Alice acordou cedo e bem disposta, tomou um banho demorado enquanto escutava a música "Meu Jardim" de Vander Lee, se arrumou rapidamente e saiu em direção a cozinha, todos ainda estavam dormindo quando passou pela sala e viu que apenas Chocolate tinha acordado e mexia a bolinha verde com sua pata, olhou tristemente a sua foquinha de pelúcia, mas, não se mexeu para leva-la até a dona, na verdade virou o rosto, magoado que estava, há meses sentia que Maitê agora era a sua dona, mas, tinha uma história antiga com Alice e não esquecia os bons momentos, estava quase dormindo quando viu a foca voar "pega Chocolate, pega a sua foquinha, vai filho". Quando ouviu, nem pode acreditar, balançou o rabo loucamente, parecia que todos esses meses não tinham existido e correu feliz trazendo e indo buscar o seu brinquedo preferido.

         A loira saiu sem fazer barulho indo até o quartinho de trás, levou consigo Chocolate, e só assim pode perceber como o ambiente estava triste, parecia sem vida, não viu e nem sentiu nenhum ser. Buscou um cd da avó e escolheu um mantra de Deva Premal, era Ganaytri Mantra, e foi como  se milhares de luzes se ascendessem, de repente tudo se iluminou no ambiente, pediu sinceras desculpas a todos os seres e deuses, e a magia se fez, pela primeira vez viu a fadinha que morava no jardim, viu alguns gnomos que energizavam as plantas e por fim, viu Annick.

- Lila, fico feliz que tenha voltado, todos nós ficamos, obrigada. Bom, não podemos perder tempo, nesse período a Bruxa Negra tem feito seus estragos, alguns membros migraram para o seu clã e não há nada que possamos fazer...

- O que aconteceu com Zoya?

- Zoya entrou para esse clã...

- Annick, a Bruxa Negra, o que ela faz de tão grave?, sempre ouvi falar nela, mas, nunca soube do que seria capaz...

- A Bruxa Negra é chamada de a grande parteira, pois, entre muitas coisas, ela quer trazer ao mundo aquele que que nascerá gerando o caos mundial, um ser bem pior do que esse que governa o país na atualidade, e para isso ela precisa de uma bruxa pura, que aceite ser a geradora desse ser, nós tentamos descobrir quem é essa bruxa, mas, só a vê quem entra para o clã, um dia uma delas veio até nós, queria pedir ajuda, a única coisa que descobrimos foi que todas as mulheres que entram no clã são testadas, sabemos também que as vezes ela sai procurando mulheres para recrutar, bom, a moça morreu nos braços de Helena, e não temos como saber muito mais do que isso, o que sabemos é pelas profecias, e percebemos que pelos sinais faltam poucas luas para que seu plano se concretize, a lua rosa foi substituída pela lua negra na noite de ontem, enfim, o que sei é que são poucas mulheres que podem gerar esse ser Alice, a pessoa tem que ser de uma geração de bruxas, e tem que ter a marca...

- Que marca?.

- Três meia luas intercruzadas, esse sinal geralmente fica bem escondido, é uma marca de nascença que passa de geração para geração, mas, que só se manifesta aos trinta anos, como você já não estava mais na tradição e nem estudando bruxaria, sua avó não se preocupou muito em conversar contigo sobre o assunto, mas, prevendo o que poderia acontecer, te certou de instruções e cuidados. Bom, voltando a marca, lógico que não necessariamente a bruxa que tem a marca vai virar uma bruxa negra, existe uma escolha, mas, muitas são seduzidas, as sacerdotisas da ordem negra tem uma força descomunal, não se tem como brigar de igual a igual em matéria de força e prática mágica, no entanto, todas elas tem um ponto fraco, só precisa descobrir qual, enfim, mas, não se preocupe, elas não conseguem nada sem que tenha um pouco do DNA da vítima. O que quero dizer, é que com certeza você tem essa marca Alice, sua avó da última vez que veio sentiu, olhe no meio da sua cabeça, você só pode senti-la a noite, por favor, não se apavore, sua mãe e avó também tinham a marca. Patrícia, sua mãe, por muito pouco não se tornou a principal sacerdotisa dessa ordem, mas, como deve imaginar ela preferiu uma vida de viagem e prazeres, para a nossa sorte...

          Alice escutou tudo muito atenta, estava disposta a não permitir que o caos não fosse instaurado no mundo, e saiu disposta a mudar tudo. Voltou para cozinha e todos continuavam dormindo, Chocolate foi até o sofá bocejou, dormindo logo em seguida. Olhou no relógio, ainda era cedo, parecia que o tempo tinha voado lentamente.

