amarelo, e isso a incomodou.
– Okay! Você venceu! Eu vou conversar com ela sobre isso. – Falou sozinha enquanto tirava o cobertor que cobria seu rosto.
Antes que a ruiva pudesse levantar da cama, o som de vozes se aproximando do quarto lhe chamou a atenção.
– Emily, querida, olha quem está aqui de novo... – Katrien abriu a porta sem sequer bater, obtendo a reprovação da filha que fechou a cara ao semicerrar seu olhar.
Quando seus olhos alcançaram a morena que estava ao lado de sua mãe, seus lábios relaxaram em um sorriso discreto e seus olhos se iluminaram.
– Eu juro que tentei convence-la em não te acordar... – A voz pacata de Alice teria soado melhor se sua cabeça não estivesse doendo tanto.
Emily rapidamente se sentou na cama e suas mãos não demoraram em percorrer os fios de seu cabelo antes tão bagunçados.
– Ela não se aguenta. – Pressionou os lábios enquanto batia os cílios em uma falsa cara meiga.
– Você está com uma cara péssima filha. – Katrien estudou o cansaço estampado naqueles olhos azuis tão fundos. – E eu não te vi chegando ontem... Aonde vocês foram? – Seus olhos alteram entre Alice e a filha.
O espanto atravessou o rosto da ruiva, deixando-a completamente sem voz. Aquela reação não havia passado despercebido pela morena, que acompanhou seus olhos transformarem-se em duas bolas azuis gigantes.
Alice curvou o rosto enquanto analisava-a, e as linhas de expressão que tomaram seu rosto traduziam seu conhecimento sobre a mentira de Emily.
– Nós... – Rangeu os dentes enquanto buscava por uma boa desculpa. – Nós fomos passear pelas ruas do centro. – A morena mordiscou o lábio inferior enquanto encarava os olhos suplicantes de Emily. – E acabamos perdendo a noção do tempo. – Completou quando os olhos desconfiados de Katrien pesaram sobre ela.
– Eu... – A ruiva acompanhou a mentira. – Eu queria conhecer cada cantinho! A cidade é tão linda! – As palavras saíram apressadas, aumentando ainda mais a desconfiança da mãe.
– Sei bem... – Mediu a filha com um olhar sério. – Enfim, não vou me meter no que vocês fizeram ou deixaram de fazer. – O timbre sugestivo de Katrien fez as bochechas da ruiva ficarem do tom do seu cabelo. – Eu vou preparar algo para vocês comerem.
Alice aguardou até que Katrien saísse do quarto e fechou a porta de forma lenta, mantendo a mão sobre a maçaneta por alguns segundos antes de tomar coragem para encarar a ruiva novamente.
– Então a nova Emily anda mentindo para a sua mãe... – Ao virar-se, seus olhos estudaram cada tensão explicita no corpo da outra. Os ombros estavam firmes e eretos, e os olhos transbordavam preocupação. Os lábios formavam uma linha dura, e o cenho estava franzido.
Emily manteve-se em silêncio durante a aproximação da morena.
– Então... Onde nós estávamos ontem? – Pressionou os lábios em um meio sorriso.
Alice acompanhou o olhar da ruiva percorrer todo o quarto antes de ouvi-la se justificar.
– Nós precisávamos pensar um pouco, sem ninguém por perto. Então fomos caminhar... – O desapontamento que tomou forma nos olhos da morena não passou despercebido por Emily. – E quando eu digo nós, me refiro a mim. – Seus olhos buscaram pelos de Alice, e um breve sorriso tomou seus lábios ao encontra-los. – Obrigada por me encobrir.
– Tem certeza que isso é a única coisa que eu encobri? – Perguntou receosa.
Alice sentiu um frio instar-se em sua barriga quando cogitou a possibilidade do “nós” ter alguma relação com Anne, e não apenas com uma forma de expressão similar a que havia usado.
Emily sentiu seu coração vacilar com a pergunta. Recordou-se que embora a sua intenção fosse realmente essa ao sair de casa, o encontro inesperado com uma mulher chamada Lívia havia dado outro significado para a noite. As horas que havia passado ao lado da loira estavam protegidas por um segredo que Emily prometeu guardar.
– Uhum. – A ruiva confirmou ao balançar a cabeça, dando entendimento a palavra que mal foi ouvida por Alice.
