8 - Imagem do paraíso (Imagem escolhida por Geh Lima)
— Mãe, onde a mamãe está?
A mulher já perdeu a conta de quantas vezes a pequena Estela perguntou pela mãe só naquele dia. Gerlane, ou Geh, como prefere ser chamada, suspira pela milésima vez, tenta controlar suas lágrimas, mas falha assim que escuta a voz da sua filha de quatro anos. Sua esposa, Vitória, está internada depois de descobrir ter câncer de mama.
Aquilo foi um golpe inexplicável nas duas, literalmente. Ambas usufruindo do grande momento das carreiras, de serem mães, com seus trinte e cinco anos, professoras universitárias, em processo de construção da vida de casadas. Tiveram a filha no momento mágico. Suas vidas giram em torno daquele pequeno ser, nada vai mudar isso, nem aquela maldita doença.
— Ela está na casa da vovó, meu amor, eu já te disse.
— Mas porque ela não... _ A menina boceja. — Por que ela não me levou? _ Geh sorri e beija o topo da cabeça da filha, que já demonstra sinais de sono.
— Porque ela está fazendo coisas de adulto.
— Não gosto de coisas de adulto.
— Nem eu, minha estrelinha, nem eu.
Ao fechar os olhos a morena lembra-se do olhar penoso da esposa, apesar de Vitória tentar ser a mulher forte que sempre foi, era claro que seus pensamentos estavam em Estela, tanto que obrigou a esposa a vir para casa ficar com sua filha.
Suas lágrimas voltam a cair, sabe que tem que ser forte, mas não tem como evitar, tem sua menina nos braços, seu milagre, mas não para de pensar na esposa, que aparenta não estar bem como o médico disse que ficaria. Aparentemente o câncer estava avançado, seria preciso a cirurgia e algumas sessões de quimioterapia, mas ainda não era uma tentativa certa da recuperação.
O desespero estava começando a tomar conta dela. Aquele era o primeiro dia de uma batalha que terão que lutar juntas, além de tentar de todas as formas não deixar aquilo afetar Estela, apesar de saberem que será uma missão impossível. Sessões de quimioterapia são tão ruins quanto pensam, ela sabe, todos sabem e em breve sua esposa também saberá.
Geh se acomoda melhor na cama e tenta dormir por algumas horas, sabe que aquele será um dia incomum entre os que virão pela frente, só não sabia que seria tão pior do que imaginou.
....................**********....................
No dia seguinte ela estava cedo no hospital depois de deixar a filha na creche e pedir para sua irmã, que vem a ser madrinha da menina, ir buscá-la. As famílias das duas entendem que precisarão ajudar de todas as formas, o problema nem seria tanto o financeiro, a família de Vitória tem boas condições, a complicação seria mesmo o emocional tendo uma criança de quatro anos envolvida.
— Oi, bom dia. _ A morena diz assim que ver a loira acordar aos poucos.
— Oi, querida. Você veio muito cedo, eu disse para ficar com Estela.
— Você sabe que eu não conseguiria nem dormir, Vitória, fui porque nossa filha estava chorando. Mas...
— Não podemos desampará-la. Não faça isso. _ A loira diz seriamente, mas era exatamente o que queria, estava doente, era fato, talvez não sobreviva, mas se acontecer o pior não quer que sua esposa negligencie a filha.
— Eu não vou fazer isso, Vitória, você está me ofendendo. Está sendo difícil para mim também. Estela também é minha filha e você é o amor da minha vida e...
— Desculpa. _ A loira diz assim que sente as lágrimas descerem por seu rosto. — Vem aqui. _ A morena tira o tênis e deita ao lado da mulher.
— A gente vai passar por isso também. A gente sempre consegue.
— Eu sei, meu amor, eu sei.
Elas ficaram ali por um tempo até o médico chegar e dizer que os exames precisavam ser feitos, após eles, terão uma visão mais detalhada da situação e então começar os procedimentos. Ele avisou que a paciente precisaria estar sempre em repouso, assim que fizerem a biopsia marcaria a cirurgia, isso porque Vitória preferia assim, a quimioterapia seria uma opção, mas a mulher não se importa em perder a mama, na sua mente é melhor do que passar pela tortura na quimio, pois não suportaria estar assim perto da filha.
Quando elas chegam a sua residência, a emoção toma conta das duas. Vitória por estar voltando depois de três dias no hospital, quando passou mal e descobriu o câncer, e Geh por ter sua esposa em casa de novo, mesmo que saibam que terão grandes desafios pela frente.
— Você quer comer alguma coisa? _ A morena pergunta assim que entram no quarto.