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Flashback on

          Era fim de noite, as luzes da boate tornaram-se mais ternas, era "A hora do flashback", momento muito aguardado nas sextas, quando o DJ Olavinho deixava rolar as músicas mais antigas e casais aproveitavam para curtir juntinhos. Alice sentou em um dos bancos que circundavam o barzinho, dispensando a garota que tinha acabado de ficar dentro do banheiro. Piscou para a bartender e pediu seu drink preferido de fim de noite, o "Dama rosa", feito de champanhe, leite condensado, creme de leite e morangos.

- Gata, prepara um "dama rosa" daqueles...

          Enquanto isso, Alice embalava seu corpo com uma música antiga do Bee Gees "how deep is your love" tocado pela boyband Take that.  A bartender já ia entregar o drink a Alice, quando uma mulher se adiantou.

- pode deixar que eu mesmo faço isso...

          A bartender balançou os ombros, voltando a se concentrar na série de drinks que estavam anotados em uma caderneta.

          Alice ficou anestesiada, olhando a beleza da mulher que estava a sua frente, tinha um cheiro embriagante, era muito alta e sua pele alva  combinava em perfeição com os olhos verdes, seus cabelos eram castanhos claros, lisos e presos em um rabo de cavalo, com duas tranças que iam de encontro ao rabo, alinhadas uma de cada lado, no entanto, apenas em uma delas tinha uma fita vermelha que seguia junto com os cabelos, tudo combinava com perfeição no rosto anguloso de traços delicados e finos, até mesmo um piercing atrevido da sobrancelha, coisa que nunca tinha agradado Alice. Seguiu analisando a mulher parada a sua frente com a taça na mão, estava vestida com uma jaqueta preta, meio desbotada, deixando a mostra a barriga bem torneada, estava com uma calça de risca de giz, enquanto um suspensório caia largado em suas pernas.

- Não vai querer o drink? - Perguntou a moça olhando com um sorriso discreto.

- Sim, e você quem é?.

- Eu, posso ser tantas, mas, se quer um nome pode me chamar de Jane Doe, mas, eu prefiro ser chamada apenas de Doe.

- Que nome incomum, Doe -  riu Alice.

           Doe se aproximou, passando a mão pela mandíbula da loira, e sussurrou no seu ouvido...e você é Alice Durand, estou certa?.

- Sim, certíssima, minha família é bem conhecida na cidade, que não conhece minha avó Helena?, ela ajudava muitos na cidade, era uma pessoa especial.

- ó, se era...

          Alice puxou um banco, pedindo que Doe sentasse ao seu lado, se arrumou, tentando disfarçar a embriaguez, enquanto pensava em um assunto inteligente para conversar, mas, a bebida não permitiu outra reação, e sem paciência para pensar em algo, apenas puxou o rosto de Doe, beijando-a com ardor, tinha um sabor diferente, meio agridoce, o que atiçou sua libido, com desejo, buscou o corpo da outra de encontro ao seu, só assim pode observar um colar de pérola negra dentro de uma lua de ouro,  mas, não pensou em nada, só queria aumentar o contato dos corpos, puxou novamente o rosto de Doe para um novo beijo, e passou a ondular seu corpo tentando envolver Doe e seduzi-la, suspirava alto, queria Doe com todas as suas forças, como se tivesse em um deserto e encontrasse um manancial de água, pensou também que Doe seria como água  de coco depois de correr no sol em uma belíssima praia nordestina, perdida em seus desvaneios, ficou sem entender, quando do nada, a moça se afastou terminando o terceiro beijo, riu discretamente, voltando a sussurrar no ouvido de Alice.

- Já tenho o que preciso, obrigada pelo beijos e pela troca de DNA, Alice...

- Espera Doe, como faço para te encontrar?.

- Não se preocupe, com certeza, a gente se esbarra por ai...

          Alice olhou Doe se afastar e pensou, "eu hein, que maluca!, é uma pena, pois pensei que fosse terminar a noite muito bem acompanhada".

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Flashback off

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          Alice encostou a mão na cabeça e pensou "que burra eu fui", mas, não tinha o que fazer no momento, e tentou esquecer a grande batalha que travaria com Doe.

          Com muito amor preparou a mesa para o café da manhã, assou um bolo de maçã com canela, foi até a padaria trazendo pães de queijos e pãezinhos, fez café, esquentou o leite e preparou um delicioso chocolate para Maitê, colocando chantili por cima, depois esperou que Zefa, Sâmia e Maitê acordassem. As três ficaram surpresas, a mesa estava linda e tudo estava muito gostoso, Maitê sorriu e falou "você voltou a ser legal Alice!", e todas riram, conversando amenidades como não faziam há muito tempo.

Fim do capítulo