Emily sentiu-se desconfortável por não poder contar a Alice o que realmente havia feito na noite anterior, mas uma promessa era uma promessa, e independente da omissão, ela não precisava contar toda a sua vida para a morena.
– Você já tem algum plano para hoje? – Alice se sentou na ponta da cama, investindo em uma distração para aquele assunto.
– Ainda não... Mas eu tenho certeza que terei em alguns segundos. – Emily ajeitou as pernas em cima da cama, cruzando-as em borboleta, dando mais espaço para que Alice pudesse se aproximar se quisesse.
Alice sorriu com os lábios pressionados, lançando-a um olhar acolhedor.
– Você está me conhecendo bem demais, Harley. – Os olhos da ruiva rodaram nas orbitas.
– Foi só um palpite. – Limitou-se a essas palavras, postergando o assunto que tanto lhe causava desconfiança em relação à Alice.
A ruiva estava com um short de moletom cinza e a blusa azul marinho de manga contrastava com a sua pele extremamente branca. O cabelo agora arrumado lhe caia pela lateral do rosto, cobrindo-lhe parte da bochecha.
Alice não pôde deixar de notar que, mesmo estranhamente de bom humor, a ruiva estava com o olhar e rosto cansados, provavelmente por uma noite mal dormida, e foi impossível não sentir a curiosidade que explodia dentro de si ao se perguntar o que realmente Emily havia feito na noite passada. Com o cenho franzido, a morena buscou analisar cada traço da mulher a sua frente, e doeu quando uma dúvida pontou em seus pensamentos:
– Até onde eu a conheço agora? – Perguntou-se em um silêncio que fez seu corpo estremecer.
Por mais que lhe doesse admitir, Alice sabia que aquela não era a mesma mulher que conhecera sua vida inteira, e temer o desconhecido era inevitável para ela.
O tempo em que a morena passou a estudando e se questionando despertou curiosidade nos olhos já tão atentos de Emily.
– Devo imaginar que o mundo da lua é para onde iremos hoje? – A ruiva mostrou os dentes em um sorriso divertido, despertando Alice do transe.
– Ha. – Foi irônica. – Muito engraçada. – Os olhos da morena foram de encontro à janela, observando o céu limpo lá fora. – Embora eu quisesse ter uma nave para ir à lua, você terá que se contentar com uma volta de carro até o parque.
– Tudo menos parque... – Resmungou ao se jogar de costas no travesseiro da cama. – Se eu for a um parque hoje eu juro que vou dormir. – Confessou.
– A noite foi boa em! – Falou em um timbre ácido.
A surpresa daquelas palavras fez com que a ruiva erguesse a cabeça e também uma das sobrancelhas, travando seu olhar em Alice.
– Eu vou fingir que não ouvi isso. – A reprovação transbordou de seus olhos azuis.
Alice entreabriu a boca para desculpar-se, mas antes que pudesse fazê-lo de fato, Emily prosseguiu.
– Alguma outra sugestão? – Levantou-se da cama, ajeitando o short de moletom enquanto caminhava até o guarda roupa para buscar algo para vestir.
– Na verdade não. – Comprimiu os lábios. – Porque não fazemos assim: Você decide o que vamos fazer hoje. – Alice alcançou-a novamente com o olhar.
Emily segurava as portas do guarda-roupa com a ponta dos dedos. Seus olhos percorreram pelas roupas distribuídas pelos cabides, olhando também em algumas gavetas enquanto refletia sobre a sugestão de Alice. Era difícil decidir o que queria fazer quando na verdade ainda desconhecia as coisas que gostava. A ruiva ainda estava em processo de autoconhecimento, e das poucas coisas que gostava correr era certamente uma delas, mas não dava para convidar alguém para sair correndo por ai. Ainda ponderando sobre, Emily recordou-se de uma história que sua fisioterapeuta tinha lhe contado uma vez, sobre um dia bom em que havia passado com a família na praia e sobre o fato de correr na areia para brincar com o filho.
– Nós poderíamos ir à praia! – Olhou a morena de soslaio.
A expressão completamente ansiosa e impaciente da ruiva fez Alice pressionar os lábios para evitar uma risada.
– Eu topo! – Antes que o sorriso de satisfação tomasse os lábios de Emily por completo, uma ressalva da morena a interrompeu. – Mas com uma condição. – Levantou o indicador.
Emily tentou decifrar o mistério daquele par de olhos castanhos, analisando-a durante um silêncio que torturava sua curiosidade.