— Não, quer dizer, sim, mas não é comida. _ A loira sorri para a esposa e então se aproxima, abraçando seu corpo e beijando seus lábios levemente, mas logo se transformaram em algo rápido e desesperado.
— Espera, o que está fazendo?
— Quero fazer amor com você. _ Geh sorri.
— Isso eu já entendi, querida, mas tem algo errado.
— Geh... _ A loira suspira, pois a morena acaricia a lateral do seu rosto.
— Fala comigo, por favor, não me deixa no escuro, temos que fazer isso juntas.
Vitória sabe disso, porém é complicado, mais do que pensou que seria. Ela está apavorada, desesperada, isso porque ainda nem viu sua filha. Sabe que serão dias difíceis, mas prefere acreditar que tudo dará certo no final, no entanto também é humana, tem suas inseguranças e uma delas é perder sua esposa por conta dessa doença maldita.
Geh é uma mulher linda, seu porte atlético é atrativo para qualquer pessoa, homens, mulheres, jovens, adultos... Vitória sempre teve ciúmes da esposa, agora perderá um dos seios, esteticamente ficará diferente por um tempo, pelo menos até colocar um silicone, isso se o processo cirúrgico der certo, caso contrário passará por sessões torturantes e quimioterapia que deixarão sua aparência completamente destruída. Sim, ela é humana e sente que pode perder aquela mulher maravilhosa, apesar da morena deixar claro que ama a loira e nunca a deixaria por um motivo tão desumano.
— Eu vou perder um seio, isso se não acontecer o pior e eu fazer quimioterapia, quero me sentir desejada agora, quero que você se lembre de mim como eu sou agora.
— Droga, Vitória, como você pode pensar algo assim? _ A morena se afasta apenas para encarar os olhos da outra com mais clareza. — Eu te amo tanto que só pensar em não te ter mais... _ A maior fecha os olhos com força. — Dói, Vi, dói muito. Por favor, não pensa isso. Eu já disse, vamos superar isso juntas.
A loira já chorava, seu coração sabe daquilo, mas nem essa certeza lhe impediu de ter medo, de sentir insegurança.
— Eu te amo.
É só o que a loira consegue dizer antes de beijar a esposa, demonstrando aquele amor no toque dos lábios, das mãos, dos corpos, dos sentimentos. Elas se amam e a promessa de comprometimento, dos votos, da união, permanecerá até os últimos dias das suas vidas.
....................**********....................
— Mamãe. _ Estela solta a mão da madrinha e corre para os braços da mãe assim que entra e ver a loira deitada no sofá.
— Oi, estrelinha. _ Vitória abraça a filha com toda a força que pode para transmitir sua saudade e amor.
— Você não me levou para a casa da vovó, você não me levou.
— Oh, minha pequena, estava fazendo coisas de adulto.
— Não gosto de coisas de adulto. _ Então elas se separam.
— Como você está? Comportou-se nesses dias? _ A loira senta e coloca a filha no colo. Ama o fato de ela parecer tanto consigo, loirinha, pele clara e olhos esverdeados. Elas buscaram um doador parecido com a morena, mas isso não ajudou no fato de Estela ser uma pequena cópia da mãe, o que amolece o coração de Geh também.
— Claro, eu sou um anjinho.
— Claro que você é um anjinho. _ A loira beija a bochecha de Estela. — Oi, Gabi.
— Oi, Vi. _ Vitória entende que vai ter que se acostumar com aqueles olhares de piedade, algo que sempre odiou.
— A Geh está lá dentro preparando o jantar, vai até lá.
— Certo. Você... Você está bem?
— Vou ficar, não se preocupe.
A menor assente e vai para a cozinha. Vitória começa a conversar com a filha, tentando passar o máximo de tempo com a menina. Ela nunca falaria em voz alta para a esposa, mas não está tão confiante.
....................**********....................
— Como se sente? _ Geh pergunta para a loira que está deitada na cama do hospital. Chegou o dia da cirurgia e elas estavam ansiosas e nervosas.
— Não sei explicar, com medo, diria.
— Vai dar tudo certo. _ A morena levanta e beija os lábios da esposa. Assim que o faz, a porta se abre e Dulce, a mãe da loira, entra com a neta no colo.
— Oi, meu amor.
— Mamãe, vovó disse que você tá dodói.
— Vem aqui. _ Dulce leva a menina para perto da mãe, que se senta para falar melhor com a filha. — Mamãe vai fazer uma operação.
— Vai cortar a barriguinha igual fez para eu sair? _ Os olhos das três mulheres brilham pelas lágrimas que se formaram devido a emoção do momento.
