CAPÍTULO 26 - Último capítulo

          Camilla acordou no meio da noite assustada, gritou pelo pai que veio até o seu quarto para conversar um pouco até que a filha se acalmasse.

- Teve outro pesadelo minha filha?.

- Tive pai, fiquei com muito medo, primeiro eu estava com muita gente de braços dados assim ó - Camilla explicou como estavam e voltou a falar - tinha muita gente pai e gritavam "abaixo a ditadura", depois gritaram "o povo no poder", também falaram outras coisas, eu estava lá, só que era mais velha e umas pessoas me chamavam de companheira, depois já era outro dia, eu estava com outras pessoas e vi que uns rapazes carregavam o corpo de um estudante chamado Edson Luís, e tinham vários cartazes diferentes escritos "Bala mata fome?", "Os velhos no poder, os jovens no caixão" e "Mataram um estudante. E se fosse seu filho?", teve ainda uma outra vez que alguns homens de farda avançavam com uns cavalos para cima da gente, mas, conseguimos fugir, eu, o Dante que no meu sonho era chamado de Roger, e ele também era grande, lá também estavam a Tia Alice e a Tia Janine, só que a Tia Alice era chamada de Anna e era bem diferente do que ela é.

          Jairo coçou a cabeça, esses pesadelos estavam mais frequentes desde que mudaram de apartamento.

- Camilla, tem certeza que você não assistiu nada sobre a Ditadura militar?.

- Não pai, já falei...

- Tá bom, o pai acredita em você.

- Pai, o que é Ditadura militar?.

- É um período triste na nossa história, prometo que o pai amanhã te conta um pouco sobre isso.

- Eu lembrei de uma música, sabia?

- Qual?

- "Caminhando e cantando e seguindo a canção, somos todos iguais braços dados ou não"...Pai, quando ouço essa música dá um aperto no coração.

- Minha filha, está tudo bem, vamos voltar a dormir?, amanhã você foi convidada para almoçar no sítio da Tia Alice e da Tia Janine, te peço para não contar nada desses sonhos, tudo bem?.

- Tá bom Pai, ah, sabe o que o mano me disse?, que o Vítor e o Marcos do 301, falaram que a Alice a Janine não são irmãs, que elas são assim casal como você e a mamãe, é verdade?.

- Então filha, elas não me falaram nada, mas, se for verdade o que importa mesmo é que são pessoas do bem, não é?.

- Verdade papai - Falou Camilla abrindo a boca com sono.

- Boa noite filha.

- Boa noite pai.

          Estava longe do almoço, mas, Camilla estava arrumada e seguiu para tocar na casa das vizinhas, estava animada em passar o dia no sítio, também trazia consigo Clotilde na coleira.

- Oi, ela pode ir tia Alice?.

- Claro Camilla, pode sim...

- Só um minuto querida, pode ficar a vontade, vou chamar a Tia Janine para ir.

          Alice entrou do quarto e suspirou, Janine continuava de cara emburrada.

- Janine, a Camilla já está ai, vai continuar com essa tromba na frente da criança.

- Já disse que não vou mais...

- Amor, seja razoável, depois conversamos sobre esse assunto de inseminação artificial, eu te disse, eu vou pensar, com todo carinho, ok?.

- Eu sonhei com a bebê por uma semana seguida, nada mais justo que eu seja a mãe dela. Alice se ela nascer por outra pessoa vou ficar muito chateada com você.

- Meu bem, como você vai saber se é a criança do seu sonho?.

- Eu sei, ela disse que estava pronta e que queria vir através de mim, você está me enrolando porque não quer me dar o seu óvulo e não quer que eu engorde.

          Alice se aproximou, abraçou a namorada pela cintura, e sorriu.

- Minha gata, não é nada disso...quer saber?, tudo bem Janine, vamos ter a bebezinha loira que tanto quer, essa semana mesmo vamos estudar todo o procedimento, está bem?, vamos aumentar nossa família, vamos a uma clínica de fertilização assistida, te dou o meu óvulo e você gera a nossa filha, bom, também precisamos escolher um doador, no banco de sêmen, afinal, precisamos "matéria prima" masculina, não é?.

- Te amo tanto Lila, é meu sonho...ter uma filha nossa.

- Amor, você não sabe se será um menino ou uma menina...

- Eu sei, será uma menina.

          Camilla estava na porta observando as duas, percebeu que eram de fato um casal e estavam felizes.

- Oi tia, vocês estavam demorando, eu vim aqui...

- Tudo bem querida, pode entrar, chega aqui pertinho. Sabe, eu e Tia Alice somos um casal, nós nos amamos e vamos em breve ter um bebezinho, o que acha?.

- Acho muito legal tias, meu pai disse que o importante é que são boas pessoas, eu vou poder brincar com ela?.

- Pode sim, claro, e você vai querer nos ajudar também?.

- Vou sim, eu tenho uma ideia para o nome, se for menina, vocês podiam colocar de Malu, não é lindo?.

- Maria Luiza você diz?.

- Não tia Janine, só Malu mesmo.

- Tai gostei, se for menina será Malu.

          O dia estava lindo quando chegaram ao sítio, Chocolate, Charlote e os três filhotes correram para receber o pequeno grupo, depois de abraçar cada um, Janine e Alice contaram a novidade explicando como seria o procedimento, Alice doaria o óvulo e Janine carregaria o filho, ou a filha, contavam animadas do plano, enquanto Sâmia, Zefa e Tiago aplaudiram comemorando, Maitê e Camila já se conheciam e seguiram para brincar no jardim, levando Clotilde e os outros cachorros.

- É Alice, ai está o maior legado que a nossa Heleninha nos deixou, esse amor que sentimos uns pelos outros. Eu preparei um texto, é de uma novela antiga com a Christiane Torloni e o Antônio Fagundes chamada "A viagem", que assistia todas as noites com Helena, anotei o texto e acho que não existe oportunidade melhor para ler. Zefa saiu para buscar um caderno, tossiu para conter a emoção e começou a ler.

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"Hoje, de algum lugar longe dessas terras

Há um doce olhar só pra você

Um olhar especial

De alguém especial, de distantes origens

Um olhar de um justo coração que pulsa só a vida

Que sorri porque ama plenamente

Sem julgamentos, preconceitos nem prisões

Hoje, como ontem, longe desses céus

Há um encantado olhar só pra você

Nesse olhar vai para você a magia da luz

A simplicidade do perdão

A força para comungar com a vida

A esperança de dias mais radiantes de paz

Hoje, de algum lugar dentro de você,

Alguém que já o amou muito e ainda o ama

Diz para você que valeu a pena ter estado nessas terras...

Sob estes céus...

Falando de união, paz, amor e perdão

Poder sentir a força que faz você sorrir

E continuar o caminho

Que um dia aquele doce olhar iniciou pra você

Tudo isso, só para você saber que

A VIDA CONTINUA...

E A MORTE É UMA VIAGEM!

Fim do capítulo