– Qual? – Insistiu.
– Precisa ser na praia da Guarita, é sério. – Sua voz soou em um tom implorativo, e ela logo retribuiu o olhar atento de Emily.
A ruiva alternou seu olhar entre as roupas a sua frente e os olhos animados de Alice, e não demorou muito para que uma resposta viesse à tona. Emily enfiou as mãos para dentro do guarda-roupa, e ao encontrar o que desejava, virou-se para Alice, balançando a parte superior de um biquíni que segurava na ponta dos dedos. O sorriso divertido que tomou os lábios da ruiva logo foi acompanhado pela outra.
Após Emily se arrumar, elas tomaram um café da manhã apressado junto à Katrien, passaram na casa de Alice para que ela pudesse se trocar para a nova rota que fariam no dia de hoje.
Embora fosse um longo trajeto do centro de Porto Alegre até a praia da Guarita, a pequena viagem valeria apena para o que as aguardava lá. As duas horas e meia que passaram dentro do carro deram espaço para uma conversa descontraída sobre as músicas que tocavam no rádio, e também para uma abordagem mais amigável de Alice quanto a noite passada de Emily. Depois de algumas investidas, a morena conseguiu extrair a informação de que a ruiva havia saído para correr no centro da cidade, e que havia perdido o sono a noite pensando sobre algo que tinha a intenção de conversar com Alice ainda hoje.
Quando chegaram até o município de Torres, Alice deixou o carro próximo à praia da Cal, garantindo a Emily que fariam uma caminhada por paisagens maravilhosas até chegar à praia da Guarita, e ela estava certa. Emily apreciou todo o trajeto que fizeram até lá, o verde misturado a uma paisagem de falésias e paredes rochosas que se encontravam com o mar deixaram-na fascinada. Antes de por fim se acomodarem na praia, percorreram algumas partes do parque da Guarita e foi impossível não apreciar toda a diversidade de flora e fauna do lugar. Desde o mar, dunas, e mata até as áreas alagadas.
– Alice, aqui é lindo. – Sentenciou pela quinquagésima.
A morena respondeu-a com um sorriso singelo enquanto forrava as cangas na areia da praia.
Emily se sentiu mais confortável ao notar que a praia não estava muito cheia, possivelmente por ainda ser um dia de semana em que pessoas normais estariam em seus empregos. Aceitar seu corpo com as marcas do acidente não foi um processo rápido. Por muito tempo, Emily teimou em andar com roupas curtas ou decotadas que pudessem mostrar qualquer parte das cicatrizes, e até mesmo os banhos que eram acompanhados por Katrien no inicio da sua recuperação foram complicados. A ruiva insistia para não tirar a roupa na frente das pessoas, e fazê-lo agora, na frente de alguém por quem claramente se sentia atraída, seria complicado.
Emily passou longos minutos apenas observando Alice arrumar as coisas que haviam trazido para a praia. Vê-la se despir logo após fazê-lo, ficando apenas de biquíni tão rapidamente lhe pareceu fácil, e foi inevitável não observar as curvas chamativas da cintura bem desenha da morena, ou até mesmo o seio bem arredondado e demarcado pelo biquíni cortininha listrado em tons de branco e preto.
– Emily Harley, ainda não te contaram que é feio ficar encarando alguém enquanto essa pessoa está se despindo? – O tom divertido misturado ao sorriso sacana nos lábios de Alice fez a ruiva ficar complemente rubra e sem graça.
– Hm... – Engoliu seco, sentindo a vergonha descer-lhe pela garganta. – Eu não... – As palavras teimavam em sair.
Alice soltou uma risada gostosa enquanto seus olhos prendiam-se ao desespero e constrangimento que tomava a feição da ruiva.
– Eu estou só zoando com a sua cara! Relaxa. – A morena pressionou os lábios em um sorriso.
Alice balançou a cabeça negando-se a acreditar que Emily havia realmente ficado pilhada com a brincadeira. Ela se sentou na canga, esticando as pernas e apoiando os braços para trás, deixando seu corpo mais alongado para pegar sol.
A ruiva permaneceu estagnada, completamente sem reação após as palavras da outra. Estava desconsertava com o flagra.
– Puta que pariu Emily, você não dá uma dentro! Tinha que ficar secando e garota desse jeito?! Que porr* está acontecendo? – Murmurou para si mesma.