— Sim, desse jeito. Aí depois a mamãe vai precisar ficar quietinha no quarto, descansando. Você promete que vai ajudar a mamãe Geh a cuidar de mim?
— Prometo. Só se você for para a fazenda com a gente.
— Você quer ir para a fazenda?
— Sim, quero muito.
— Então a gente vai assim que a mamãe se recuperar.
— Certo, então eu vou cuidar de você depois da operação.
— Muito bom, estrelinha.
Vitória não poderia de fato explicar o que estava sentindo no momento. Por isso simplesmente puxa sua filha para um abraço ao mesmo tempo em que olha para a esposa e mãe, ambas limpam as lágrimas. Elas estão confiantes que tudo vai dar certo. O médico as fez ter essa esperança, mas o medo ainda é presente.
— Bom, vou indo com ela para a casa da Gabi, depois volto, quero estar aqui quando você sair daquela cirurgia.
— Vai dar tudo certo, mãe, tenha fé.
— Eu tenho, meu amor, eu tenho.
Dulce beija o topo da cabeça da filha e pega a neta. Estela ainda tenta fazer manha, mas recebe um olhar repreensivo de Geh e logo para. A morena se despede da filha e volta a sentar ao lado da esposa. Ficaram apenas conversando sobre coisas de casa, até o médico entrar no quarto e avisar que a paciente seria preparada para a cirurgia.
— Eu vou estar aqui te esperando.
— Eu sei.
A loira diz e trocam um beijo. Ambas têm seus medos expostos naquele toque. Geh muito mais, pois era evidente que a loira não está tão confiante quanto a morena, isso está destruindo Geh por dentro, mas estará ao lado de Vitória em todos os momentos.
....................**********....................
Para Vitória, acordar depois daquelas horas era um alívio, mas ao mesmo tempo angustiante, pois isso quer dizer que está mesmo sem um seio, no entanto está viva, isso que importa. Ela gem* aos poucos quando abre os olhos. O primeiro rosto que ver é o do amor da sua vida, o que a faz sorrir.
— Oi, como se sente?
— Sede. _ A enfermeira que estava ao lado sai para buscar um pouco de água.
— Não se esforça. _ A loira assente. – O médico disse que foi tudo bem. _ A paciente sorri ao ouvir isso, logo recebe um beijo nos lábios. — Eu te amo.
Ambas sorriem, então a loira responde um “Eu também te amo”, sem som, apenas o movimentar da boca, o que era suficiente para a morena, pois ela não admite pensar que vai perder sua esposa.
....................**********....................
UM MÊS DEPOIS
— Eu sinto muito.
Não foi preciso nenhuma delas escutar mais nada. Era evidente o que ele queria dizer. Mesmo com a retirada do seio o câncer não sumiu. Ainda havia indício dele e aquilo foi o começo do desespero para Vitória que fez o sacrifício de tirar parte do seu corpo na esperança de ter sua saúde, mas não adiantou, terá que fazer quimio, era exatamente o que ela tentava evitar.
— Quando? _ Sua pergunta pegou Geh e o médico de surpresa, pois eles pensaram por um tempo que ela se negaria a fazer.
— O quanto antes melhor, daqui dois dias já podemos começar.
— Certo, então vamos marcar, se é para fazermos, então vamos fazer.
O homem encara a morena que assente, não está entendendo a reação da esposa, mas não vai contra sua decisão, está respeitando-a desde que fez a escolha sozinha de tirar o seio sem antes tentar a quimioterapia, o que era uma opção. Vai continuar apoiando-a como sempre fez.
Depois de marcarem tudo, elas saem, ainda sem dizer nada, assim como todo o caminho para casa. Quando chegam à residência o silêncio ainda toma conta, ou quase isso, pois a loira veio aos prantos, deixando seu corpo ir ao chão. Geh corre para perto e a puxa para seu colo, acalentando, tentando lhe dar forças, mas a verdade é que nem ela estava conseguindo controlar suas emoções.
— Eu te amo, eu te amo, eu te amo.
O choro desesperado de Vitória estava deixando a morena mais agoniada. Ela não tem capacidade de dizer algo diferente daquilo, sabe o quanto a esposa evitou essas sessões, sabe o quanto a mulher da sua vida não quer que sua menina a veja daquela forma. A única coisa que Vitória pensa no momento é manter uma imagem feliz, alegre, boa, para Estela antes de partir, pois para ela aquilo se torna cada vez mais inevitável.
— Eu não vou suportar, eu não vou.
— Para. _ Então a morena se afasta e encara os olhos da loira. — Você vai porque você é a mulher mais forte que eu conheço. Você, Vitória Lima, é o amor da minha vida, mãe da minha filha e eu não vou te deixar desistir, você entendeu?
