Helena

Ainda estava abalada com tudo que tinha acontecido. Por vezes me peguei chorando em momentos que deveria estar me distraindo, me desligando dos meus problemas. Recebi olhares acusatórios de pessoas que eu gostava, que eu considerava meus amigos. Ainda me dói lembrar de tudo que houve, me dói saber a que ponto o ser humano pode chegar, o quão cruel pode ser uns com os outros.

Precisava superar tudo que houve, colocar uma pedra em cima dessa parte do meu passado e tentar seguir em frente. Era isso que eu repetia pra mim diariamente em frente ao espelho.

"Você pode, você consegue Helena."

***

Já sentia o cansaço tomar meu corpo ao colocar o ultimo quadro na parede do meu quarto. Aos poucos minha nova casa ia se moldando ao meu gosto. Pra onde eu olhava conseguia enxergar um pouco de mim, da minha vida. Minha parte preferida da casa nova sem dúvidas era meu escritório. Tinha uma estante com meus livros, alguns álbuns de fotos, alguns enfeites, tudo muito simples, mas meu. A partir de agora seria ali que eu corrigiria minhas provas, que passaria horas me dedicando ao meu trabalho. Seria meu recanto!

Ainda estava divagando sobre isso quando ouvi o barulho do carro entrando na garagem. José Henrique, meu marido, havia chegado. Antes da confusão na minha antiga escola acontecer, eu já estava decidida a pedir o divórcio. Era casada a uma década e meia com ele, mas meu casamento não era mais um conto de fadas. Ele chegava tarde do trabalho com uma frequência cada vez maior, não me dava atenção, não se interessava em saber como foi meu dia, como eu me sentia.

Chegamos a ficar dois dias inteiros sem trocar uma só palavra, tudo estava desgastado, e eu me sentia cada vez mais infeliz. Tinha um carinho imenso por ele, pela nossa história, mas tudo não passava disso, de carinho.

Não o amava mais e acredito que ele também não. Mas então minha vida foi virada de cabeça pra baixo e mal pude reagir. Quando vi, tudo já estava feito, e por incrível que pareça a única pessoa que ficou do meu lado foi ele, meu marido.

Como eu poderia me separar depois disso? Eu jamais o trairia assim, jamais o deixaria depois de ser um dos únicos a me dar apoio no momento mais difícil da minha vida. Quando consegui um acordo no meu antigo trabalho, foi proposto a mim uma transferência de escola e consequentemente cidade. No início eu não aceitei, não achava justo ter que mudar minha vida por uma mentira, uma armação. Mas infelizmente eu não tinha outra alternativa. Não me restou mais nada além de assinar os documentos que acordaram tudo isso e ir embora.

Sei que pra José Henrique tudo foi tão difícil quanto pra mim. Ele também teve que mudar sua vida, deixar seu trabalho e se moldar a minha nova vida, e isso eu jamais serei capaz de esquecer, jamais.

Eram três horas da manhã quando decidi me levantar e tomar uma água. Estava a tempo demais rolando na cama de um lado para o outro, sentia meu corpo todo coçar e sabia que isso era consequência da minha ansiedade. Ás 07:30 teria minha primeira aula no colégio Dom Alfredo e embora não devesse, me sentia nervosa. Acho que isso é normal, afinal, estava inciando um novo ciclo em minha vida.

Depois que voltei da cozinha, deitei novamente em minha cama e pedi a Deus que me permitisse dormir por pelo menos algumas horas, ou eu amamheceria com terríveis olheiras. Quando enfim estava conseguindo relaxar, senti Zé Henrique atrás de mim, envolvendo minha cintura com posse ao mesmo tempo que deslizava seus lábios em minha nuca. Eu sabia o que ele queria, só não sabia se eu desejava o mesmo.

Fiquei quieta por alguns minutos, tentando fingir que estava dormindo.

- Eu sei que está acordada docinho. - sentia ele passar sua barba áspera em meus braços - Vamos carinho, me deixa te amar vai.

A culpa passou a pesar em mim, lembrei de tudo que ele havia feito por mim e me obriguei a me entregar a ele. A única coisa boa em tudo isso, é o fato dele não ser mais um garoto e não aguentar mais um sex* de várias horas. Em menos de vinte minutos já havia se saciado e assim pude tentar dormir novamente.

***

Acordei assustada com o barulho do despertador, olhei para o lado e meu marido ainda dormia sereno. Sentindo o frio na barriga, me levantei e me arrumei para meu primeiro dia de trabalho, sentindo que talvez agora, enfim, a vida pudesse sorrir pra mim.

Fim do capítulo