Alice ergueu o pescoço, e seus olhos acompanharam o corpo da ruiva de cima em baixo até alcançar seu rosto novamente. O par de olhos azuis dela estava imóvel e visivelmente alardeado. A morena acompanhou a direção do olhar, mas não havia nada além da extensão da areia da praia para ver, confirmando o que já esperava: Emily estava travada pelo nervosismo da situação.
– Você não vai tirar essa roupa? – Tentou quebrar o gelo.
– Eu... – Emily ergueu o indicador antes de completar. – Eu acho melhor não. – Balançou a cabeça enquanto preparava-se para sentar ao lado da outra.
– Para disso! – Alice tirou o apoio das mãos da canga, tomando uma postura mais ereta enquanto fitava a outra. – Você vai ficar com marca de short e das mangas da blusa, e vai por mim, você não quer isso.
Uma linha formou-se entre as sobrancelhas da ruiva.
– Você não precisa ter vergonha de mim, Harley. – Estimulou. – Ou você já se esqueceu de que eu já vi esse corpinho ai? – O timbre brincalhão da morena não foi suficiente para deixa-la mais confortável com a ideia de tirar a roupa.
– Quem me garante? – Semicerrou os olhos ao encará-la de volta. – Se eu não lembro, eu não fiz. – Um sorriso ainda tímido formou-se em seus lábios.
– Eu garanto. – Arqueou as sobrancelhas. – Mas é melhor eu não falar até onde já te vi sem roupa, senão vai continuar com essa cara de pimentão!
A ruiva arregalou os olhos, cobrindo todo o rosto com as mãos instantes após imaginar a possibilidade de já ter ido para a cama com Alice no passado.
O coração de Emily disparou no peito. Seu corpo estremeceu e a ponta dos dedos esfriaram.
– Não vai me dizer que nós já... – A ruiva entreabriu os dedos indicador e médio, e seus olhos logo se abriram de encontro à Alice, que a essa altura já prendia o riso com certa dificuldade.
A morena não precisou responder verbalmente, suas sobrancelhas arqueadas e os lábios pressionados em um sorriso descarado foram o suficiente para que Emily concluísse que sim, fazendo-a fechar os dedos indicador e médio novamente, cobrindo totalmente seus olhos.
– Puta que pariu. – Soltou em voz alta. – Valeu pelo banho de vergonha, Alice! – A garganta chegou a arranhar de tão seca que a boca ficou. – Eu vou ali no carro buscar a minha dignidade e já volto!
A morena arfou ao ver Emily se afastar em um passo receoso.
– Emily, calma. – Enfatizou. – Olha, se você se sentir mais confortável, eu fecho os olhos, ok? – A morena fechou os olhos enquanto mantinha um sorriso empático nos lábios. – E só para te lembrar, a ideia de vir à praia foi sua, então...
A ruiva fechou os olhos e rangeu os dentes, admitindo para si mesma de que Alice estava certa. A ideia, mesmo que inconsequente, tinha sido dela, e ela teria que ter coragem para enfrentar os dilemas com o seu próprio corpo. Seus olhos estudaram a face e atitude da morena por alguns segundos, certificando-se de que ela iria cumprir com o que havia falado.
– Não abre os olhos até eu falar que pode, ok? – O timbre rouco e tímido após o silêncio tranquilizou Alice.
Os olhos de Emily percorreram toda a praia, analisando as poucas pessoas que lá estavam certificando-se de que não havia ninguém olhando para ela. Com muita dificuldade ela tirou primeiro a camiseta em tom ferrugem, depositando-a em cima da bolsa que havia trazido. O short jeans branco foi a outra peça a deixar seu corpo. A ruiva retorceu o corpo e sentiu suas bochechas arderem quando os olhos de Alice se abriram após conceder-lhe permissão.
Aqueles olhos castanho-amarelados abriram-se em um rompante, ansiosos demais para encontrar com o corpo que tanto conhecia e sentia falta de tocar. Alice observou o rosto envergonhado de Emily e aquilo fez seu coração palpitar. Seu olhar percorreu o rosto da ruiva com cautela, mas seus olhos perderam o brilho no instante em que ela se deparou com a primeira cicatriz no corpo de Emily, logo abaixo da sua clavícula esquerda. Era uma cicatriz densa que lhe trouxe um embrulho no estomago ao relembrar do acidente. Seu coração apertou, e a falta de ar veio logo em seguida. Alice não precisava perguntar como aquela cicatriz havia aparecido ali, lembrando-se exatamente do momento em que chegou ao local do acidente.