Vitória queria ter aquela fé da esposa, queria concordar, mas não pode, não consegue mentir para Geh nem nesse momento. Então faz a única coisa que pode para evitar aquela resposta negativa, a beija.
A morena segura sua esposa com força, deixando claro que estará ao seu lado em todos os momentos, inclusive nesse. Geh sem esperar levanta e segura o corpo da esposa, o mesmo que ela não toca de forma tão íntima há um tempo. Caminha para o quarto e a deita na cama. Seria a primeira vez que elas fariam amor depois da cirurgia.
— Espera. _ Vitória segura a mão da esposa assim que ela tenta tirar sua blusa. — Eu não sou mais a mesma.
Geh sorri e a beija com todo o seu amor, carinho e respeito. A loira se deixa levar, aos poucos vai permitindo a esposa tirar sua roupa. Quando está nua da cintura para cima, espera pela reação da morena. Vitória está nervosa, ansiosa e preocupada. Ver a maior ficar ereta e encarar seu tronco, os olhos da morena brilham, não só por admiração, mas porque também vai amar aquela mulher seja como for, onde for e quando for.
— Linda.
— Geh... _ Os olhos da morena enfim encaram a esposa. Ela se abaixa de novo e beija mais uma vez os lábios da loira com carinho, mas logo o toque se intensifica.
— Eu vou te amar. Eu te amarei para sempre.
— Diz que me deseja.
— Ah, Vitória, eu te desejo, meu amor, eu te desejo como nunca quis outra mulher. Eu vou te provar. _ Geh então fica de joelhos, volta a encarar a esposa, leva sua mão para o seio e aperta, fazendo Vitória gem*r. A morena sorri, agora se afasta apenas o suficiente para tirar sua calça, logo volta a sentar no colo da esposa. — Vou te provar o quanto você ainda me deixa louca de tesão. _ A mulher eleva o tronco e pega a mão de Vitória, levando para dentro da sua calcinha. A loira gem* ao sentir a umidade. — Está sentindo? É assim que você me deixa, meu amor, é desse jeito que fico quando estou com você, e droga... _ A maior gem* quando a esposa começa a se mover. — Não é um seio que vai mudar isso. Ah... Isso.
Geh deixa seu corpo cair em cima da esposa, enquanto Vitória continua se movendo, a masturbando, se deliciando com o fato de estar mesmo deixando a morena daquela forma.
— Você confia... Confia em mim? _ A loira assente. Geh sorri, se abaixa e a beija, então sussurra perto do seu ouvido. — Então me fode.
Os gemidos de ambas foram mais do que a expressão do prazer, mais do que a satisfação física, foi a certeza das palavras de Geh. Ela ama sua esposa não só pelo seu físico, ama por tudo, por ser sua mulher, por ser tão especial, por ser mãe da sua filha, por ser essa guerreira. Ela ama Vitória Lima e nem um câncer vai mudar isso.
....................**********....................
— Você não precisa estar aqui. _ Vitória diz ao olhar para seus amores.
— Você não acha mesmo que iria estar em outro lugar, não é? _ A loira sorri pelas palavras da outra, mas fica séria ao ver a filha se mexer no colo de Geh, que segura sua mão.
— Acha que foi uma boa ideia trazê-la?
— Acho que sim, ela estava curiosa, meu amor, sabe como ela é. Talvez seja bom para ela entender que não fará mal a você. _ Geh sorri, apesar de estar nervosa pela primeira sessão. — Estela achava que você não ia voltar mais, querida, olha para ela. _ Ambas olham para a menina que dorme calmamente. — Não tem como dizer não a essa coisinha.
— Golpe baixo, amor. Golpe baixo.
Elas ficam um tempo ali, olhando para a filha dormindo, até a enfermeira vir e injetar a substância nas veias da loira. Explicou que ela pode sentir enjoos depois, dor de cabeça e bastante sono, como era a primeira sessão talvez não sentisse nada, pois as coisas começam a ficar mais tensas a partir da terceira. Vitória terá oito sessões para então observarem se terá resultados.
Claro que ela perguntou sobre a queda de pelos, a enfermeira sorriu, era uma dúvida de todas as mulheres. Da mesma forma, poderia acontecer a partir da terceira sessão, isso porque eram com as três doses que o corpo apresentava as fraquezas, consequências disso era a moleza e a perda de pelos.
Como elas esperavam, Estela acorda no meio da sessão, logo começa a fazer várias perguntas sobre a agulha enfiada na veia da mãe. Geh observava a interação das duas, esperançosa para enfim ter sua família bem de novo.
....................**********....................
