Sophie e o pai treinaram alguns passes no quintal de casa durante a manhã de domingo e logo depois do almoço ele saiu para um bar com os amigos deixando Sophie entediada em casa. Ela não gostava ficar parada por muito tempo, mas nenhum dos amigos estava disponível naquele dia. Kevin saiu com a mãe e Claire ficaria estudando o dia inteiro.

Sophie tentou assistir algum filme, mas não tinha muita paciência para televisão se não fossem eventos esportivos. “Último domingo sem NFL, Sophie, você aguenta”, pensou antes de decidir sair para correr.

Por mais que futebol fosse sua real paixão, o atletismo era também algo muito prazeroso e correr sempre fora sua válvula de escape. Não teria sobrevivido o ano anterior sozinha com sua mãe se não fosse por isso. Sempre que se sentia sufocada ou irritada, simplesmente saía para correr ou para ir à academia.

Naquele dia ela decidiu tentar um caminho diferente do que costumava fazer todo dia pela manhã e chegou em uma vizinhança que não conhecia.

De repente assustou-se com um barulho de vozes altas. Tirou os fones de ouvido rápido e buscou a fonte, assustada.

– Você não pode ir assim! – ouvia uma voz familiar.

– Me larga! – outra voz gritou e então Sophie ouviu o barulho de algo quebrando e um gemido de dor.

Correu em direção a casa de onde vinha o som e chegou a tempo de ver um carro sair de forma tão irresponsável que quase a atropelou.

Quando olhou para o quintal da casa, encontrou Quinn caída no chão com sangue saindo de seu braço.

– Você está bem? – Sophie correu em sua direção preocupada e agachou-se na frente de Quinn, tomando cuidado com os cacos de vidro de uma garrafa de bebida quebrada que estavam no chão.

– Eu estou bem. Foi só um cortezinho – falou Quinn tentando segurar o braço esquerdo, mas ele continuava sangrando.

– Não foi tão pequeno, precisa estancar.

Sophie rapidamente tirou a blusa que usava, ficando apenas de top.

– Deixa eu te ajudar – falou logo antes de segurar o braço de Quinn, cobri-lo com sua blusa e apertá-lo bem forte.

– Sua blusa vai ficar toda manchada de sangue – disse Quinn ainda surpresa por Sophie estar ali, tão perto dela, segurando seu braço.

Ela foi pega de surpresa pela chegada de Sophie e sentia-se vulnerável. A situação em si com a sua mãe já a deixava abalada e estava difícil esconder suas emoções. Será que Sophie viu sua mãe ou ouviu a confusão anterior?

– É só uma blusa. Não se preocupa – disse olhando finalmente nos olhos de Quinn.

– Obrigada – ela falou sinceramente.

Sophie ficou um tempo calada sem saber o que dizer, apenas olhando nos olhos de Quinn. Nunca a vira com um olhar tão sincero, completamente desprovido do típico deboche e ar de superioridade.

As duas ficaram em silêncio por um tempo e Quinn sentia a sua própria respiração densa. Não conseguia tirar os olhos dela e não teve tempo de pensar rápido o suficiente antes de olhar o corpo de Sophie suado com o top preto, apenas abaixou o olhar tentando disfarçar o desejo.

– Já deve estar melhor – comentou Quinn.

– Deixa eu ver – falou Sophie retirando calmamente a blusa – Ainda está sangrando um pouco, mas acho que não vai precisar de ponto. Vamos precisar esperar para ver se vai estancar, mais alguns minutos.

E então as duas ficaram em silêncio novamente. Quinn estava tensa, olhando para o chão.

– Quer falar sobre o que aconteceu? – Sophie perguntou delicadamente.

Por conta do relato de Kevin ela já imaginava o que havia acontecido. Provavelmente a mãe havia jogado a garrafa de bebida em Quinn, o que gerou o corte e os cacos de vidro em baixo de si.

– Não – respondeu Quinn, simplesmente e Sophie reparou que ela tencionou. Fez uma movimentação como se fosse retirar o braço.

– Tudo bem! – falou Sophie rapidamente – Não precisamos falar sobre isso se você não quiser, só me deixa ajudar.

Quinn novamente subiu o olhar até o de Sophie e novamente relaxou o braço em suas mãos.

– Por que você me ajudaria? – perguntou.

– Por que eu não te ajudaria? – Sophie devolveu a pergunta.

Quinn não conseguiu segurar um sorriso sincero e um olhar doce. Sophie sentiu a respiração parar por um milésimo de segundo, surpresa. Nunca vira aquela feição carinhosa de Quinn, ela era sempre tão fria e distante.

– Talvez porque eu implique com você todo dia – disse quase rindo, com a mesma feição leve.

– Sinto te decepcionar, mas eu não tenho medo você – falou Sophie também sorrindo – E aquelas implicâncias não me tiram do sério nem um pouco.  

Quinn riu de forma sincera e Sophie completou:

– Não conta para ninguém, mas eu até acho divertido.