Alice seguia o motorista da carreta em passos apressados e nervosos, seu coração estava descompassado no peito, e uma respiração pesada a acompanhava desde a saída do cerimonial. Seus pensamentos estavam turvos, e tudo que lhe vinha à cabeça era de que aquilo não era verdade, não poderia ser verdade. Minutos atrás Emily estava lá, com ela. Como ela poderia estar envolvida em um acidente?
As luzes das sirenes da ambulância e do corpo de bombeiros puderam ser avistadas de longe, e vê-las trouxe a Alice um desespero da realidade que a alcançava a cada passo que dava em direção ao acidente. Quando chegou ao local, a aglomeração de pessoas que circulava o carro envolvido lhe deu calafrios. Suas pernas falharam e as lágrimas invadiram seus olhos de forma abrupta e descontrolada. Ela precisou ser amparada por uma das pessoas próximas antes de tomar coragem para se aproximar mais.
Cada pessoa pela qual se esgueirava para conseguir ter uma visão mais clara do acidente parecia lhe arrancar um pedaço da alma e da esperança que tinha do motorista estar enganado. Com um timbre fraco e quase inaudível, Alice pediu licença para cada um até que obtivesse uma visão limpa.
Seus olhos foram imediatamente de encontro ao carro capotado, avistando todos os estilhaços dos vidros espalhados pelo local junto a extensos rastros de sangue. Seu coração pulsava em um ritmo tão descompassado que lhe trazia dor física. Seus olhos ficaram turvos pelas lágrimas densas que os tomaram após a confirmação de que aquele era o carro de Matheus. A movimentação dos paramédicos atraiu seus olhos justamente para o que ela mais temia em ver: o corpo de Emily ainda no chão, sendo analisado pelos paramédicos. As roupas estavam banhadas em um sangue de coloração tão viva que seu estômago embrulhou.
– Emily! Emily! – Alice gritava quando tentou correr em direção a amada, sendo impedida por um oficial do corpo de bombeiros que fazia a barricada entre as pessoas e a área isolada do acidente.
– Senhorita afaste-se, por favor! – As mãos firmes do oficial seguravam Alice pelos braços, e seu semblante sério não balançou pela mulher aos prantos que estava a sua frente.
– Eu a conheço! Por favor... – As palavras saíram embargadas pelo choro, e a todo o momento seus olhos acompanhavam a movimentação dos paramédicos que começavam a imobilizar a ruiva e coloca-la sobre a maca.
– Eu lamento! Mas você não pode se aproximar agora. – Alice se debatia nos braços do oficial, negando-se a aceitar a sentença. – Senhorita, acalme-se! Se você quer o melhor para ela, não interfira no trabalho dos paramédicos.
– Mas ela... Eu... Eu precis... – As palavras negaram-se a sair quando um nó formou-se em sua garganta ao ver o corpo de Emily com mais clareza.
Alice moveu a cabeça para acompanhar a movimentação rápida dos paramédicos enquanto eles cortavam a camisa social que a ruiva usava. Os profissionais liberaram o caminho para que pudessem colocar pressão em uma ferida no tronco de Emily que parecia não querer parar de sangrar. Ainda preso ao corpo da ruiva estava uma das ferragens do carro cravada logo abaixo da clavícula. Os paramédicos haviam optado por não remover o material até chegarem a um hospital.
Alice mal conseguia ver o rosto de Emily. Os cabelos ruivos misturados ao sangue e o extenso hematoma roxo cobriam grande parte do rosto dela, e vê-la desta forma lhe trouxe um sentimento horrível.
A tristeza nublou as feições do rosto da morena, trazendo um enorme desconforto para Emily. A ruiva contorceu-se em uma tentativa falha de esconder as marcas em seu corpo.
– Está tão ruim assim? – O desapontamento tomou aqueles olhos azuis, e Emily não foi capaz de encarar a outra.
– O quê? – Assustou-se com a pergunta, retornando de seus pensamentos. – Não, claro que não! Não é isso. – A morena precisou respirar fundo e engolir a dor que aquelas lembranças haviam lhe trazido antes de prosseguir. – Essas cicatrizes me fizeram lembrar do acidente, só isso. – Alice dobrou os joelhos e os abraçou.