Como a enfermeira havia previsto, as duas primeiras sessões foram calmas, Vitória sentiu dor de cabeça, mas nada insuportável, mas então veio a quinta sessão, foi a partir dessa que a loira entendeu de verdade sua real situação.
Agora, deitada em sua cama, sentindo frio, cheia de olheiras, dor pelo corpo todo, depois de ter vomitado tanto no banheiro do hospital quanto na sua casa... Nesse momento começa a passar um filme pela mente da loira, aquilo não foi bom, pois para ela já são lembranças que levará para sua pós vida.
— Você quer comer alguma coisa?
A loira nega e a morena suspira. Já fazia duas horas que a esposa fez o procedimento e desde lá não falou uma palavra. Então Geh tira sua camiseta e sapato, se deita na cama e puxa a outra para perto, que logo se aconchega contra o corpo maior com prazer. Elas ficaram em silêncio por um bom tempo, nenhuma teve coragem de falar alguma coisa, isso até a loira sentir a ânsia novamente e se virar para vomitar no balde que a morena colocou ali para facilitar sua vida.
— Eu estou aqui, meu amor, eu estou aqui.
Geh diz enquanto passa a mão nas costas da loira. Ela lutava para não chorar, para não se deixar levar pela sensação de inutilidade, porque era exatamente assim que se sentia. Depois desse momento, ainda com Vitória em seu silêncio, consegue dormir um pouco. Só acorda quando sente pequenas mãozinhas tocando seu rosto, ao abrir os olhos se permite sorrir pela primeira vez naquele dia.
— Oi, mamãe. _ Estela diz ao sorrir sapeca, está sentada ao lado da mãe.
— Oi, estrelinha. Como foi na creche?
— Bem, você está melhor?
— Um pouco.
— Já pode brincar comigo?
Dói, dói para cacete escutar aquelas perguntas todos os dias e sempre dar a mesma resposta. Vitória perdeu as esperanças, agora sente que sua missão é outra, será difícil, mas entende que não pode dar mais expectativas para nenhuma das duas, a sua única opção é prepará-las para o pior.
— Ainda não, meu amor, mas quero conversar algo com você.
— Ah, mãe, quero brincar. _ Coração da loira dispara.
— Quero te pedir uma coisa. _ A loirinha assente. — Você sabe por que eu sempre te chamo de estrelinha?
— Não, por quê? _ A atenção da garotinha estava toda em sua mãe.
— Porque um dia eu vou ser uma estrela e você é minha filha, então é minha estrelinha.
— Você vai virar estrela, mamãe? Que legal.
— Sim, só tem um problema nisso.
— Qual?
— Quando... Quando acontecer... _ Vitória lutava para não se derramar em lágrimas, quase não tem mais forças. — Eu vou deixar você e a mamãe Geh sozinhas. _ A menininha pensa um pouco nas palavras da mulher, fazendo suas caretas confusas.
— Mas mamãe, quem vai cuidar da gente? A mamãe sempre diz que você que cuida.
— É exatamente isso que vou te pedir, meu amor. _ As lágrimas escorrem pelo rosto da outra, que tenta tirar forças de todos os lugares para continuar aquela conversa, apesar de saber que sua filha não está entendendo tudo. — Você vai ter que cuidar da mamãe.
— Mas eu sou criança. _ Estela diz e cruza os braços, arrancando um sorriso da mãe.
— Eu sei, estrelinha, mas você vai cuidar dando muito amor, carinho, brincando com ela. Você pode fazer isso pela mamãe?
— Eu não quero.
— Você não quer cuidar da mamãe?
— Não!
— Por quê? _ A loira fica confusa.
— Porque assim você vai virar estrela e deixar a gente, eu não quero isso.
Vitória não consegue mais resistir, enfim se deixa levar pelas lágrimas, então puxa a filha para um abraço. Estela não entendeu aquele diálogo no momento, mas um dia vai lembrar-se e saber do que a mãe falava. Aos poucos a garotinha pega no sono, mas só a mãe dela sabe o quanto aqueles momentos entre elas são importantes a partir daquele dia.
A loira também adormece, porém não sabia que do lado de fora Geh escutava tudo. Quando escuta o pedido da esposa para a filha, se deixa escorregar encostada à parede e chora, ela chora tão desesperadamente que se comparava a um bebê. Suas mãos se prendem ao cabelo ao abaixar a cabeça. Sente a falta de fé da esposa e aquilo a estava destruindo.
— Por favor, Deus, por favor, não tira ela de mim, não a tira da gente.