– Eu também – admitiu Quinn sorrindo para Sophie e olhando-a nos olhos.

– Você tem gaze ou alguma coisa para fazer curativo? – perguntou Sophie checando o corte novamente.

– Acho que sim.

– Vai me convidar para entrar? – brincou Sophie.

– Então é assim? Nem me beijou e já quer me levar para casa? – implicou Quinn, mas não da forma debochada e fria de sempre e sim sorrindo.

– Eu já estou até sem blusa! Por que esperar? – entrou na brincadeira.

As duas sorriram e se olharam nos olhos novamente antes de Sophie completar.

– Deixa eu fazer um curativo. Você não vai conseguir fazer com uma mão só.

Quinn fez que sim com a cabeça e as duas se levantaram. Sophie continuou pressionando o corte e elas caminharam lado a lado até entrarem na casa de Quinn.

– Pressiona bem e me fala onde estão as coisas que eu pego – falou Sophie assim que chegaram na sala.

– No armário do banheiro deve ter alguma coisa – disse Quinn explicando a direção.

Quando Sophie retornou com gaze e esparadrapo, pediu que Quinn se sentasse em uma cadeira da sala e puxou outra de forma a ficar à sua frente.

– Parou de sangrar, mas se voltar depois, melhor você ir num médico, talvez precise levar ponto – disse retirando a blusa de seu braço e começando a fazer o curativo.

– Vou ficar bem.

Quinn aproveitou que Sophie estava entretida cuidando dela e se permitiu olhar melhor seu corpo e seu rosto, que estava tão perto.

– Prontinho – disse Sophie quando terminou.

– Obrigada – falou Quinn de forma sincera.

As duas ficaram sentadas uma de frente para a outra sem saber o que dizer. Quinn tentava pensar em algo para falar pois não queria que aquele momento terminasse, mas estava nervosa e nada saía.

– Eu sei que você não quer falar sobre o que aconteceu – começou Sophie calmamente – Mas eu acho que você devia tentar. Se não quiser falar comigo, fala com seu namorado ou um amigo.

Quinn abaixou o olhar e fez uma feição triste. Ela não tinha amigos de verdade. Ela não tinha com quem conversar.

– Você não precisa se preocupar. Eu vou ficar bem – disse com uma feição distante, movendo-se incomodada na cadeira.

Sophie percebeu que seu semblante leve de antes fora embora depois de seu comentário. Quinn voltou a apresentar um olhar frio, com falsa firmeza.

– Se algum dia você mudar de ideia e quiser falar sobre isso ou qualquer outra coisa, pode confiar em mim – levantando-se foi até um lugar da sala que tinha um papel e uma caneta – Esse é meu número. Pode me ligar a hora que for – falou colocando o papel na mesa e se posicionando em pé, de frente para Quinn.

– Obrigada, mas eu estou bem – disse incomodada.

Sophie sabia, Quinn tinha certeza que Kevin havia contado pelo menos alguma coisa sobre sua mãe.

– Posso te pedir um favor? – perguntou Quinn.

– Claro!

– Não conta para ninguém...

– Eu não ia... – Sophie começou, mas foi interrompida.

– Principalmente para o Kevin – disse Quinn firme.

Sophie ficou em silêncio por alguns segundos antes de responder.

– Tudo bem, mas eu acho que você devia conversar com ele – disse e viu Quinn rir de forma irônica, claramente muito magoada.

– Como seu amiguinho já deve ter te contato, eu já tentei conversar com ele! Muitas vezes!

Sophie conseguiu ver a mágoa e a tristeza claramente em Quinn e sentiu-se muito mal. Ela merecia saber a verdade, mas não cabia a ela contar.

– Você devia tentar de novo – e então colocou a mão carinhosamente sobre o ombro de Quinn – Confia em mim e tenta só mais uma vez.

Quinn sentiu-se arrepiar com o toque de Sophie e segurou a respiração. Não a respondeu. Apenas a encarou por mais alguns segundos.

– E a oferta permanece – disse Sophie retirando sua mão do ombro de Quinn e apontando o papel na mesa – Se precisar é só ligar.

Sophie deu um último sorriso antes de se encaminhar para a porta. Quinn levantou e chamou-a antes que saísse.

– Obrigada – falou com toda a sinceridade que conseguia e completou em tom de brincadeira – Mas você sabe que não vou deixar de implicar com você por causa disso né?

Sophie sorriu lindamente antes de responder.

– Eu não esperava nada diferente – piscou para Quinn com seu típico falso flerte e saiu pela porta.

Quinn ainda ficou alguns segundos olhando o lugar por onde Sophie saiu, sem acreditar no que acabara de acontecer. Por fim sentou-se novamente na cadeira da sala e alcançou a blusa de Sophie suja com o seu sangue. “Ainda dá para sentir seu cheiro”, pensou levando-a ao rosto.

Fim do capítulo