Emily olhou-a de soslaio, e vê-la após admitir o que estava passando em sua cabeça lhe deu uma percepção diferente do que Alice estava sentindo: Não era decepção ou descontentamento com seu corpo, mas uma dor relacionada a tudo que havia passado após o acidente.
– Você estava lá? – Emily aproximou-se de forma lenta. – Digo, no dia do acidente? – Sentou-se ao lado de Alice, observando a feição da morena enquanto seus olhos castanhos se perdiam na imensidão do mar.
A advogada foi incapaz de verbalizar qualquer resposta. Sua garganta parecia ter se fechado para as palavras. Ela apenas consentiu em um balançar de cabeça.
Nem mesmo o vento fresco que insidia em seu rosto e trazia consigo a brisa do mar, ou o céu ensolarado que aquecia seu corpo foram capazes de sozinhos acalmarem seu coração. Fazia algum tempo desde a ultima vez que havia relembrado do acidente de forma tão vívida. Era como se todo o desespero daquele dia houvesse novamente se instalado em seu coração, trazendo-a o amargor da dor de suas escolhas. Evitar que as lágrimas tomassem conta dos seus olhos foi a parte mais difícil, e Alice precisou olhar para Emily e certifica-se de que ela realmente estava lá para então começar a recuperar-se.
Seus olhos alternaram entre o azul do mar e dos olhos da ruiva algumas vezes durante um silêncio que se fazia necessário. Entre as diferentes imensidões de azul que a cercavam, não foi difícil escolher em qual se afundar.
– Minutos antes do acidente, nós estávamos no mesmo lugar... – As palavras de Alice carregavam angustia. – E você saiu com o Matheus logo depois de termos um desentendimento. – Os olhos da ruiva penetravam nos seus, tão atenta a aquelas palavras que todo o barulho do mundo externo ofuscou-se. – Pouco tempo depois o motorista do caminhão que bateu no carro de vocês apareceu lá, chamando por mim com aquela roupa ensanguentada e... – Alice fechou os olhos durante uma respiração difícil, e quando seus olhos abriram, lá estavam as tão indesejadas lágrimas, brilhando em seus olhos.
Emily franziu o cenho, e a estranha sensação que sentiu invadir seu peito a fez querer abraçar a morena. Mas limitou-se apenas em um toque ao depositar sua mão sobre o joelho da outra, dando-a o conforto para prosseguir.
– Você estava inconsciente quando eu cheguei lá, e os oficiais não me deixaram ir até você... – Seus olhos contornaram a praia e pararam ao encontrar o mar. – Você teve duas paradas antes mesmo de te colocarem na ambulância, Emily. – Alice perdeu a luta quando uma lágrima morna escorreu pelo seu rosto. – E a quantidade de sangue que... – A voz ameaçou embargar no choro, forçando-a a iniciar outro silêncio doloroso.
– Eu estou aqui, Alice. – A ruiva negou-se a deixa-la passar por aquilo de novo, acariciando a perna dela.
– Eu sei. – A advogada cedeu em um sorriso breve que se misturou ao salgado das lágrimas que atingiram seus lábios.
Emily sabia que jamais seria capaz de imaginar o que Alice sentiu, mas vê-la daquela forma a fez entender que o trauma do acidente não se limitava apenas à ela, mas à todas as pessoas que faziam parte de sua vida.
-- Ei... – Disse em um tom rouco e baixo. – Eu não quis vir aqui com você para vê-la chorar assim. – Emily transcorreu o dedo indicador pelo braço da advogada até o alcance do queixo. Ao tocá-lo com a ponta dos dedos, a ruiva trouxe aqueles olhos castanhos de encontro aos dela, movendo o rosto de Alice em sua direção.
A intensidade com a qual os olhos da morena penetraram aos seus deixou seu coração bagunçado em uma mistura de batimentos fortes e acelerados. O toque antes tão inocente agora causava a ruiva arrepios na espinha. Olhos castanhos e azuis travaram uma batalha na qual Alice estava mal acostumada em ganhar, e que Emily ainda desconhecia aonde poderia leva-las.
O par de olhos azuis foi de encontro aos lábios da advogada como um ato de memória muscular, e percebê-la o fazer deixou Alice completamente inquieta e indecisa. Ela queria seguir com a atração natural que seus corpos tinham um pelo outro e beijar a ruiva ali mesmo, sem pedir permissão ou esperar consentimento. Mas esse era o seu lado emocional gritando em seu peito, enquanto a razão sussurrava para que ela esperasse por uma iniciativa de Emily.