A prece não era apenas para o Criador, era para qualquer força que pudesse lhe dar um suspiro de esperança. Estava morrendo aos poucos junto de Vitória, a única pessoa que conseguia tirar sorrisos dela era Estela, mas ver sua mulher preparando a filha para o pior acabou com seu coração. Ela não suportaria, nunca vai suportar a ideia de perder o amor da sua vida.
....................**********....................
Esperança... É uma palavra bonita que todas as pessoas gostam de usar no dia a dia, na vida, motivação para sobreviver, para entender a falta de amor pelo mundo, para compreender e criar expetativas para o futuro. É sinônimo de bons resultados, de esperar... Era isso que Vitória e Geh fizeram até a última sessão de quimioterapia, elas esperaram cada segundo por um milagre.
Então chegou o dia de receber os exames, entender se estava tendo efeitos. Perder o cabelo acabou não sendo um problema para a loira, na verdade foi algo bom, pois Estela achava o máximo tocar na cabeça da mãe raspada, até disse que faria o mesmo. Mas só Vitória e Geh sabem como doía escutar aquilo. No momento a inocência de Estela era o bem mais precioso que elas tinham.
Agora, sentadas mais uma vez em frente ao médico, que suspira ao abrir o envelope, elas percebem uma coisa. Esperança é uma droga, ela só faz com que os corações se destruam aos poucos, lentamente, cada pedaço dele, cada momento, cada olhar, cada beijo, cada vez que elas fizeram amor, a esperança destruiu tudo.
— Eu sinto muito.
Vitória aperta a mão da esposa, já esperava por aquilo, mas sabe que Geh não queria escutar, não poderia suportar, por isso esperaria que a morena surtasse para depois ampará-la, não quer sua mulher desesperada, pois Estela vai precisar dela.
— Não. _ Geh já entendeu, mesmo que doa, ela entendeu.
— Eu sinto mesmo, mas...
Porém a morena não o deixa terminar, ela solta a mão da esposa e sai correndo do cômodo. Geh corre para fora do hospital, simplesmente corre para o mais longe que consegue daquele lugar que desejava nunca mais voltar, porém nem isso foi suficiente para apaziguar a dor que sentia no peito. Ao chegar até o jardim do local se deixa cair de joelhos no chão. Não se importa com as pessoas a olhando, com os olhares penosos e cheios de dor, pois todos entendem que algo terrível aconteceu para ela estar ali.
Geh se deixa chorar, se deixa sentir a dor antecipada da perda. Ela queria ser forte, mas na verdade ninguém poderia explicar aquilo. Para piorar tinha a conformidade da esposa. No entanto a verdade é que Vitória sente tanta dor, sente seu corpo tão fraco, tão passivo da doença, dos momentos de desespero, que não consegue mais suportar, não queria deixar sua família, sua esposa, sua mãe, sua filha, seu pequeno milagre, mas não era mais ela, nunca mais será ela mesma. Não pode ser egoísta e querer permanecer se não pode dar o amor que todos merecem.
— Você não pode, não pode tirá-la de mim. Não pode!
De repente ela escuta um trovão e uma chuva forte começa a cair. Todos correm, mas Geh continua lá, de joelhos, chorando, desesperada, agoniada, sofrendo. Sua mente vaga pela lembrança do olhar de Vitória, pela forma que elas costumavam fazer amor, se amar, se sentir, até chegarem em Estela. Lembrando-se de como as duas se parecem, se dão bem, de como a filha pede para estar com a mãe, pensa na impossibilidade de viver sem sua mulher.
— Não... Por favor... Não! _ Então ela sente braços a abraçarem. Não era sua esposa, não era o amor da sua vida, mas ainda assim era importante. — Eu não posso perdê-la, Gabi, eu não posso.
— Eu sei, eu sei. Mas você precisa ser forte pela Estela, por favor, Geh, por favor.
A morena sabe disso, mas nem essas palavras foram suficientes para conter as lágrimas, para parar de pensar na sua vida sem Vitória, na verdade desde que conheceu a loira ela nunca mais imaginou sua vida sem a mulher. Mas agora? Agora todos os seus sonhos haviam sido destruídos.
Gabi chorava junto da irmã, não sabe o que dizer, apenas abraçá-la e tentar confortar seu coração, mas ela, assim como todos da família sabem que nada poderia ser feito, apenas esperar e viver o luto, o sofrimento, a perda.
Ficaram ali por um tempo, até Gabi dizer que Dulce veio buscar a filha. Geh se sentiu mal, porém não disse nada. Elas voltaram para casa. A morena suspira alto antes de abrir a porta. Ao fazer isso encontra sua filha e sua esposa sentadas no tapete da sala, brincavam. A loira parecia melhor, mas a maior sabe que aquilo era apenas seu esforço natural para estar com sua estrelinha o máximo que podia.