A mistura de sentimentos que tomou o controle do seu corpo deixou Alice trêmula, pilhada em um nervosismo próximo ao do seu primeiro beijo com Emily. Ela lutou para afastar-se daqueles olhos que tão facilmente a dominava, mas era simplesmente impossível fazê-lo. Em poucos segundos, Alice perdeu-se na feição doce da mulher que estava a sua frente, e de repente tudo ficou preto.
Fim do capítulo
Olá meninas, boa noite!
Não sei se vocês chegaram a ver nos comentários, mas...
Peço desculpas pelo atraso deste capítulo, eu acabei me empolgando e escrevi um capitulo a frente deste que deveria ter postado rsrsrs
É o mal das idéias que vem em forma não cronológica D:
Espero que gostem da Leitura!
Um grande beijo para vocês!
P.S. Desculpem por qualquer erro de digitação, não estou tendo muito tempo para revisar os capítulos.
Comentar este capítulo:
lay colombo
Em: 31/08/2020
A situação é muito complicada, pq agora as duas tem q entender se querem mesmo esse relacionamento ou não, pq as vezes oq elas tão sentindo agora é um reflexo do passado mas q não se encaixa mais nessa nova versão de qm elas são (eu realmente espero q não, pq torço muito por elas, mas...), A Ruiva pelo menos sabe q ela agora é uma outra versão de si mesma, mas será q a Alice já percebeu q ela tbm não é a mesma ? Q oq aconteceu com Em mudou demais ela por dentro ? Pq eu acho q não
Bom depois dessa reflexão profunda vinda sabe Deus da onde, espero real q as duas voltem a se acertar
bjos meu anjo, até o próximo 😘
Resposta do autor:
Realmente uma reflexão bem profunda, haha
Passei um bom tempo tentando decidir como seguir com essa mudança também, e espero que os próximos capítulos tragam à vocês o mesmo entendimento do tão precioso tempo que eu tive quando me decidi.
Peço desculpas pela demora em postar um novo capítulo, mas só consegui recuperar os arquivos do meu notebook pessoal hoje, porque tive uns problemas técnicos com ele.
Em breve vou postar o novo capítulo!
Um grande beijo e até logo!
Mille
Em: 15/08/2020
Oi Jenny
Capítulo maravilhoso será que sai o beijo delas??
Bjus e até o próximo capítulo
Resposta do autor:
Seráaaaaaaaaaaaaaa?
Em breve você saberá!
PEço desculpas pela demora em postar um novo capítulo, tive alguns problemas técnicos com meu notebook e estava na batalha para tentar recuperar meus arquivos. Por fim, consegui!!
Um grande beijo e até breve!
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patty-321
Em: 14/08/2020
Uau! Amo esses suspenses. Essa tensão sexual entre as duas espero que renda cenas não somente românticas como eróticas. Hehehe. Adoro.
Resposta do autor:
Que bom você gosta Patty, tento sempre trazer alguns suspenses e mistérios para vocês!
Não sou a melhor pessoa do mundo para escrever erotismo, mas estou estudando técnicas de escrita relacionadas à isso, se serve de dica para os próximos capítulos rs
Um grande beijo, e desculpe pela demora para postar um novo capítulo, tive alguns problemas técnicos com meu notebook pessoal D:
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Simone
Em: 13/08/2020
Uau!!! 😱
Isso é que é uma autora de palavra!!! 🤗
Que delícia! Já estou me preparando para começar a leitura! Depois volto para comentar o capítulo.
Hmmmmm... Já construindo capítulos futuros?! Gostei demais disso!!!
Até breve, moça!
Beijos!
Simone.
Resposta do autor:
Sempre tento ser rs!
Mas sou uma humana imperfeita que foi deixada na mão essas duas últimas semanas. Meu notebook com todos os meus dados resolveu dar problema, e quase fui a loucura, porque tudo meu de faculdade e também da história estavam nele, e eu já havia escrevido muitas coisas, não queria começar do zero os capítulos futuros, rs.
Precisei comprar uns dispositivos para conectar meu HD em outro notebook e puf, consegui recuperar o que precisava (embora ainda esteja com o notebook pessoal com problemas).
Peço desculpas pela demora, mas já estou providenciando o encerramento do próximo capítulo para divulgar!
Um grande beijo!
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