— Mamãe! _ A menina corre para perto da morena, que sorri. — Você está toda molhada. Mãe, a mamãe está molhando o chão.
— Você é uma dedo duro. _ Geh entra na birra da filha.
— Meu amor, vai buscar uma toalha para a mamãe. _ Vitória diz e então ver a filha correr para a dispensa. Ela se aproxima de Geh com cautela.
— Desculpa, eu devia ter ficado lá.
— Eu teria feito igual. Não perdeu muito, além de ele dizer quanto tempo eu tenho.
— Isso não tem graça, Vi, não tem...
— Eu sei. _ A loira se aproxima e a abraça sem se importar por estar molhada. — Você tem que ser forte por mim, por você e principalmente por Estela. _ A morena a abraça.
— Eu não vou suportar te perder, por favor, não me deixa.
— Ah, meu amor. _ A loira se afasta e dá um selinho na outra, depois encosta as testas. — Se dependesse de mim eu ficaria para a eternidade ao lado de vocês. Mas não é, e eu preciso que nos ajude, Geh, agora mais que nunca a gente precisa de você.
— Eu não sou tão forte.
— Você é, querida, você é. _ Então elas se afastam e se encaram, apenas para ter certeza do que vem pela frente, pois ambas precisavam se preparar.
— Mãe, aqui. E para de beijar a mamãe Vi. _ Estela chega perto das duas e entrega a toalha para a maior. Então Vitória olha de volta para a esposa.
— Vamos para a fazenda.
— O que? _ Geh pergunta.
— Vamos ficar na fazenda até...
— Vi...
— Considere esse o meu último pedido.
A morena suspira, ela não tinha como negar, mas seu coração estava completamente destruído. Aquele foi o primeiro dia do mês mais feliz e ao mesmo tempo mais aterrorizante da sua vida.
....................**********....................
Olhar para Vitória passou a ser a maior obsessão da morena. Todas as manhãs ela acordava primeiro e olhava para o lado, buscando por algum sinal de vida da esposa. Dorme feliz e acorda aterrorizada, pensando se aquele é o dia, se aquele será o momento em que perderá o amor da sua vida.
Fazia duas semanas que estavam na fazenda dos pais da loira, apesar de Vitória tentar passar alegria, força e carinho para ela e a filha, Geh sabe que a esposa está quebrada, se esforçando ao máximo para que Estela tenha o seu melhor. Como hoje, que a menina resolveu ir até a cachoeira. Ela adora o lugar e as duas mães acharam uma boa ideia, apesar de a mulher parecer muito cansada.
Geh sente a mulher suspirar mais uma vez, estando de costas apoiada contra seu corpo. Estão sentadas em cima de uma toalha na grama. Estela está brincando com seu novo presente, um cachorro. Ela corre e grita de alegria com o animal. A morena então beija a bochecha da esposa que sorri com o ato. Vitória não poderia reclamar dos seus últimos dias. Sua mulher, a que escolheu para estar até nos últimos momentos, lhe deu todo o amor do mundo. A fez sentir atraente, mesmo que esteja sem um seio e os pelos do corpo. A fez ser a mulher mais especial do universo. Não poderia reclamar.
Ama Geh com todas as suas forças. Deixá-la junto da filha lhe dá medo, inevitavelmente aquilo a faz sofrer. A morte é dolorosa, mas nada se compara ao desespero de deixar as duas mulheres da sua vida. Estela ainda não entende. Elas conversaram com a filha, ainda insistindo na ideia de a mãe virar estrela, sabem que uma hora esse conto de fadas irá acabar, mas preferem assim, pois seria pior para ambas explicar a realidade para uma criança de quatro anos.
— Promete que vai ser feliz. _ As palavras da loira fazem a morena suspirar.
— Eu não posso te garantir isso, mas eu prometo que farei nossa filha feliz.
— Eu preciso ir sabendo que você também será feliz.
— Eu acho que nunca mais serei totalmente feliz sem você.
A loira nada diz, nem se move, continua parada, hora olhando para a cachoeira na sua frente, outrora olhando para a filha que brinca com o animal. Então simplesmente sorri. Sorri porque está feliz. Sorri porque ela não acredita nas palavras de Geh. Sorri porque ela sente que completou sua missão naquela vida.
— Esse é o meu final feliz. Essa é minha imagem do paraíso. O meu fim do túnel. Eu sei que todos vão sofrer, mas... É isso, Geh, era para ser assim.
A morena nada diz, apenas aperta o corpo da menor contra o seu e se deixa chorar mais uma vez. Ela entende as palavras da esposa. Sabe que Vitória está conformada com o seu destino, mas ela não, Geh não se conforma que a vida foi tão dura com as duas. No final das contas viveu o melhor e pior de tudo.
— Eu te amo, eu sempre vou te amar.
— Eu sei, querida. _ Só então Vitória se vira e encara a esposa. – Eu também sempre vou te amar.
Elas trocam um beijo. O mais lindo e belo sentimento exposto naquele toque. Diante daquela cachoeira, daquela paisagem, dos olhos curiosos da sua filha, da vida que lhes deu tantos presentes, diante daquilo tudo elas se despedem. Mas com a promessa de um dia se reencontrarem.
....................**********....................
QUINZE ANOS DEPOIS
— Mamãe, isso não se faz. _ Estela reclama assim que entra em casa e ver a mãe deitada no sofá.
— Claro que se faz. Aquele moleque... _ Geh diz ao revirar os olhos, mas não lhe dá muita atenção. Logo escutam a porta se abrir novamente e a ruiva entrar.
— Tia, a mamãe fez de novo. Eu já tenho dezenove anos e ela não para com isso. _ A mulher sorri e deixa a bolsa em cima do sofá, então vai até a morena e beija seus lábios com carinho.
— Não me metam na loucura de vocês. Sou uma mulher de quarenta anos que ainda quer viver mais. Então se resolvam sozinhas. Oi, queridas, e tchau, queridas.
Valentina diz e deixa as duas discutindo. O fato é que Estela está fazendo faculdade na universidade onde a mãe é professora e sua madrasta também. Então toda vez que ela ver sua menina com o namorado dá um jeito de envergonhá-la na frente dos amigos. Estela fica vermelha e sem jeito, o que faz Geh lembrar-se de sua ex esposa. Talvez ela faça de propósito só para ver o rosto da filha corar e lhe trazer boas lembranças.
A ruiva entra no quarto e tira as roupas do trabalho, pega a toalha e se enrola, depois se deita na cama para relaxar um pouco antes de ir tomar um banho. Mas de repente ela escuta a porta se abrir.
— Você vai matar essa menina um dia.
— Não ligo, ela é minha filha, tem que me respeitar. _ Geh chega perto da esposa e se senta, pega seus pés e coloca em seu colo, começando a fazer massagem.
— Você vai ficar uma velha chata.
— Olha quem fala. Você faz a mesma coisa com a Helena, e olha que ela só tem dez anos. Falando nisso cadê a minha filha?
— Ela ficou com a Gabi, disse que queria brincar com a Cintia.
— Essas duas...
— Nem começa, elas são crianças.
— Viu, é disso que estou falando. _ A morena sorri e se aproxima, ficando com o corpo em cima da outra, logo beijando seus lábios com carinho. — Mas não se preocupe, assim que ela completar quatorze anos minha vigilância começa, assim como faço com Estela.
Ambas sorriem. Elas se conhecerem três anos após a ida de Vitória. A ruiva apareceu no momento ideal na vida da mais velha. Geh ainda se lembra da ex esposa. Na verdade, nunca vai esquecer e a atual esposa entende. Pois acredita também no amor da morena para si.
— Você é feliz comigo? _ A pergunta pegou a mais nova de surpresa.
— Que pergunta é essa? _ Valentina fica confusa.
— Só responde.
— Querida, estamos juntas há doze anos, você me deu uma filha linda, sem contar em Estela que considero minha filha. Eu te amo e sempre acreditei no seu amor. Como pode duvidar se sou feliz? _ Geh sorri e beija os lábios da esposa com amor.
— Hoje faz quinze anos.
— Eu sei. Se sua pergunta tem a ver com isso. Acredite, meu amor, você cumpriu sua promessa. Você fez e ainda faz sua filha feliz e também é feliz. Quer dizer, espero que seja. _ A morena então sorri e beija os lábios da esposa com mais amor, paixão, mais certeza, deixando clara sua resposta. Depois encosta suas testas.
— Eu te amo. Você me trouxe vida. Eu sou perdidamente apaixonada por você.
Elas sorriem e se beijam novamente. Logo depois a ruiva vai tomar seu banho. Geh então se levanta e caminha até a janela. Lá a abre e olha para o céu, ao lado da Lua tem uma grande estrela, ela a olha e sorri.
— Eu também sempre vou te amar, Vi. Para sempre.
As lembranças de Vitória a fizeram crescer junto com Estela, Valentina e Helena, seu outro milagre. Por isso agradece todos os dias seu antigo e seu novo amor, mas no final das contas ela é uma mulher apaixonada pelas duas mulheres que lhe fez ter os melhores momentos da sua vida.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook:
[Faça o login para poder comentar]